Fisioter Bras 2022;23(3):463-82
REVISÃO
Estratégia
protetora de ventilação mecânica na síndrome respiratória aguda grave por
influenza: revisão sistemática
Protective mechanical ventilation strategy in severe
acute respiratory syndrome by influenza: a systematic review
Letícia
Brito Mendes Pimenta*, Raquel Annoni*, Luciana de
Almeida Silva Teixeira**
*Departamento
de Fisioterapia Aplicada, Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM),
Uberaba, MG, **Departamento de Clínica Médica, Universidade Federal do
Triângulo Mineiro (UFTM), Uberaba, MG
Recebido
em 9 de abril de 2021; Aceito em 12 de março de 2022.
Correspondência: Letícia Brito Mendes Pimenta,
Departamento de Fisioterapia Aplicada, Universidade Federal do Triângulo
Mineiro (UFTM), Av. Frei Paulino, 30 Abadia 38025-180 Uberaba MG
Letícia
Brito Mendes Pimenta: leticia.pimenta@uftm.edu.br
Raquel
Annoni: raquel.annoni@uftm.edu.br
Luciana
de Almeida Silva Teixeira: lalmeidast@gmail.com
Resumo
Objetivo: Avaliar se a estratégia protetora de
ventilação mecânica na síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) por
Influenza é capaz de reduzir o tempo de ventilação mecânica e aumentar a
sobrevida. Métodos: A busca foi realizada nas bases de dados Pubmed, Embase, Cochrane, Lilacs,
Medline, Scopus, Web of Science, Science Direct, Cinahl e SAGE, entre 2009 e 2019. Buscou-se por ensaios
clínicos controlados e randomizados, estudos analíticos com grupo controle:
coorte prospectiva ou controle histórico. A população estudada foi de
indivíduos adultos com diagnóstico de síndrome respiratória aguda grave por
Influenza, que receberam estratégia protetora de ventilação com baixos volumes
correntes e/ou manobra de recrutamento alveolar comparada com qualquer outra
estratégia. Resultados: A busca resultou em 445 referências; apenas 1
artigo preencheu os critérios de elegibilidade. O estudo incluído trouxe que o
uso de baixos volumes traz benefícios para os pacientes com SDRA de etiologias
virais, como menor tempo de ventilação mecânica, de internação em UTI e
hospitalar. Conclusão: A escassez de artigos sobre a estratégia de
ventilação protetora em SDRA secundário à infecção por Influenza não permite
concluir se essa estratégia é capaz de reduzir o tempo de ventilação e/ou
melhorar a sobrevida nessa população. A literatura carece de mais estudos que
permitam conclusões robustas.
Palavras-chave: síndrome do desconforto respiratório
agudo; vírus influenza; respiração artificial.
Abstract
Objective: To assess whether the protective
strategy of mechanical ventilation in Severe Acute Respiratory Syndrome due to
Influenza can reduce the time of mechanical ventilation (MV) and increasing
survival. Methods: Systematic literature review with the PRISMA-P 2015
protocol. The search strategy was performed in the Pubmed,
Embase, Cochrane, Lilacs, Medline, Scopus, Web of
Science, Science Direct, Cinahl and SAGE databases.
The search resulted in a total of 445 references, but only 1 article met the
criteria defined for this review. The data were extracted and the evidence set
was evaluated according to the GRADE approach. Results: The included
study showed that the use of low tidal volumes brings benefits to patients with
ARDS of viral etiologies, such as less time on mechanical ventilation and less
time in the ICU and hospital. In addition, ventilated patients with high volumes
had a higher mortality in 28 days. Conclusion: The results presented
underline the importance of the immediate recognition of ARDS secondary to
influenza infection and the need for implantation of protective MV. However,
the low quality of the evidence from these studies does not allow us to draw
robust conclusions.
Keywords: respiratory distress syndrome;
influenza virus; respiration, artificial.
A
infecção respiratória pelo vírus influenza A continua sendo uma importante
ameaça à saúde global. Algumas pandemias já ocorreram, e embora seja impossível
prever a próxima, sua ocorrência é considerada inevitável. Considerando a
crescente globalização econômica e urbanização, a próxima pandemia poderá se
espalhar mais rapidamente e ainda poderá desencadear um grande número de óbitos
[1]. Dados recentes da Organização Mundial de Saúde estimam cerca de um bilhão
de casos de infecção pelo vírus influenza A anualmente no mundo, sendo 3 a 5
milhões graves, resultando em 290.000 a 650.000 mortes [1,2].
