ARTIGO ORIGINAL

Fotobiomodulação como uma nova abordagem para o tratamento de traumas mamilares: um estudo piloto, randomizado e controlado

Photobiomodulation as a new approach for the treatment of nipple traumas: a pilot study, randomized and controlled

 

Angélica Rodrigues de Araújo, Ft., D.Sc.*, Ana Luiza Valério do Nascimento, Ft.**, Fernanda Souza da Silva, Ft., D.Sc.***, Juliana Moreira Camargos, Ft.****, Marina Sarti Muradas, Ft.****, Natasha Valeska Maia Gonçalves de Faria, Ft.**

 

*Professora do curso de Fisioterapia da PUC Minas, **Especialista em Fisioterapia aplicada em Neurologia, PUC Minas, ***Professora do curso de Fisioterapia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCMMG), ****Especialista em Fisioterapia na Saúde da Mulher, PUC Minas

 

Recebido em 20 de dezembro de 2011; aceito em 1 de outubro de 2012.

Endereço de correspondência: Angélica Rodrigues de Araújo, Centro Clínico de Fisioterapia PUC Minas, Av. 31 de Março, 500, prédio 46, 30535-600 Belo Horizonte MG, E-mail: angelica@bios.srv.br; Ana Luiza Valério do Nascimento: annaluizavn@yahoo.com.br; Fernanda Souza da Silva: nandasouzafisio@yahoo.com.br; Juliana Moreira Camargos: jumcamargos@yahoo.com.br; Marina Sarti Muradas: marinasarti@hotmail.com; Natasha Valeska Maia Gonçalves de Faria: natasha.puc@globo.com

 

Resumo

Objetivo: Avaliar a eficácia de um dispositivo fototerápico desenvolvido especificamente para o tratamento dos traumas mamilares. Material e métodos: Quatro puérperas foram aleatoriamente alocadas em dois grupos: controle (n = 4 mamas) e experimental (n = 4 mamas). O grupo controle recebeu somente orientações de cuidados com as mamas e sobre técnicas adequadas à amamentação. O grupo experimental (n = 4 mamas) recebeu, além das orientações, as aplicações fototerápicas por meio do protótipo fotobiomodulador (varredura de 880-904 nm e fluência de 4 J/cm²) durante 6 semanas. Foram avaliados: a área da lesão mamilar, a dor (Escala Visual Numérica) e a Qualidade de Vida (SF-36). Resultados: As lesões mamilares das participantes foram inicialmente classificadas como fissuras pequenas e médias. No grupo controle, 50% das lesões cicatrizaram completamente; as demais reduziram de tamanho. No grupo experimental, o percentual de cicatrização foi de 100%. O percentual de redução no tamanho das lesões mamilares foi de 54,5% no grupo controle e de 74,1% no grupo experimental. A diferença observada entre os grupos foi estatisticamente significativa (p = 0,036). A intensidade da dor reduziu satisfatoriamente em ambos os grupos. A média da redução da intensidade da dor no grupo controle foi de 73,6% e no experimental de 81,5% (p = 0,116). Conclusão: Os resultados deste estudo demonstraram que o protótipo fotobiomodulador foi eficaz no tratamento dos traumas mamilares.

Palavras-chave: doenças mamárias, aleitamento materno, fototerapia, cicatrização.

 

Abstract

Objective: To evaluate the effectiveness of a specifically designed device for phototherapy treatment of nipple trauma. Methods: Four women were randomly assigned to two groups: control (n = 4 breasts) and experimental (n = 4 breasts). The control group received only the guidelines of the breast care and appropriate techniques for breastfeeding. The experimental group (n = 4 breasts) received guidelines care and phototherapy applications through luminous prototype (880-904 nm and fluence of 4 J/cm²) for 6 weeks. The area of nipple injury, pain (Visual Numerical Scale) and quality of life (SF-36) were assessed. Results: The participants of nipple injuries were classified as small and medium size. In the control group 50% of the lesions healed completely and the others reduced in size. In the experimental group the percentage of healing was 100%. The percentage reduction in the size of nipple trauma was 54.5% in the control group and 74.1% in the experimental group. The difference between groups was statistically significant (p = 0,036). Pain intensity satisfactorily reduced in both groups. The average reduction in pain intensity in the control group was 73.6% and 81.5% in the experimental (p = 0,116). Conclusion: The results of this study demonstrated that the luminous prototype was effective in the treatment of nipple traumas.

