Fisioter Bras 2021;2292);233-48

doi: 10.33233/fb.v22i2.4480

REVISÃO

Disfunções do assoalho pélvico em praticantes de Crossfit

Pelvic floor dysfunctions in Crossfit practitioners

 

Andreza Tomasi da Silva*, Yasmin Podlasinski da Silva**, Magda Patrícia Furlanetto***

 

*Graduanda do Curso Fisioterapia, Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter, ***Graduanda do Curso de Medicina, Universidade Luterana do Brasil – ULBRA, ***Docente da Disciplina de Fisioterapia Urogenital, Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter

 

Recebido em: 27 de novembro de 2020; aceito em 12 de abril de 2021.

Correspondência: Yasmin Podlasinski da Silva, Rua Fernandes Vieira, 437/4, Bairro Bom Fim, 90035091 Porto Alegre RS, E-mail: yasminpodlasinski97@gmail.com

 

Andreza Tomasi da Silva: andrezafisioterapiaepilates@gmail.com

Yasmin Podlasinski da Silva: yasminpodlasinski97@gmail.com

Magda Patrícia Furlanetto, magdafurlanetto@hotmail.com

 

 

Resumo

Introdução: A incontinência urinária é uma disfunção do assoalho pélvico e acomete mulheres das mais variadas idades. A atividade física tem diversos benefícios, no entanto o assoalho pélvico pode ser a única área do corpo em que seu efeito positivo pode ser questionado. O CrossFit® é um programa de treinamento de alto impacto que envolve exercícios aeróbicos e anaeróbicos. Esta atividade possui um caráter motivacional e desafiador e vem ganhando milhões de adeptos no mundo todo. Objetivo: Revisar os estudos publicados nos últimos 5 anos a respeito das disfunções do assoalho pélvico em atletas praticantes de CrossFit®. Métodos: Revisão integrativa de literatura realizada através de pesquisa nas bases de dados Pubmed, Bireme (Lilacs, Medline, Scielo), Science Direct e PeDro, entre os anos de 2015 a 2020. Resultados: Foram incluídos 6 artigos aplicáveis aos critérios de elegibilidade. A população estudada são mulheres de 16 a 75 anos, praticantes de CrossFit®. Na avaliação metodológica, os estudos foram considerados fracos a moderados e apenas um forte. Conclusão: Como principais achados deste estudo, observou-se uma prevalência significativa de IU em praticantes de CrossFit®; essa disfunção parece estar relacionada a um atraso na ativação da musculatura pélvica quando exigida durante os exercícios.

Palavras-chave: exercício físico; diafragma da pelve; distúrbios do assoalho pélvico.

 

Abstract

Introduction: Urinary Incontinence is a pelvic floor dysfunction and affects women of all ages. Physical activity has several benefits; however, the pelvic floor may be the only area of the body in which its positive effect can be questioned. CrossFit® is a training program of high impact that involves aerobic and anaerobic exercises. This activity has a motivational and challenging character and has been gaining millions of followers worldwide. Objective: To review the studies published in the last 5 years regarding pelvic floor dysfunctions in athletes practicing CrossFit®. Methods: Integrative literature review carried out by searching the Pubmed, Bireme (Lilacs, Medline, Scielo), Science Direct and PeDro databases, between the years 2015 to 2020. Results: 6 articles applicable to the eligibility criteria were included. The studied population are women aged 16 to 75 years practicing CrossFit®. In the methodological evaluation, the studies were considered weak to moderate and only one strong. Conclusion: This study observed a significant prevalence of urinary incontinence in CrossFit® practitioners; this dysfunction seems to be related to a delay in the activation of the pelvic muscles when required during exercises.

Keywords: exercise; pelvic floor; pelvic floor disorders.

 

Introdução

Mulheres das mais variadas idades podem ser acometidas por disfunções do assoalho pélvico (DAP). Entretanto, há relatos na literatura de jovens nulíparas que apresentam tal sintomatologia, como a incontinência urinária e desenvolvimento de prolapsos durante a prática de esportes, especialmente os de alto impacto [1]. A incontinência urinária (IU) é uma disfunção de causa multifatorial e pode ser classificada em três principais tipos: esforço, urgência e mista. A IU de esforço (IUE) é a DAP mais comumente associada à prática desportiva e é provocada por aumentos de pressão intra-abdominal. A perda urinária, por sua vez, é atribuída à fraqueza muscular ou insuficiência ou falha do sistema de suporte uretral [2,3,4]. Apesar da grande prevalência da IU entre mulheres, que pode chegar a 60% no climatério, poucos estudos sobre prevalência e fatores de risco de IU em atletas de elite femininas foram publicados [5].

