Fisioter Bras 2022;2395):735-47
REVISÃO
Síndrome de burnout nos
profissionais de saúde do âmbito hospitalar: uma revisão integrativa
Burnout syndrome in hospital health professionals: an integrative review
Ana Beatriz Moreira Santos*,
Cláucio Neves de Azevedo*, Maria Laura Rodrigues
Gomes*, Simone Monte Bandeira de Mello, M.Sc.**,
Belisa Duarte Ribeiro de Oliveira, D.Sc.**
*Fisioterapeuta, egresso
do Centro Universitário Tabosa de Almeida (ASCES-UNITA), **Docente do curso de
Fisioterapia, Centro Universitário Tabosa de Almeida (ASCES-UNITA), Caruaru, PE
Correspondência: Ana Beatriz Moreira Santos, Rua
Professora Cacilda Breckenfeld, 175 Jardim São Paulo 50910-410
Recife, PE
Ana
Beatriz Moreira Santos: anabmoreiras@gmail.com
Cláucio Neves de Azevedo:
claucioazevedo@gmail.com
Maria
Laura Rodrigues Gomes: laurarodriguesgomes16@gmail.com
Simone
Monte Bandeira de Mello: simonte.monte@asces.edu.br
Belisa
Duarte Ribeiro de Oliveira: belisaduarte@asces.edu.br
Resumo
Introdução: Atualmente o ambiente de trabalho vem
sendo intensificado e sofrendo pressão constante, com isso a classe dos
profissionais de saúde se torna um grupo vulnerável ao desencadeamento de
doenças ocupacionais, como a Síndrome de Burnout (SB), caracterizada por
etiologia multidimensional: a exaustão emocional, a despersonalização e baixa
realização nas atividades. Objetivo: Através das pesquisas à literatura,
identificar a frequência da SB nos profissionais de saúde. Metodologia:
Trata-se de uma revisão integrativa, segundo os preceitos de estudos
exploratórios. Para coleta das fontes de informação foram utilizadas as bases
de dados: PubMed, SciELO, Biblioteca Virtual em Saúde
(BVS), e Medline, nos idiomas inglês, português e espanhol, dentro do intervalo
de 2010 a 2020 e utilizando os seguintes Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): Burnout, DORT, saúde do trabalhador. Resultados:
Dentre os profissionais de saúde do setor de emergência, relacionados à SB, os
médicos se destacaram evidenciando 6 especialidades: anestesiologistas,
cardiologistas, intensivistas, neurologistas, pediatras e residentes em
cirurgia geral. Conclusão: A partir dos resultados, se faz necessário o
desenvolvimento de estudos e pesquisas científicas que investiguem os fatores associados
negativamente à síndrome de burnout, com o objetivo de preveni-la e
proporcionar melhor qualidade de vida a esta população.
Palavras-chave: burnout; profissionais de saúde;
esgotamento profissional.
Abstract
Introduction: Currently the work environment has been intensified
and under constant pressure, with this the class of health professionals
becomes a vulnerable group to the triggering of occupational diseases, such as
Burnout Syndrome (BS), characterized by multidimensional etiology: emotional
exhaustion, depersonalization and low performance in activities. Objective:
Through literature research, to identify the frequency of BS in health
professionals. Methodology: This is an integrative review, according to
the precepts of exploratory study. The following databases were used to collect
the information sources: PubMed, SciELO, Virtual
Health Library (BVS), and Medline, in English, Portuguese and Spanish, within
the range of 2010 to 2020 and using the following Science Descriptors of Health
(DeCS): Burnout, DORT, worker's health. Results:
Among the health professionals in the emergency sector related to BS,
physicians stood out, showing 6 specialties: anesthesiologists, cardiologists,
intensivists, neurologists, pediatricians and residents in general surgery. Conclusion:
Based on the results, it is necessary to develop studies and scientific
research that investigate the factors negatively associated with Burnout
Syndrome, in order to prevent it and provide a better quality of life for this
population.
Keywords: burnout; health professionals; professional
exhaustion.
O
ambiente de trabalho, atualmente, apresenta-se com um ritmo cada dia mais
intensificado, altamente exigente, hostil, acarretando impactos importantes na
saúde dos profissionais. As metas exigidas e a pressão imposta podem ser
fatores desencadeadores de estresse no trabalhador. Várias profissões sofrem
com essa pressão, tais como: médicos, enfermeiros, dentistas, dentre outros
[1,2].