Key-words: breast diseases, breast feeding, phototherapy, wound healing.

 

Introdução

 

Cuidados inadequados no período gestacional e puerperal são fatores predisponentes ao surgimento de problemas mamários, dentre os quais tem grande destaque os traumas mamilares (fissuras e rachaduras) [1]. Essas lesões caracterizam-se como uma solução de continuidade da pele na região do mamilo e estão altamente relacionadas à inflamação da camada superior da derme [2]. Podem ser circulares ou longitudinais e de tamanhos variados. A lesão circular localiza-se geralmente na junção mamilo-areolar; a lesão longitudinal pode ser encontrada em qualquer local do mamilo, vertical ou horizontalmente, dividindo-o em dois [3].

Os traumas mamilares são causados pela má posição da criança em relação à mama, pelo número e duração inadequados das mamadas e pelo mecanismo de sucção incorreto [1]. Normalmente aparecem entre a 2ª e 3ª semanas pós-parto, sendo causa frequente de dor mamária e de interrupção precoce da amamentação [2-4], situações prejudiciais tanto à saúde materna quanto à do lactante.

O desmame precoce traz prejuízos ao bebê, uma vez que o fornecimento de nutrientes essenciais, de fatores de crescimento e de componentes imunológicos presentes na composição do leite materno deixarão de ser ofertados. Para a mãe, a interrupção da amamentação dificulta o processo de involução uterina, aumenta o risco de sangramento após o parto, da incidência de câncer de ovário e de mama, além de não proporcionar uma boa interação mãe-filho [5].

Atualmente, a abordagem terapêutica dos traumas mamilares tem focado no reforço às orientações de cuidados com a mama e às técnicas adequadas para amamentação [6,7]. Essas medidas, entretanto, tem um caráter muito mais preventivo do que curativo, não sendo, na maioria das vezes, suficientes para potencializar o fechamento da lesão mamilar. Nesses casos, há a necessidade de técnicas mais efetivas, pois quanto mais rápido ocorrer a cicatrização, menores serão as chances do desmame precoce [4].

Riordar e Nichols [8] e Potter [9] relatam que apesar do melhor tratamento para as lesões mamilares ainda ser a prevenção, estratégias que sejam efetivas em tratá-las também são de extrema importância, pois quanto mais rápido ocorrer a cicatrização, maiores serão as chances de retorno à prática da amamentação e menores serão os riscos de complicações maternas secundárias, como por exemplo, a mastite e os abscessos.

Dentre as condutas comumente utilizadas para o manejo das fissuras e das rachaduras mamilares, destaca-se a aplicação tópica de fármacos [10]. Essa terapia, além de muitas vezes não apresentar resultados satisfatórios, tem como desvantagem a necessidade de interrupção do ato de amamentar durante o período de tratamento [8,9]. Nesse contexto, a acupuntura, as compressas quentes e frias [11] e o ultrassom terapêutico [12] são citados pela literatura como outras opções para o tratamento dos traumas mamilares. Os resultados dessas terapias, entretanto, são ainda controversos [13,14].

Uma alternativa potencialmente promissora para o tratamento das lesões mamilares é a fototerapia. Esse recurso utiliza ondas eletromagnéticas na faixa espectral do vermelho ao infravermelho próximo, que são aplicadas nos tecidos através de dispositivos luminosos de baixa potência, como o LASER (Light Amplification by Stimulated of Radiation) e o LED (Light Emitting Diode). Diversos trabalhos demonstram a eficácia desse recurso no aprimoramento da cicatrização de feridas [15-20] e no controle da dor [21,22]. Esses efeitos, entretanto, ainda são pouco investigados no tratamento dos traumas mamilares.