Segundo o Relatório do Comitê Consultivo das Diretrizes de Atividade Física de 2018, a atividade física regular tem um efeito benéfico em vários aspectos da saúde que incluem risco reduzido de ganho excessivo de peso, função cognitiva aprimorada, risco reduzido de demência e de câncer. Além disso, minimiza o impacto de progressão de algumas condições crônicas, como osteoartrite, hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus tipo 2. O assoalho pélvico (AP) nas mulheres pode ser a única área do corpo em que o seu efeito positivo é questionado por apresentar um risco de 3 vezes mais chances de incontinência em mulheres atletas podendo representar uma ameaça à saúde, autoestima, bem-estar e pode culminar no afastamento do esporte [3,6,7,8].

Os exercícios de alto impacto e a fisiopatologia da IUE estão possivelmente relacionados a um desequilíbrio entre o apoio fornecido pela musculatura do AP (MAP) e a pressão intra-abdominal repentina gerada durante os exercícios. Estudos mostram que em comparação a grupos de mulheres sedentárias, as atletas que jogam vôlei e basquete demonstram uma pressão vaginal maior, sugerindo que a disfunção não se deve a fraqueza muscular e sim a um atraso na resposta das fibras musculares. Embora o basquete e o voleibol sejam modalidades diferentes do CrossFit®, esses exercícios compartilham movimentos de saltos e agachamentos semelhantes [9,10].

CrossFit® é um programa de treinamento criado em 1990 por Greg Glasmann, que consiste em uma mistura de exercícios aeróbicos e anaeróbicos com o objetivo de melhorar o condicionamento físico. Este tipo de treinamento busca levar o atleta ao seu limite e utiliza exercícios do levantamento olímpico como agachamentos, arremessos e desenvolvimentos, exercícios aeróbicos de remos, corrida e bicicleta e movimentos ginásticos como paradas de mão, paralelas, argolas e barras [2,11,12]. As aulas duram em média uma hora, que incluem o aquecimento, desenvolvimento da técnica e WOD, sigla em inglês de Workout of the Day, ou "missão do dia". Obrigatoriamente, os treinos seguem os três pilares da modalidade que consistem em realizar movimentos funcionais em alta intensidade e constantemente variados. Esta atividade, por seu caráter motivacional e desafiador, vem ganhando milhões de adeptos no mundo todo [11].

 O tratamento da IU pode ser cirúrgico ou conservador. Nos últimos anos, o tratamento clínico vem ganhando maior projeção, pelos bons resultados, baixo índice de efeitos colaterais e pela diminuição de custos. A avaliação física e funcional do AP é fundamental na prevenção e no tratamento desta condição. Embora as evidências apontem os exercícios perineais como melhor opção para o tratamento da IUE, a fisioterapia dispõe de diversos recursos para a reabilitação como o treinamento para os músculos do AP com biofeedback, eletroestimulação, cones vaginais, entre outros [2,13,14].

Entretanto, a literatura tem se mostrado escassa acerca de informações sobre a relação da IU com o exercício físico de alto impacto, especificamente o CrossFit®. Desta forma, estudos que avaliem os sintomas de disfunções nesta população podem ser de grande valia para que seja possível identificar as causas e, desta forma, prosseguir com o tratamento e prevenção. Diante disto, este estudo tem por objetivo revisar os estudos publicados nos últimos 5 anos a respeito das disfunções do AP em atletas praticantes de CrossFit®.

 

Métodos

Trata-se de uma revisão integrativa de literatura realizada através de busca bibliográfica digital em artigos científicos publicados em revistas impressas e eletrônicas, no período compreendido entre os anos de 2015 e 2020, nas bases de dados eletrônicas Pubmed, BVS, PEDro, Scielo, Science Direct e Google Acadêmico. Foram selecionados estudos com idioma de publicação em português, espanhol e inglês em diferentes estratégias para assegurar uma busca abrangente, conforme disposto na Tabela I. Também foram realizadas pesquisas manuais com base nas referências dos estudos incluídos. A questão norteadora deste estudo foi verificar a presença de disfunções pélvicas em atletas de todos os níveis do CrossFit®. Esta pergunta foi capaz de gerar descritores referentes à população, intervenção de interesse e o contexto (PICo).

