ARTIGO ORIGINAL
Comparação entre as
técnicas de estimulação sensorial em diferentes texturas e banho de contraste
na melhora da sensibilidade plantar em indivíduos portadores de diabetes
mellitus tipo 2
Comparison between sensory stimulation techniques at different textures
and contrast bath on improving plantar sensitivity in patients with diabetes
type 2
Nathália Chaves Sousa*,
Manuelle de Sousa e Souza*, Vicari
Mayla Barros de Queiroz*, Rodrigo Luís Ferreira da
Silva, D.Sc.**, Mariana dos Anjos Furtado de Sá, D.Sc.**
*Acadêmica do Instituto
Esperança de Ensino Superior (IESPES), **Docente efetivo do Curso de
Fisioterapia da Universidade do Estado do Pará (UEPA)
Recebido em 3 de
dezembro de 2019; aceito em 18 de março de 2020.
Correspondência: Mariana dos Anjos
Furtado de Sá, Av. Curua-Una, 7055
casa 23 Bairro Jutaí 68045-000 Santarém PA
Mariana dos Anjos
Furtado de Sá: marifurtadodesa@gmail.com
Nathália Chaves Sousa:
nathchavs2218@gmail.com
Manuelle de Sousa e Souza:
souzasousamanu@gmail.com
Vicari Mayla
Barros de Queiroz: vicaribq@hotmail.com
Rodrigo Luís Ferreira da
Silva: rodrigolfs@uepa.br
Resumo
Introdução: O Diabetes Mellitus
tipo 2 (DM2) é considerado um dos principais problemas da saúde pública. Assim,
uma das complicações a longo prazo está relacionada as alterações de
sensibilidade principalmente na região podal. Objetivo: Comparar os
efeitos entre as técnicas de estimulação sensorial em diferentes texturas e o
banho de contraste para melhora da sensibilidade plantar de indivíduos
diabéticos tipo 2. Métodos: Trata-se de um ensaio clínico randomizado,
no qual os indivíduos foram inclusos por ordem de adesão através de sorteio,
sendo 6 participantes do circuito com estações em diferentes texturas (GDT) e 6
participantes do revezamento em banho de contraste (GBC) com idade média de 63
± 12 e 56 ± 11 anos. A avaliação sensitiva foi realizada em 9 pontos dos pés,
antes e após 24 intervenções fisioterapêuticas, sendo aplicadas 5 dias por
semana. Resultados: Tanto a técnica GDT quanto a GBC apresentaram
melhora significativa, com o valor de p < 0,0001 comparando o antes e
depois. A variável entre os grupos obteve o resultado de 0,0258. Conclusão:
Foi possível identificar que as duas técnicas promoveram a melhora da
sensibilidade plantar de forma significativa, evidenciando que a técnica do
banho de contraste mostrou-se mais eficaz comparada a variável do protocolo de
diferentes texturas.
Palavras-chave: diabetes mellitus,
neuropatias diabéticas, Fisioterapia.
Abstract
Introduction: Diabetes Mellitus type 2 (DM2) is considered one of the major public
health problems. Thus, one of the long-term complications is related to changes
in sensitivity, especially in the foot region. Objective: To compare the
effects between sensory stimulation techniques in different textures and the
contrast bath to improve plantar sensitivity of type 2 diabetic individuals. Methods:
This is a randomized clinical trial, in which the individuals were included by
order of adherence by lottery, being 6 participants in the circuit with
stations in different textures (GDT) and 6 participants in the contrast bath
relay (GBC) with mean age of 63 ± 12 and 56 ± 11 years. The sensory evaluation
was performed in 9 points of the feet before and after 24 physiotherapeutic
interventions, being applied 5 days a week. Results: Both the GDT and
GBC techniques showed significant improvement, with the value of p < 0.0001
comparing the before and after. The variable between the groups obtained the
result of p < 0.0258. Conclusion: It was possible to identify that
both techniques promoted the return of plantar sensitivity significantly, showing
that the contrast bath technique was more effective compared to the protocol
variable of different textures.
Keywords: diabetes mellitus, diabetic neuropathies, Physical Therapy Specialty.
O Diabetes Mellitus
(DM) é definido como um distúrbio metabólico, sendo o gerador da hiperglicemia
crônica, além de déficits no metabolismo dos carboidratos, lipídeos e
proteínas, devido a episódios de falhas na ação e secreção da insulina [1].
Apesar da sua
caracterização bem específica, deve-se notar que existem dois tipos de DM: tipo
1 (DM1) que ocorre de uma maneira repentina, geralmente em crianças e
adolescentes [2], e o tipo 2 (DM2) no qual o alvo principal são os adultos
acima do peso e com histórico familiar da doença [3].
