Fisioter Bras 2021;22(5):697-711
REVISÃO
Existe
relação entre etnia e a incidência de prolapsos genitais?
Is there a relationship between
ethnics and genital prolapse incidence?
Gabriela
Thaís dos Santos Alves*, Yasmin Podlasinski da
Silva**, Magda Patrícia Furlanetto***
*Graduanda
do Curso Fisioterapia, Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter, **Graduanda do Curso de Medicina, Universidade
Luterana do Brasil – ULBRA, ***Docente da Disciplina de Fisioterapia
Urogenital, Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter
Recebido
em 27 de novembro de 2020; aceito em 25 de setembro de 2021.
Correspondência: Yasmin Podlasinski
da Silva, Rua Fernandes Vieira, 437/4 Bom Fim 90035091 Porto Alegre RS
Gabriela Thaís dos Santos Alves: gabithays.sa@hotmail.com
Yasmin Podlasinski da Silva:
yasminpodlasinski97@gmail.com
Magda Patrícia Furlanetto:
magdafurlanetto@hotmail.com
Resumo
Introdução: Prolapso de órgão pélvico (POP)
consiste no deslizamento de órgãos pélvicos femininos através do introito
vaginal, por falhas no sistema de suporte. Acredita-se que a etnia esteja
diretamente associada ao aparecimento do POP. Objetivo: Revisar estudos
publicados nos últimos 5 anos para verificar a relação entre etnia e a
incidência de prolapso de órgãos pélvicos em mulheres de diversas raças. Métodos:
Revisão integrativa de literatura efetuada através de uma busca em artigos
científicos publicados em revistas impressas e eletrônicas no período
compreendido entre os anos de 2015 e março de 2020, nas bases PubMed, Bireme e PEDro. Resultados:
Foram incluídos 4 estudos segundo os critérios de elegibilidade. Foram
identificados estudos sobre diferenças étnicas em POP ou períneo descendente. A
população estudada foi de mulheres afrodescendentes, caucasianas e asiáticas.
Na avaliação metodológica, apenas um estudo foi considerado moderado, enquanto
os demais foram considerados fortes. Conclusão: A análise dos dados foi
capaz de demonstrar diferenças em sintomas, nos perfis genético, metabólico e
de composição das fibras musculares. Observou-se que mulheres afrodescendentes
apresentam maior índice de prolapsos de parede anterior, as caucasianas de
parede posterior e asiáticas apresentaram maior descida uterina e prolapsos de
cúpula vaginal.
Palavras-chave: prolapso de órgão pélvico; grupos
étnicos; diafragma da pelve.
Abstract
Introduction: Pelvic organ
prolapse (POP) is the falling of female pelvic organs through the vaginal
opening, due to the weakening of the pelvic support system. Ethnicity is
considered as directly associated with the occurence
of POP. Objective: Reviews published in the last 5 years to verify the
relationship between ethnicity and the incidence of pelvic organ prolapse in
women of different races. Methods: Integrative literature review carried
out through a search of scientific articles published in printed and electronic
journals in the period from 2015 to March 2020, in databases PubMed, Bireme and
PEDro. Results: Four studies were included
according to the eligibility criteria. Studies on ethnic and/or racial differences
in POP or descending perineum were identified. The population studied was
Afro-descendant, Caucasian, and Asian women. In the methodological evaluation,
only one study was considered moderate, while the other were considered strong.
Conclusion: After analyzing the studies, it was possible to observe some
ethnic/racial differences in the incidence of POP, such as symptoms, influence
of genetics and composition of muscle fibers. Afro-descendant women had a
higher rate of anterior prolapse, Caucasian women of posterior prolapse, and
Asian women had a greater uterine descent and vaginal vault prolapse.
Keywords: pelvic organ prolapse; ethnic
groups; pelvic floor.
Denomina-se Prolapso de Órgão Pélvico (POP), a descida de
vísceras pélvicas femininas, incluindo útero, bexiga, reto ou parte do
intestino delgado que, devido à perda do sistema de suporte subjacente, causam
uma herniação nas paredes vaginais, ou mesmo da
cúpula vaginal [1,2]. Dizer que POP é um distúrbio altamente prevalente no
mundo geralmente é aceito, visto a estimativa de aumento de até 46% na
incidência de POP até 2050, representando um total de até 4,9 milhões de
mulheres afetadas [1]. Ainda que o POP não seja um risco de vida para as
mulheres, os relatos mais comuns são a diminuição de funcionalidade nas
atividades de vida diária, incontinência ou retenção urinária, “vagina mais
baixa” ou “peso na vagina” [3].