Os resultados positivos dos trabalhos em que a luz é utilizada para o tratamento das lesões mamilares [23,24], juntamente ao fato dessa terapia ser confortável, de custo relativamente baixo e principalmente não levar a interrupção da amamentação, tornam a fototerapia uma opção interessante para o manejo das fissuras e rachaduras do mamilo.

O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia de um dispositivo fototerápico desenvolvido especificamente para o tratamento dos traumas mamilares.

 

Material e métodos

 

Amostra

 

Quatro mulheres puérperas, residentes na região metropolitana de Belo Horizonte, participaram do estudo. Todas as participantes apresentavam diagnóstico médico de lesões mamilares bilateral, caracterizadas como fissuras e ou rachaduras do mamilo. Desta forma, oito mamas (n = 8) foram incluídas na pesquisa.

Para participarem do estudo as mulheres deveriam apresentar trauma mamilar não infectado e ter idade entre 18 e 35 anos. Como critérios de exclusão considerou-se: 1) presença de feridas infectadas (mastite) e/ou ingurgitamento mamário; 2) história prévia de câncer; 3) uso de outras modalidades terapêuticas que pudessem interferir na cicatrização das lesões e/ou no quadro álgico; 4) história de fotossensibilidade; 5) déficit cognitivo.

As participantes selecionadas para o estudo foram previamente esclarecidas sobre os procedimentos da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

Procedimentos e randomização

 

Este trabalho trata-se de um estudo piloto, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (CAAE 0130.0.213.000-05/CAAE 0239.0.213.000-07).

As mamas foram aleatorizadas por meio de um sorteio feito pela própria participante, para um dos dois grupos de tratamento: controle (n = 4 mamas) e experimental (n = 4 mamas). O grupo controle foi formado pelas mulheres que receberam orientações sobre cuidados com as mamas e técnicas adequadas para a amamentação. O grupo experimental foi constituído pelas mulheres que receberam, além das orientações, aplicações fototerápicas por meio de um dispositivo desenvolvido especialmente para o tratamento de traumas mamilares. Ambos os grupos foram acompanhados por seis semanas consecutivas.

Todas as participantes foram submetidas a uma avaliação inicial, realizada por um profissional cego quanto aos grupos de tratamento. A avaliação teve como objetivos caracterizar a participante (idade, cor, número de filhos, escolaridade, tipo de parto, experiência prévia com amamentação, tempo de puerpério) e, especialmente, o mamilo (cor e tipo – protuso, semiprotuso, invertido, pseudoinvertido ou hipertrófico). Após a avaliação, as participantes eram encaminhadas para dar início às intervenções, conforme seu grupo de tratamento.

 

Orientações

 

Todas as participantes do estudo receberam orientações individuais sobre cuidados com as mamas e técnicas adequadas para a amamentação. As participantes foram orientadas para não usar cremes, sabonetes ou qualquer tipo de pomada ou substância nos mamilos; utilizar sutiã com alças largas e firmes para ajudar na sustentação das mamas; permanecer em posição confortável, com o corpo do bebê totalmente voltado para o seu durante a amamentação; segurar a mama em “C” para auxiliar a pegada do bebê na mama; esperar que o bebê esvazie a primeira mama oferecida e só então passar para a mama contralateral; colocar a ponta do dedo mínimo no canto da boca do bebê para auxiliar a retirada do mesmo da mama.

As informações foram passadas verbalmente e reforçadas por um folder educativo na avaliação inicial, na 3a e na 6a semanas do estudo, sempre por um mesmo profissional, cego quanto ao grupo de tratamento da participante.

 

Fototerapia

 

Um dispositivo fotobiomodulador (patente PI0905068-0A2) foi desenvolvido utilizando-se diodos emissores de luz, também conhecidos pela sigla em inglês LED (Light Emitting Diode), acoplados a uma peça anatomicamente ajustada ao formato da mama humana (Figura 1). Os parâmetros utilizados para as aplicações fototerápicas foram: área total de emissão de 1,44 cm²; modo de emissão contínuo; potência de saída 10 mW; comprimento de onda infravermelho (varredura de 880 – 904 nm); fluência de 4 J/cm² e tempo de aplicação de 10 minutos/sessão.

