Fisioter Bras 2021;22(5):637-48
ARTIGO
ORIGINAL
Análise
dos marcos do desenvolvimento em prematuros utilizando a Escala Bayley
Analysis of developmental
milestones in preterm infants using the Bayley Scale
Ligiane
Souza dos Santos, M.Sc.*, Lilian Cristina Munhoz
Soria**, Janaina Senhorini dos Santos, M.Sc.*, Juliana Marinho Antoniucci,
M.Sc.***, Olga Maria Piazentin
Rolim Rodrigues, D.Sc.****
*Fisioterapeuta
da Sorri-Bauru, SP, **Especialista em Dermato-funcional
pela Universidade Metodista de Piracicaba /UNIMEP, Fisioterapeuta da
Sorri-Bauru, SP, *** Fisioterapeuta Supervisora da Sorri-Bauru, SP, ****Livre
Docente em Psicologia do Desenvolvimento pela UNESP, campus de Bauru, SP,
Docente do Programa de Pós-graduação em Psicologia do Desenvolvimento e
Aprendizagem da Faculdade de Ciência, UNESP, campus de Bauru, SP
Recebido
em 3 de março de 2021; aceito em 4 de outubro de 2021.
Correspondência: Olga Maria Piazentin
Rolim Rodrigues, Departamento de Psicologia, Avenida Edmundo C. Coube, 14-01,
17033-360 Bauru SP
Ligiane Souza dos Santos:
souzaligi@gmail.com
Lilian Cristina Munhoz Soria: limunhozfisio@yahoo.com.br
Janaina Senhorini dos Santos:
senhorinijanaina@yahoo.com.br
Juliana Marinho Antoniucci:
julianaantoniucci_fisio@yahoo.com.br
Olga Maria Piazentin Rolim
Rodrigues: olga.rolim@unesp.br
Resumo
Prematuros
apresentam risco aumentado para atrasos na aquisição de habilidades neuromotoras. Os marcos do desenvolvimento preconizam que
um bebê a termo de seis meses seja capaz de manter-se sentado com apoio, aos
nove meses se locomova utilizando o movimento de engatinhar e, aos 12 meses,
troque passos com apoio. Este estudo pretendeu analisar o desenvolvimento
motor grosseiro de bebês nascidos pré-termo quanto à aquisição das habilidades
do sentar, engatinhar e andar, utilizando os escores
da Escala Bayley-III, aplicada aos seis, nove e 12
meses em participantes de um programa de intervenção precoce, relacionando-as
ao sexo e idade gestacional. Observou-se que dos 129 participantes, 37,21% dos
bebês se sentaram com apoio por 30 segundos aos seis meses. Quanto à série
engatinhar, avaliada aos nove meses, 27,91% dos bebês apresentaram o movimento
nesta idade. Aos 12 meses, a maioria dos
participantes (82,17%) apresentou o andar com apoio, o esperado para
a idade. Considerando sexo e idade gestacional, observou-se que quanto menos
semanas gestacionais menos bebês alcançaram as metas para a idade/mês e essa
ocorrência é mais frequente em meninos.
Palavras-chave: desenvolvimento infantil;
recém-nascido prematuro; intervenção precoce.
Abstract
Premature infants are at increased risk for delayed
acquisition of neuromotor skills. The developmental milestones recommend that a
baby at term of six months be able to remain seated with support, at nine
months move around using the crawling movement and, at 12 months, walk with
support. This study aimed to analyze the gross motor development of babies born
preterm regarding the acquisition of the skills of sitting, crawling
and walking, using the scores of the Bayley-III Scale, applied at six, nine and
12 months in participants of an early intervention program, relating them to
sex and gestational age. We observed that of the 129 participants, 37.21% of
the babies sat with support for 30 seconds at six months. As for the crawling
series, assessed at nine months, 27.91% of babies showed movement at this age.
At 12 months, most participants (82.17%) presented the floor with support, as
expected for their age. Considering sex and gestational age, the fewer
gestational weeks the fewer babies reached the goals for age/month and this
occurrence is more frequent in boys.
Keywords: child development; infant,
premature; early intervention.
