ARTIGO ORIGINAL

Características antropométricas de mulheres praticantes do método Pilates em duas cidades gaúchas

Anthropometric profile of women practicing the Pilates method in two cities of Rio Grande do Sul

 

Aline Nogueira Haas, D.Sc.*, Orlando Bulso Júnior*, Débora Bittencourt*

 

Universidade Federal do Rio Grande do Sul/RS

 

Recebido 13 de outubro de 2016; aceito 15 de maio de 2018.

Endereço para correspondência: Profª Drª Aline Nogueira Haas, Rua Felizardo, 750 Bairro Jardim Botânico 90690-200 PortoAlegre RS, E-mail: alinehaas02@hotmail.com; Orlando Bulso Júnior: bulsojr@hotmail.com; Débora Bittencourt: dedhybitencourt@hotmail.com

 

Resumo

Introdução: Ainda que o Método Pilates (MP) tenha se desenvolvido muito nos últimos dez anos, publicações e evidências científicas sobre os seus efeitos na composição corporal, IMC e perfil antropométrico são escassos. Objetivo: Avaliar e comparar as medidas antropométricas, IMC e composição corporal de mulheres praticantes do MP. Métodos: Foram avaliadas 50 mulheres, das cidades gaúchas de Osório e Canoas, praticantes do MP há pelo menos seis meses, idade entre 20 e 55 anos. Os dados foram coletados de maio a julho de 2015, em três estúdios de Pilates. Foram mensuradas 48 medidas corporais e realizada comparação entre os dois grupos. Os participantes desse estudo praticam o MP contemporâneo, duas vezes por semana, uma hora em média, em aparelhos e solo. Resultados: Quando avaliadas as medidas de dobras cutâneas, perímetros, circunferências, diâmetros, comprimentos e IMC, não houve diferenças significativas entre os dois grupos estudados. Contudo, a média do IMC mostrou-se bastante próxima à faixa do sobrepeso. Quanto à quantificação dentro dos índices de referência para a gordura corporal em indivíduos do sexo feminino, 56% da amostra estava acima da média. Conclusão: As características antropométricas, IMC e composição corporal das participantes são muito semelhantes. Ainda que, a prática do MP seja regular, a média do IMC próxima a faixa de sobrepeso é preocupante.

Palavras-chave: antropometria, composição corporal, índice de massa corporal, exercício.

 

Abstract

Introduction: Although the use of the Pilates Method (PM) increased a lot over the last ten years, publications and scientific evidence on its effects in body composition, BMI and anthropometric profile are scarce. Objective: To evaluate and compare the anthropometric measurements, BMI and body composition of female PM practitioners. Methods: We evaluated 50 women, in two cities of south Brazil (Osório and Canoas). They were PM practitioners for at least six months, aged 20 to 50 years, and agreed to participate in the study. Data were collected from May to July 2015 in three Pilates studios, two in Canoas/RS and one in Osório/RS. Forty-eight body parameters were measured and compared between the two groups. The sample performed contemporary PM, twice a week, one hour on average, in apparatus (Cadillac, Reformer, Barrels, Chairs) and Mat. Results: When evaluated measurements of skinfolds, perimeters, circumferences, diameters, lengths and BMI, we did not observe significant differences between the two groups. However, BMI average is very close to the overweight range. As for the quantification within the reference indices for body fat in female individuals, 56% of the sample was above the average. Conclusion: Anthropometric characteristics, BMI and body composition of the participants are very similar. Although the practice of PM is regular, it is worrying that the BMI average of the two groups is next to the overweight range.

Key-words: anthropometry, body composition, body mass index, exercise.

 

Introdução

 

A avaliação da composição corporal é um componente de grande importância na área de saúde, sendo definida como a quantificação dos componentes estruturais, forma e proporção do ser humano [1]. Através da avaliação da composição corporal pode-se, além de determinar os componentes do corpo humano de forma quantitativa, utilizar os dados desta análise para detectar o grau de desenvolvimento e crescimento de diferentes populações [2]. Para realizar o cálculo fracionado da composição corporal é usada uma combinação distinta de medidas, obtidas de maneira simples e prática de diferentes tecidos corpóreos, entre estes, perímetros, longitude segmentar óssea, diâmetros, alturas e peso [3].

Já a prática de atividade desportiva regular tem capacidade de modificar a estrutura da massa muscular e da massa gorda [4], atualmente, encontram-se alguns estudos que buscam identificar o perfil antropométrico de populações que praticam o Método Pilates [5-7]. Dessa forma, esse estudo tem como objetivo avaliar e comparar as medidas antropométricas, Índice de Massa Corporal (IMC) e composição corporal de mulheres praticantes do Método Pilates das cidades de Osório e Canoas, no Estado do Rio Grande do Sul.