O tratamento fototerápico foi realizado três vezes por semana, em dias alternados, durante seis semanas consecutivas, totalizando 18 sessões. Para as aplicações, o dispositivo fotobiomodulador foi posicionado sobre a mama, especificamente na região do mamilo, de forma que a radiação emitida incidisse perpendicularmente na ferida. Previamente às aplicações, resíduos de leite no mamilo eram retirados com auxílio de uma gaze. Para evitar a exposição direta da luz aos olhos, óculos de proteção foram utilizados pelas participantes e pelo terapeuta durante todo o período de aplicação do dispositivo luminoso.

 

Figura 1 - Dispositivo fotobiomodulador utilizado para o tratamento de traumas mamilares: aplicação em uma das participantes do estudo.

 

Tamanho e classificação das fissuras mamilares

 

As fissuras mamilares foram medidas nas 1a, 3a, 6a, 9a, 12a, 15a e 18a sessões utilizando-se um paquímetro digital Black Bull© e classificadas, no início e no término do estudo de acordo com Pereira et al. [25]. Segundo os autores, o mamilo pode ser considerado quanto a sua integridade como íntegro ou fissurado. Nesse último caso, a fissura pode ser classificada como pequena (menor ou igual a 3 mm), média (menor ou igual a 6 mm) ou grande (maior que 6 mm).

As medidas e a classificação das fissuras foram realizadas por um pesquisador previamente treinado para a realização dos procedimentos.

 

Dor

 

A intensidade da dor foi avaliada utilizando a Escala Visual Numérica (EVN). A EVN foi aplicada nas 1a, 4a, 7a, 10a, 13a, 16a e 18a sessões, sempre por um mesmo indivíduo, cego em relação ao grupo de tratamento da participante. No grupo experimental, a avaliação da intensidade dor antecedia a aplicação da fototerapia.

 

Qualidade de vida

 

O impacto da presença das fissuras e rachaduras mamilares na qualidade de vida das participantes foi avaliado por meio do Questionário SF-36 (versão resumida), aplicado na primeira (pré-tratamento), terceira (9a sessão) e última (pós-tratamento) semanas do estudo.

 

Análise estatística

 

Os dados obtidos foram analisados descritivamente. A mediana das dimensões relativas (%) e absolutas (mm) do tamanho das lesões e dos níveis de dor foi considerada para as análises. O percentual de redução semanal no tamanho das lesões foi comparado entre os grupos e as mudanças foram analisadas utilizando-se o Wilcoxon Signed Ranks Test. O nível de significância estatística foi definido como p < 0,05.

 

Resultados

 

A idade média das mulheres participantes do estudo foi de 28 anos (mínima de 18 anos; máxima de 35 anos). O tempo de puerpério variou de 9 a 90 dias. O tipo de mamilo apresentado foi predominantemente protuso e a maioria das puérperas (3) relataram ter experiência prévia com a amamentação.

As lesões mamilares das participantes foram inicialmente classificadas como fissuras pequenas e médias. A média pré-tratamento do tamanho das fissuras no grupo controle foi de 3,6 ± 2,6 mm e de 3,8 ± 1,7 mm no grupo experimental. No grupo controle, 50% das lesões (2/4) evoluíram para cicatrização completa; as demais reduziram de tamanho, passando de fissuras médias para pequenas. No grupo experimental, o percentual de cura foi de 100% (4 mamilos classificados como íntegros pós-tratamento). Na Figura 2 estão apresentadas a média do tamanho das fissuras nos grupos controle e experimental, no início e no fim dos tratamentos.

 

Figura 2 - Tamanho médio das fissuras mamilares (mm) nos grupos controle e experimental, pré e pós-tratamento.

 

O percentual de redução no tamanho das lesões mamilares foi de 54,5% no grupo controle e de 74,1% no grupo experimental. A diferença observada entre os grupos foi estatisticamente significativa (Wilcoxon’s Test; p = 0,036). Os percentuais de redução no tamanho das fissuras por semana e total em cada um dos grupos podem ser visualizados na Figura 3.

 

 

Figura 3 - Percentual de redução no tamanho das fissuras ao longo e no final dos tratamentos, nos grupos controle e experimental.