     

Tabela I - Descritores e operadores booleanos utilizados na busca em bases de dados

 

 

As buscas foram realizadas por dois avaliadores independentes que selecionaram os estudos potencialmente relevantes a partir dos títulos e resumos dos resultados obtidos nas bases de dados. Quando essas seções não forneceram informações suficientes para serem incluídas, o texto completo foi verificado. Posteriormente, os mesmos revisores avaliaram independentemente os estudos completos e realizaram a seleção de acordo com os critérios de elegibilidade, ou seja, o uso de uma publicação que tenha envolvido na pesquisa disfunções urinárias em atletas praticantes de CrossFit®.Os casos discordantes foram resolvidos por consenso. Autores, ano de publicação, participantes, tipo de intervenção e resultados das variáveis de interesse foram obtidos de forma independente pelos dois revisores, utilizando um formulário padronizado. A análise dos dados foi realizada de forma descritiva, procedendo-se a categorização dos dados extraídos em grupos temáticos a partir das variáveis de interesse.

A avaliação da qualidade dos estudos foi realizada através da escala Downs & Black [15] que foi desenvolvida com intuito de preencher lacunas na avaliação de estudos que não sejam ensaios clínicos randomizados. Esta escala inclui 5 subitens relacionados com: 1) a forma de reportar os resultados (se a informação apresentada no estudo permite ao leitor interpretar os dados e resultados sem enviesamento), 2) a validade externa, 3) os vieses, 4) os fatores de confusão, e a 5) potência do estudo. Para corresponder a estes subitens estão listados 27 critérios que, caso o avaliador os identifique, serão pontuados com “um” valor. A ausência de critério corresponde à avaliação de “zero”. Nestes critérios incluem-se aspetos como: se as hipóteses e objetivos são descritos, se as variáveis a serem medidas estão descritas na secção de introdução e métodos, se os indivíduos perdidos em follow-up foram ou não reportados, se está garantida a aleatoriedade da amostra, o anonimato dos sujeitos, se há referência aos procedimentos estatísticos, entre outros.

Esta escala é reconhecida como “metodologicamente forte” e é mais flexível que outras, já que permite avaliar de forma credível, um maior leque de tipos de estudo. Tem também a vantagem de ser possível avaliar e destacar potenciais forças e fraquezas dos estudos em avaliação. Foram considerados metodologicamente fortes trabalhos que apresentaram escore igual ou superior a 80% da pontuação máxima, escores entre 60 e 80% como moderados e aqueles inferiores a 60% foram considerados metodologicamente insatisfatórios (fracos). Os estudos poderiam obter a pontuação máxima de 28 pontos, visto que a pergunta 5 permite pontuação de 0 a 2. Para os estudos que não eram ensaios clínicos, as questões específicas para tal não foram utilizadas, sendo considerados 19 itens da escala original, fornecendo uma pontuação máxima de 20 pontos.

 

Resultados

 

Na busca inicial, foram encontradas 158 referências no total. Foram 148 artigos na base de dados Google Acadêmico e desses, 6 foram escolhidos para avaliação. No Pubmed foram encontrados 2 artigos, sendo 1 incluído no estudo e o outro excluído por ser em outro idioma. Na base de dados BVS foram encontrados 2 artigos que foram incluídos e, por fim, no Science Direct foram encontrados 6 artigos, sendo 2 incluídos. Nas bases Scielo e PEDro nenhum estudo foi localizado. Um artigo foi localizado por busca manual nos estudos incluídos. Sendo assim, 8 artigos foram selecionados inicialmente e, após a leitura na íntegra, 2 foram excluídos. Por fim, 6 estudos foram selecionados após a leitura analítica por apresentarem o objeto de análise e aspectos que respondiam à questão norteadora. A Figura 1 representa o fluxograma de pesquisa relatado e os 6 artigos selecionados trata-se de estudos de delineamento transversal [9,17,18,19,20,21].