O estilo de vida
sedentário e os maus hábitos alimentares têm gerado grandes consequências para
a saúde da população mundial [4,5]. No Brasil, mais de 12 milhões de indivíduos
possuem DM2, sendo a maioria deles acima de 40 anos e obesos. Nos Estados
Unidos, a estimativa é que entre 7 e 10% dos cidadãos adultos sejam portadores
da doença [6].
Os sinais indiciosos da
patologia são poliúria, polidipsia, polifagia e perda ponderal [7]. Assim, uma
das complicações da patologia a longo prazo está relacionada ao aparecimento do
pé diabético, que se caracteriza como uma complicação de origem neuropática
periférica, acometendo geralmente os pés e os segmentos restantes dos membros
inferiores [8,9]. Na patologia ocorrem alterações de sensibilidade
principalmente na região podal, podendo, desta forma, desencadear infecções,
úlceras, degradação dos tecidos e até mesmo amputações [10,11].
As complicações
relacionadas ao pé diabético, em grande parte, podem ser prevenidas através do
controle glicêmico, do etilismo, da obesidade, do tabagismo, bem como a
realização de protocolos que auxiliem no retorno da sensibilidade plantar
[12,13].
Uma das técnicas que
podem auxiliar no aumento da sensibilidade é o protocolo de estimulação
sensorial em diferentes texturas. O objetivo desta terapia é melhorar a
habilidade para interpretar a resposta sensorial alterada e melhorar a
percepção funcional do paciente com DM2. Este método consiste em colocar os pés
em diferentes texturas em um determinado período. Este tipo de intervenção é de
fácil manuseio e pode ser ensinado ao paciente para que seja possível sua
realização em ambiente fora da terapia [10].
O banho de contraste é
outra técnica utilizada para o ganho de sensibilidade. Consiste em mudanças
bruscas de temperatura, com imersão em água gelada (17° a 19°) e morna (37° a
39°). Esse método provoca a vasoconstrição e vasodilatação na região podal,
trazendo a melhora na circulação local e consequentemente o aumento do
metabolismo [14]. Portanto, o presente estudo tem como objetivo comparar os
efeitos entre as técnicas de estimulação sensorial em diferentes texturas e o
banho de contraste para melhora da sensibilidade plantar de indivíduos
diabéticos tipo 2.
Trata-se de um estudo
experimental, no qual duas intervenções terapêuticas para recuperação da
sensibilidade superficial plantar foram propostas e aplicadas em dois grupos
diferentes, buscando comparar os seus resultados quanto aos índices
quantitativos de estesiometria.
Todas as intervenções
foram realizadas no laboratório de Cinesioterapia do Instituto Esperança de
Ensino Superior, em Santarém/PA, no período de agosto a setembro de 2019.
Participaram desta
investigação 12 indivíduos diabéticos, que apresentavam alteração da
sensibilidade protetora na região plantar em pelo menos um ponto a ser testado
(ou seja, a atenuação da sensibilidade com o monofilamento
lilás), que foram selecionados de um determinado serviço público do Município
de Santarém/PA. Os primeiros a cumprirem os critérios de inclusão fizeram parte
da pesquisa.
Os participantes foram
divididos em dois grupos: GDT constituído por 6 indivíduos que receberam a
conduta terapêutica baseada em estímulos na região plantar por diferentes
texturas; e GBC constituído por 6 indivíduos que receberam a terapia através do
banho de contraste. A distribuição dos participantes nos dois grupos da
pesquisa, ocorreu de maneira randomizada, através de sorteio.
Os participantes do GDT
eram solicitados a tocarem e deslizarem os seus pés em 6 caixas, cada uma
forrada com uma textura diferente: lixa nº 100, caixas de ovos vazias, grãos de
feijão, grãos de arroz, esponja de aço e espuma. Em cada caixa os participantes
tocavam e deslizavam os pés por 3 minutos. No GBC os participantes eram
submetidos ao banho de contraste através da imersão dos pés em água morna em
uma temperatura entre 37ºC e 39ºC, seguido da imersão em água gelada com a
temperatura entre 17ºC e 19ºC. Este processo tinha duração de 12 minutos, sendo
realizadas 4 imersões (2 vezes em água morna e 2 vezes em água gelada de
maneira alternada).
Após a inclusão em um
dos grupos os participantes eram avaliados pelas pesquisadoras, que
investigavam dados para a caracterização clínico-epidemiológica dos grupos
(gênero, tempo de diagnóstico e idade), assim como realizavam o teste de
sensibilidade plantar, pela técnica estesiométrica,
que representou a variável de desfecho desta investigação.
Ambos os pés dos
participantes foram testados e em cada pé nove pontos foram selecionados para a
aplicação dos monofilamentos (figura 1). Uma escala
de pontuação foi empregada para quantificar os níveis de sensibilidade plantar
(Quadro 1).