 

Material e métodos

 

A amostra foi composta por 50 mulheres, sendo 25 na cidade de Canoas (GPC) e 25 na cidade de Osório (GPO). Os critérios de inclusão adotados foram: ter idade entre 20 e 55 anos e praticar o MP contemporâneo há pelo menos seis meses. Os critérios de exclusão foram: gravidez; obesidade a partir do grau II conforme classificação da Organização Mundial da Saúde (IMC > 35 kg/m²), o que impossibilita a mensuração das dobras cutâneas; lesão, deformidade ou amputações que inviabilizem qualquer um dos testes que foram aplicados. Os participantes desse estudo praticavam o MP contemporâneo, duas vezes por semana, uma hora em média por aula, em aparelhos (Cadilac, Reformer, Barrels, Chairs) e solo (Mat).

Foram medidas 48 variáveis antropométricas, realizadas por um antropometrista nível II acreditado pela International Society for the Advancement of Kinanthopometry (ISAK), utilizando os procedimentos previstos por essa organização [8]. Sendo eles: quatro medidas básicas (massa corporal, altura, altura sentado e envergadura), nove dobras cutâneas, dezessete perímetros, nove diâmetros e nove comprimentos.

Para determinar a composição corporal utilizou-se a equação de cinco componentes (peso de pele, peso de ossos, massa magra, massa gorda e massa residual) de Ross & Kerr [9].

Calculou-se o IMC que é utilizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para classificação do estado nutricional de adultos e idosos [10]. De acordo com a OMS, a seguinte classificação foi adotada (Tabela I).

 

Tabela I - Tabela de classificação do IMC conforme a OMS.

 

Fonte: adaptada da WHO [11,12]

 

A fim de classificar a massa corpórea das participantes (massa magra, massa gorda, massa óssea, massa residual e pele), e quantificar dentro dos índices: excelente, bom, aceitável, acima da média e risco relacionado à obesidade, foram utilizados os valores de referência para a gordura corporal em indivíduos do sexo feminino, proposto por Golding, Myers & Sinning [13], conforme mostrado na tabela II.

 

Tabela II - Valores de referência para a gordura corporal em relação a idade em indivíduos do sexo feminino.

 

 Fonte: adaptado de Golding, Myers & Sinning [13].

 

Foi realizada a estatística descritiva (média, mediana e desvio padrão) e a normalidade dos dados foi verificada através do Teste Shapiro-Wilk. Para as variáveis que rejeitaram a hipótese de normalidade da distribuição de diferenças foi utilizado o Teste U de Mann-Whitney para dados não paramétricos, com o intuito de comparar os dois grupos. Já para as variáveis que não rejeitaram a hipótese de normalidade, foi utilizado o Teste t para amostras independentes. Para testar a equivalência das variâncias, utilizou-se o teste de Levene. O nível de significância adotado para ambos os testes foi de p < 0,05. Para a análise dos dados foi utilizado o software SPSS versão 20.0.

 

Resultados

 

A tabela III apresenta os resultados de média, mediana, desvio padrão e valor de p do IMC e dos cinco componentes corporais (massa magra, massa gorda, massa residual, peso ósseo e peso de pele) nos dois grupos estudados (GPO e GPC). Observa-se na mesma que não ocorreu diferença estatística significativa entres estas variáveis.

Em relação ao IMC, verificamos que ambos os grupos (GPO e GPC) estão no limite da classificação adequado (24,90 kg/m²), conforme a OMS.

 

Tabela III - Valor de média, mediana, desvio padrão e valor de “p” do IMC e dos cinco componentes corporais.

 

S = média; DP = desvio padrão; SW = teste de Shapiro-Wilk.

 

A tabela IV apresenta a quantificação dentro dos índices de referência para a gordura corporal em indivíduos do sexo feminino. A mesma demonstrou que 52% do GPC e 60% do GPO estão acima da média, conforme a classificação proposta na tabela II.

 

Tabela IV - Classificação quanto à quantificação dos índices de referência para a gordura corporal conforme Golding, Myers & Sinning [13].

 

Discussão

 

Ao comparar o GPO e GPC não foram encontradas diferenças estatísticas nas 48 variáveis antropométricas, no IMC e na composição corporal. Contudo, quando analisadas as DC isoladamente, o GPO apresentou medidas superiores ao GPC em quase a totalidade dos pontos de referência utilizados. Mesmo que essa diferença não tenha sido significativa, na prática, demonstra uma tendência a maiores níveis de gordura corporal no GPO.