A prematuridade é um fator de risco para o desenvolvimento
infantil, pois interrompe os processos de maturação do cérebro, podendo levar a
incapacidades comportamentais, cognitivas e funcionais, reconhecidas como
atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor (ADNPM) [1]. A Organização Mundial
da Saúde (OMS) define prematuros como recém-nascidos com menos de 37 semanas de
gestação, independente do peso ao nascimento. Os bebês nascidos com peso
inferior a 2500 g são classificados como recém-nascidos de baixo peso, não
importando o tempo de gestação. Salienta-se que nem todo bebê com baixo
peso ao nascer é um bebê pré-termo e que nem todo bebê pré-termo
necessariamente apresenta baixo peso, sendo situações distintas e de risco para
o desenvolvimento do neonato [2].
A classificação de recém-nascidos pré-termo (RNPT), varia
de acordo com suas idades gestacionais em: Prematuridade Limítrofe, aqueles com
idade gestacional entre 37 e 38 semanas incompletas; Prematuridade Moderada,
aqueles com idade gestacional entre 31 e 36 semanas completas e Prematuridade
Extrema, aqueles com idade gestacional entre 24 e 30 semanas. Quanto à
classificação da variável de peso do recém-nascido a termo, adota-se a seguinte
definição: recém-nascido de muito baixo peso (< 1500 g), recém-nascido de
baixo peso (< 2500 g) e recém-nascido com peso superior a 2500 g [3].
A movimentação ativa observada em recém-nascidos prematuros
representa aquisições do período pré-natal. A partir da 28ª semana gestacional,
há um processo de mielinização das grandes vias subcorticais, levando a
capacidade de coordenar um número maior de músculos de um segmento ou de todo o
corpo para aquisição de um movimento espontâneo global [4]. Segundo o autor,
nas últimas semanas gestacionais, o feto se movimenta contra as paredes
elásticas do útero, encontrando nela certa resistência, o que contribui no
desenvolvimento de sua força muscular, principalmente de membros inferiores. Em
um ambiente extrauterino, o bebê experimenta a ação da gravidade limitando movimentos
livres que até então eram realizados [4].
No primeiro ano de vida é de extrema importância o
diagnóstico de problemas relacionados ao desenvolvimento motor, pois podem
levar a prejuízos a médio e longo prazo. Para que o diagnóstico precoce de atrasos
no desenvolvimento seja feito, é necessário ter conhecimento dos marcos do
desenvolvimento nos primeiros meses de vida do bebê [5].
No primeiro trimestre, o recém-nascido apresenta uma
postura fletida, atribuída ao ambiente intrauterino. O controle de cabeça e a
habilidade de levantá-la e girá-la contra a gravidade são destacadas nessa
fase. No segundo trimestre, observa-se que o bebê explora os pés com a boca,
apresenta o rolar e empurra-se com as extremidades para locomoção, senta-se com
apoio, inclinando o tronco para frente e apoiando-se nas mãos. Também consegue
segurar objetos, apoiando-se com o outro braço realizando, assim, a
transferência lateral de peso. No terceiro trimestre se senta sem apoio
utilizando as mãos para brincar e explorar objetos, adquire a posição de gatas,
conseguindo levantar-se com o apoio dos braços. Ao quarto trimestre o bebê
engatinha dissociando membros superiores e inferiores, aprende a sentar-se
agachando primeiro. Fica em pé segurando-se na mobília e utiliza base larga com
pernas abduzidas pela falta de equilíbrio [6].
No desenvolvimento motor típico, existem padrões de
movimentos entre tronco, membros superiores e inferiores para que sejam
adquiridas habilidades funcionais. O alinhamento biomecânico e a ativação
muscular do tronco nos primeiros meses de vida são essenciais para a aquisição
de posturas como o rolar, sentar-se, engatinhar e andar independente. A análise
de habilidade de sentar-se pode atuar como fator de prognóstico para o
desenvolver das demais habilidades motoras no primeiro ano de vida. Em bebês
nascidos prematuramente estes marcos no desenvolvimento podem apresentar
atraso, como, por exemplo, o sentar independente, em bebês nascidos a termo
ocorre entre o 6° e o 7° mês [5].
