Fisioter Bras 2021;22(5):724-32
ARTIGO
ORIGINAL
Composição
corporal e índice de massa corporal de mulheres praticantes de Pilates de duas
cidades gaúchas
Body composition and body mass
index in women Pilates practitioners from two Brazilian cities
Bruna
Mathucheski*, Susiane
Reis*, Orlando Bulso Junior*, Francine Rodrigues
Pinto*, Arieli Dias*, Anelise Reis Gaya*, Aline
Nogueira Haas*
*Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
Recebido
em 16 de julho de 2020; aceito em 12 de agosto de 2021.
Correspondência: Aline Nogueira Haas, Rua Felizardo,
750 Jardim Botânico 90690-200 Porto Alegre RS
Bruna Mathucheski: bru_mathucheski@hotmail
Orlando Bulso Junior:
bulsojr@hotmail.com
Francine Rodrigues Pinto: francine.rodriguesp@gmail.com
Arieli Dias:
ariieli_dias@hotmail.com
Anelise Reis Gaya: anegaya@gmail.com
Aline Nogueira Haas: alinehaas02@hotmail.com
Resumo
Introdução: O Método Pilates (MP) se desenvolveu
muito nos últimos anos, fazendo-se necessário compreender seus efeitos na
composição corporal de seus praticantes. Objetivo: Avaliar e comparar o
Índice de Massa Corporal (IMC) e a composição corporal de mulheres praticantes
do MP de duas cidades do Estado do Rio Grande do Sul. Métodos: Foram
avaliadas 30 mulheres praticantes do MP contemporâneo há pelo menos três meses,
com frequência de uma ou duas vezes por semana, com idade média 40,50 ± 10,94
anos, sendo 15 delas em Encruzilhada do Sul (GE), e as outras 15, em Viamão
(GV). Foram aferidas seis dobras cutâneas, seis perímetros, nove diâmetros e
nove comprimentos, além de peso e altura para obter o IMC. Foi realizada
estatística descritiva e teste t para amostras independentes, adotando nível de
significância de p < 0,05. Resultados: Não foram encontradas
diferenças estatísticas significativa entre os grupos na composição corporal e
no IMC. Ocorreu diferença estatística significativa entre os dois grupos com
relação ao tempo de prática (p = 0,01). Conclusão: Conclui-se que os
grupos apresentam composição corporal e IMC semelhantes. Porém, evidencia-se
uma tendência a maiores níveis de gordura corporal e índices de obesidade no
GV, devido ao menor tempo de prática do MP.
Palavras-chave: antropometria; composição corporal;
índice de massa corporal; exercício.
Abstract
Introduction: Although the
Pilates Method (PM) has developed a lot in the last years, publications and
scientific evidence on its effects on body composition are scarce. Objective:
To evaluate and compare the BMI and body composition of PM women practitioners
from two Brazilian South Region cities. Methods: 30 women, contemporary
PM practitioners, at last 3 months, once or twice a week, mean age 40.50 ±
10.94 years, from the cities of Encruzilhada do Sul
(GE = 15) and Viamão (GV = 15) in Rio Grande do Sul,
were evaluated. Six skin folds, six circumferences, nine diameters and nine
lengths were measured, and also weight and height to
obtain BMI. Descriptive statistic and T test for independent samples was
performed, with significance level p < 0.05. Results: No statistical
difference between the two groups in the body composition and BMI were found.
Statistical difference between the two groups in the practice time were found
(p = 0.01). Conclusion: BMI and body composition were similar in both
groups. However, GV showed high levels of body fat, due to the shorter practice
time.
Keywords: anthropometry; body composition;
body mass index; exercise.
A obesidade está em constante crescimento e é associada a
muitas condições de saúde crônicas como diabetes, hipertensão, doenças
cardíacas, apneia do sono e mortalidade [1]. Através da avaliação da composição
corporal pode-se determinar os componentes do corpo humano de forma
quantitativa; detectar o grau de desenvolvimento e crescimento de diferentes
populações; investigar o sobrepeso; e, observar se há relação com alterações
patológicas [2].