     

     

Prisma, 2009 [16]

Figura 1 - Fluxograma de seleção dos estudos

 

Características dos estudos incluídos

 

As características dos artigos selecionados, desfechos e resultados são apresentados na Tabela II. Foram encontrados dois estudos que investigaram a prevalência de DAP em praticantes de CrossFit® através de questionários eletrônicos [17,18]. Dois estudos compararam os sintomas urinários entre atletas de CrossFit® e praticantes de atividades de baixo impacto [9,19]. Outros dois artigos utilizaram testes para força e suporte da MAP [20,21] e todos os estudos incluídos foram de delineamento transversal. A população incluiu apenas mulheres, com idade que variou de 16 a 75 anos, sendo que apenas um estudo incluiu mulheres com idade abaixo de 18 anos. O número amostral variou de 70 a 551 participantes.

 

Tabela II - Fontes bibliográficas identificadas, tipo de estudo, características de amostra (número de pacientes, público-alvo e idade média)

 

 

Avaliação do risco de viés dos estudos

 

No que se refere às pontuações obtidas por meio da Escala Metodológica Downs and Black, os estudos incluídos obtiveram média de 12,6 ± 2,4 considerando a pontuação máxima de 20 pontos para os delineamentos transversais. Dentre os critérios metodológicos que mais apresentaram falhas, alude-se ao déficit de representatividade da população de interesse, a ausência de grupo controle nas amostras e o fato do local de realização do estudo não ser representativo de tratamento para o paciente. Nos aspectos relacionados à validade externa e interna (viés) dos estudos, dos 6 trabalhos analisados, 3 artigos obtiveram uma pontuação abaixo de 60%, sendo considerados como metodologicamente insatisfatórios (fracos), os outros 3 artigos obtiveram escores superior a 60%, portanto foram considerados moderados, e apenas um estudo acima de 80%, conforme demonstrado no Gráfico 1.

     

 

Gráfico 1 - Percentual obtido por meio da escala Downs and Black para os trabalhos selecionados

 

Análise dos desfechos

 

            Os resultados obtidos em relação aos métodos de avaliação, análise dos desfechos e principais conclusões dos estudos selecionados estão dispostos na Tabela III.

 

Tabela III - Resultados obtidos em relação aos métodos de avaliação, análise dos desfechos, resultados e principais conclusões (ver PDF anexo)

 

Discussão

 

Os estudos selecionados para esta revisão demonstraram uma prevalência maior de DAP em mulheres praticantes de CrossFit®, em relação a mulheres que realizavam exercícios de baixo impacto como ginástica e exercício aeróbico. A maioria dos estudos utilizou questionários para identificar a prevalência de IU e apenas dois [20,21] utilizaram ferramentas de avaliação funcional do AP, como o perineômetro e o POP-Q. Dos estudos selecionados dois utilizaram apenas um grupo de estudo, os outros dividiram a amostra em grupos de atividades extenuantes e atividades não extenuantes, no entanto não houve comparação com um grupo controle de mulheres sedentárias.

Em termos metodológicos, de acordo com a escala Downs & Black, dos artigos avaliados, três apresentaram escores fracos [9,17,18], dois apresentaram escores moderados [16,21] e apenas um apresentou escore forte obtendo 80% da pontuação [20]. Dentre os indicadores de qualidade ausentes, destacam-se a ausência de grupos controles, a não representatividade da população de interesse e o método de avaliação não ser representativo. Estes fatores podem colocar em risco os achados de alguns estudos e, por isso, devem ser analisados com cuidado.        

Foram encontradas diferenças nos escores em relação a idade, menopausa, IMC, paridade, e estavam todos significativamente associados a maior pontuação na gravidade da IU. Fatores bem estabelecidos, como o aumento do peso corporal, número de partos, cirurgias pélvicas, tabagismo, Diabetes mellitus tipo 2 e o hipoestrogenismo podem aumentar ou provocar deficiência na função da MAP. Estudos apontam ainda que fatores que aumentam a pressão intra-abdominal, como tosse crônica, constipação intestinal com esforço crônico para defecar e a atividade física extenuante, também podem levar a condições como a IU [3,22,23,24]. Um estudo conduzido por Gepharte et al. [25] procurou determinar se a experiência de paridade, idade ou a prática do CrossFit afetam a PIA durante os exercícios, já que este aumento está entre os fatores de risco para as disfunções urinárias. Os participantes geraram PIA média >200 cmH2O e foi encontrada uma diferença significativa entre o pico médio da PIA das mulheres multigestas e as nulíparas (p = 0,009). A experiência com o CrossFit não afetou o pico médio da PIA alcançado com o exercício. Outros estudos apontam também que exercícios de alto rendimento com elevados níveis de estresse podem ocasionar a diminuição do estrogênio, assim como no período pós-menopausa, o que resulta no enfraquecimento da MAP e nos sintomas urinários associados [26,27].