O músculo elevador do ânus (EA) e a fáscia endopélvica são os principais suportes anatômicos para este
conjunto de vísceras. A presença de falhas, neste sistema de suporte, como
ruptura ligamentar ou fraqueza da musculatura do assoalho pélvico (MAP), pode
desencadear um prolapso. Entre os tipos de prolapsos temos: prolapsos de parede
anterior, relacionados ao deslizamento da bexiga; prolapsos de parede
posterior, relacionados ao deslizamento do reto; e prolapso apical, quando se
refere à descida do útero ou vagina através do introito vaginal. Neste último
caso, é frequente a associação com a enterocele, e, por fim, o prolapso total,
que se refere ao descenso completo de todos os compartimentos através da
abertura vaginal [4].
Os tratamentos para POP podem ser classificados em
cirúrgicos e conservadores, considerando principalmente o estágio de evolução
desta disfunção. A escala Pelvic Organ Prolapse Quantification (POP-Q) é considerada a mais completa e
atual para quantificar o prolapso, gerando melhores condições de opções entre
os tratamentos propostos [5]. Nos manejos conservadores, pode-se optar pela
reabilitação da MAP através do treinamento muscular, utilização de biofeedback, eletroestimulação e até mesmo mudanças no
estilo de vida. O treinamento muscular do assoalho pélvico (TMAP), além de
melhorar a força e resistência desta musculatura, e assim proporcionar maior
sustentação para os órgãos pélvicos, auxilia na melhora da capacidade de
recrutamento, levando a uma melhor coordenação reflexa durante o esforço, bem
como dos mecanismos de continência [5,6].
Ainda quando se trata de métodos não cirúrgicos, é possível
a utilização do pessário, um dispositivo mecânico
vaginal que realiza a função de “impedir” a queda dos órgãos pélvicos,
substituindo a ação que a MAP teria na sustentação deste complexo [7].
Normalmente indicado para mulheres que apresentam POP em estágios mais
avançados (III e IV) que optam por não realizar a cirurgia, por não apresentar
em condições clínicas, ou mesmo por estarem aguardando tratamento cirúrgico
[8,9].
Já quando o método cirúrgico é
necessário, os objetivos principais são a
restauração anatômica da região
pélvica, bem como a manutenção da
função
sexual, urinária, intestinal e prevenção da
recorrência do POP [10]. Entre os
tratamentos cirúrgicos atuais encontram-se a colpopexia sacral abdominal,
colpopexia sacroespinhal vaginal, colposacropexia
laparoscópica, uso de telas de polipropileno, malha transvaginal, histerectomia
vaginal e histeropexia [10,11,12,13]. Cada um desses métodos representa uma escolha
em relação ao tipo de POP que o paciente apresenta. Apenas após uma boa
avaliação e anamnese torna-se possível a opção pelo melhor procedimento.
Já estão bem documentadas as disparidades interétnicas da
anatomia óssea do Homo sapiens. Inicialmente apenas o crânio era utilizado para
a diferenciação da afinidade biológica, mas atualmente a pelve óssea é
igualmente utilizada para realizar esse reconhecimento [14]. Outra
característica em que é possível observar variações em função da origem racial
é a composição das fibras e perfil metabólico de células músculo esqueléticas
[15]. O corpo humano é composto principalmente por dois tipos de fibras
musculares, fibras vermelhas, também conhecidas como fibras do tipo I, e fibras
brancas, também chamadas de fibras do tipo II. As dimensões do tipo de miofibra diferem de acordo com o grupo racial, visto que
afrodescendentes possuem quantidades elevadas de fibras do tipo II, que estão
relacionadas a contrações rápidas, de força. Já caucasianos apresentam maior
percentual de fibras tipo I, relacionadas a contrações lentas, de resistência
[16].
Embora a etiologia do POP seja multifatorial, alguns
estudos trazem a etnia como um fator etiológico em potencial e sua prevalência
parece variar de acordo com o grupo étnico [17,18]. Desse modo, esta revisão
integrativa tem como finalidade verificar se existe algum tipo de relação entre
etnia e a incidência de prolapsos de órgãos pélvicos em mulheres de diversas
raças.
O presente estudo trata-se de uma revisão integrativa de
literatura realizada através de busca bibliográfica digital em artigos
científicos publicados em revistas impressas e eletrônicas no período
compreendido entre os anos de 2015 a março de 2020, nas bases de dados
eletrônicas PubMed, Bireme e PEDro.