Em
relação à patogenia da infecção pelo vírus influenza A nos seres humanos, a
infecção do trato respiratório inferior pode levar à morte por insuficiência
respiratória, frequentemente devido a inundação alveolar com subsequente
desenvolvimento da síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) [3]. A
incidência geral de SDRA por influenza é de 2,7 casos por 100.000 pessoas-ano e
pode ser responsável por 3,8% de todas as internações por insuficiência
respiratória [4].
A
lesão das vias aéreas, epitélio e endotélio alveolar mediado pelo vírus ocorre
por meio da própria patogenicidade viral, atribuível ao seu tropismo pelas vias
aéreas do hospedeiro e células epiteliais alveolares; e também devido a uma
resposta imune inata robusta, que embora contribua para a depuração viral, pode
piorar a gravidade da lesão pulmonar. Estudos também sugerem que a mortalidade
na infecção viral pode resultar de uma resposta imune excessivamente exuberante
ou depuração viral prejudicada. O mecanismo molecular exato por trás da
apresentação clínica variada ainda não está claro [4,5]
A
grave insuficiência respiratória após infecção pelo vírus Influenza A pode
resultar em necessidade de suporte ventilatório. Durante a pandemia de 2009,
aproximadamente 60 a 88% dos pacientes admitidos nas unidades de terapia
intensiva (UTIs) por complicações da infecção pelo vírus Influenza requereram
ventilação mecânica (VM) e destes, 49 a 72% evoluíram com SDRA [6,7]. Porém,
apesar dos benefícios, a ventilação por pressão positiva pode piorar a lesão
pulmonar pré-existente ou ainda induzir injúria pulmonar por si só, chamada de
lesão induzida pelo ventilador mecânico – ventilator-induced
lung injury (VILI) [6].
Um
terço dos pacientes progridem para hipoxemia refratária pós-dano
alveolar difuso associado com bronquiolite necrotizante e extensa hemorragia, e
necessitam de técnicas de ventilação mecânica de resgate [8,9]. Estas técnicas
incluem manobras de recrutamento alveolar, ventilação por posição prona,
ventilação por alta frequência, oxigenação por membrana extracorpórea, dentre
outros. Apesar de muitos estudos comprovarem benefícios destas terapias de
resgate na SDRA por outras etiologias, existe incerteza a respeito da
efetividade dessas terapias de resgate entre os pacientes com SDRA por
influenza [10].
Estudos
relatam mortalidade de 21 a 48% nos pacientes que desenvolvem a SDRA por
influenza [11]. O curso clínico é substancialmente diferente da SDRA
não-influenza, com evolução rapidamente progressiva [12,13]. Neste contexto,
uma revisão sistemática serviria para orientar as melhores práticas em suporte
ventilatório para pacientes com SDRA por Influenza. Sendo assim, foi formulada
a pergunta baseada na estratégia PICO: “A estratégia protetora de ventilação mecânica
na Síndrome Respiratória Aguda Grave por Influenza é capaz de reduzir o tempo
de ventilação mecânica e aumentar a sobrevida?”
Protocolo
Esta
revisão sistemática foi conduzida de acordo com guia PRISMA-P 2015 [14] (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-analyses). O
protocolo foi registrado no banco de dados PROSPERO (International
Prospective Register of Systematic Reviews), sob o
número CRD42020156373.
Critérios
de elegibilidade
Para
a população (P), foram incluídos estudos sobre indivíduos adultos com
diagnóstico de síndrome respiratória aguda grave por Influenza. Para o
diagnóstico de SDRA utilizou-se a definição de Berlim [15] e para o diagnóstico
de Influenza, a confirmação etiológica por RT- PCR, teste rápido ou cultura
viral. As intervenções (I) incluídas foram relacionadas à ventilação mecânica
protetora sendo definidas como instituição de baixos volumes correntes e/ou de
manobra de recrutamento alveolar. Foram selecionados estudos que compararam (C)
as intervenções citadas com qualquer outra estratégia ventilatória empregada.