Na presente revisão, os achados demonstram que mulheres praticantes de CrossFit® apresentaram uma prevalência significativamente maior de IU quando comparadas a praticantes de esportes de baixo rendimento. Em contrapartida, Middlekauffe et al. [20] avaliaram praticantes de CrossFit® e em um grupo de mulheres praticantes de atividades não extenuantes não foram encontradas diferenças entre a FM do AP no repouso e logo após a realização de um protocolo de exercícios. Ratificando estes resultados, o estudo conduzido por Machado [2] demonstra que mulheres ativas e sedentárias apresentaram resultados semelhantes na avaliação com palpação vaginal, com gradação ligeiramente maior no grupo controle. A autora descreve que isto pode ocorrer pelo fato de que o exercício físico não influencia no fortalecimento do AP, visto que nenhuma prática esportiva envolve contração voluntária desta musculatura. Pela repetição de situações de aumento na PIA causada pela prática de movimentos de alto impacto, muitas mulheres não demonstram uma contração simultânea efetiva ou pré-contração [3]. Desta forma, sugere-se que estas atividades levam a alterações biomecânicas do AP, como aumento na distensibilidade e atraso na contração, sendo o aumento da espessura uma forma de adaptação a estas mudanças [28,29].

DeLancey et al. [30] relatam que inervação dos músculos profundos e superficiais do assoalho pélvico são diferentes, e concluem que a contração de mulheres continentes e incontinentes são distintas. No caso das mulheres continentes a contração inicia-se com os músculos superficiais e em seguida os profundos e, as incontinentes, apresentam um mecanismo contrário a este. Andrade et al. [31] em um estudo realizado com 50 mulheres, com idade entre 25 e 50 anos, praticantes de pelo menos uma modalidade de atividade física em academia, demonstraram que cerca de 34% das mulheres analisadas apresentam sintomas de IUE, das quais 24% da amostra estudada realizava atividade física entre 5 e 10 anos. Este resultado demonstrou que a sobrecarga constante sobre a MAP, devido ao aumento da PIA por períodos prolongados, proporciona fraqueza do períneo e aumento da probabilidade de desenvolver IUE. Sendo assim, sustentam a importância da contração da MAP durante a prática de qualquer modalidade de exercícios físicos, com o intuito de prevenir as disfunções do assoalho pélvico [32].

Apesar da grande prevalência de incontinência urinária nas amostras descritas nos estudos, houve limitações em relação as avaliações realizadas. Cabe ressaltar que nos trabalhos em que a opção foi utilizar questionários online, poderia haver o não entendimento completo e gerar distorções dos resultados. Embora estudos que buscam entender a relação das DAP com o exercício físico, bem como o CrossFit®, venham sendo realizados, ainda há uma carência de ensaios clínicos para esta área específica. A fisioterapia tem um papel importante sobre as DAP, podendo atuar na prevenção, fortalecimento e principalmente na percepção do períneo, reforçando o mecanismo de continência e coordenação da MAP, especialmente durante o esforço [33].

     

Conclusão

 

Como principais achados deste estudo, observou-se uma prevalência significativa de incontinência urinária em praticantes de CrossFit® e essa disfunção parece estar relacionada a um atraso na ativação da musculatura pélvica quando exigida durante os exercícios. O CrossFit® é uma modalidade esportiva que vem crescendo notoriamente em número de adeptos e por ser considerado um exercício de alto impacto para o assoalho pélvico é importante que haja informação sobre prevenção e tratamento. No entanto, como limitação desta revisão, é importante ressaltar a baixa qualidade metodológica encontrada na maioria dos estudos incluídos.