Por sua vez, o engatinhar e o andar também são importantes
etapas do desenvolvimento da criança, mostrando as primeiras expressões da
locomoção. Tais comportamentos refletem grandes mudanças na estrutura corporal,
no controle motor e na coordenação, e tudo isso se deve a maturação do sistema
nervoso central [7].
O engatinhar é um marco importante para que o bebê comece a
explorar melhor o ambiente, onde ocorre maior demanda dos membros superiores
fazendo com que tenha maior descarga de peso e alongamento de toda musculatura
envolvida, exigindo também equilíbrio e destreza corporal para aquisição desta
etapa [8]. O autor também relata que o engatinhar é essencial para a preparação
do desenvolvimento da marcha e desenvolvimento do senso de direção.
A aquisição da marcha tem sido considerada como
o principal desafio a ser superado pelo bebê durante seu desenvolvimento
motor. Por volta dos doze meses, bebês adotam a bipedestação
e são capazes de realizar os primeiros passos independentemente. O padrão do
andar nesta fase é influenciado pelas características do plano gravitacional,
pela carência de força muscular presente, dificuldades de equilíbrio e
controle do movimento [9].
Bebês prematuros apresentam maior risco de atraso no
desenvolvimento neuropsicomotor do que aqueles nascidos a termo [10]. Métodos
de identificação e de tratamento de recém-nascidos prematuros com déficits
motores têm enfatizado a avaliação e a intervenção precoce durante o primeiro
ano de vida. Segundo as “Diretrizes da Estimulação Precoce”, define-se
estimulação precoce (EP) como uma abordagem de caráter sistemático e
sequencial, que utiliza condutas, técnicas e recursos terapêuticos capazes de
estimular todas as áreas que interferem na maturação da criança, favorecendo o
desenvolvimento motor, cognitivo, sensorial, linguístico e social, amenizando
eventuais prejuízos [11].
A utilização de instrumentos de avaliação validados é de
grande importância e estabelece uma linguagem padronizada entre profissionais
de várias áreas, permitindo a conferência de técnicas e abordagens
terapêuticas, tendo bases científicas para a compreensão e estudo dos problemas
observados. Entre outros testes e avaliações, a Escala Bayley
é destacada como padrão ouro na avaliação do desenvolvimento infantil, sendo amplamente
utilizada mundialmente [12]. Ela oferece uma avaliação abrangente em cinco
domínios distintos, permitindo a comparação do desenvolvimento infantil entre
tais áreas avaliadas, sendo flexível e lúdica, com aplicação fácil e com níveis
excelentes de validade e confiabilidade. Tem se mostrado útil para
identificação precoce de risco de desenvolvimento infantil, além de
possibilitar o fornecimento de orientações e informações aos pais quanto à
evolução da criança em atendimentos clínicos ou em programas de intervenção
precoce [13].
A Sorri-Bauru tem, entre suas atividades, um Programa de
Intervenção Precoce, criado inicialmente para o atendimento de bebês com
deficiência ou que apresentam atrasos importantes no seu desenvolvimento.
Tradicionalmente oferece, gratuitamente, uma gama de serviços às pessoas com
deficiência por meio de convênios com SUS e Secretaria Municipal de Saúde.
Atualmente a Sorri-Bauru em parceria com o Departamento de Psicologia, da
UNESP, campus de Bauru, tem desenvolvido o projeto “Bebês prematuros: Programa
de estimulação ao desenvolvimento e apoio emocional às mães”, financiado pelo
PRONAS, do Ministério da Saúde. Este projeto tem como objetivo acompanhar o
desenvolvimento de bebês prematuros durante o primeiro ano de vida, oferecendo
atendimento por equipe transdisciplinar e centrado na família. Entre os
atendimentos está o de fisioterapia que desenvolve ações com o objetivo de
otimizar o desenvolvimento motor de bebês nascidos prematuros durante o seu
primeiro ano de vida.
O presente estudo pretendeu analisar o desenvolvimento
motor grosseiro de RNPTs quanto à aquisição das
habilidades do sentar-se aos seis meses, engatinhar aos nove meses e andar com
apoio aos 12 meses de bebês nascidos pré-termo, relacionando-as ao sexo e idade
gestacional.