Para realizar o cálculo fracionado da composição corporal é
usada uma combinação distinta de medidas, obtidas de maneira simples e prática
de diferentes tecidos corpóreos, entre estes, perímetros, longitude segmentar
óssea, diâmetros, alturas e peso [1]. Com esses dados é possível identificar de
que forma a gordura está distribuída e auxiliar profissionais da área da saúde
na compreensão do estado de saúde atual de seu cliente, melhorando seu
atendimento [2].
O Método Pilates (MP) é um método de condicionamento físico
e mental criado pelo alemão Joseph Pilates na década de 40, caracterizado por
exercícios realizados em solo ou em aparelhos específicos com a utilização de
molas [3]. Caracteriza-se por uma atividade anaeróbica que pode ser praticada
em níveis variados, desenvolvendo prioritariamente capacidades de
flexibilidade, força e resistência muscular [3].
Atualmente, encontram-se alguns estudos que buscam
identificar as características antropométricas de populações que praticam o MP
[4,5,6]. Contudo, no Brasil, essas publicações são escassas. Assim, este estudo
tem como objetivo avaliar e comparar o Índice de Massa Corporal (IMC) e a
composição corporal de mulheres praticantes do MP das cidades de Encruzilhada
do Sul e Viamão, no Estado do Rio Grande do Sul/RS).
Desenho
do estudo e amostra
Este é um estudo de corte transversal, com abordagem
quantitativa. A amostra foi composta por 30 mulheres, sendo 15 na cidade de
Encruzilhada do Sul que corresponde ao Grupo Encruzilhada (GE) e 15 na cidade
de Viamão, Grupo Viamão (GV), praticantes do MP contemporâneo, com frequência
de uma ou duas vezes por semana, e duração em média de uma hora por aula.
Foram estabelecidos alguns critérios de inclusão, que
foram: ter idade entre 20 e 60 anos e praticar o MP há pelo menos três meses.
Os critérios de exclusão foram: gravidez, lesão, deformidade ou amputações que
inviabilizem qualquer um dos testes que foram aplicados.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, registrado na Plataforma Brasil sob
o número 45017115.6.0000.5347. Todos os participantes assinaram um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido antes do período de coleta, concordando com a
participação no estudo.
Coleta
de dados
A coleta dos dados foi realizada em dias previamente
agendados, conforme a disponibilidade dos participantes em dois estúdios: um na
cidade de Encruzilhada do Sul e um em Viamão. Após a explicação do propósito do
estudo, cada participante foi conduzido a uma sala apropriada, onde foi feita a
coleta de dados de forma individual, com duração aproximada de 30 min.
Protocolos
de avaliação
Com o intuito de obter dados sobre a composição corporal e
o IMC da amostra estudada, foram avaliadas as seguintes variáveis
antropométricas: massa corporal, estatura, seis dobras cutâneas (tríceps,
subescapular, supra espinhal, abdominal, coxa, panturrilha), seis perímetros
(braço, antebraço, tórax, coxa, panturrilha, cintura), nove diâmetros e nove
comprimentos. As avaliações foram realizadas por um antropometrista
nível II acreditado pela International Society for the Advancement of Kinanthopometry (ISAK) [7].
Também foram coletadas, através de uma anmnese
inicial, informações referentes ao tempo de prática no MP e idade.
Os instrumentos de coleta de dados foram: adipômetro marca Lange®, trena antropométrica marca Cescorf®, paquímetro marca Cescorf®
de 60 cm, paquímetro marca Cescorf® modelo Innovare de 24 cm e Sigmômetro
marca Cescorf®. Para medir massa corporal e altura
foi utilizada balança marca Cadence® e estadiômetro marca Sanny®.
Para determinar a composição corporal utilizou-se a equação
de cinco componentes (peso de pele, peso ósseo, massa residual, massa adiposa,
massa muscular) de Ross, Kerr [8].
