REVISÃO
A aplicação da escala
KTK para a análise do desenvolvimento motor grosso em crianças
The KTK scale application for the analysis of the gross motor
development in children
Fabiana do S. da Silva
Dias de Andrade, D.Sc.*, Renato da Costa Teixeira, D.
Sc.**, Lilian Rose Mascarenhas, M.Sc.***, Pollyanna Dórea Gonzada de
Menezes****, Rafael Vinícius Santos Cruz*****, Fabianne
de Jesus Dias de Souza******
*Docente da Faculdade
de Ciências Integradas de Taquara, **Docente da Universidade do Estado do Pará,
***Docente da Universidade do Estado do Pará, ****Docente da União
Metropolitana de Educação e Cultura, *****Fisioterapeuta do Hospital Santa Casa
de Misericórdia de Itabuna, ******Docente da Universidade Federal do Pará
Recebido em 5 de
dezembro de 2019; aceito em 20 de maio de 2020.
Correspondência: Fabiana do S. da
Silva Dias de Andrade, Rua Maximiliano Hahn 37/301, Bairro Jardim Bela Vista
95670-000 Gramado RS
Fabiana do S. da Silva
Dias de Andrade: fabi4000@gmial.com
Renato da Costa
Teixeira: renatocteixeira@uepa.br
Lilian Rose Mascarenhas:
lilianrosemascarenhas@yahoo.com.br
Pollyanna Dórea Gonzada de Menezes: polly_dorea@yahoo.com.br
Rafael Vinícius Santos
Cruz: rafaviny@gmail.com
Fabianne de Jesus Dias de Souza:
fabiannesousa@hotmail.com
Resumo
Introdução: A escala Körperkoordinations test für Kinder (KTK) destaca-se por ser uma forma indireta e
eficaz de mapear a coordenação motora grossa entre crianças de 5 a 14 anos de
idade. O teste é constituído por quatro etapas, nas quais avaliam-se: 1)
equilíbrio em marcha para trás; 2) saltos laterais; 3) saltos monopedais e 4) transferência sobre plataformas. Objetivo:
Buscar através de revisão narrativa a aplicabilidade da escala KTK na pesquisa
do desenvolvimento motor grosso com crianças sobrepeso/obesas e eutróficas. Métodos: Foi realizada uma revisão
narrativa da literatura nacional e internacional através das bases de dados Lilacs, PubMed, Scielo e Bireme e por meio do cruzamento das
palavras-chave: Child, Overweight,
Obesity, Motor skills, Körperkoordinationstest für
Kinder (KTK) e os seus correspondentes em português. Os artigos de
observação e experimentação realizados no período de 2003 até o presente
momento foram incluídos desde que atendessem aos critérios de inclusão. Conclusão:
A bateria de testes KTK mostrou-se eficiente para pesquisa do desenvolvimento
motor grosso de menores sobrepeso/obesos e eutróficos.
Palavras-chave: criança, sobrepeso,
obesidade, destreza motora.
Abstract
Introduction: The Körperkoordinations test für Kinder scale (KTK) stands out as an indirect and
effective way of mapping gross motor coordination between 5 to 14 years old.
The test consists of four stages, which evaluate: 1) backward balance; 2) side
jumps; 3) single jump and 4) transfer on platforms. Objective: To search
through narrative review the applicability of the KTK scale in the research of
gross motor development with overweight/obese and eutrophic children. Methods:
A narrative review of the national and international literature was performed
through the Lilacs, PubMed, Scielo and Bireme
databases and by crossing the keywords: Child, Overweight, Obesity, Motor
skills, Körperkoordinationstest für
Kinder (KTK) and their correspondents in Portuguese. Observation and
experimentation articles conducted from 2003 to the present moment were
included if they met the inclusion criteria. Conclusion: The KTK test
battery proved to be efficient for researching the gross motor development of
underweight/obese and eutrophic individuals.
Keywords: child, overweight, obesity, motor skills.
Estimativas mundiais
apontam que a prevalência global de crianças com sobrepeso/obesidade cresceu de
4,2% em 1990 para 6,7% em 2010. No mesmo ano havia aproximadamente 43 milhões
de crianças sobrepeso/obesas, e destas, 35 milhões residiam em países em
desenvolvimento [1].
O Brasil, por sua vez,
experimenta uma transição nutricional com decréscimo no déficit de peso para
aumento nos índices de sobrepeso/obesidade, não apenas entre adultos, mas
também entre o público infantil [2]. Nesse contexto, ressalta-se o Projeto
ERICA (Estudos de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes-2013-2014), o qual
avaliou 73.399 (72%) de um total de 102.327 adolescentes elegíveis na faixa
etária de 12 a 17 anos de idade, demonstrando uma prevalência de sobrepeso de
17,1% e de obesidade de 8,4% [3].
