RELATO DE CASO
A eficácia da técnica
da osteopatia visceral no diabetes tipo 2
The effectiveness of the visceral osteopathy technique in type 2
diabetes
Walter Bezerra Da
Silva*, Teresa Cristina de Freitas Nery*, Ivan Luiz Pavanelli*, Kelvin Anequini Santos*, Thiago Lopes Barbosa de Morais*, Bruno
Gonçalves Dias Moreno*
*Escola Brasileira de
Fisioterapia Manipulativa (EBRAFIM)
Correspondência: Bruno Gonçalves Dias
Moreno, Rua Berlim, 34 Qd F2 Golden Park Residence 15135-820 Mirassol SP, bruno@ebrafim.com
Walter Bezerra Da Silva:
walteracupunturista@hotmail.com
Teresa Cristina de
Freitas Nery: teresacristina.nery@gmail.com
Ivan
Luiz Pavanelli: ivanluiz_p@hotmail.com
Kelvin Anequini Santos: kanequini@gmail.com
Thiago Lopes Barbosa de
Morais: fisiotlopes@yahoo.com.br
Resumo
Este estudo se
justificou pela pequena quantidade de pesquisa sistematizada sobre a eficácia
da Osteopatia no Diabetes; teve como objetivo, verificar a eficácia da
Osteopatia visceral nos portadores de Diabetes Mellitus tipo 2. O estudo contou
com a participação de uma paciente do sexo feminino, 46 anos, encaminhada pelo
setor de nutrição do Hospital de Guarnição do Exército de Natal/RN, que
controla a glicemia apenas com alimentação. A paciente foi submetida a uma
sessão semanal durante dois meses consecutivos, o que totalizou oito sessões;
foram coletados dados da anamnese segundo a abordagem osteopática
e a paciente foi submetida ao exame laboratorial de hemoglobina glicada no
início e no final do tratamento; foram realizadas as técnicas viscerais de
Manipulação Osteopática com o objetivo de atuar na
mobilidade e de motilidade visceral. No início do estudo a hemoglobina glicada
encontrava-se com o valor 6,3% e no final houve uma redução para 5,2% o que
sugere um efeito positivo, pois este exame possui enorme importância na
avaliação do controle da Diabetes, resumindo para o especialista e para o
indivíduo em tratamento se o controle glicêmico foi eficaz, ou não. Este estudo
mostrou que a técnica de Osteopatia Visceral foi eficaz em controlar os índices
sanguíneos de glicose no indivíduo tratado.
Palavras-chave: diabetes mellitus,
hemoglobina A glicada, manipulação osteopática.
Abstract
This
study was justified by the small amount of systematized research on the
efficacy of Osteopathy in Diabetes. The objective was to verify the efficacy of
visceral osteopathy in patients with type 2 diabetes mellitus. The study had
the participation of a female patient, 46 years old, referred by the nutrition
sector of the Hospital de Garrison Army of Natal/RN, which controls blood
glucose only with foods. The patient was submitted to a weekly session for two
consecutive months, which totaled eight sessions; data were collected from the
anamnesis according to the Osteopathic approach, and the patient was submitted
to laboratory examination of glycated hemoglobin at the beginning and at the
end of treatment; the visceral techniques of Osteopathic Manipulation were
performed with the objective of acting on the mobility and visceral motility.
At the beginning of the treatment, glycated hemoglobin was 6.3%, and in the end
there was a reduction to 5.2%, which suggests a positive effect, since this
test is extremely important in the evaluation of Diabetes control, summarizing
the specialist and the individual under treatment whether or not glycemic
control was effective. This study showed that the Visceral Osteopathy technique
was effective in controlling blood glucose indices in the individual treated.
Keywords: diabetes mellitus, hemoglobin A glycated, osteopathic manipulation.
A história do Diabetes
Mellitus (DM) atravessou os séculos. Em 1500 a.C., o papiro egípcio Ebers, já falava de uma doença que tinha como
característica grande quantidade de urina, porém, foi no século II, com a
descrição de Arataeus da Capadócia que veio a
denominação desta doença, com sua clássica descrição “a carne do corpo e dos
membros se derretia e se convertia em urina” [1].
Atualmente o DM é
considerada uma síndrome de evolução crônica que acometem o homem moderno em
qualquer idade, condição social e localização geográfica. Caracterizada por uma
deficiência absoluta ou relativa de insulina que irá influenciar negativamente
o metabolismo dos glicídios, proteínas, lipídios, água, vitaminas e minerais, e
durante a sua evolução, na dependência do controle metabólico obtido, podem
advir complicações agudas e crônicas [2]. Essa síndrome constitui hoje um
problema de saúde pública, em razão de sua elevada prevalência, acentuada
morbidade e mortalidade e, por fim, das repercussões econômicas e sociais
decorrentes do impacto dessas complicações [3].
