ARTIGO ORIGINAL
Fisioterapeuta do
trabalho: profissional habilitado para realizar perícia junto a justiça do
trabalho
Physiotherapist of work: professional enabled to perform judicial
expertise
Carlos Henrique Nunes
da Costa*, José Ronaldo Veronesi Junior**
*Fisioterapeuta do
Trabalho, Ergonomista, Perito Judicial,
**Fisioterapeuta do Trabalho, Ergonomista, Perito
Judicial, Doutor em Ciências Biomédicas e CEO do IEDUV
Correspondência: José Ronaldo Veronesi Junior, Instituto Educacional Veronesi
- IEDUV, Sala 401, torre A, Centro Empresarial, Av. João Palácio, 300, Eurico
Sales 29160-161 Serra ES.
Trabalho apresentado na
I semana científica do IEDUV – I Seminário de Perícia Fisioterapêutica pelo
Método Veronesi, Vitória/ES, 17 a 20 de janeiro de
2019 (Prof. Dr. Francisco Rebelo, Universidade de Lisboa; Prof. Dr. José
Ronaldo Veronesi Junior, IEDUV/ Faculdade Delta; Prof.
Msc. Cristiane de Oliveira Veronesi,
IEDUV/ Faculdade Delta;Prof. Dra. Lisandra Vanessa Martins, UFES)
José Ronaldo Veronesi Junior: veronesi@ieduv.com.br
Carlos Henrique Nunes da
Costa: chnccosta@yahoo.com.br
Resumo
Com o advento da
globalização a partir do início dos anos 1980 nos países centrais e dos anos
1990 no Brasil, e das mudanças decorrentes da reestruturação produtiva do
trabalho, os trabalhadores, de forma geral, sofreram profundas mudanças no seu
cotidiano laboral. Além dos prejuízos trazidos para o trabalhador, a ocorrência
de acidentes e doenças relacionadas com o trabalho enseja custosa toda
sociedade e estado, consequentemente, os trabalhadores acometidos pelas
LER/DORT possuem direito indenizatório tanto no âmbito previdenciário, quanto
no âmbito civil. Os procedimentos requisitados por autoridade judiciária
visando apontar os fatos de natureza específica necessária são esclarecimento
de um processo chamado de perícia judicial, o perito é indivíduo de confiança
do juiz, sendo até denominado de os olhos e os ouvidos do juiz. Não há qualquer
menção no Código de Processo Civil Brasileiro (CPC) que estabeleça restrição de
natureza profissional quanto à escolha do perito, ficando a cargo do juiz a
escolha do profissional que lhe assistirá no caso, o novo CPC, por sua vez,
mantém este entendimento. Deve-se ressaltar que o alvo do fisioterapeuta é a
perícia cinesiológica funcional e não a perícia
médica, atribuída logicamente aos formados em escolas de ciências médicas. O
Fisioterapeuta está amparado legalmente para executar perícia judicial conforme
Resolução nº 381, de 03 de novembro de 2010, do Conselho Federal e Fisioterapia
e Terapia Ocupacional, que dispõe sobre a elaboração e emissão pelo
Fisioterapeuta de atestados, pareceres e laudos periciais, sendo este
entendimento não só do COFFITO, mas também do MTE/CBO o qual reconhece que o
fisioterapeuta é profissional habilitado e capaz de realizar avaliações e
intervenções ergonômicas.
Palavras-chave: fisioterapia,
perícia, fisioterapeuta do trabalho.