Ao avaliarmos o IMC, a média dos grupos foi muito próxima ao sobrepeso (GPC 24,36 kg/m² e GPO 24,90 kg/m²), considerando a classificação da OMS [11,12]. Em pesquisa sobre antropometria e estado nutricional de crianças, adolescentes e adultos [14] os dados mostram que no Estado do Rio Grande do Sul a média do IMC para mulheres da mesma faixa etária estudada é muito semelhante aos nossos achados (24,92 kg/m²). Porém, quando estratificados por idade, 71% das mulheres gaúchas entre 20 e 54 anos estão na faixa do sobrepeso, enquanto nosso estudo demonstrou um percentual inferior (42%). Embora a pesquisa referente às mulheres gaúchas [14] não tenha isolado fatores como a prática de atividade física ou mesmo hábitos alimentares, destaca-se que, em nosso estudo, o percentual da amostra na faixa de sobrepeso foi abaixo dos 71% encontrados nas mulheres gaúchas. Isso poderia ser explicado pela prática do MP, embora exista carência de estudos capazes de gerar evidências suficientes sobre o tema.

Nesse sentido, Sekendiz et al. [15] verificaram que, após cinco semanas de intervenção do MP, duas vezes por semana, em mulheres de 26 a 47 anos, os dados comparativos do pré e pós protocolo de treinamento não apresentaram mudança significativa no IMC das participantes. O que corrobora com a necessidade de estudos com maior número de participantes e controle de variáveis (dieta, atividade de vida diária e atividade física paralela ao MP) que influenciam no IMC e na composição corporal.

Outro fator importante relacionado ao IMC foi discutido em estudo epidemiológico realizado na região semiárida do Brasil [16]. Das 6.845 mulheres, entre 20 a 49 anos, 48,7% estavam nas faixas de obesidade e sobrepeso. Esta prevalência praticamente dobrou da faixa etária dos 20 para os 30 anos, passando de 11% para cerca de 20%. Esses dados vêm ao encontro de nossa pesquisa, onde as praticantes do MP mais jovens apresentaram menor IMC em relação às mais velhas.

Ressalta-se ainda que 56% da amostra estavam acima da média aceitável para o índice de referência de gordura corporal [13]. Porém, estes valores usados como referência podem estar subestimando a transição epidemiológica relacionada à obesidade, na qual o Brasil encontra-se nas últimas décadas [16]. Igualmente escalas de avaliação específicas para população brasileira, considerando a miscigenação étnica, não foram encontradas na literatura [17].

Acredita-se que nossos achados, principalmente em relação ao IMC e à composição corporal, não possam ser explicados apenas pelo tempo dispendido na prática semanal do método, já que as avaliadas de GPO (23 praticantes, duas vezes na semana; e dois praticantes, uma vez na semana) e GPC (22 praticantes, duas vezes na semana; e três praticantes, uma vez na semana) apresentam periodicidade semelhante e praticam o MP há mais de seis meses. Embora outros estudos [18,19] tenham encontrado redução no percentual de gordura, com protocolo de treinamento semelhante a periodicidade das praticantes incluídas no nosso estudo, outros fatores como a dieta e os hábitos de vida diária podem influenciar diretamente na composição corporal.

Em estudo randomizado realizado por Vaquero-Cristóbal et al. [7], após 12 semanas de intervenção do MP, duas vezes por semana, foi detectado que não houve mudança significativa no percentual de gordura entre o grupo experimental e o grupo controle. Indicando que 24 sessões do MP podem não causar efeito nessas variáveis. Da mesma forma, em revisão sistemática desenvolvida por Aladro-Gonzalvo et al. [20], que buscou avaliar os impactos do MP na composição corporal, os autores destacaram a impossibilidade de afirmar que o método, isoladamente, seja capaz de alterar parâmetros como IMC, massa gorda e magra, medidas de DC e circunferências. Ainda, destacam a necessidade de estudos mais robustos, com protocolo de treinamento padronizado e controle dietético, dados que também não foram isolados em nosso estudo.

Assim, considerando a carência de estudos brasileiros, capazes de avaliar o efeito do MP na composição corporal e no IMC, nosso estudo traça um primeiro panorama sobre o tema. Acredita-se assim que estudos randomizados, com intervenção nutricional, protocolo de Pilates padronizado, questionário padronizado de estilo de vida e atividades de vida diária, com número expressivo de participantes, possam ser capaz de verificar o efeito do MP na composição corporal.

 

Conclusão

 

Ao comparar os dados antropométricos do GPO e o GPC não foram encontradas diferenças estatísticas. Porém, o IMC de ambos os grupos encontra-se próximo ao sobrepeso e o índice de massa gorda de mais da metade da amostra está acima da média, conforme a classificação utilizada. Destaca-se que estes dados são preocupantes, contudo variáveis como alimentação e estilo de vida, podem influenciar nestes resultados.

Embora existam alguns estudos sobre os efeitos do MP na composição corporal e que apresentem o comportamento das variáveis antropométricas no sexo feminino, ainda não há evidências científicas de que o mesmo possa influenciar nessas variáveis. Dessa forma, indica-se a necessidade de mais estudos na área, principalmente em populações brasileiras.

 

Referências

 

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