O esclarecimento sobre
os fatores de risco para obesidade na infância é fundamental, posto que ¾ das
crianças obesas tornam-se adulto obeso [4]. Sabe-se que a obesidade infantil é
de causa multifatorial e, entre elas citam-se: atuação da família, importância
da escola, papel da comunidade, políticas nutricionais voltadas para a
quantidade de energia adequada a ser ingerida pela criança e o próprio ambiente
em que ela se encontra inserida [5].
Sobre a análise do
desenvolvimento motor, inúmeros instrumentos podem auxiliar na sua avaliação e
diagnóstico, entre eles está a escala Körperkoordinations
test für Kinder (KTK) [6].
Esse teste destaca-se por ser uma forma indireta e eficaz de mapear a
coordenação motora grossa, sendo validado para crianças e adolescentes de 5 a
14 anos de idade. É constituído por quatro etapas nas quais avaliam-se: 1)
equilíbrio em deslocamentos para trás; 2) saltos laterais; 3) saltos monopedais e 4) transposição lateral [7]. Sua principal
finalidade é medir o grau de déficit motor para as atividades de balanceio,
ritmo, lateralidade, velocidade e agilidade. É um instrumento com escores
separados para o sexo feminino e masculino, limitando-se a avaliar apenas o
desenvolvimento motor grosso, com ênfase às habilidades pertinentes ao
equilíbrio dinâmico [8,9].
Sendo assim, o objetivo
do presente artigo é demonstrar a aplicação da bateria de testes KTK na análise
do desenvolvimento motor grosso de crianças sobrepeso/obesas, a partir dos
resultados encontrados no meio científico.
Trata-se de uma revisão
narrativa sobre o uso da escala Körperkoordinationstest
für Kinder (KTK) no período de 2003 até 2019, tendo
sido consultadas as bases de dados Lilacs, PubMed, Scielo e Bireme, por meio
do cruzamento das palavras-chave: Child, Overweight, Obesity, Motor
skills, Körperkoordinationstest für
Kinder (KTK) e os seus correspondentes em português. Foram considerados
elegíveis os estudos experimentais e observacionais que utilizaram a escala, os
quais impreterivelmente deveriam apresentar claramente os seus métodos.
Outrossim, foram excluídos trabalhos de revisão sistemática, de literatura e
aqueles que não apresentassem metodologia adequada a este estudo.
Crianças e adolescentes
obesos apresentam com frequência múltiplas comorbidades físicas e psicológicas
[10]. Entre as físicas estão o aparecimento de hipertensão arterial, diabetes, resistência
à insulina, dislipidemias, doenças coronarianas e distúrbios do sono [3,5].
Além de contribuir para
a ocorrência de comorbidades metabólicas, o aparecimento de sobrepeso/obesidade
é fator de risco importante para atrasos no desenvolvimento motor em crianças
[11,12].
Para Lopes [13],
crianças obesas exibem um desempenho acentuadamente inferior e são menos
habilidosas nas tarefas motoras que exigem apoio, propulsão e movimento de uma
grande proporção de massa corporal em comparação aos seus pares eutróficos. Segundo Liang [14], a
população obesa apresenta duas vezes mais dificuldades motoras que as eutróficas.
Uma coordenação motora
pobre não apenas prejudica o desenvolvimento motor normal
mas também afeta o desempenho das atividades acadêmicas, bem como a interação
em atividades físicas e sociais entre os pares [15]. Entretanto, ainda é
pequeno o número de publicações que examinam as consequências da obesidade e
suas possíveis repercussões sobre o desenvolvimento motor infantil [16-18].
Estudos apontaram que a
prática de atividade física entre jovens apresenta relação inversa com o risco
de doenças crônicas não transmissíveis como a obesidade [19]. Entretanto, a
prevalência de sedentarismo é elevada, tal como mostra uma coorte de 4.452
adolescentes com idades entre 10 e 12 anos, na qual 58,2% da amostra adotava um
estilo de vida considerado sedentário com menos de 300 minutos de atividade
física semanal [20]. Oehlschlaeger [21], estudando a
prevalência e os fatores associados ao sedentarismo em uma amostra
representativa de 960 adolescentes em Pelotas/RS, encontraram índices de 39% de
sedentarismo.