Calculou-se
o IMC dividindo-se o valor do peso em kg, pelo quadrado da altura,
medida em metros, (kg/m2). De acordo com a OMS
[9], a seguinte classificação foi adotada:
Quadro
I - Classificação do
IMC conforme a OMS [9]
A fim de classificar a massa corpórea das participantes,
foram utilizados os valores de referência para a gordura corporal em indivíduos
do sexo feminino, adaptado de Golding, Myers, Sinning
[10] (Quadro II).
Quadro
II - Valores de
referência para a gordura corporal em relação à idade em indivíduos do sexo
feminino
Análise
estatística
Foi realizada a estatística descritiva e a normalidade dos
dados foi verificada através do Teste Shapiro-Wilk. Foi utilizado o Teste “t”
para amostras independentes, com o intuito de comparar os dois grupos. O nível
de significância adotado foi de p < 0,05. Para a análise dos dados foi
utilizado o software SPSS versão 20.0.
A Tabela I apresenta os resultados de média, desvio padrão
e valor de “p” das variáveis (idade, massa corpora, altura, tempo de prática e
IMC) e dos cinco componentes corporais no GE, no GV e no GE+GV. Observa-se que
ocorreu diferença estatística significativa somente com relação ao tempo de
prática entre os dois grupos.
Verifica-se, ainda, que o GV (25,91 ± 3,37) apresenta
valores médios de IMC acima da classificação considerada adequada (de 18,5 a
24,90 kg/m²) pela OMS [9]; e, o GE apresenta valores médios de IMC (24,56 ±
3,93) muito próximos ao limite superior dos valores considerados adequados.
Tabela
I – Valor de média,
desvio padrão e valor de “p” das variáveis e componentes corporais nos GE e GV
S = média; DP = desvio padrão; *diferença
estatística significativa (valor de p < 0,05)
Na Tabela II, a amostra foi categorizada com relação ao
IMC, conforme a OMS [9]. Observa-se que 60% do GV está classificado como
“sobrepeso/obesidade grau I e II”; enquanto somente 33% do GE pertence a essa
classificação.
Tabela
II – Categorização
da amostra com relação ao IMC, conforme a OMS [9]
A Tabela III apresenta a quantificação dentro dos índices
de referência para a gordura corporal em indivíduos do sexo feminino. Demonstrou
que 20% do GE e 53,33% do GV estão acima da média, conforme a classificação
proposta no Quadro II.
Tabela
III – Classificação
quanto à quantificação dos índices de referência para a gordura corporal
conforme Golding, Myers, Sinning [10]
O objetivo deste estudo foi avaliar e comparar o IMC e a
composição corporal de mulheres praticantes do MP das cidades de Encruzilhada
do Sul e Viamão, RS. Ao comparar o GE e GV não foram encontradas diferenças
estatísticas significativas nos cinco componentes corporais da composição
corporal e no IMC. Somente foi encontrada diferença estatística significativa
entre os grupos (p = 0,01) em relação ao tempo de prática (Tabela I).
O GV apresentou valor de média do IMC acima da
classificação considerada adequada pela OMS [9] e superior ao GE. 60% da
amostra do GV está classificada como “sobrepeso/obesidade grau I e II”;
enquanto no GE, somente 33% encontram-se nessa classificação (Tabela II).
Todavia, não houve diferença significativa entre os grupos na média do IMC,
sendo a média do GE muito próxima ao limite superior dos valores considerados
adequados (Tabela I). Em relação à quantificação dentro dos índices de
referência para a gordura corporal em indivíduos do sexo feminino, metade do GV
está acima da média, enquanto somente 20% do GE encontra-se nessa classificação
(Tabela III).