Referências

     

  1. Almeida MBA, Barra AA, Figueiredo EM, Velloso FSB, Silva AL, Monteiro MVC, et al. Disfunções de assoalho pélvico em atletas. Femina [Internet]. 2011 [citado 2019 Jun 12];39(8):396-402. Disponível em: http://www.repositorio.ufop.br/handle/123456789/7236
  2. Machado LS. Avaliação funcional do assoalho pélvico em atletas e sua relação com a incontinência urinária [Dissertação]. Porto Alegre: UFCSPA; 2017. Available from: http://repositorio.ufcspa.edu.br/jspui/handle/123456789/572
  3. K. Urinary incontinence, pelvic floor dysfunction, exercise and sport. Sports Med 2004;34(7):451-64. doi: 10.2165/00007256-200434070-00004 [Crossref]
  4. Lichtenstein MB, Jensen TT. Exercise addiction in CrossFit: Prevalence and psychometric properties of the exercise addiction inventory. Addict Behav 2016;3:33-7. doi: 10.1016/j.abrep.2016.02.002 [Crossref]
  5. Carvalho MP, Andrade FP, Peres W, Martinelli T, Simch F, Orcy RB, et al. O impacto da incontinência urinária e seus fatores associados em idosas. Rev Bras Geriatr Gerontol 2014;17(4):721-30. doi: 10.1590/1809-9823.2014.13135 [Crossref]
  6. Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Incontinência Urinária Não Neurogênica [Internet]. 2019 [cited 2020 Nov20]. Available from: http://conitec.gov.br/
  7. K, Nygaard IE. Is physical activity good or bad for the female pelvic floor? A Narrative Review. Sports Med 2020;50(3):471-84. doi: 10.1007//s40279-019-01243-1 [Crossref]
  8. Casey EK, Temme K. Pelvic floor muscle function and urinary incontinence in the female athlete. Phys Sports Med 2017;45(4):399-407. doi: 10.1080/00913847.2017.1372677 [Crossref]
  9. Yang J, Cheng JW, Wagner H, Lohman E, Yang SH, Krishingner GA, et al. The effect of high impact crossfit exercises on stress urinary incontinence in physically active women. Neurourol Urodyn 2019;38(2):749-56. doi: 10.1002/nau.23912 [Crossref]
  10. Santos KM, Roza T, Mochizuki L, Arbieto ERM, Tonon SC. Assessment of abdominal and pelvic floor muscle function among continent and incontinent athletes. Int Urogynecol J 2019;30(5):693-9. doi: 10.1007/s00192-018-3701-8 [Crossref]
  11. Tibana RA, Almeida LM, Prestes J. Crossfit® riscos ou benefícios? O que sabemos até o momento? Rev Bras Ciênc Mov 2015;23(1):182-5. doi: 10.18511/rbcm.v23i1.5698 [Crossref]
  12. Lichtenstein MB, Jensen TT. Exercise addiction in CrossFit: Prevalence and psychometric properties of the Exercise Addiction Inventory. Addict Behav 2016;3:33-37. doi: 10.1016/j.abrep.2016.02.002 [Crossref]
  13. Araújo MP, Parmigiano TR, Negra LGD, Toreli L, Carvalho CG, Wo L, et al. Avaliação do piso pélvico de atletas: existe relação com incontinência urinária? Rev Bras Med Esporte 2015;21(6):442-46. doi: 10.1590/1517-869220152106140065 [Crossref]
  14. Hay-Smith EJC, Herderschee R, Dumoulin C, Herbison GP. Comparisons of approaches to pelvic floor muscle training for urinary incontinence in women. Cochrane Database of Systematic Reviews. Cochrane Database Syst Rev 2012;48(4):689-715. doi: 10.1002/14651858.CD009508 [Crossref]
  15. Downs SH, Black N. The feasibility of creating a checklist for the assessment of the methodological quality both of randomised and non-randomised studies of health care interventions. J Epidemiol Community Health 1998;52(6):377-84. doi: 10.1136/jech.52.6.377 [Crossref]
  16. Itens P, Revis R, Uma P. Principais itens para relatar Revisões sistemáticas e meta-análises: A recomendação PRISMA. Epidemiol Serv Saúde 2015;24(2):335-42. doi: 10.5123/S1679-49742015000200017 [Crossref]
  17. Araújo MP, Brito LGO, Rossi F, Garbiere ML, Vilela ME, Bittencourt VF. Prevalence of female urinary incontinence in crossfit practitioners and associated factors: an internet population-based survey. Female Pelvic Med Reconst Surg 2020;26(2):97-100. doi: 10.1097/SPV.0000000000000823 [Crossref]