O presente estudo foi
submetido a análise do Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Esperança de
Ensino Superior (IESPES), aprovado sob o número do parecer: 3.503.919 e CAAE:
09365319.0.0000.8070.
Os pontos testados
estão demonstrados na figura 1.
Fonte: Ministério da
Saúde (2010) [15].
Figura 1 - Pontos de
avaliação da sensibilidade plantar.
Quadro 1 - Escala de
pontuação para os níveis de sensibilidade.
Fonte: Garbino et al. [16].
Cada grupo foi formado
por 6 voluntários após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE).
Vale ressaltar que após
a coleta dos dados pessoais, os indivíduos primeiramente passavam por uma
hidratação, higienização e lixamento dos pés, para que em seguida, fosse
aplicado o teste de sensibilidade plantar pela técnica estesiométrica.
Logo após esta
avaliação inicial os participantes começavam seus protocolos terapêuticos. Para
cada grupo foram executadas 24 intervenções, com frequência de 5 sessões por
semana. Ao final do período de intervenções foram realizadas as reavaliações
dos participantes, utilizando os mesmos métodos da avaliação inicial.
Todos os achados foram
duplamente digitados e organizados em planilhas do software Excel (Microsoft
Office®2016). Os dados de caracterização clínico-epidemiológica (gênero, tempo
de diagnóstico e idade) receberam tratamento estatístico descritivo e tiveram
suas distribuições comparadas pelo teste “qui-quadrado”.
Já os resultados das
avaliações inicial e final dos níveis de sensibilidade plantar, primeiramente
tiveram sua normalidade testada e em seguida foram comparados por meio dos
testes “t de Student pareado” para análise
intragrupo, teste “t de Student não pareado” para a
realização da comparação entre os grupos e o teste “Mann-Whitney” para análise
das variáveis intergrupos para o resultado final.
Foi analisado cada um
dos nove pontos sendo possível a visualização do estágio de cada pé dos
participantes, assim os resultados da comparação individual da região podal
foram calculados através da média dos pontos. Estas análises foram processadas
no software SPSS 24.0, e o nível de significância empregado nestas análises foi
5% (p ≤ 0,05).
Tabela I – Caracterização da
amostra de acordo com os grupos estudados.
*Resultados do teste Qui-quadrado; **Resultado do teste t de Student
não pareado. Fonte: dados da pesquisa.
Na tabela I foi
possível identificar que o perfil dos participantes se mostrou semelhante, não
havendo diferença significante que possa interferir nos resultados da pesquisa,
através do gênero, idade e tempo de diagnóstico.
Tabela II – Descrição dos
resultados do valor mínimo, máximo, mediana, média e desvio padrão (DP) da
amostra.
*Resultados do teste
D´Agostino Pearson. Fonte: dados da pesquisa.
Na tabela II os
resultados demonstraram normalidade na comparação antes e depois intragrupos,
não demostrando normalidade nas variáveis intergrupos.
Tabela III – Comparação antes
e depois do resultado médio da sensibilidade plantar direito/esquerdo dos
participantes inseridos no grupo diferentes texturas (GDT).
P1-P6 = Participantes;
*Resultados significativos do teste t de Student
pareado. Fonte: dados da pesquisa.
Os resultados não foram
significativos na média dos pontos do pé direito de P2 e P3, e pé esquerdo de
P4, mostrando que nesses casos não houve resultado da melhora da sensibilidade
na técnica de diferentes texturas.
Tabela IV – Comparação antes
e depois do resultado médio da sensibilidade plantar direito/esquerdo dos
participantes inseridos no grupo banho de contraste (GBC).
P1 - P6 = Participantes;
*Resultados significativos do teste t de Student
pareado. Fonte: dados da pesquisa.
Na tabela IV, os resultados
não demonstraram significância na média de pontos do pé direito P1 e P3, no pé
esquerdo não houve melhora na média de P4.
Tabela V – Comparação dos
resultados das técnicas de diferentes texturas e banho de contraste e a
resultante da variável intergrupo.
*Resultados do teste Student pareado, **teste t de Student
não pareado, *** teste Mann-Witnney. Fonte: dados da
pesquisa.
Foi possível
identificar a melhora significativa da sensibilidade nas duas técnicas, mas a
variável do banho de contraste se mostrou melhor que a técnica de diferentes
texturas, assim apresentando como melhor terapia empregada para o ganho do
objetivo proposto.
O Diabetes Mellitus
tipo 2, segundo Sousa et al. [17] é caracterizado pela hiperglicemia
crônica devido a uma resistência e/ou falha da ação da insulina, dificultando a
entrada de glicose para o interior das células, levando ao desequilíbrio no
metabolismo do portador. Carneiro [18] afirma que a patologia pode acarretar
complicações crônicas no Sistema Nervoso Periférico, podendo resultar em
déficits motores e sensitivos.