Em relação aos desfechos (O), incluímos como desfecho primário tempo de
ventilação mecânica e desfecho secundário sobrevida em 28 dias.
Foram
incluídos estudos nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola, publicados entre
os anos de 2009 a 2019. Os artigos foram excluídos na ausência de interface com
o objetivo da revisão, pacientes menores de 18 anos, modelos animais, resumos,
estudos de caso, editoriais ou revisões de literatura.
Estratégia
de busca
A
estratégia de busca foi realizada nas bases de dados Pubmed,
Embase, Cochrane, Lilacs, Medline, Scopus, Web of Science, Science Direct, Cinahl
e SAGE. A estratégia utilizada foi:
1)
Síndrome do Desconforto Respiratório do Adulto OR Respiratory
Distress Syndrome, Adult OR Síndrome de Dificultad Respiratoria del Adulto OR SDRA
Humano OR human ARDS OR Pulmão de Choque OR shock lung OR choque pulmonar OR
Síndrome da Angústia Respiratória do Adulto OR adult respiratory distress syndrome OR síndrome de dificuldad
respiratória del adulto OR Síndrome do Desconforto
Respiratório Agudo OR acute respiratory
distress syndrome OR
síndrome de dificuldad respiratória aguda OR Síndrome
do Desconforto Respiratório em Adultos OR respiratory
distress syndrome in adults OR síndrome de dificuldad
respiratória en adultos
2) Orthomyxoviridae OR Mixovirus OR
Vírus da Influenza OR influenza virus OR virus de la gripe OR Virus das Gripes OR flu virus OR Vírus de Gripe OR virus
de la influenza OR Vírus de Gripes
3)
Respiração Artificial OR Respiration, Artificial OR Respiración Artificial OR Ventilação Mecânica OR mechanical ventilation OR ventilacion mecânica.
4) 1 AND
2 AND 3
Seleção
dos estudos e coleta de dados
Na
seleção dos artigos buscou-se por ensaios clínicos controlados e randomizados,
estudos analíticos com grupo controle: coorte retrospectiva, prospectiva ou com
controle histórico. Dois revisores (L.B.M.P. e R.A.) avaliaram os títulos e
resumos de forma independente. O texto completo de todos os artigos relevantes
foi avaliado segundo os critérios de elegibilidade. Os artigos foram incluídos
por consenso de ambos os revisores e não houve necessidade de um terceiro
revisor resolver quaisquer divergências. A extração dos dados foi realizada por
um revisor e o outro revisou a extração. Os dados extraídos foram: autor, ano e
país; tipo de estudo; população; comparação; resultados e conclusão.
Avaliação
da qualidade das evidências
Para
a avaliação da qualidade da evidência foi utilizado o sistema GRADE (Grading of Recomendations
Assessment, Developing and Evaluation). Inicialmente, evidências provenientes de
estudos randomizados foram consideradas como de alta qualidade, e aquelas
provenientes de estudos observacionais de baixa qualidade [16].
Análise
estatística
Considerando
a inclusão de apenas um estudo, não foi possível o tratamento estatístico das
informações por meio de metanálise. Os resultados
foram analisados de forma descritiva.
Processo
de seleção dos estudos
A
busca resultou em um total de 445 referências (Figura 1). Após a remoção de 125
artigos duplicados, 320 títulos foram selecionados quanto à relevância em
relação à questão PICO. Foram excluídos 244 artigos, entre revisões, abstracts,
estudos de caso, editoriais ou ausência de abordagem do tema. Em relação aos
resumos, 76 foram avaliados e 64 artigos excluídos por não fazerem comparação
entre estratégias; por serem revisões e/ou editoriais; estudos em modelo animal
ou em crianças e; por nem todos os pacientes apresentarem SDRA ou estarem em
ventilação mecânica (VM). Portanto, os textos completos de 12 artigos foram
revistos, sendo 11 excluídos devido à ausência de comparação entre estratégias
ou ausência de descrição da estratégia ventilatória empregada.