Abstract
With
the advent of globalization since the beginning of the 1980s in the central
countries and the 1980s in Brazil, and the changes resulting from the
productive restructuring of labor, the workers have generally undergone
profound changes in their daily work. In addition to the damages brought to the
worker, the occurrence of work-related accidents and illnesses is a costly
process for all society and the state. Consequently, the workers affected by
the RSI/DORT have the right to compensation both in the social security and in
the civil sphere. The procedures required by a judicial authority aiming at
pointing out facts of a specific nature are clarification of a process called
judicial expertise. The expert is an individual of confidence of the judge,
even being called the eyes and ears of the judge. There is no mention in the
Civil Procedure Code (CPC) that establishes a professional restriction on the
choice of expert, and the judge is responsible for choosing the professional
who will assist him in the case, the new CPC, in turn, maintains this
understanding. It should be emphasized that the physiotherapist's goal is
functional kinesiological expertise, not medical expertise, logically
attributed to those trained in medical science schools. The Physiotherapist is
legally protected to perform judicial expertise under Resolution No. 381 of
November 3, 2010, of the Federal Council and Physiotherapy and Occupational
Therapy, which provides for the preparation and issuance by the Physiotherapist
of attestations, opinions and expert reports, this understanding being not only
of COFFITO, but also of the MTE/CBO which recognizes that the physiotherapist
is a qualified professional and capable of performing ergonomic evaluations and
interventions.
Key-words: physiotherapy,
expertise, work physiotherapist.
Com o advento da
globalização a partir do início dos anos 1980 nos países centrais e dos anos
1990 no Brasil, e das mudanças decorrentes da reestruturação produtiva do trabalho,
os trabalhadores, de forma geral, sofreram profundas mudanças no seu cotidiano
laboral. No contexto dessas mudanças destaca-se, entre outros, os seguintes
impactos na vida do trabalhador: cobrança por altas metas de produtividade;
melhoria na qualificação; ambiente laboral como causa de adoecimentos; extensas
jornadas de trabalho; defasagem salarial; alto custo de vida para o sustento
digno da família; sistemas de transportes e vias públicas deficientes; longos
percursos entre a moradia e local de trabalho; insegurança urbana, etc. Estes
são alguns dos principais fatores de adoecimento e afastamento do trabalho. O
absenteísmo ocupacional é um grande problema nas organizações, sejam elas
públicas ou privadas [1].
Além dos prejuízos
trazidos para o trabalhador, a ocorrência de acidentes e doenças relacionadas
com o trabalho ensejam custosa toda sociedade e estado. Estes custos podem ser
classificados em três categorias principais: 1) Custos Diretos: consistem em
componentes relativos ao tratamento e reabilitação; 2) Custos Indiretos: são
relacionados com as oportunidades perdidas pelo trabalhador acidentado, o
empregador, os colegas de trabalho e a sociedade, compreendendo custos
previdenciários, salariais, administrativos e perdas de produtividade; 3)
Custos Humanos: referem-se à piora na qualidade de vida do trabalhador e de sua
família. A OIT estima que cerca de 4% do produto interno bruto mundial (PIB),
cerca de 2,8 trilhões de dólares, são despendidos por ano em custos diretos e
indiretos devido a acidentes e doenças relacionadas com o trabalho [2].
Na esfera legal, as
LER/DORT foram consideradas como doença do trabalho pela Portaria nº 4.060, de
06 de agosto de 1987, do Ministério do Trabalho e da Previdência Social,
podendo, portanto, serem consideradas como acidente de trabalho por estar
dentre os casos previstos no artigo 20 da Lei nº 8.213/91 e artigo 140 do
Decreto nº 611/92. Consequentemente, os trabalhadores acometidos pelas LER/DORT
possuem direito indenizatório tanto no âmbito previdenciário, quanto no âmbito
civil [3].
Os procedimentos
requisitados por autoridade judiciária visando apontar os fatos de natureza
específica necessária são esclarecimento de um processo chama-se perícia
judicial. Desta forma, a perícia é o exame de situações ou fatos relacionados a
coisas e pessoas, praticadas por especialista no assunto em questão, com o
propósito de esclarecer determinados aspectos técnico-científicos (geralmente
explicitados através de quesitos). Seus resultados devem ser apresentados sob
forma de parecer sucinto, respondendo apenas aos quesitos formulados, ou de
laudo técnico com exposição detalhados elementos averiguados, sua análise e
fundamentação das conclusões, além das respostas aos quesitos formulados. A
perícia judicial difere das demais perícias, mesmo de outras modalidades de
perícias oficiais, pelas três seguintes características: é realizada sob
direção e autoridade do juiz; assegura a presença das partes durante a produção
da prova pericial; e possibilita a intimação do perito a comparecer à audiência
para responder a esclarecimentos, por requerimento das partes, ou iniciativa do
juiz [3].