  18. High R, Thai K, Virani H, Kuehl T, Danford J. Prevalence of pelvic floor disorders in female crossfit athletes. Female Pelvic Med Reconst Surg 2020;26(8):498-502. doi: 10.1097/spv.0000000000000776 [Crossref]
  19. Whitney E, Jaramillo-Huff A, Barnes KL, Petersen TR, Komesu YM. The Stress Urinary Incontinence in CrossFit (SUCCeSS) Study. Female Pelvic Med Reconst Surg 2020;26(2):101-6. doi: 10.1097/SPV.0000000000000815 [Crossref]
  20. Middlekauff ML, Egger MJ, Nygaard IE, Shaw JM. The impact of acute and chronic strenuous exercise on pelvic floor muscle strength and support in nulliparous healthy women. Am J Obstet Gynecol 2016;215(3):316-7. doi: 10.1016/j.ajog.2016.02.031 [Crossref]
  21. Pires T, Pires P, Moreira H, Gabriel R, Viana S, Viana R. Assessment of pelvic floor muscles in sportswomen: Quality of life and related factors. Phys Ther Sport 2020;43:151-6. doi: 10.1016/j.ptsp.2020.02.015 [Crossref]
  22. Marinho AR, Leal B, Flister J, Bernardes N, Rett M. Incontinência urinária feminina e fatores de risco. Fisioter Bras 2006;7:4. doi: 10.33233/fb.v7i4.1921 [Crossref]
  23. Barbosa AMP, Carvalho LR, Martins AMVC, Calderon IMP, Rudge MVC. Efeito da via de parto sobre a força muscular do assoalho pélvico. Rev Bras Ginecol Obstet 2005;27(11):677-82. doi: 10.1590/S0100-72032005001100008 [Crossref]
  24. Danforth KN, Townsend MK, Lifford K, Curhan GC, Resnick NM, Grodstein F. Risk factors for urinary incontinence among middle-aged women. Am J Obstet Gynecol 2006;194(2):339-45. doi: 10.1016/j.ajog.2005.07.051 [Crossref]
  25. Gephart LF, Doersch KM, Reyes M, Kuehl TJ, Danford JM. Intraabdominal pressure in women during CrossFit exercises and the effect of age and parity. Baylor University Medical Center Proceedings 2018;31(3):289-93. doi: 10.1080/08998280.2018.1446888 [Crossref]
  26. K, Borgen JS. Prevalence of stress and urge urinary incontinence in elite athletes and controls. Med Sci Sports Exerc 2001;33(11):1797-1802. doi: 10.1097/00005768-200111000-00001 [Crossref]
  27. Higa R, Lopes MHBM, Reis MJ. Fatores de risco para incontinência urinaria na mulher. Rev Esc Enferm USP 2008;42(1):187-92. doi: 10.1590/S0080-62342008000100025 [Crossref]
  28. Roza T, Brandão S, Oliveira D, Mascarenhas T, Parente M, Duarte JA, et al. Football practice and urinary incontinence: Relation between morphology, function and biomechanics. J Biomech 2015;48(9):1587-92. doi: 10.1016/j.jbiomech.2015.03.013 [Crossref]
  29.  Kruger JA, Dietz HP, Murphy BA. Pelvic floor function in elite nulliparous athletes. Ultrasound Obstet Gynecol 2007;30(1):81-5. doi: 10.1002/uog.4027 [Crossref]
  30. Lancey JO. Anterior pelvic floor anatomy in female. In: The pelvic floor: Its function and disorders, 2 ed. New York: Harcourt and Elsevier; 2002 p.13-28.
  31. Andrade NVS, Manso VMC, Antunes MB. Incontinência urinária de esforço em mulheres praticantes de atividades físicas. Ensaios e Ciência Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde [Internet] 2011;15(3):41-53. [citado 2020 Mar 12]. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=26021120005
  32. Barros JD, Lucena ACT, Anselmo CWSF. Incontinência urinária de esforço em atletas do sexo feminino: uma revisão da literatura. An Fac Med Univ Fed Pernamb [Internet] 2007;52(2):173-80. [citado 2020 Mar 10]. Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lil-495337?lang=fr
  33. Silva REG, Vivas GT, Silva SL. Cinesioterapia na prevenção da incontinência urinária de esforço em mulheres idosas e sua relação com a qualidade de vida. Revista de Ciências da Saúde na Amazônia [Internet]. 2015 [citado 2020 Mar 10];1(1). Disponível em: https://periodicos.ufac.br/revista/index.php/ahs/article/view/80/0