Foram selecionados estudos com idioma de publicação em português e inglês em
diferentes estratégias para assegurar uma busca abrangente, conforme disposto
no Quadro 1. Também foram realizadas pesquisas manuais com base nas referências
dos estudos incluídos. A questão norteadora deste estudo foi verificar se
existe um perfil étnico em relação aos prolapsos genitais. Esta pergunta foi
capaz de gerar descritores referentes à população, análise de interesse e o
contexto (PICo).
Quadro
1 - Descritores e
operadores booleanos utilizados na busca em bases de dados
Dois avaliadores realizaram de forma independente as buscas
dos estudos, sendo eles selecionados a partir dos títulos e resumos de acordo
com a sua relevância para a pesquisa. Caso o estudo
não se enquadrasse nessa seleção, o texto completo era verificado. Sequencialmente,
os estudos completos eram avaliados pelos mesmos revisores, de forma
independente, aplicando os critérios de elegibilidade: alguma publicação que
tenha envolvido pesquisa sobre diferenças étnicas e/ou raciais nos prolapsos
genitais. Para os casos discordantes os revisores chegaram a um consenso. Em um
formulário padronizado com: autores, ano de publicação, participantes, tipo de
intervenção e resultados das variáveis de interesse foram obtidos de forma
independente pelos dois revisores. A análise dos resultados foi realizada de
forma descritiva, com a categorização dos dados extraídos em grupos temáticos a
partir das variáveis de interesse.
A
qualidade dos estudos foi avaliada pela escala Downs
& Black, escala desenvolvida como ferramenta de
avaliação de estudos que
não sejam ensaios clínicos randomizados. Os 5 subitens
dessa escala estão
relacionados com: 1) a forma de reportar os resultados (se a
informação
apresentada no estudo permite ao leitor interpretar os dados e
resultados sem
enviesamento); 2) a validade externa; 3) os vieses; 4) os fatores de
confusão;
e a 5) potência do estudo. Para corresponder a estes subitens
estão listados 27
critérios que, caso o avaliador os identifique, serão
pontuados com “um” valor.
Em caso de ausência de critério à
avaliação o valor é considerado
“zero”. Estão
inclusos nesses critérios situações como: se as
hipóteses e objetivos são
descritos, se as variáveis a serem medidas estão
descritas na secção de
introdução e métodos, se os indivíduos
perdidos em follow-up foram ou não
reportados, se está garantida a aleatoriedade da amostra, o
anonimato dos
sujeitos, se há referência aos procedimentos
estatísticos, entre outros.
A escala Downs & Black pode ser considerada
“metodologicamente forte”, além de permite avaliar de forma credível vários
tipos de estudo. Possui a vantagem de avaliar e destacar potenciais forças e
fraquezas dos estudos. Com isso, foram classificados como metodologicamente
fortes, trabalhos que apresentaram escore igual ou superior a 80% da pontuação
máxima, escores entre 60 e 80% como moderados e aqueles inferiores a 60% foram
considerados metodologicamente insatisfatórios (fracos). Os estudos podem obter
a pontuação máxima de 28 pontos, visto que a pergunta 5 permite pontuação de 0
a 2 [19]. Aos estudos sem metodologia de ensaios clínicos, as questões
específicas não foram realizadas, sendo considerados 19 itens da escala original,
fornecendo uma pontuação máxima de 20 pontos.
Na busca inicial, foram encontradas 128 referências no
total. Foram 62 artigos na base de dados Bireme, 66 na base PubMed
e no PEDro não foram encontrados artigos para incluir
no estudo. Um total de 4 referências foram extraídas. Foram excluídos 58
estudos duplicados e 50 estudos após leitura dos títulos e resumos. Sendo
assim, 20 artigos foram selecionados inicialmente, e após a leitura na íntegra,
16 foram excluídos. Por fim, 4 estudos foram selecionados após a leitura
analítica por apresentarem o objeto de análise e aspectos que respondiam à
questão norteadora. A figura 1 representa o fluxograma de pesquisa relatado e,
dentre os selecionados, tratava-se de 1 estudo de coorte retrospectivo [20], 1
estudo de coorte prospectivo [14], 2 estudos de caso-controle [17,21].
Prisma 2009 [22]
Figura
1 - Fluxograma de
seleção dos estudos
Características
dos estudos incluídos
Foram encontrados estudos sobre
diferenças étnicas e/ou raciais em prolapsos de órgãos pélvicos ou períneos
descendentes. A população estudada nas referências selecionadas encontra-se
descrita na Tabela I.