 

A intensidade da dor reduziu satisfatoriamente nos grupos controle e experimental. A média da redução no grupo controle foi de 73,6% e no experimental de 81,5% (Wilcoxon’s Test: p = 0,116). Na Figura 4 é possível visualizar os valores médios da intensidade da dor nos grupos controle e experimental, no início e no fim dos tratamentos.

 

 

Figura 4 - Intensidade média da dor (EVN) nos grupos controle e experimental, pré e pós-tratamentos.

 

Os domínios avaliados pelo SF-36 estão representados na Figura 5. Dentre os vários domínios avaliados, os que apresentaram maior impacto no grupo controle foram o aspecto físico e a dor, enquanto no grupo experimental foi somente a dor. Em todos os domínios investigados, o grupo experimental tendeu a apresentar a média inicial dos scores mais altas e melhores do que as apresentadas pelo grupo controle. Essa tendência se manteve em relação à média final dos scores. A maioria dos domínios apresentou melhora satisfatória ao longo do estudo, tanto no grupo controle quanto no experimental.

 

 

Figura 5 - Domínios avaliados pelo Questionário SF-36 nos grupos controle e experimental, pré e pós-tratamentos.

 

Discussão

 

A lesão mamilar é um problema comum durante o período puerperal [1]. Essas lesões estão comumente associadas à dor, ao desmame precoce e principalmente ao aumento do risco para o desenvolvimento de mastite [4].

      As intervenções realizadas no presente trabalho, orientações e fototerapia, foram ambas capazes de promover a redução no tamanho das lesões mamilares. Entretanto os resultados encontrados foram significativos apenas para o grupo em que o dispositivo luminoso foi aplicado. A melhora observada no grupo controle pode ser justificada pela adesão às orientações de cuidado com a mama. Essa intervenção possibilita a retirada de fatores que predispõem à ocorrência de fissuras mamilares, principalmente o posicionamento e a pega inadequados do lactente [1,3,4]. Os melhores resultados observados no grupo experimental em relação ao processo de cicatrização das lesões mamilares devem-se à aplicação da fototerapia. Segundo a literatura, a luz na faixa espectral do vermelho ao infravermelho é capaz de favorecer o reparo tecidual [16-20,26]. Esse benefício é consequente aos efeitos fisiológicos da luz, dentre os quais se destacam: o estímulo à síntese de ATP e de fatores de crescimento, o aumento da proliferação de fibroblastos e da produção de colágeno [27].

A produção de novos ATP ocorre rapidamente após a radiação tecidual com a luz, favorecendo a atividade metabólica dos fibroblastos [13,28-30]. Os fibroblastos secretam fibronectina, proteoglicanos e fibras colágenas (principalmente do tipo III). Franek et al. [31] relatam que a fototerapia é capaz de induzir a um aumento significativo dos índices de produção de colágeno tipo III, 72 horas após o tratamento. Posteriormente, ocorre o processo de remodelagem e fortalecimento do tecido neoformado e a proporção de colágeno tipo I aumenta em relação ao colágeno tipo III. O estímulo fototerápico favorece o processo de remodelagem e o desenvolvimento da força tênsil [29,31], justificando a melhor cicatrização observada no grupo experimental.

      Outros importantes efeitos da fototerapia que também podem justificar sua ação sobre o processo cicatricial são o estímulo à microcirculação e à neovascularização [32]. Esses efeitos contribuem para um melhor aporte de elementos nutricionais à lesão que, associados principalmente ao incremento da produção de ATP, proporcionam um aumento na velocidade mitótica das células, facilitando a multiplicação celular e a formação de tecido de granulação [31].

As ações da luz sobre os tecidos humanos são mediadas pela absorção da energia luminosa (fótons) no citocromo mitocondrial. Uma vez absorvida a luz, eventos fotoquímicos e fotofísicos primários irão ocorrer na mitocôndria, promovendo reações bioquímicas e/ou biofísicas. Alguns dos efeitos gerados na mitocôndria em resposta à absorção da luz são mudanças no estado redox e aceleração na transferência de elétrons, aumento da produção de superóxido e a geração de oxigênio molecular [23,30,33].