Neste contexto, Maronesi et al. [19] complementam que a neuropatia
periférica pode se desenvolver desde o princípio da doença apresentando
possibilidades de tornar-se crônica a longo prazo. Com isso, pode gerar
acometimentos na sensação dolorosa e quadros infeciosos.
Existem muitos métodos
de avaliação da sensibilidade, sendo um deles, o monofilamento
de Semmes-Weinstein, que segundo Mendes [20], é
utilizado para a verificação dos graus sensitivos táteis. Este método é
responsável por avaliar a sensação protetora plantar e o mecanismo de defesa
dos pés, demonstrando se o indivíduo apresenta riscos para desenvolver úlceras
na região podal.
Carmo et al.
[21] afirmam que há necessidade da avaliação sensitiva estesiométrica
dos portadores de diabetes mellittus pelos
profissionais capacitados da área da saúde, a fim de detectar precocemente o
diagnóstico da diminuição ou perda da sensibilidade protetora plantar,
possibilitando o direcionamento do tratamento adequado e autocuidado, evitando
possíveis acometimentos secundários.
O estudo realizado por
Santos et al. [22] demonstra que pé diabético consiste em lesões
causadas por déficits circulatórios e sensitivos de uma determinada região,
resultando em infecções, úlceras ou amputações e, consequentemente, a perda da
qualidade de vida do portador da doença. O autor relata também as maneiras
preventivas de tal acometimento, como controle da glicemia, uso de sapatos
adequados, higienização, secagem correta dos dedos, entre outros.
Há diversos tratamentos
para ajudar no retorno sensitivo, sendo um deles a estimulação sensorial em
diferentes texturas, que consiste em estimular a área com parestesia em objetos
de formatos diversificados, e banho de contraste que é definido pela imersão do
membro em temperaturas divergentes [14,23].
Santos et al.
[24] realizaram uma pesquisa com 13 mulheres diabéticas, onde foram aplicadas
as técnicas de estimulação sensorial através de texturas diferenciadas e treino
de equilíbrio e marcha. Seus resultados mostraram uma melhora de 70% na
sensibilidade plantar, mostrando valor de p < 0,05, apesar da ocorrência de
outliers, ou seja, valor atípico na pesquisa. O presente estudo corrobora a
pesquisa citada, demostrando significância na melhora sensitiva cutâneo-plantar,
porém sem associação das técnicas de equilíbrio e marcha.
No estudo de Santos et
al. [10] foram executadas técnicas de estimulação nervosa por meio de
diferentes texturas e imersão em água em temperaturas distintas, com o objetivo
de desenvolver o retorno sensitivo podal em 7 indivíduos diabéticos. Em seus
resultados mostraram melhora na sensibilidade em 6 participantes, apresentando
déficit da percepção através do nervo calcâneo em 1 participante, sendo
diferente do estudo em questão, pois evidenciou melhora em toda a amostra dos
submetidos as técnicas, mas os resultados referentes a variável que compara as
duas técnicas apontaram que o protocolo de banho de contraste obteve maior
efetividade em relação a técnica em diferentes texturas.
Foi evidenciado por
Carvalho et al. [25] a melhora do processo inflamatório e analgesia
através do banho de contraste, sendo demostrado no presente estudo que esta
técnica traz benefícios na melhora sensitiva da área aplicada. Isso pode ser
explicado pelo aumento do metabolismo e oxigenação local que o calor induz,
havendo, durante a técnica, a dinâmica de vasoconstrição e vasodilatação,
aumentando o aporte sanguíneo.
Já Torriani
et al. [23] utilizaram objetos de diferentes texturas, massagem manual
profunda associada a mobilização ativo-assistida e objetos de formatos
diferentes associados a mobilização ativo-assistida para estimulação motora e
sensorial nos pés de 18 pacientes hemiparéticos pós
Acidente Vascular Encefálico, divididos em três grupos respectivamente. Em seus
resultados, observou-se que não houve diferença estatística entre os grupos,
mostrando o mesmo nível de qualidade das técnicas. Diferente, o atual estudo
evidenciou melhora importante nas duas técnicas, mas o banho de contraste
obteve resultados superiores quanto a variável concernente a técnica de
diferentes texturas.
Foi possível
identificar que as duas técnicas promoveram a melhora da sensibilidade plantar
de forma significativa, evidenciando que a técnica do banho de contraste
mostrou-se mais eficaz comparada a variável do protocolo de diferentes
texturas, porém é necessário que haja mais estudos com amostras maiores e
avaliações de outros aspectos da região plantar como sensibilidade térmica e
dolorosa, com o objetivo de mostrar resultados mais aprofundados e
diversificados. Estes critérios avaliativos podem ser testados através da
associação a outros protocolos fisioterapêuticos.