Mesmo que a diferença entre os dois grupos no valor do IMC
e nos componentes da composição corporal não tenha sido significativa, os
resultados apontam uma tendência a maiores níveis de gordura corporal e índices
de sobrepeso/obesidade no GV. Embora exista carência de estudos capazes de
gerar evidências suficientes sobre esse tema, acredita-se que tal resultado
pode ser explicado pela diferença estatística no tempo de prática dos grupos,
indicando que, quanto maior o tempo de prática do MP, maior o efeito na redução
do IMC e composição corporal como apontado em outros estudos [1,13,14].
Destaca-se que os dados encontrados no GV diferem dos
estudos realizados por Pinto et al. [6] e por Vaquero-Cristóbal
et al. [4,5], no qual foram avaliadas mulheres gaúchas e espanholas
praticantes do Método Pilates Clássico, mas foram encontrados valores médios de
IMC e composição corporal inferiores aos desse grupo. Porém, os valores médios
de composição corporal e IMC do GE se assemelham aos dos estudos mencionados
[4,5,6], pois esse grupo possui uma média de tempo de prática maior que o GV e
semelhante ao grupo de praticantes do Método Pilates Clássico. Dessa forma,
essa diferença pode estar relacionada a média de tempo de prática do GV, que é
inferior a um ano, indicando, mais uma vez, que um maior tempo de prática pode
influenciar nos valores de composição corporal e de IMC.
Nesse sentido, Picolli [13] e Çakmakçi [1] perceberam melhoras na composição corporal de
mulheres sedentárias, assim como Jago et al.
[14], que verificaram pequena redução nos valores de IMC em meninas
adolescentes, após períodos de intervenção com MP de três a quatro vezes por
semana. Indicando que, mesmo em um curto período de intervenção, a frequência
semanal superior a duas vezes por semana é eficaz para apresentar resultados
positivos na mudança da composição corporal. Por outro lado, Tsai et al. [11] e Segal,
Hein, Basford [12] relataram não terem observado
mudanças significativas na composição corporal de participantes de um programa
de exercícios do MP, após 12 e 8 semanas, uma vez por semana.
Percebe-se, assim, que há uma divergência nos estudos
publicados com relação à melhora da composição corporal após a prática do MP.
Na revisão sistemática realizada por Aladro-Gonzalvo et
al. [15] foi constatado que há poucas evidências que indicam um efeito
positivo do MP na composição corporal, mas afirmam que há uma tendência para a
redução do peso corporal e da MA, quanto mais horas de prática do MP forem
realizadas por semana. Em outra revisão sistemática, realizada por Bittencourt et
al. [16], também foram encontradas evidências moderadas, quanto ao efeito
do MP na composição corporal de indivíduos saudáveis. A falta de evidências
científicas na área se dá, principalmente, pelas falhas metodológicas nos
estudos analisados, pela falta de padronização das técnicas de medição, pelo controle
insuficiente do estado nutricional dos participantes e pela má qualificação dos
instrutores de Pilates. Assim, acredita-se que com melhores delineamentos
metodológicos e maior controle do estado nutricional dos participantes será
possível encontrar melhores níveis de evidência dos efeitos do MP na composição
corporal.
Aponta-se como limitação do estudo, o pequeno número
amostral e a falta de controle sobre os dados referentes à dieta e à avaliação
nutricional da amostra estudada. Ainda, assim, destaca-se o caráter inédito do
mesmo, pois são poucos os estudos observacionais, realizados no Brasil, que
determinam o perfil da composição corporal e IMC de mulheres praticantes do
Método.
Conclui-se que ambos os grupos apresentam composição
corporal e IMC semelhantes. Porém, evidencia-se uma tendência a maiores níveis
de gordura corporal e índices de obesidade no GV, devido ao seu menor tempo de
prática do MP.
Tendo em vista a carência de estudos na área, é necessário
a realização de ensaios clínicos randomizados, com protocolos de Pilates
padronizados, avaliação nutricional, amostras com números expressivos de
participantes. Para que dessa forma, possa-se efetivamente ser capaz de
verificar o efeito do MP na composição corporal e no IMC em mulheres
praticantes do Método.
Conflito de interesses
Os autores não possuem nenhum conflito de interesses.