Diversos estudos demonstram que a terapia com luz é eficaz também na promoção de analgesia [21,22,29,33]. O estímulo à microcirculação local e as alterações induzidas sobre as aferências nociceptivas e sobre o sistema nervoso central são algumas das principais justificativas fisiológicas para o uso de dispositivos luminosos na modulação da dor [34]. Segundo a literatura, a luz é capaz de induzir a aumentos dos níveis de B-endorfina no fluido espinhal e da excreção urinária de glicocorticóides e serotonina [29,33]. A diminuição da liberação de substâncias alogênicas tais como bradicinina, acetilcolina e prostaglandina-2, e um complexo mecanismo de bloqueio eletrolítico das fibras nervosas são propostos como teorias para explicar os efeitos induzidos pela terapia luminosa no controle da dor [29,33].

      No presente estudo, o grupo tratado com a terapia luminosa obteve maior percentual de redução na intensidade da dor (81,5%) quando comparado com o grupo controle (73,6%). A diferença observada entre os grupos não atingiu, entretanto, limites de significância estatística (p = 0,116). O fato de a dor ser uma experiência multidimensional e subjetiva e o instrumento utilizado para sua avaliação (EVN) discriminar apenas a intensidade da dor podem ter contribuído para esse achado.

Os efeitos cicatrizantes e analgésicos da luz sobre os tecidos são dependentes dos parâmetros luminosos de tratamento, principalmente do comprimento de onda (nm) e da fluência (J/cm2) [34]. No presente estudo, os parâmetros luminosos utilizados (comprimento de onda infravermelho; fluência de 4 J/ cm²) assemelham-se aos encontrados na literatura. Ortiz et al. [17] e Simunovic et al. [34] relatam que a aplicação da fototerapia no comprimento de onda infravermelho promoveu incremento na proliferação de fibroblastos, aumento do tecido epitelial, aumento da rede capilar, redução do tamanho das lesões cutâneas e alívio da dor. Alguns autores citam que quando o objetivo da intervenção luminosa incluir a potencialização da ação da bomba de sódio e potássio, o estímulo à produção de ATP, o restabelecimento do potencial de membrana, o aumento do metabolismo e da proliferação celular, fluências menores que 10 J/cm2 e potência de 50 W ou menor devem ser utilizadas [35]. Estudos demonstram que fluências de 4 J/cm² promovem a dinamização do processo cicatricial de tecidos biológicos [19,28] e efeitos analgésicos [21,22,29,33].

Os resultados encontrados nos domínios do questionário de qualidade de vida SF-36 sugerem que as intervenções realizadas foram eficazes em promover melhoras na qualidade de vida em ambos os grupos. Essa melhora pode estar relacionada à diminuição da intensidade da dor e do tamanho das lesões mamilares, visualizados nos grupos controle e experimental. No grupo controle, a melhora da qualidade de vida, entretanto, não reflete a cura das fissuras. Nesse grupo apenas 50% das lesões mamilares evoluíram para uma cicatrização completa. Potter [9] relata que apesar do melhor tratamento para as lesões mamilares ainda ser a prevenção, estratégias que sejam efetivas em tratá-las também são de extrema importância, pois quanto mais rápido ocorrer a cicatrização, maiores serão as chances de retorno à prática da amamentação e menores serão os riscos de complicações maternas secundárias a estas lesões, como, por exemplo, o desenvolvimento da mastite e dos abscessos. Nesse contexto, o tratamento fototerápico utilizado no presente estudo destaca-se das orientações por ter favorecido o fechamento completo das fissuras mamilares em todas as participantes do grupo experimental.

O protótipo desenvolvido para o tratamento das lesões mamilares mostrou-se prático, pois foi confeccionado respeitando o formato anatômico para encaixe na mama humana feminina. O conforto oferecido à paciente e ao terapeuta, a facilidade de manipulação e a higienização do equipamento, a acoplagem adequada à área de tratamento e a facilidade de transporte e acomodação no ambiente terapêutico dinâmico, juntamente com os resultados positivos encontrados neste estudo sugerem que esse dispositivo é uma alternativa promissora para o tratamento das fissuras e rachaduras do mamilo.