Fonte:
Moher D et al. [14]
Figura
1 - Modelo de
diagrama de fluxo
Avaliação
da qualidade das evidências
No
sistema GRADE, a avaliação da qualidade da evidência é realizada para cada
desfecho analisado [16],
em nosso estudo desfecho primário tempo de
ventilação
mecânica e desfecho secundário: sobrevida em 28 dias. Como
foi incluído apenas um estudo observacional, a qualidade da
evidência se inicia como baixa. O risco
de viés de publicação é maior em estudos
observacionais, classificando o risco,
portanto, como substancial ou fortemente suspeito.
A
imprecisão também reduz o nível de evidência, pois o tamanho da amostra é
pequeno. Não há evidência indireta a ser considerada. Sobre a inconsistência,
não se observou diferença entre os subgrupos. Nenhuma das comorbidades
diferiram significativamente entre cada um dos grupos de volume corrente (VC),
exceto para diabetes (P = 0,042). O valor de PEEP e pressão inspiratória
empregados não foi significativamente diferente entre os diferentes grupos de
volume corrente (P = 0,706 e P = 0,587, respectivamente). O uso de estratégias
de manejo para hipoxemia não diferiu entre os grupos de VC (P = 0,966, P =
0,176 e P = 0,406, respectivamente). Diante destas análises, a confiança na
estimativa de efeito é muito limitada. Há importante grau de incerteza nos
achados (tabela I).
Tabela
I - Avaliação da
qualidade de evidências
Características
do estudo incluído
Apenas
um estudo preencheu os critérios de inclusão (Tabela II) [17]. Os autores
analisaram prontuários de 104 pacientes que necessitaram de VM para tratar a
SDRA causada pela infecção por influenza A/H1N1 na Coreia. Esses registros
foram classificados em 3 categorias, de acordo com o VC que receberam: VC menor
ou igual a 7 ml/kg, VC maior que 7 ml/kg e menor ou igual a 9 ml/kg ou VC maior
que 9 ml/kg. O grupo com VC maior que 9 ml/kg mostrou uma mortalidade na UTI em
28 dias significativamente maior que o grupo com VC menor ou igual a 7 ml/kg
(72,0% vs 40,7%, P = 0,007) e o grupo com VC entre
7,1 e 8,9 ml/kg (72,0% vs 42,2%, P = 0,004). A
gravidade da hipoxemia avaliada pela PaO2/FIO2 não foi um indicador de
mortalidade na UTI em 28 dias (HR, 0,997; IC95%, 0,992-1,002; P = 0,173). Na
análise multivariada ajustada para idade, VC maior que 9 ml/kg, escores APACHE
II e SOFA indicou que VC maior que 9 ml/kg de peso predito foi um preditor
independente para mortalidade na UTI em 28 dias (HR, 2,459; IC 95%,
1,357-4,457; P = 0,003). O escore SOFA foi também um indicador significativo de
mortalidade em 28 dias (HR, 1,158; IC, 1,031-1,301; P = 0,014).
Tabela
II - Características
do estudo incluído
Características
dos estudos excluídos
A
maior parte dos estudos excluídos eram observacionais e retrospectivos [18,19,20,21,22,23]
e não faziam comparação entre estratégias ventilatórias. A síntese dos estudos
e os motivos para exclusão são expostos na Figura 1.
Dos onze trabalhos excluídos, cinco
relatam a experiência no uso de oxigenação por membrana extracorpórea
[18,19,20,21,23,24,25] usada como terapia de resgate diante da hipoxemia refratária
observada nos pacientes (tabela III). Em 2013 no Canadá, autores realizaram
comparação entre pacientes que receberam óxido nítrico inalatório com um grupo
que não recebeu, mas não relataram a estratégia ventilatória do grupo sem óxido
nítrico [23]. Na Índia, pesquisadores realizaram uma coorte retrospectiva em
grupos de pacientes com SDRA por influenza entre sobreviventes e não
sobreviventes que receberam ventilação de alta frequência. Foi observado um
aumento da sobrevida nos pacientes que receberam menor tempo de ventilação
convencional antes da aplicação da ventilação de alta frequência [26].
Um
estudo observacional prospectivo no Chile em 2011 avaliou os efeitos de um
protocolo envolvendo medidas farmacológicas e não farmacológicas [27], que
envolvia estratégia protetora de ventilação mecânica, ajuste individualizado da
PEEP, protocolo de sedoanalgesia, manejo restritivo
de fluidos, protocolo de desmame e ventilação por posição prona, além da
oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) como terapia de resgate. Foi
observada diminuição da mortalidade em relação a populações comparáveis (21%).