Várias são as
complicações associadas, disfunções e insuficiência de vários órgãos,
especialmente olhos, rins, nervos, cérebro, coração e vasos sanguíneos, podendo
resultar de problema na secreção e/ou ação da insulina envolvendo processos
patogênicos específicos; por exemplo a destruição das células beta do pâncreas
(produtoras de insulina), resistência à ação da insulina, distúrbios da
secreção da insulina, entre outros. Divide-se em três tipos 1, 2 e gestacional;
no primeiro também conhecido como juvenil o indivíduo apresenta destruição
total das células betas, representa 10 por cento dos casos, tipo 2 que
compreende 90% dos casos a destruição e parcial e a gestacional que é um tipo
de diabetes encontrado no período pré-natal de causa desconhecida [4].
Observa-se que o DM é
uma epidemia em curso. Estima-se que a população mundial acometida é de 422
milhões de indivíduos em 2014, em contrapartida com os 108 milhões de 1980. Sua
prevalência quase que dobrou passando 4,7% para 8,5% na população adulta, os
óbitos advindos chegaram à marca de 1,5 milhões. A grande parte dos indivíduos,
cerca de 80%, estão em países em desenvolvimento, onde a epidemia tem maior
intensidade e existe crescente proporção de pessoas acometidas em grupos
etários mais jovens, as quais coexistem com o problema que as doenças infecciosas
ainda representam. No Brasil nos anos 80 o DM apresentava uma prevalência de
7,6%, já em 2010 essa taxa aumentou para 15%. Em 2014, estimou-se que
existiriam 11,9 milhões de pessoas, na faixa etária de 20 a 79 anos, com
diabetes no Brasil, podendo alcançar 19,2 milhões em 2035. Observa-se que o
número de diabéticos está aumentando em virtude do crescimento e do
envelhecimento populacional, da maior urbanização, da progressiva prevalência
de obesidade e sedentarismo, bem como da maior sobrevida de pacientes com DM.
Medir o predomínio atual de DM e estimar o número de pessoas com diabetes no
futuro é importante, pois possibilita planejar e alocar recursos de maneira
racional [5].
Mundialmente, os custos
diretos para o atendimento ao diabetes variam de 2,5% a 15% dos gastos
nacionais em saúde, dependendo da prevalência local de diabetes e da
complexidade do tratamento disponível. Além dos custos financeiros, o diabetes
acarreta também outros custos associados à dor, ansiedade, inconveniência e
menor qualidade de vida que afeta os doentes e suas famílias. O DM representa
também carga adicional à sociedade, em decorrência da perda de produtividade no
trabalho, aposentadoria precoce e mortalidade prematura [4].
Dentre as
possibilidades terapêuticas da fisioterapia encontra-se a Osteopatia, ciência
criada por Dr. Still no século XVIII, que estabeleceu um elo permanente entre
estrutura e função. A mesma se utiliza de técnicas normativas
dos sistemas musculoesquelético, visceral e craniano. A Osteopatia foi
crescendo na medida em que se conseguia confirmar na prática clínica os
fundamentos estabelecidos [6].
Atualmente o francês
Jean Pierre Barral tem aprofundado a manipulação visceral e difundido suas
técnicas para terapeutas do mundo, para trabalharem com os órgãos viscerais de
forma específica, beneficiando assim o corpo em sua globalidade [7]. As
vísceras possuem um movimento particular descrito como motilidade que é intrínseco
ao órgão, e a mobilidade que é o movimento entre dois órgãos, ou entre um órgão
e a parede do peritônio, ou entre uma víscera e o diafragma, ou entre um órgão
e outra estrutura musculoesquelética. Patologias orgânicas podem levar a uma
redução de mobilidade e motilidade visceral, causadas por aderências
(fixações), espasmo visceral ou por ptose [8].
A proposta do
tratamento osteopático com enfoque na víscera
consiste em devolver a mesma os movimentos reduzidos ou perdidos tendo em vista
suas propriedades mecânicas, que interagem com sua fisiologia. Portanto,
qualquer alteração mecânica da víscera, acarretará comprometimento em sua
função normal. Isto se explica pelo fato de que as vísceras possuem um sistema
articular e ligamentar (sustentação), que definimos como articulação visceral.
Esta, por sua vez, possui superfícies de deslizamento, que são membranas
serosas (meninges, pleura, peritônio, pericárdio) envolvendo a víscera e se
comunicando com determinada parede muscular, esqueleto, ou outra víscera [9].