Novos estudos são, entretanto, necessários para avaliar a reprodutibilidade dos resultados observados em uma amostra de tamanho maior e validar a eficácia do dispositivo fotobiomodulador para o tratamento das fissuras mamilares.

 

Conclusão

 

Os resultados do presente trabalho sugerem que o protótipo emissor de ondas eletromagnéticas na faixa espectral do infravermelho próximo, desenvolvido especificamente para o tratamento de traumas mamilares, foi um instrumento eficaz para o tratamento clínico das lesões mamilares das puérperas participantes deste estudo. A aplicação deste protótipo proporcionou a aceleração do processo de cicatrização nas lesões das lactentes que foram submetidas a esta aplicação.

 

Agradecimentos

 

Agradecemos à equipe do Laboratório de Bioengenharia da UFMG, em especial Sara Del Vecchio e Maurício Ferrari Santos Corrêa, e à Bios Serviços e Comércio pelo auxílio no desenvolvimento do protótipo luminoso.

 

Referências

 

  1. Giugliani ERJ. Common problem during lactation and their management. J Pediatr (Rio J) 2004;80:147-54.
  2. Rezende J. Obstetrícia. 9a. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002.
  3. Freitas F, Martins-Costa SH, Ramos JGL, Magalhães JA. Rotinas em obstetrícia. 3a. ed. Porto Alegre: Artmed; 2006.
  4. Biancuzzo M. Sore nipples: preventions and problems solving. Herndon: WMC Worldwide Publishing; 2000.
  5. Linhares E. Mamas, lactação, obstetrícia. 3a. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1974.
  6. Snowden HM, Renfrew MJ, Woolridge MW. Treatments for breast engorgement during lactation. Cochrane Database Syst Rev CD000046, 2001.
  7. Cotterman KJ. Reverse pressure softening: a simple tool to prepare areola for easier latching during engorgement. J Hum Lact 2004;20(2):227-37.
  8. Riordan JM, Nichols FHA. Descriptive study of lactation mastitis in long-term breastfeeding women. J Hum Lact 1990;6(2):53-8.
  9. Potter B. Women’s experiences of managing mastitis. Community Pract 2005;76(6):209-12.
  10. Lawrence RA, Lawrence RM. Management of the mother-infant nursing couple. In: Breastfeeding: A guide for the medical profession. 5ª ed. St Louis: Mosby; 1999.
  11. Buchko BL, Pugh LC, Bishop BA, Cochran JF, Smith LR, Lerew DJ. Comfort measures in breastfeeding, primiparous women. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs 1994;23(1):46-52.
  12. McLachlan Z, Milne EJ, Lumley J, Walker BR. Ultrasound treatment breast engorgement: a randomized double blind trial. Aust J Physioter 1991;37:23-8.
  13. Ziemer MM, Cooper DM, Pigeon JG. Evaluation of a dressing to reduce nipple pain and improve nipple skin condition in breast-feeding women. Nurs Res 1995;44(6):347-51.
  14. Giugliani ERJ. Falta embasamento científico no tratamento dos traumas mamilares. J Pediatr (Rio J) 2003;79(3):197-8.
  15. Gonçalves RV, Novaes RD, Matta SL, Benevides GP, Faria FR, Pinto MV. Comparative study of the effects of gallium-aluminum-arsenide laser photobiomodulation and healing oil on skin wounds in Wistar rats: a histomorphometric study. Photmed Laser Surg 2010;28(5):597-602.
  16. Peplow PV, Chung TY, Baxter GD. Laser photobiomodulation of wound healing: a review of experimental studies in mouse and rat animal models. Photmed Laser Surg 2010;28(3):291-325.
  17. Krynica I, Rutowski R, Staniszewska-Kus J, Fugiel J, Zaleski A. The role of laser biostimulation in early post-surgery rehabilitation and its effect on wound healing. Ortop Traumatol Rehabil 2010;12(1):67-79.