No
ano de 2018 em Taiwan, autores demonstraram aumento da mortalidade nos
pacientes com SDRA por influenza que foram ventilados com VC superior a 8 ml/kg
peso predito nas primeiras horas após a intubação. Um aumento de 1 ml/kg peso
predito nas primeiras horas esteve relacionado com aumento de 26,1% na
mortalidade em 30 dias [20].
Outro
estudo, conduzido nos Estados Unidos em 2011, realizou comparação entre
pacientes que desenvolveram SDRA por H1N1 comparado a um grupo SDRA não-H1N1
[12]. Os resultados comprovaram que a gravidade da SDRA associada à influenza é
superior à lesão pulmonar não associada à influenza, com hipoxemia mais grave e
persistente por dias após a apresentação inicial [28,29].
Tabela
III - Características
dos estudos excluídos (ver PDF anexo)
Este
estudo teve como objetivo resumir as evidências disponíveis sobre a estratégia
protetora de VM na SDRA por influenza. Foi utilizada uma ampla estratégia de
busca para identificar estudos que pudessem colaborar no manejo da hipoxemia
refratária e melhorar a sobrevida desta população. Porém, a grande maioria dos
estudos identificados não preenchiam os critérios de inclusão. Não foi
encontrado nenhum estudo experimental, apenas 1 estudo observacional
retrospectivo que abordava os aspectos definidos na estratégia PICO.
Na
literatura, os resultados clínicos favoráveis dos efeitos da redução do VC na
SDRA estão bem definidos [30,31]. Porém, no caso da SDRA por etiologias virais
não há evidências confiáveis de que essa importante intervenção terapêutica
consiga reduzir a mortalidade [32]. Um estudo observacional retrospectivo no
México relatou não haver diferenças entre VC ou estratégias ventilatórias entre
os sobreviventes ou não sobreviventes [33] (média, 8,97 vs
7,8 ml/kg; P = 0,190).
Contudo,
o estudo incluído nesta revisão analisando 104 pacientes na Coreia descreve os
efeitos da ventilação mecânica com baixos VC (menor ou igual a 7 ml/kg peso predito), médios VC (maior que 7 ml/kg, porém
menor ou igual a 9 ml/kg) ou altos VC (maior que 9 ml/kg peso predito) em
pacientes com SDRA por influenza [17]. Os autores concluíram que baixos volumes
trazem benefícios para os pacientes com SDRA de etiologias virais, como menor
tempo de VM e menor tempo de internação em UTI e hospitalar. Além disso, os
pacientes ventilados com VC elevado apresentaram maior mortalidade em 28 dias.
Corroborando estes achados, um estudo retrospectivo realizado em Taiwan
comprovou que um aumento de 1 ml/kg de peso predito nos primeiros três dias de
intubação esteve relacionado à 26% de aumento da mortalidade nos pacientes com
infecção por influenza [20].
A
gravidade da SDRA secundária à infecção por influenza é superior à SDRA por
outras etiologias, com hipoxemia mais grave e persistente por dias após a
apresentação. Essa diferença na gravidade da lesão pulmonar é comprovada por
vários estudos patológicos e de autópsia que demostraram danos alveolares
difusos e hemorragia alveolar em pacientes com H1N1 [12].
Em virtude do grave
comprometimento pulmonar, terapias de resgate são frequentemente
necessárias,
entre elas a manobra de recrutamento alveolar (MRA),
oxigenação por membrana
extracorpórea (ECMO), ventilação por
posição prona e óxido nítrico
inalatório.
A
MRA faz parte da estratégia protetora, sendo utilizada com aumento das pressões
inspiratórias por curtos períodos de tempo para abrir os alvéolos colapsados e
permitir a distribuição mais homogênea da ventilação [9,10].
Como a SDRA é uma
doença que cursa de uma fase exsudativa a uma fase com fibrose
alveolar e
intersticial persistente, o diagnóstico precoce é
fundamental, para que as MRA
e a manutenção da abertura alveolar com PEEP suficiente
sejam eficazes. Os
benefícios em relação à
redução do tempo de ventilação
mecânica e redução de
mortalidade ainda não está claro na literatura [20,35,36].