Tabela
I - Fontes
bibliográficas identificadas, tipo de estudo, características de amostra
(número amostral, etnia/raça e idade média)
AD = afrodescendentes; AS = asiáticas; CC = caucasianas
Avaliação
do risco de viés dos estudos
No que se refere às pontuações obtidas por meio da Escala
Metodológica Downs and Black, os estudos incluídos
obtiveram média de 16,3 ± 1,7 considerando a pontuação máxima de 20 pontos para
os delineamentos transversais, caso-controle e de coorte. Dentre os critérios
metodológicos que mais apresentaram falhas, alude-se o fato de que alguns
artigos não citaram os critérios de inclusão e/ou exclusão dos pacientes
analisados para sua amostra. Também foi observado que alguns estudos não
proporcionam a estimativa da variabilidade aleatória dos dados. Em alguns
artigos não houve representatividade da população estudada, o que gera a necessidade
de uma nova pesquisa com maior número da população de origem para ter uma maior
precisão dos resultados. Grande parte dos estudos analisados não foram
realizados em locais que representem os hospitais ou centros de tratamento onde
a maioria da população de origem teria condições de comparecer, tornando os
estudos aplicáveis apenas nos ambientes que foram observados. Nos aspectos
relacionados à validade externa e interna (viés) dos estudos, dos 4 trabalhos
analisados, 1 estudo obteve pontuação entre 60% e 80%, sendo considerado
moderado. Os demais artigos obtiveram escore acima de 80% sendo considerados
fortes, conforme demonstrado no Gráfico 1.
Gráfico
1 - Percentual
obtido por meio da escala Downs and Black para os
trabalhos selecionados
Análise
dos desfechos
Os resultados obtidos em relação aos métodos de avaliação,
análise dos desfechos e principais conclusões dos estudos selecionados estão
dispostos na Tabela II.
Tabela
II - Resultados
obtidos em relação aos métodos de avaliação, análise dos desfechos, resultados
e principais conclusões (ver PDF tabela)
Foram selecionados para esta revisão quatro artigos que
apresentam mulheres de diversas etnias com prolapso sintomático ou
assintomático, em estágios variados, e pós-cirurgia reconstrutiva pélvica
apical. Os estudos avaliaram diferenças étnicas em relação a prolapsos de
órgãos pélvicos e/ou períneos descendentes, força da MAP, dimensões hiatais e
avulsão do músculo EA. Dentre os métodos utilizados para realizar a avalição
foram descritos o POP-Q, US transperineal em repouso
e durante manobra máxima de Valsalva e qualidade de
contração da MAP.
Em relação à qualidade metodológica dos estudos selecionados,
conforme o Check list
Downs and Black, dos quatro artigos avaliados,
apenas um obteve escore moderado. Os demais obtiveram escore acima de 80%,
sendo assim, considerados metodologicamente fortes. No que se refere aos
indicadores de qualidade que não foram atendidos estão o fato de que alguns
artigos não citaram os critérios de inclusão/exclusão dos pacientes presentes
no estudo. Observou-se também que em alguns não proporcionaram a estimativa da
variabilidade aleatória dos dados. Em outros, não ocorreu representatividade da
população estudada, e o último critério ausente foi que os locais onde
aconteceram os estudos, na maior parte deles, eram de pouco acesso, onde a
maioria da população de origem não teria condições de comparecer. Unindo todos
estes fatores, coloca-se em risco os achados de alguns estudos, portanto, é
necessário serem analisados com cautela.
Dentre os estudos presentes nesta revisão, foi possível
observar que mulheres Afrodescendentes (AD) apresentaram maior paridade,
maiores dimensões do hiato e do corpo perineal, além de serem mais
distensíveis, tanto em repouso quanto em manobra de Valsalva.
De acordo com Shek et al. [17], mulheres AD
possuem descenso de órgãos pélvicos significativamente maiores, inclusive a
descida do colo da bexiga é maior, mesmo em repouso. Segundo Ford et al.
[20], essas diferenças etiológicas relacionadas a etnia, podem estar associadas
à desigualdade socioeconômica, determinantes genéticos do POP e morfologia dos
sistemas de suporte uretral. Quando se trata de lesões obstétricas, alguns
dados indicam que o fator racial está diretamente ligado à ocorrência destas
lesões [20]. Encontra-se também casos em que o POP surge por conta de fatores
hereditários para parentescos de primeiro grau, envolvendo genes pertencentes à
biossíntese de colágeno e elastina [23].