O presente estudo é de delineamento longitudinal, avaliando
o impacto de uma intervenção sobre marcos do desenvolvimento motor de bebês
prematuros. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da UNESP (processo
nº 64920817.9.0000.5398). Foram cumpridas todas as normas éticas para a coleta
e análise dos dados.
Participaram 129 bebês nascidos com até 35 semanas de
gestação ou com baixo peso ao nascer, de ambos os sexos, sendo 66 meninos e 63
meninas, que foram atendidos no projeto Bebês prematuros: Programa de
estimulação ao desenvolvimento e apoio emocional às mães. Os critérios de
inclusão foram: prematuridade (idade gestacional < 35 semanas); Baixo peso
ao nascer (< 2500 g); de ambos os sexos e que, por ocasião da avaliação
tivessem 15 dias mais ou menos de seis, nove e 12 meses de idade.
Os dados foram coletados na SORRI-Bauru, em sala
especialmente reservada para esta finalidade, garantindo ausência de outros
estímulos e privacidade. A sala contém uma mesa alta, tipo maca, uma
escrivaninha e cadeiras.
Para avaliação do desenvolvimento motor foi utilizada a
Escala Bayley-III, prevista para crianças até 42
meses. É subdividida em áreas como: a motora grossa e fina; cognitiva e
linguagem expressiva e receptiva. A área motora grossa, com 72 itens,
compreende os movimentos do corpo do bebê em relação à gravidade, foi a
escolhida para este estudo.
Os bebês tiveram seu desenvolvimento motor grosso avaliado
aos seis, nove e doze meses. Após a avaliação os dados eram analisados e
definidas as estratégias para estimular os itens em defasagem. Para esse estudo
foram considerados os dados dos itens descritos no Quadro 1, referente a Bayley III [14].
Quadro
1 - Descrição dos
comportamentos utilizados para avaliação dos marcos de desenvolvimento motor
grosso
Com a finalidade de apresentarmos como se comportou o grupo
estudado sintetizamos na Tabela I, dados sobre sexo, classificação de
prematuridade e a habilidade motora ao sentar-se com apoio por 30 segundos aos
seis meses de idade cronológica, de acordo com a avaliação utilizando a Escala Bayley III. A amostra se dividiu de modo equivalente em
meninos e meninas. Para os dois sexos prevaleceu a prematuridade moderada.
Quanto à habilidade de sentar-se, 48 bebês (37,21 %) de
ambos os sexos alcançaram o sentar aos seis meses de idade cronológica.
Comparando o desempenho em relação ao sexo, mais meninas (39,68%) do que
meninos (34,85%) realizaram o comportamento. Quanto à idade gestacional, os
bebês tanto meninas (38,09%) como meninos (33,34%) classificados como moderada
ou limítrofe realizaram o comportamento de sentar-se por pelo menos 30”. Dos 14
bebês com prematuridade extrema, apenas um menino realizou o comportamento na
série proposta.
Tabela
I – Caracterização
da amostra e frequência absoluta e relativa do comportamento de sentar-se com
apoio aos seis meses de idade
No que se refere ao movimento de engatinhar, observamos os
seguintes resultados apresentados na Tabela II. Da amostra toda, 27,91%
realizaram o comportamento aos nove meses. Deles, mais meninas (31,74%) do que
meninos (22,73%) o fizeram. Nos dois grupos prevaleceu os bebês de
prematuridade moderada.
Tabela
II – Frequência
absoluta e relativa do comportamento de engatinhar aos nove meses de idade
Aos 12 meses, foram analisados os resultados referentes ao
comportamento de andar com apoio, conforme mostra a Tabela III.
Tabela
III – Frequência
absoluta e relativa do comportamento de andar com apoio aos 12 meses de idade
Com base na Tabela III, nota-se que, quanto à série andar
com apoio, 82,17% da amostra total o fizeram. As meninas apresentaram
resultados mais satisfatórios, já que 84,12% delas foram observadas realizando
a marcha com apoio, enquanto 80,30% dos meninos a realizaram. Quanto à
prematuridade, também prevaleceu em ambos os sexos o melhor comportamento de
andar com apoio para os bebês com prematuridade moderada. Dos prematuros
extremos, tanto entre os meninos como entre as meninas, metade deles realizaram
o comportamento esperado aos 12 meses.