A classe
dos profissionais de saúde demanda um alto nível de estresse cotidiano, devido
ao constante cuidar das pessoas e responsabilidade envolvida. Podem ser
considerados fatores desencadeantes deste estresse: as questões emocionais
presentes na assistência a cada indivíduo, como a dor, o medo e a angústia de
um paciente grave ou mesmo sua família; as condições de trabalho, como a falta
de infraestrutura, escassez de recursos para o atendimento, os riscos
biológicos, físicos e químicos do ambiente; e acrescenta-se, também, a divisão
desproporcional da carga trabalhista por turnos [3,4].
As
doenças ocupacionais como as Lesões por Esforços Repetitivos (LERs) e Distúrbios Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho
(DORTs), representam importantes agravos à saúde dos
trabalhadores. Apresentam-se como uma queixa decorrente de um desequilíbrio
entre as exigências das tarefas relacionadas ao trabalho e as capacidades
funcionais dos indivíduos. Sendo os principais agravos, as doenças do sistema
osteomuscular e do tecido conjuntivo [4].
A partir
da influência do ambiente laboral, se desenvolvem outras consequências que
acometem, não só a saúde física, mas também, a saúde mental do trabalhador.
Desta forma, o profissional se mostra mais vulnerável a riscos, ao adoecimento
e a sofrer acidentes de trabalho. Estes riscos incluem fatores psicossomáticos,
desenvolvimento de doenças ocupacionais e desencadeamento de síndromes, como a
Síndrome de Burnout (SB) [5,6].
A SB
possui um conceito multidimensional que envolve três componentes relacionados
ao quadro clínico: a Exaustão Emocional (EE), que se refere à fadiga ou sensação
de exaustão mental e física, dificultando ou impedindo a realização de uma
tarefa; a Despersonalização (DP), incluindo comportamentos de insensibilidade e
atitudes negativas do profissional com relação a quem recebe seus serviços; e a
Baixa Realização (BR), que compreende o sentimento de diminuição da realização
pessoal e insatisfação do profissional com suas atividades [2].
O
trabalhador acometido pela SB passa a ter uma avaliação negativa do seu
desempenho, uma visão pessoal de fracasso, baixa autoestima, baixa
concentração, vontade de abandonar o trabalho, dores de cabeça, insônia, dores
musculares e fadiga crônica. É indubitável a grande repercussão na qualidade de
vida deste trabalhador [7].
Segundo a
Organização Mundial da Saúde (OMS), no Brasil, 72% das pessoas sofrem com
estresse no trabalho. Sobre isso, a Associação Internacional de Manejo do
Estresse (ISMA) aponta que, deste percentual, 32% têm burnout, a síndrome
caracterizada por sensação de não dar conta de tarefas, indiferença ao trabalho
e baixa satisfação profissional. Com a crescente incidência, a OMS admitiu a
necessidade de inclusão da síndrome de burnout na Classificação
Internacional de Doenças (CID) [8].
O
presente tema apresenta uma significativa relevância, em virtude dos resultados
negativos causados pela SB à sociedade e ao bem-estar dos trabalhadores,
gerando impactos na qualidade de vida. Por conseguinte, é pertinente estudar a
Síndrome para que empresas, gestores e os profissionais saibam como lidar com essa
doença ocupacional.
Diante
das consequências ocasionadas em vários aspectos da vida, profissões e lugares
do mundo pela SB, observa-se também a grande exposição dos profissionais de
saúde à esta doença ocupacional, visto que é uma classe de trabalhadores
submetida a um estresse contínuo. Diante deste contexto, determinou-se como
objetivo do presente estudo, identificar a frequência da SB nos profissionais
de saúde.
O artigo
foi desenvolvido, segundo os preceitos de estudo exploratório, tratando-se,
portanto, de uma revisão integrativa, que discorreu sobre o que há de mais
atual disponível na literatura, elucidando a Síndrome de Burnout em
profissionais de saúde. A identificação dos artigos foi realizada através de
buscas das bases de dados Medline, PubMed e Scielo para trabalhos publicados entre os anos de 2010 a
2020, nos idiomas português, inglês e espanhol. A coleta foi realizada no
período entre dezembro de 2019 a janeiro de 2020.
Na
estratégia de busca foram utilizadas as seguintes combinações de termos: 1.
Síndrome de Burnout e Profissionais de Saúde, 2. DORT e Saúde do Trabalhador,
3. Maslach Burnout Inventory
(MBI) e Profissionais de Saúde.