A avaliação a partir do POP-Q demonstrou que, em mulheres
AD, os pontos Ba e C eram de menor comprimento. As asiáticas, por sua vez,
demonstram menor paridade, ponto C mais baixo, maior descendência uterina,
descida significativa do útero durante a manobra de Valsalva,
e apresentam maior risco de POP uterino. Além disso, caucasianas (CC)
demonstraram ponto Bp mais baixo, medidas de hiato
genital, corpo perineal e comprimento vaginal maiores, descendência da ampola
retal durante a manobra de Valsalva, e a etnia CC
mostrou maior risco de POP de compartimento posterior e menor risco para
compartimento apical. Em contraponto, Abdool et
al. [14] verificaram que asiáticas (AS) apresentam maior mobilidade descendente
de órgãos pélvicos e que existe uma menor taxa de avulsão dos órgãos. Sabe-se
que a fraqueza da MAP é um fator determinante na queda dos órgãos pélvicos e,
de acordo com Ceaser e Hunter [16], indivíduos AD
apresentam uma capacidade aeróbica máxima mais baixa e fibras musculares
esqueléticas do tipo II em maior porcentual na sua composição. Contudo,
diferentes etnias podem apresentar diversos perfis de fibras musculares, o que
corrobora nossos achados.
A fibra muscular do tipo I ou lenta está diretamente
relacionada ao sistema aeróbico, sendo muito resistente à fadiga muscular,
grande vascularização, altos níveis de mioglobina e baixo percentual para
velocidade de contração e relaxamento e na capacidade de gerar força. Esse tipo
de fibra ainda possui contrações mais longas e resistentes, apresentado uma
prevalência de enzimas oxidativas. Já as fibras do tipo II ou rápidas
demonstram baixo tempo de contração, porém uma maior velocidade, diretamente
associadas à energia anaeróbica e a prevalência das enzimas glicolíticas. Essas
fibras destacam-se pela baixa resistência e quantidade de mioglobina, no
entanto apresentam alta capacidade de contração e relaxamento, alta velocidade
de condução do potencial de ação e grande capacidade de gerar força [24]. Neste
contexto, estudos sugerem que mulheres AD apontam menor perfil de fibras do
tipo I, que estão diretamente relacionadas à sustentação dos órgãos pélvicos,
levando, assim, a uma probabilidade maior para o surgimento do POP [17]. Por
outro lado, as CC apresentam mais sintomas urinários associados, que podem
estar envolvidos na fraqueza muscular, pois apresentam uma menor quantidade de
fibras do tipo II, envolvidas na habilidade dos músculos de responderem de
forma rápida ao aumento da pressão intra-abdominal, visto que, nesta revisão,
as mulheres CC apresentaram maiores escores totais de PFDI-20, escores mais
altos do UDI-6 e em geral sintomas de POP associados aos sintomas urinários
[20].
Ratificando os achados presentes nesta revisão, Abulaizi et al. [25] demonstraram que a patogênese
do POP está diretamente relacionado à hereditariedade. Alguns polimorfismos de
DNA associados ao POP foram avaliados, entre eles, receptores de estrogênio α
e b,
receptores de progesterona, colágeno tipo III α1, entre outros. Os autores
ainda observaram que os papéis fisiológicos de certas proteínas fornecem um
suporte para as estruturas da MAP. Além disso, o loco q21 do cromossomo 9 pode
influenciar diretamente, pois transporta o gene de maior suscetibilidade ao POP.
Estes genes estão localizados em uma região que codifica, em sua grande
maioria, proteínas musculares funcionais ou que são altamente expressas nos
músculos. Reforçando estes achados, Suminski et
al. [15] descrevem que as características genéticas variam em função da
origem racial, considerando que fatores hereditários contribuem com uma grande
fração para a indicação fenotípica da composição das fibras e do perfil
metabólico dos músculos esqueléticos.
Foi possível observar diversas diferenças étnicas/raciais
na incidência de POP. A análise dos dados referente as etnias/raças
afrodescendentes, asiáticas e caucasianas demonstrou diferenças em sintomas,
nos perfis genético, metabólico e de composição das fibras musculares. Além
disso e, apesar da necessidade de maiores pesquisas, a presente revisão pode
observar que mulheres afrodescendentes apresentam maior índice de prolapsos de
parede anterior, as caucasianas de parede posterior e asiáticas apresentaram
maior descida uterina e prolapsos de cúpula vaginal. Todavia, os resultados dos
artigos não foram considerados conclusivos, levando, assim, a uma necessidade
de ampliar as pesquisas e os níveis de evidência científica. Deve-se também
levar em consideração a escassez de estudos direcionados para o conhecimento
aprofundado da anatomia do assoalho pélvico em diversas etnias.