Este estudo analisou a aquisição das habilidades de sentar-se,
engatinhar e andar com apoio aos seis, nove e 12 meses de bebês prematuros,
considerando o sexo e o nível de prematuridade. A amostra era composta por
meninos e meninas em quantidades equivalentes. Quanto à prematuridade,
prevaleceu a moderada para os dois sexos.
Observou-se na amostra, a dificuldade em adquirir o
comportamento de sentar-se aos seis meses, pois a maioria dos bebês não
realizou a demanda. A habilidade de sentar é um marco no desenvolvimento motor
grosso e permite que nesta postura o bebê possa aprimorar outras atividades,
como explorar com as mãos brinquedos além de realizar alcances de objetos.
Influencia positivamente em futuras aquisições, nas etapas a serem atingidas,
preparando-os para a primeira locomoção com o engatinhar e na evolução em
si das habilidades motoras como um todo. Do ponto de vista fisiológico, o
sentar proporciona ganhos nos processos de fortalecimento muscular, favorece
equilíbrio e autonomia das musculaturas envolvidas, já que os bebês necessitam
ativar músculos extensores para realizar o controle postural da cabeça e do
tronco superior. Autores pontuam que prematuros demonstram um desequilíbrio
entre os grupos musculares extensores e flexores, o que pode justificar o
atraso na habilidade de se sentar, já que a postura depende do controle de
cabeça, tronco e equilíbrio para ser mantida [5].
Nas avaliações realizadas, muitos bebês não realizaram
posturas e movimentos típicos do desenvolvimento global nas fases propostas. O
engatinhar foi o que menos apareceu em relação a todas as séries estudadas,
esperado para ocorrer aos nove meses. Tal postura locomotora exige movimentos
dissociados em membros superiores e inferiores, estabilidade de tronco,
incluindo a sinergia entre músculos abdominais e paravertebrais,
talvez isso justifique que essa tenha sido a série que apresentou os menores
índices de êxito. Outra hipótese seria o fato de que uma considerável parte dos
prematuros apresentaram atrasos em marcos do desenvolvimento avaliados
anteriormente, como o sentar com apoio, impactando no retardo do aparecimento
do engatinhar. Zanini et al. [4] reforçam que estas alterações no
desenvolvimento comprovam a necessidade do acompanhamento destes bebês, para
que sejam encaminhados para serviços específicos precocemente, evitando com que
haja uma maior dificuldade em desenvolver algumas posturas tais como o
engatinhar.
O fato do engatinhar ocorrer antes da aquisição da marcha,
para a maioria das crianças, sugere alguma relação entre ambos os
comportamentos motores. Do ponto de vista sensório motor, esta relação parece
ter sido aceita, em especial quando considerada a teoria de integração sensorial
de Ayres, na qual afirma que importantes aferências táteis, proprioceptivas e
cinestésicas são geradas no ato de engatinhar. Com isto, a criança poderia
adquirir uma boa percepção espacial, o que facilitaria o desenvolvimento de
outras atividades motoras de maior complexidade [15].
Quanto à série avaliada andar com apoio, prematuros
obtiveram melhor desempenho quando comparado aos outros marcos, quando a
maioria apresentou a aquisição do comportamento aos 12 meses. Todos os bebês
participavam do programa de Intervenção precoce e, provavelmente, o resultado
positivo, aos 12 meses, se deve ao trabalho realizado, mostrando a importância
do mesmo para a aquisição de habilidades que possibilitam a aprendizagem de
outros comportamentos importantes para o desenvolvimento dos bebês.
Considerando o sexo dos bebês, as meninas apresentaram
desempenho melhor nos três comportamentos avaliados do que os meninos. Esses
resultados corroboram os encontrados por Zanini et al. [4], os quais
relatam que meninos tiveram resultados inferiores quando comparados às meninas.
A prematuridade extrema, ainda que pouco frequente na
amostra, apontou para desempenho inferior dos bebês quando comparados aos de
outras classificações (moderado e limítrofes) de prematuridade. Esse dado
corrobora a literatura da área mostrando a necessidade desta população de risco
passar por avaliações específicas para que seja feita uma intervenção precoce
[4].