A partir
da seleção dos artigos, de acordo com os critérios de elegibilidade e
inelegibilidade (Figura 1), os resultados encontrados foram analisados (Tabela
I), com as seguintes descrições: Autor/ano, Desenho de estudo, Título e
Profissionais de saúde. Em seguida, foram observados os objetivos traçados para
o presente estudo e suas respectivas respostas de maneira discursiva e
conclusiva.
Figura 1 – Seleção das fontes de informação:
critérios de elegibilidade e inelegibilidade
Diante
dos trabalhos encontrados na pesquisa, 16 artigos foram analisados de acordo
com os seguintes aspectos: autor principal, ano da publicação, desenho de
estudo, título e profissionais de saúde presentes no trabalho (Tabela I).
Tabela I - Artigos incluídos neste estudo,
classificados segundo autor principal e ano da publicação, desenho de estudo,
título e profissionais de saúde presentes no estudo
Ainda não
há consenso na literatura acerca da interpretação do MBI para caracterizar a
SB. Há autores que determinam a presença da doença pelo critério dos três itens
que caracterizam a Síndrome, enquanto outros acreditam que, independentemente
da presença de todos os itens, apenas um deles é suficiente para o diagnóstico.
Neste estudo, foi considerada a presença dos três itens em nível elevado para o
diagnóstico da doença, pois, de acordo com a literatura é necessário que as
três dimensões sejam afetadas para conferir maior fidedignidade ao real
diagnóstico dessa doença. O resultado da SB nas diferentes profissões de saúde
é apresentado, considerando o autor principal e ano de publicação, número de
participantes (n) respondentes ao questionário MBI, que totalizou em 4477
profissionais de saúde, e porcentagem de cada variável (BR, DP e EE) (Tabela
II).
Tabela II - Resultado da Síndrome de Burnout
(SB) nas diferentes profissões de saúde, relacionado com a quantidade de
participantes respondentes ao MBI, autor principal e ano de publicação do
trabalho
Foi
calculada a média de cada característica presente na SB: baixa realização nas
atividades, despersonalização, e exaustão emocional. Os dados obtidos foram
expostos, de acordo com a profissão e especialidades correspondentes (Figura
2).
Figura 2 - Prevalência da síndrome de burnout
nos diferentes profissionais de saúde (%)
Os
artigos analisados apresentaram delineamento epidemiológico seccional, visando
verificar a prevalência da Síndrome de Burnout em profissionais de saúde. Todos
os artigos foram publicados após o ano de 2016 e mais de 56% deles foram
realizados em 2018. A frequência desses estudos vem aumentando ao longo do
tempo, devido às características sociodemográficas, variáveis profissionais e
fatores organizacionais do ambiente de trabalho deste público [10].
Nesta
pesquisa, observou-se maior prevalência da Síndrome de Burnout no profissional
médico, com as respectivas variáveis: sexo, idade, quantidade de filhos e
estado civil. Tais resultados encontrados apontam que 80% do público é feminino
e 20% masculino, com idade média de 36 anos, sendo 50% casados e 50% solteiro
sem filhos.
Japec et al. [11] trouxe em seu estudo
transversal a participação de 2557 respondentes elegíveis com idade média de 41
anos onde a prevalência também foi maior em mulheres, com tempo médio de
serviço de 15 anos, corroborando com tais estudos. Cruz et al. [12]
mostrou em seu estudo descritivo a participação de 235 profissionais de saúde,
com idade média de 48 anos, predominantemente do sexo feminino e solteiras, com
tempo de serviço médio de 12 anos.
Fabichak, Junior e Marrone [13] realizaram um
estudo analítico com 24 participantes, médicos residentes de clínica médica.
Neles, aplicaram questionários sobre dados sociodemográficos, ocupacionais,
percepção de estressores na organização do trabalho, sintomas somáticos e a
versão para português do Maslach Burnout Inventory (MBI). Observaram um índice de 75% para a
variável de Exaustão Emocional (EE) e metade dos participantes apresentaram
critérios indicativos para SB. Semelhante a este estudo, Silva et al.
[14], em seu trabalho descritivo transversal, utilizou os mesmos instrumentos
de avaliação em 36 fisioterapeutas que atuam na UTI para cuidados com adulto,
tendo encontrado a prevalência de Burnout equivalente a 56,42% para a variável
EE.
Em estudo
transversal, Brayde et al. [15] observaram
que, dos 47 residentes que optaram por participar da pesquisa, a predominância
foi do sexo feminino, com 57,4% na sua totalidade, em detrimento do sexo
masculino com 42,6%. A faixa etária de maior prevalência foi de 25-29 anos, o
que corresponde a 59,6%. Quanto ao estado civil, destacou-se o solteiro, na
proporção de 57,4%.