Portanto, o objetivo do
estudo foi avaliar a eficácia da técnica da osteopatia visceral no diabetes
tipo 2.
Trata-se de um estudo
descritivo, experimental e transversal. A presente pesquisa desenvolveu-se no
Setor de Fisioterapia do Hospital de Guarnição de Natal/RN, pertencente ao
Exército Brasileiro, no período de fevereiro a junho de 2018.
O estudo contou com a
participação de uma paciente do sexo feminino ECS, 46 anos, encaminhada pelo
setor de nutrição, a qual controla a glicemia apenas com alimentação, sendo
constatado através de exames laboratoriais realizados no referido hospital. A
voluntária é portadora de Diabetes Mellitus tipo 2, na faixa etária de
prevalência de tal patologia, que controlasse a glicemia apenas com dieta.
Foram excluídos da pesquisa: indivíduos que fazem uso de antiglicêmicos,
portadores de DM tipo 1 e 3, com histórico de complicações advindas da
diabetes, pancreatite aguda ou crônica, câncer, dificuldade de locomoção,
distúrbios psiquiátricos e os que se recusarem a assinar o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE.
A voluntária foi
esclarecida sobre o propósito da pesquisa e assinou termo de consentimento
livre e esclarecido como exige o Comitê de Ética em pesquisas envolvendo seres
humanos conforme resolução 196/96. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética
em pesquisa da Universidade Potiguar - UNP (parecer nº 14252/2017).
A paciente foi
submetida a uma sessão semanal durante dois meses consecutivos, o que totalizou
8 sessões; foram coletados dados da anamnese segundo a abordagem osteopática; e a mesma foi submetida ao exame laboratorial
de hemoglobina glicada antes de iniciar o tratamento, ao término e dois meses
após a conclusão, a fim de verificar as variações dos resultados laboratoriais,
dentro do presente estudo. Durante a sessão a mesma foi conduzida à maca,
permaneceu em decúbito dorsal; o terapeuta realizou técnica de motilidade do
pâncreas (gangorra), que consiste em realizar movimentos rítmicos da mão sobre
o pâncreas, fazendo com que a cabeça do mesmo se movimente para anterior e
posterior, a fim de melhorar sua liberdade de movimento; tendo em vista a
relação dos órgãos com o pâncreas será feito previamente a técnica estiramento
do duodeno descendentemente, como também a liberação do mesocólon
transverso fazendo a tração do mesmo através do alongamento de ambas flexuras
cólicas, haja vista a relação que eles têm com o órgão em questão, por se
encontrarem localizados anteriormente. Devendo estes serem manipulados antes
mesmos que o pâncreas para melhor eficiência da técnica segundo Barral [11].
Observou-se no presente
estudo que a hemoglobina glicada sofreu as seguintes alterações: antes de
iniciar o tratamento a mesma encontrava-se com a percentagem de 6,3%, houve uma
redução para 5,5%, e quatro meses após o do término do tratamento foi dosado
novamente, o qual apresentou-se com 5,2% (Figura 1).
Figura 1 - Evolução dos
valores da Hemoglobina Glicada (A1C) no tempo.
Tabela I - Evolução dos
valores da hemoglobina glicada (A1C) no tempo.
Atualmente o Diabetes
Mellitus se apresenta como uma das mais importante causas de morbidade e
mortalidade em diferentes grupos etários da população. O predomínio total de
diabetes é aproximadamente 6% da população, onde 90% por cento é tipo 2.
Tratamento e cuidados com DM representam uma porção substancial do gasto
nacional de cuidado de saúde, que compromete 2,5% a 15% do orçamento anual da
saúde de um país; no Brasil chega em torno de 12,48 bilhões de reais, cálculos
recentes preveem que o Sistema único de Saúde (SUS) a nível ambulatorial gasta
R$ 2.108,00 por paciente [10].
A cada dia cresce a busca por formas de
como combater tal enfermidade, devido o papel brutalmente modificativo que ela
desempenha na vida do seu portador; dentre as modalidades encontram-se:
controle alimentar, atividade física, alopatia, homeopatia, acupuntura,
osteopatia dentre outras.
Autores aduzem em suas
obras que, toda víscera deve funcionar normalmente, sem qualquer restrição,
caso haja limitação do seu movimento natural seja por fixação ou aderência a
outra estrutura, não importando seu tamanho, causará prejuízo funcional ao
órgão. No caso da patologia em questão a víscera mais evidenciada é o pâncreas.
Contudo, após análises bibliográficas, se pôde verificar que a sua manipulação
promove um aumento no fluxo das secreções excretadas, bem como melhora a sua
mobilidade e motilidade [11].