O perito é indivíduo de
confiança do juiz, sendo até denominado de os olhos e os ouvidos do juiz,
figurando como auxiliar da justiça, e ainda que seja serventuário excepcional e
temporário deve reunir os conhecimentos técnicos e científicos indispensáveis à
elucidação dos problemas fáticos da questão [4].
Este trabalho é um
estudo de revisão bibliográfica não sistemática, sobre atuação de fisioterapeutas
como peritos judiciais.
Para elaboração deste,
realizou-se uma revisão de literatura para obter fundamentação teórica com base
em artigos científicos e levantamento de dados através de buscas na internet.
Foram selecionados 7
artigos científicos em português. Como critério de inclusão as publicações
deviam ter sido publicadas do ano 2009 a 2017, e conter os seguintes
descritores: Fisioterapia, Perícia, Fisioterapeuta do Trabalho. Já como
critério de exclusão, são os artigos que não continham os descritores acima e
com data de publicação inferior ao ano de 2010.
O Perito judicial é o
auxiliar da Justiça, pessoa civil, nomeado pelo juiz ou pelo Tribunal,
devidamente compromissado, assistindo-o para realizar prova pericial
consistente em exame, vistoria ou avaliação, valendo-se de conhecimento
especial, técnico ou científico. No caso específico das perícias trabalhistas,
o perito deve ter conhecimento profundo em biomecânica e cinesiologia que
estudam o movimento humano, pois, nos casos de LER/DORT os fatores etiológicos
descritos na literatura são os movimentos repetitivos, as posturas e a
biomecânica ocupacional inadequadas, entre outros [4].
Deve-se destacar,
entretanto, que apesar de o profissional médico em seu gradil curricular, seja
de graduação ou especialização em medicina do trabalho, não ter a cadeira de
cinesiologia e/ou biomecânica e, por isso não apresentar o conhecimento
técnico-científico necessário para ser perito no estabelecimento de nexo causal
entre as LER/DORT e as atividades laborais, é o único profissional indicado
para periciar quanto à existência da patologia em questão. Fica claro,
portanto, que existe a perícia técnico-médica, na qual o médico investigará a
existência ou não da doença, e a perícia técnica cinesiológica-funcional,
onde o fisioterapeuta irá averiguar a existência de nexo entre a patologia
previamente diagnosticada e confirmada pelo exame médico e as atividades
laborais do reclamante [3].
No que tange à expressão
Perícia Judicial, o Código de Processo Civil Brasileiro (CPC), em seu Artigo
145 dispõe o seguinte: “quando a prova de fato depender de conhecimento
técnico ou científico, o juiz será assistido por perito”. Ainda nesse
dispositivo, constata-se no § 1º: “Os peritos serão escolhidos entre
profissionais de nível universitário, devidamente inscrito no órgão de classe
competente.” Logo se vê que não há qualquer menção no CPC que estabeleça
restrição de natureza profissional quanto à escolha do perito, ficando a cargo
do juiz a escolha do profissional que lhe assistirá no caso. O novo CPC, por
sua vez, mantém este entendimento [2].
A função de perito
judicial em casos de Justiça do Trabalho associados às LER/DORT deve ser
exercida por profissionais possuidores de conhecimentos profundos de
biomecânica ocupacional. A ciência que estuda o movimento e a biomecânica é
chamada de cinesiologia, sendo o fisioterapeuta o único profissional da saúde
que tem como base em seus conhecimentos esta ciência. Deve-se ressaltar que o
alvo do fisioterapeuta é a perícia cinesiológica
funcional e não a perícia médica, atribuída logicamente aos formados em escolas
de ciências médicas [5].