Complementando
a discussão acerca dos resultados da SB em profissionais de saúde de âmbito
hospitalar, destaca-se a contribuição de Ferreira et al. [16] com um
estudo epidemiológico, envolvendo 528 técnicos de enfermagem de um Hospital
Público Universitário de alta complexidade. Aplicado o MBI, constatou-se que os
técnicos de enfermagem que compuseram a amostra, vivenciaram dimensões da SB,
sendo que 5,9% dos técnicos de enfermagem apresentaram escores de burnout nas
três dimensões (EE, DP e BR); 23,6% da amostra apresentaram nível elevado de
EE; 21,9% elevado para DP, e 29,9% com BR.
Também
corroboram para o estudo da SB nestes profissionais, Silva et al. [17],
que realizam em sua pesquisa, com 193 profissionais de saúde, sendo 152
técnicos e 41 enfermeiros. Aplicada a Escala Modos de Enfrentamento de
Problemas (EMEP) e o MBI, se obteve como resultado uma amostra majoritariamente
do sexo feminino (92,8%), solteira (48,5%), sem filhos (48,5%) e com idade
variando entre 21 e 63 anos (média = 34,13; DP = 8,6). Esta população revela
altos níveis de burnout em um contingente expressivo de profissionais de enfermagem
(84%) e baixa eficiência no uso de estratégias combativas aos estressores
laborais.
No campo
da saúde hospitalar, constata-se acelerado e frequente progresso tecnológico,
ramificação do exercício e ampliação das especificidades. Predomina-se a política
de superioridade e um amplo agrupamento de diretrizes e princípios para seu
andamento. Isso possibilita o aparecimento de divergências no meio dos
profissionais do mesmo grau, entre esses, seus diretores e com a própria
administração. Essas condições da gestão de trabalho dentro do hospital,
associados à fragilidade das situações laborais, podem levar os profissionais
de saúde ao risco de surgimento da Síndrome de Burnout [16].
Sabe-se
que os sintomas de Exaustão Emocional, a Baixa Realização profissional e
Despersonalização, característicos da síndrome, surgem e se intensificam quando
os trabalhadores não conseguem desenvolver formas eficazes de combater os
fatores de estresse no trabalho.
Torna-se
um desafio a preservação da saúde física e mental dos profissionais de saúde,
visto que, eles atuam na área hospitalar e deparam-se, cotidianamente, com
circunstâncias de sofrimento, angústia e perda, o que lhes deixam mais
suscetíveis ao desencadeamento de síndromes. Desempenhar buscas diagnósticas,
expor o prognóstico, definir e conduzir a intervenção e todos os seus
obstáculos em conjunto com a dúvida de cura e a chance de morte, são ações que
põem o profissional de frente a um estado de vigoroso fardo emocional [18].
A partir
das produções científicas consultadas e agrupadas neste trabalho, os resultados
apresentados permitem afirmar que, dentre os profissionais analisados, há maior
prevalência da Síndrome de Burnout nos médicos, apresentando como destaques as
variáveis de sexo e idade, sendo 80% do sexo feminino e com idade média acima
de 35 anos.
Diante
dos resultados apontados e tendo como perfil uma profissão onde a jornada de
trabalho tem se intensificado cada vez mais, torna-se necessário o
desenvolvimento de estudos e pesquisas nesta área, com o objetivo de
reconhecimento dos fatores que influenciam negativamente para o surgimento da
síndrome e, consequentemente, a orientação de como preveni-la e tratá-la,
proporcionando, assim, melhoria na qualidade de vida e no desempenho laboral.
Conflitos
de interesse
Não
existem conflitos de interesse.
Fontes
de financiamento
Não houve
fonte externa de financiamento.
Contribuição
dos autores
Concepção
e desenho da pesquisa: Santos ABM, Azevedo CN, Gomes MLR, Mello SMB, Oliveira
BDR; Coleta de dados: Santos ABM, Azevedo CN, Gomes MLR, Mello SMB,
Oliveira BDR; Análise e interpretação dos dados: Santos ABM, Azevedo CN, Gomes
MLR, Mello SMB, Oliveira BDR; Redação do manuscrito: Santos ABM, Azevedo
CN, Gomes MLR, Mello SMB, Oliveira BDR; Revisão crítica do manuscrito quanto ao
conteúdo intelectual importante: Santos ABM, Azevedo CN, Gomes MLR, Mello SMB,
Oliveira BDR.