O presente estudo teve
como objetivo, verificar se a manipulação osteopática
do pâncreas, efetivamente alteraria o controle glicêmico do portador, possuindo
como método de análise de eficácia a realização do exame de hemoglobina glicada
feito antes e após o tratamento.
A hemoglobina glicada
possui enorme importância na avaliação do controle do diabetes; através das
realizações do exame aludido anteriormente, é possível se obter uma espécie de
resumo, esclarecendo para o especialista e para o indivíduo em tratamento se o mesmo foi eficaz ou não. Referida análise é realizada num
período que compreende de 8 a 10 semanas após o início de nova terapêutica
aplicada. O tempo supracitado é necessário pois, antes disto, os níveis de A1C
não refletirão o verdadeiro efeito da mudança recente do tratamento, o qual
poderá ser verificado através da avaliação dos níveis de glicose sanguínea, a
qual reage mais rapidamente ao início ou à alteração da terapia. Isso ocorre
porque durante os últimos 90 dias a hemoglobina vai incorporando glicose, em
função da concentração que existe no sangue; caso as taxas de glicose
apresentem níveis elevados no período, haverá um aumento da hemoglobina glicada
[12,13].
Estudos recentes
indicam que a A1C é um componente menor da hemoglobina, sendo encontrada em
indivíduos adultos não diabéticos em uma proporção de 1% a 4% dos indivíduos. A
hemoglobina glicada reflete a glicemia média dos últimos 2 a 3 meses, o que
corresponde à meia-vida das hemácias. Quanto maior a glicemia, maior a
concentração de A1C. Na prática, os valores normais de referência vão de 4% a
6%. Níveis de A1C acima de 7% estão associados a um risco progressivamente
maior de complicações crônicas. Por isso, o conceito atual de tratamento do
diabetes define uma meta de A1C em torno de 7% (ou de 6,5%, de acordo com
algumas sociedades médicas), sendo que esse valor alvo pode ser maior ou menor,
a depender das características clínicas de cada indivíduo [14].
Portanto níveis de A1C
acima de 6,5 associa-se a um risco crescente de complicações relacionadas ao
diabetes, dentre as quais encontram-se: Doenças cardiovasculares que
representam a principal causa de morte (52%); Nefropatia em 15 à 20% na DM2,
sendo a principal causa de insuficiência renal em pacientes que fazem diálise;
Retinopatia acometendo 40% dos diabéticos, causando cegueira em pacientes na
faixa etária dos 25 a 74 anos; a Neuropatia diabética complicação mais comum e
precoce no diabético, chegando a atingir 80 a 100%; e o pé diabético como a
principal patologia em portadores de tal doença, tendo estes 15 vezes mais
risco de amputação dos quais 20% destes morrem em dois anos [15].
Em estudo randomizado
com 1441 indivíduos diabéticos tratados com alopatia após 6,5 anos, observou-se
que a manutenção dos níveis de normalidade da A1C preveniu o aparecimento e
reduziu a progressão de nefropatia, retinopatia e neuropatia diabéticas quando
comparado com o grupo controle que apresentavam A1C elevado. Isto demonstra a
impactação de qualquer terapia que controle o nível de A1C [15].
Dado prosseguimento a
realização dos procedimentos mencionados alhures, e sendo praticados todos os
atos intuitivos para se chegar a um resultado pretendido, foi verificado,
através dos procedimentos citados, uma redução de 12,69% da hemoglobina glicada
da paciente estudada, sendo que esta continuou reduzindo nos meses
subsequentes, como verificado em exames laboratoriais, totalizando uma
diminuição de 17,46% aos quatro meses após o procedimento, o que mostra,
através de comparações e análises de exames taxativos, que a manipulação
visceral tem influência sobre a víscera e que sua fisiologia pode sim ser
modificada, conforme apregoa Barral [11].
O Diabetes Mellitus do
tipo 2 é uma das patologias mais graves da atualidade, a qual gera inúmeras
alterações físicas e elevados custos financeiros aos cofres públicos.
A Organização Mundial
de Saúde indica o tratamento de Osteopatia para várias enfermidades, sem contar
que o presente estudo estimulará desse tratamento direcionados ao Diabetes do
tipo 2 e consequentemente redução de custos que são suportados pelo poder
público.
O presente estudo
mostrou que através da manipulação osteopático,
pode-se estimular o pâncreas e promover alterações fisiológicas, o que foi
corroborado com a análise laboratorial do exame da hemoglobina glicada.
Portanto, a Osteopatia mostra-se como uma alternativa de baixo custo e eficaz
para o manejo do Diabetes. Contudo faz-se necessário a realização de novos
estudos com uma maior amostragem para se observar a eficácia desta técnica nas
diferentes populações.