Diante do exposto
acima, a escala Körperkoordinations test für Kinder (KTK) destaca-se
por ser uma forma indireta e eficaz de mapear a coordenação motora grossa,
sendo validada para crianças e adolescentes de 5 a 14 anos de idade. O teste é
constituído de quatro etapas, nas quais avaliam-se: 1) equilíbrio em
deslocamentos para trás; 2) saltos laterais; 3) saltos monopedais
e 4) transferência lateral [7], conforme demonstrado na Figura 1. O objetivo do
teste é medir o grau de déficit motor para as atividades de balanceio, ritmo,
lateralidade, velocidade e agilidade. É um instrumento com escores separados
para o sexo feminino e masculino, limitando-se a avaliar apenas o
desenvolvimento motor grosso, com ênfase às habilidades pertinentes ao
equilíbrio dinâmico [8,9].
Fonte: Gorla (2009)
Figura 1 - Etapas do teste
KTK: (A) teste de marcha para trás; (B) teste de salto monopedal;
(C) teste de saltos laterais; (D) teste de transferência lateral.
O teste KTK apresenta
metas bem definidas para cada tarefa a ser executada: durante tarefa de marcha
para trás, o objetivo é medir o grau de estabilidade da criança em marcha ré
sobre três traves de larguras diferentes (6,0cm, 4,5cm e 3,0cm). Para cada
trave, devem ser contabilizadas três tentativas válidas perfazendo um total de
nove tentativas e, em cada uma delas, a criança precisa percorrer a trave com
até 8 passos e assim obter 8 pontos em cada tentativa, totalizando no máximo 72
pontos [7].
A tarefa de saltos monopedais, por sua vez, procura medir a coordenação dos
membros inferiores e energia dinâmica/força. Durante a sua avaliação a criança
é orientada a realizar três saltos para cada uma das pernas, cujos pontos devem
ser assim contabilizados: se a criança ultrapassar o obstáculo na primeira
tentativa, obtém 3 pontos, caso a criança não consiga ultrapassar ela passa
automaticamente para a segunda tentativa válida; se na segunda tentativa,
consegue ultrapassar a altura estabelecida então a criança obtém 2 pontos, mas
caso não consiga ela passa automaticamente para a terceira tentativa e; se a
criança vence seu obstáculo apenas na terceira tentativa ela ganha apenas 1 ponto. Se na última tentativa a criança não consiga
ultrapassar o obstáculo, ela somente passa para a próxima altura se tiver
somado 5 pontos nas duas alturas anteriores. A cada altura obtém-se, no máximo,
6 pontos. A altura máxima a ser testada para cada criança é de 60 cm [7].
A tarefa de saltos
laterais mede a velocidade e a criança é orientada a saltitar de um lado para o
outro, com os dois pés ao mesmo tempo, o mais rápido possível durante dois
tempos de 15 segundos cada. E por fim, a tarefa de transferência lateral mede a
lateralidade e estruturação espaço-temporal, nela a criança deve se transferir
de uma plataforma para a outra, o mais rápido possível, durante dois tempos de
20 segundos cada e sempre que fizer uma transferência acumulará 3 pontos [7].
Por meio da avaliação e
pontuação dos quatro testes obtém-se o quociente motor, que pode ser
classificado como normal se igual ou superior a 86 pontos, como baixo
desempenho motor quando menor ou igual a 85, e gravemente comprometidos quando
o quociente motor for inferior a 15 [15,22,23].
A escala KTK é
amplamente utilizada na Alemanha por qualquer profissional da área da saúde e,
em Portugal, sua aplicação é realizada especialmente por educadores físicos. No
Brasil, a sua validação foi feita por Gorla [7]
havendo alguns estudos publicados sobre a escala, aplicada principalmente por
professores de educação física das escolas de nível fundamental e médio
[15,24].
Sobre seu uso, vale
discorrer brevemente acerca de alguns trabalhos, tal como demonstrado na Tabela
I.
O KTK foi validado para
crianças e adolescentes de 5-14 anos de idade e pode ser aplicado de forma
longitudinal durante a permanência do aluno na escola, permitindo acompanhar a
sua evolução [6]. Entretanto, é importante lembrar que esse teste também
apresenta limitações, podendo ser influenciado por outros fatores como o
tamanho dos pés, a idade da criança e a falta de treino do avaliador, impondo
uma análise crítica na interpretação dos resultados [40].
Tabela I - O uso da escala
KTK na pesquisa do desenvolvimento motor grosso e seus principais resultados na
literatura científica.
Após leitura e
interpretação atenciosa da literatura, a bateria de testes KTK mostrou-se
eficiente para pesquisa do desenvolvimento motor grosso entre crianças, no
entanto, seu uso ainda é pequeno posto o desconhecimento dos profissionais da
área da saúde acerca do instrumento.