A perícia cinesiológica funcional surgiu para a justiça com a
necessidade de se realizar uma avaliação pericial mais criteriosa, para
minimizar erros e principalmente elucidar algumas questões chaves das perícias:
o indivíduo que está reclamando a ação é portador de alguma doença profissional
ou do trabalho, se essa teve origem nas atividades laborais que esse indivíduo
realiza ou realizava na empresa que está sendo reclamada, essa doença, em caso
positivo, vai trazer ou traz uma incapacidade funcional desse individuo seja
esta incapacidade laboral, de atividades de vida diária ou recreacional [5].
Após a determinação da
existência da patologia em questão os objetivos principais nas perícias
exclusivas de LER/DORT são: esclarecer se a patologia apresentada pelo
reclamante (autor da ação) possui nexo com as atividades por ele exercidas na
reclamada (réu da ação), ou seja, o estabelecimento do nexo causal e, ainda a
indicação do grau de capacidade funcional do reclamante. Também poderá ser
objeto de questionamento do juiz o prognóstico, as técnicas e o tempo
necessário para a reabilitação, se a reclamada observou as Normas
Regulamentadoras referentes à ergonomia (NR 17) e as possíveis soluções para
eliminar ou reduzir os agentes causadores de dano [3].
Além da elaboração do
laudo do nexo causal e avaliação cinético funcional, ressalta-se ainda outro
ponto de atuação importante do fisioterapeuta forense trabalhista; está voltada
a prevenção com a execução da ergonomia, visando aprimoramento cinético
funcional e premeditação de acometimentos; sendo este fator relevante na
instalação de patologias como LER/DORTs [6].
Segundo Veronesi Jr., elementos de convencimento do perito são
respostas de testes e observações feitas por ele para análise do processo de
confiabilidade do comportamento funcional do movimento, o que indicaria uma
possível condição de simulação feita pelo periciado. O que prova que a
capacitação específica do perito é fundamental para um melhor desempenho e um
resultado mais confiável e justo [7].
O Fisioterapeuta está
amparado legalmente para executar perícia judicial conforme Resolução nº 381,
de 3 de novembro de 2010, do Conselho Federal e Fisioterapia e Terapia
Ocupacional, que dispõe sobre a elaboração e emissão pelo Fisioterapeuta de
atestados, pareceres e laudos periciais, resolve no Artigo 1º: “O
Fisioterapeuta no âmbito da sua atuação profissional é competente para elaborar
e emitir parecer, atestado ou laudo pericial indicando o grau de capacidade ou
incapacidade funcional, com vistas a apontar competências ou incompetências
laborais (transitórias ou definitivas), mudanças ou adaptações nas
funcionalidades (transitórias ou definitivas) e seus efeitos no desempenho
laboral” [8].
Corroborando a ideia
acima a Fisioterapia do Trabalho, por sua vez, utiliza de tais conceitos, porém
com olhar refinado e voltado para assistência à saúde do trabalhador,
analisando os aspectos relacionados ao contexto laboral no qual o indivíduo
esteve inserido. As competências e áreas de atuação deste profissional estão
previstas na Resolução nº465/2016 do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia
Ocupacional – COFFITO [9].
Tal é o entendimento
não só do COFFITO, mas também do MTE/CBO o qual reconhece que o fisioterapeuta
é profissional habilitado e capaz de realizar avaliações e intervenções
ergonômicas [3].
É oportuno destacar
neste momento o entendimento do Excelentíssimo Juiz de Direito da comarca de
Dourados/MS, Dr. Antônio Avelino Arraes, o qual afirma que o fisioterapeuta é
plenamente capaz de dar seu parecer técnico nas demandas relacionadas às
LER/DORT, uma vez que possui em sua grade de formação curricular matérias
necessárias para a verificação da existência do nexo de casualidade, tais como:
cinesiologia, biomecânica e biomecânica ocupacional, diferentemente do
profissional graduado em medicina [3].
Diante dos estudos
analisados conclui-se que a atuação do Fisioterapeuta do Trabalho na área de
Perícia Judicial é recente e promissora, ainda muitos magistrados desconhecem
que o profissional Fisioterapeuta é capacitado para atuar como perito e/ou
assistente da justiça. Neste sentido fica claro que está área de atuação
necessita de campanhas maciças por parte dos órgãos de representação da
profissão junto à justiça do trabalho.