Quando analisados os dados da avaliação realizada aos 12
meses, em especial quanto à série andar com apoio, marco esperado para que
ocorra nesta fase no desenvolvimento típico, constata-se que grande parte dos RNPTs apresentaram a marcha com suporte. Do total da
amostra, meninos eram maioria e apresentaram desempenho pouco inferior (80,30%)
quando comparado com o grupo feminino (84,12%). A avaliação demonstra que 100%
dos bebês prematuros limítrofes, que na sua totalidade eram meninas,
apresentaram a marcha com apoio. Quando comparados ambos os sexos e
classificações de prematuridade, bebês moderados foram os que obtiveram os
melhores índices nesta atividade avaliada. RNPTs
extremos, concentraram o mesmo percentual, em ambos os sexos, 50% desta amostra
apresentaram o marco.
Formiga et al. [5] ressalta que cada bebê tem seu
ritmo e o padrão de aquisição das habilidades pode ser ligeiramente diferente,
vindo a desenvolvê-las antes ou depois do previsto. Os profissionais voltados
para a área da intervenção precoce são guiados por escalas e métodos de
avaliação consistentes e padronizados cujos marcos do desenvolvimento têm
momentos para acontecerem, delimitando se aquele bebê possui avanço ou atraso
em seu desenvolvimento. Sendo assim, não se trata apenas de maturação neurológica,
mas também de um sistema auto-organizado que envolve a tarefa, o ambiente e o
indivíduo.
O instrumento de avaliação utilizado, Escala Bayley III, tem como objetivo avaliar o desempenho das
crianças nas áreas do desenvolvimento e, desta forma, facilitar as vertentes de
uma intervenção direcionada e adequada às demandas apresentadas por cada
indivíduo. Todavia, foram encontrados poucos estudos brasileiros que avaliam a
aquisição de marcos de desenvolvimento de bebês prematuros e o efeito de programas
de intervenção precoce sobre eles.
A intervenção precoce mostra-se favorável para que esses
bebês pré-termo atinjam essa e outras etapas do desenvolvimento motor,
cognitivo e de linguagem. Tem sido recorrente na literatura a afirmação de que
a prematuridade é considerada um fator de risco para a ocorrência de atrasos
globais no desenvolvimento, inclusive na área motora. Em um estudo de Chiquetti et al. [16], 70% dos prematuros avaliados
exibiram atraso no desenvolvimento motor. Outro estudo indicou atraso no
desenvolvimento quando analisada a influência da prematuridade e do baixo peso
ao nascimento no desenvolvimento motor de crianças na faixa etária de três anos
de idade, relacionando a idade cronológica com a idade motora geral
justificando, assim, a necessidade do acompanhamento dessa população para
detecção e intervenção precoce [17].
Os resultados do presente estudo apontam para a importância
da intervenção precoce para a aquisição dos marcos de desenvolvimento motor em
bebês prematuros. O acompanhamento precoce desses marcos apontou para a
aquisição pobre do sentar-se e do engatinhar, o que nos referidos programas
sugeriram a necessidade da implementação de estratégias focalizando as
defasagens observadas. Como resultado, aos 12 meses a maioria dos bebês
alcançaram o marco previsto que era andar com apoio, mesmo alguns com
prematuridade extrema. Uma limitação observada no estudo foi um número pequeno
de bebês com prematuridade limítrofe e extrema o que impediu análises mais
refinadas do impacto de diferentes níveis de prematuridade. Estudos futuros com
amostras maiores podem incluir esse tipo de análise. Todavia, um dado
importante deste estudo foi o acompanhamento do desenvolvimento dos bebês ao
longo do primeiro ano de vida que possibilitou que defasagens fossem observadas
e planejamentos específicos fossem implementados, o que pode ter garantido o
sucesso do desenvolvimento motor aos 12 meses para cerca de 80% dos bebês
participantes. Entretanto, os dados também mostraram que acompanhar o
desenvolvimento de bebês prematuros até os 12 meses é insuficiente para
garantir a aquisição de um repertório extenso compatível com a idade
cronológica. Prematuros necessitam de acompanhamento do seu desenvolvimento
até, pelo menos a idade escolar, para garantir um desenvolvimento de sucesso em
fases posteriores da sua vida.