A
ECMO foi bastante utilizada como terapia de resgate na SDRA por H1N1 durante a
pandemia de 2009 [24]. Trata-se de uma modalidade de suporte de vida
extracorpóreo que possibilita suporte temporário à falência da função pulmonar
e/ou cardíaca refratária ao tratamento clínico convencional [37]. Sobre o uso
da ECMO para a SDRA por influenza, a literatura apresenta baixo nível de
evidência, com resultados divergentes [18,19,20,21,22,24,25]. Alguns concluíram
que a relação custo-benefício ainda permanece incerta, sem diferenças na
sobrevida quando comparado ao tratamento convencional [19,25]. Porém, outros
demonstraram que a sobrevida hospitalar alcançada com o uso da ECMO permite que
seu uso seja considerado seguro e eficaz [18,21,24].
A
ventilação por posição prona também é uma estratégia de resgate bastante
utilizada em pacientes com SDRA. Ensaios clínicos controlados e randomizados
comprovaram melhora da oxigenação quando os pacientes estão em decúbito ventral
do que em decúbito dorsal, assim como redução da lesão induzida pelo ventilador
[38]. Contudo, na SDRA por etiologias virais não há comprovação sobre a redução
de mortalidade.
Estudos
observacionais mostraram benefícios do uso do óxido nítrico inalatório para os
pacientes com SDRA por influenza com hipoxemia refratária e com hipertensão
pulmonar comprovada. Proporciona melhora transitória da oxigenação atuando
principalmente como adjunte entre outras terapias
[39]. Porém, seu uso rotineiro não é recomendado, visto não haver melhora da
sobrevida e um aumento no risco de disfunção renal [40].
A
limitação do VC para os pacientes com influenza parece estar relacionada à
diminuição da mortalidade, no entanto não há estudos experimentais suportando
essa ideia como acontece na SDRA por outras etiologias. Apesar de se passarem
quase vinte anos da publicação dos primeiros estudos [30,31], ainda se
presencia a dificuldade em se adotar estratégia protetora, principalmente
diante de importante hipercapnia e hipoxemia
refratária [19,22]. No Brasil, a prática clínica segue as orientações das
diretrizes brasileiras de ventilação mecânica da Associação de Medicina
Intensiva Brasileira (AMIB) e Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia
(SBPT) de 2013, criada após fórum com 59 especialistas que fizeram extensa
revisão da literatura mundial [41]. Estas diretrizes recomendam a ventilação
mecânica com VC menor ou igual a 6 ml/kg peso predito para SDRA de etiologias
diversas, contudo, não há recomendação específica para a SDRA por influenza.
Isso mostra a grande limitação que temos para a prática clínica baseada em
evidências nesta população.
Um
dos principais achados desta revisão sistemática é a necessidade de novas
pesquisas para investigar os efeitos da estratégia protetora de ventilação
mecânica nos pacientes com SDRA por Influenza. Como limitações, podemos citar a
dificuldade em encontrar estudos que preenchiam os critérios predefinidos baseados
na questão PICO. Ademais, não encontramos nenhum ensaio clínico controlado e
randomizado que avaliou o uso de estratégia protetora de ventilação mecânica
nessa população específica.
A
despeito da ampla busca na literatura, não foi encontrado nenhum ensaio clínico
randomizado e controlado para o uso de estratégia protetora de ventilação
mecânica em pacientes com SDRA por influenza. Portanto, não há dados
suficientes para sabermos se a estratégia protetora pode reduzir o tempo de
ventilação mecânica e aumentar a sobrevida em 28 dias, o que limita as
conclusões sobre os benefícios de tal estratégia nessa população.
Conflito
de interesse
Não
há.
Fontes
de financiamento
Não
houve financiamento para a pesquisa.
Contribuição
dos autores
Concepção
e desenho da pesquisa:
Pimenta LBM, Annoni R, LAS; Coleta de dados: Pimenta
LBM, Annoni R; Análise e interpretação dos
dados: Pimenta LBM, Annoni R; Redação do
manuscrito: Pimenta LBM, Annoni R, Teixeira LAS; Revisão
crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Pimenta
LBM, Annoni R, Teixeira LAS