Fisioter Bras 2021;22(6):789-90

doi: 10.33233/fb.v22i6.5054

 

EDITORIAL

O método científico: do bicho geográfico a Sherlock Holmes

 

Marco Orsini, Carlos Henrique Melo Reis

 

Médicos com formação em Neurologia

 

Correspondência: Marco Orsini, Rua Professor Miguel Couto, 322/1001, 24230240 Niterói RJ, Brasil orsinimarco@, hotmail.com

 

Suponhamos que sejamos grandes aventureiros, daqueles estupidamente vidrados em trilhas. Essas, dependendo do caminho percorrido, leva-nos a caminhos vários – uns já previsíveis e outros ainda inexploráveis. A investigação científica depende de um “leque multifacetado de procedimentos e vivências intelectuais e técnicas”, para que seus objetivos possam ou não ser atingidos – denominação dada aos métodos científicos. Indubitavelmente, o método é o coração pulsante de um trabalho. Quando bem empregado, demonstra aos leitores e interessados em pesquisa uma espécie de “marcação intelectual e técnica” que possibilitou-nos eastear uma bandeira num cume. Gosto, em primeira pessoa, defini-los como traços característicos da ciência com particularidades intrínsecas de criador.

Todos conhecem o pequeno ser vivo denominado bicho geográfico (larva migrans cutânea)? Essas larvas, antes da eclosão de um diagnóstico de certeza, traçam um caminho árduo e tortuoso; promovem um processo inflamatório e através desse, deixam pistas ao examinador. Tais caminhos mimetizam um desenho, geralmente, geográfico. Trocando em miúdos, esse também é o traçar de um método científico. Uma inquietude acadêmica, que faz emergir sinapses a sistemas de recompensa. Quanto mais pensamos, mais rabiscamos o método. Avançamos, apagamos, retrocedemos. Apagamos, retrocedemos e avançamos. Retrocedemos, avançamos e apagamos – até definirmos o desenho do estudo. Os bichos geográficos também avançam como o pensamento do ser-humano, pois qualquer barreira imposta pela pele, associada ao controle de defesa celular, faz-lhes buscar novos trajetos. Então podemos nos comparar às larvas? Obviamente não, pois essas precisam driblar o nosso sistema imune e, através da inflamação, redefinir nova rota. Não temos essa capacidade, por enquanto.

Atento que os métodos científicos não são exclusivos da ciência, sendo possível usá-los para a resolução de problemas do cotidiano como, por exemplo, substituirmos uma lâmpada. Desligamos o interruptor, retiramos a lâmpada queimada, inserimos uma nova e religamos o interruptor. Se a lâmpada acendeu método encerrado; caso contrário, uma nova investigação tipo as de Sherlock Holmes, mestre da ciência da dedução, inicia-se. O personagem que se faz acompanhar de seu fiel escudeiro John Watson desde o primeiro encontro que acontece em Um Estudo em Vermelho, cumpre a missão de desvendar mistérios aparentemente insolúveis, ancorado em três princípios básicos: a observação, a dedução e o conhecimento. Por falar nisso, as cenas de um crime também estão a exigir para sua solução um método bem refinado. Em adição, atento que não há ciência sem o emprego de métodos científicos.

Ao pesquisador cabe uma necessidade ímpar de inquietude intelectual, vontade de trilhar novos caminhos e elaborar perguntas. Na atualidade, já admitimos a convivência, e até a sobreposição, de métodos científicos distintos, dependendo do objeto de investigação e do tipo de pesquisa. Lembremos de pensadores como Platão (Grécia Antiga), que além das chamadas questões metafísicas, tratou de assuntos referentes à geometria, matemática, física, medicina etc., imprimindo uma visão totalizante às suas interpretações. Não podemos deixar de citar Descartes (Século XVII) e o método dedutivo, além de Kant (Século XVIII), o método do sujeito como ordenador e construtor da experiência: só existe o que é pensado. O que nos resta nesse momento? Dedilhar possibilidades, rascunhar caminhos e simplesmente pensar...