  18. Hussein AJ, Alfars AA, Falih MA, Hassan AlNA. Effects of a low level laser on the acceleration of wound healing in rabbits. N Am J Med Sci 2011;3(4):193-7.
  19. Dadpay M, Sharifian Z, Bayat M, Bayat M, Dabbagh A. Effects of pulsed infra-red low level-laser irradiation on open skin wound healing of healthy and streptozotocin-induced diabetic rats by biomechanical evaluation. J Photochem Photobiol B 2012;111:1-8.
  20. Fiório FB, Silveira Junior L, Munin E, de Lima CJ, Fernandes KP, Mesquita-Ferrari RA, et al. Effect of incoherent LED radiation on third-degree burning wounds in rats. J Cosmet Laser Ther 2011;13(6):315-22.
  21. Chung H, Dai T, Sharma SK, Huang YY, Carrol JD, Hamblin MRH. The nuts and bolts of low-level laser (light) therapy. Ann Biomed Eng 2012;40(2):516-33.
  22. Cauwels RG, Martens LC. Low level laser therapy in oral mucositis: a pilot study. Eur Arch Paediatr Dent 2011;12:118-23.
  23. Alekseenko AV, Palianitsa SI, Tarabanchuck VV, Seniutovich RV, Stoliar VF. Treatment of suppurative mastitis with the use of laser radiation and direct electric current. Vestn khir Im I I Grek 1987;139:54-7.
  24. Kovalev MI. Prevention of lactation mastitis using low-intensity laser irradiation. Akush Ginekol (Mosk) 1990;2:51-61.
  25. Pereira MJB, Reis MCG, Shimo AKK, Nakano AMS, Heck AR. Manual de procedimentos: prevenção e tratamento das intercorrências mamárias na amamentação. Programa Aleitamento Materno - SMS (Secretaria Municipal da Saúde), NALMA (Núcleo de Aleitamento Materno da EERP-USP), SUS; 1998.
  26. Siqueira CPCM, Filho DOT, Lima FM, Silva FP, Durante H, Dias IFL, et al. Efeitos biológicos da luz: aplicação de terapia de baixa potência empregando LEDs (Light Emitting Diode) na cicatrização da úlcera venosa: relato de caso. Semina: Ciências Biológicas e da Saúde 2009;30(1):37-46.
  27. Ortiz MC, Carrinho PM, Santos AAS, Gonçalves RC, Parizotto NA. Laser de baixa intensidade: princípios e generalidades – Parte I. Fisioter Bras 2001;2:221-40.
  28. Lucas C, van-Gemert MJ, de Haan RJ. Efficacy of low level LASER therapy in the management of stage III decubitus ulcers: a prospective, observer-blinded multicenter randomised clinical trial. Lasers Med Sci 2003;18:72-7.
  29. Siqueira FCHN, Reinert TC, Correa KP, Kotz JC, Bertolini GRF. Uso de laser de baixa intensidade AsALGa, 830nm, em pacientes portadores de úlceras de pressão. Reabilitar 2004;23:10-5.
  30. Karu TI. Photobiology of low power laser effects. Health Phys 1989;56:691-704.
  31. Franek A, Krol P, Kucharzewski M. Does low output Laser stimulation enhance the healing of crural ulceration? Some critical remarks. Med Eng Phys 2002;24:607-15.
  32. Sousa APC, Santos JN, Reis JA, Ramos TA, Souza J, Cangussu MCT, Pinheiro ALB. Effect of LED phototherapy of three distinct wavelengths on fibroblasts on wound healing: a histological study in a rodent model. Photomed Laser Surg 2010;28(4):547-52.
  33. Ortiz MC, Carrinho PM, Santos AAS, Gonçalves RC, Parizzotto NA. Laser de baixa intensidade: efeitos sobre os tecidos biológicos – Parte II. Fisioter Bras 2001;2:337-52.
  34. Simunovic E, Ivankovich AD, Depolo A. Wound healing of animal and human body sport and traffic accident injuries using low-level Laser therapy treatment: a randomized clinical study of seventy-four patients with control group. J Clin Laser Med Surg 2000;18:67-73.
  35. Flemming K, Cullum NA. Laser therapy for venous leg ulcers (Review). The Cochrane Collaboration. The Cochranne Library 2009; Issue 1.