Fisioter Bras 2022;23(2):265-77

doi: 10.33233/fb.v23i2.5088

ARTIGO ORIGINAL

Avaliação do centro de gravidade por baropodometria e sua influência sobre a funcionalidade de indivíduos com doença de Parkinson

Evaluation of the center of gravity by baropodometry and its influence on the functionality of individuals with Parkinson's disease

 

Mariana da Cruz Souza*, Débora Toshimi Furuta*, Dyenifer Fernandes de Oliveira*, Nicoly Ribeiro Uliam*, Isabella Cristina Leoci*, Elisa Moriel Valença**, Igor Takashi Akiyama**, Julia Teixeira Magalhães Silva**, Cristina Elena Prado Teles Fregonesi***, Lúcia Martins Barbato***, Guilherme Yassuyuki Tacao****, Augusto Cesinando de Carvalho***

 

*Discente do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu em Fisioterapia, Residência em Reabilitação Física Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Presidente Prudente/SP, **Graduando(a) do curso de Fisioterapia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Presidente Prudente/SP, ***Docente do Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Presidente Prudente/SP, ****Doutorando em Fisioterapia Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Presidente Prudente/SP

 

Recebido em 10 de fevereiro de 2021; Aceito em 3 de março de 2022.

Correspondência: Mariana da Cruz Souza, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Rua Roberto Simonsen, 305, Centro Educacional 19060-900 Presidente Prudente SP

 

Mariana da Cruz Souza: mariana-cruz.souza@unesp.br

Débora Toshimi Furuta: dehfuruta24@gmail.com  

Dyenifer Fernandes de Oliveira: dyeniferf@gmail.com

Nicoly Ribeiro Uliam: nicoly.ruliam@gmail.com  

Isabella Cristina Leoci: ftisabella.l@gmail.com  

Elisa Moriel Valença: elisa.valenca@unesp.br

Igor Takashi Akiyama: igor.akiyama@unesp.br

Julia Teixeira Magalhães Silva: teixeirajulia3@gmail.com  

Cristina Elena Prado Teles Fregonesi: cristina.fregonesi@unesp.br  

Lúcia Martins Barbato: lucia.barbatto@unesp.br

Guilherme Yassuyuki Tacao: guilherme.tacao@unesp.br  

Augusto Cesinando de Carvalho: augusto.cesinando@unesp.br

     

Resumo

Introdução: Na Doença de Parkinson (DP), o centro de gravidade (CG) tende a deslocar-se do eixo central do corpo, dificultando a realização de movimentos compensatórios que restabelecem o equilíbrio, diretamente relacionado a funcionalidade motora. Objetivo: Este estudo, de carater prospectivo, objetivou comparar o CG e a funcionalidade motora de indivíduos com DP. Métodos: Foi utilizada a Escala Unificada de Avaliação da Doença de Parkinson (UPDRS) para avaliar a funcionalidade e a plataforma de baropodometria eletrônica FootWalk Pro para avaliar o CG, a intervenção foi realizada através do telemonitoramento num período de 8 semanas com o envio de vídeos. Resultados: Os resultados mostraram que indivíduos com DP que apresentam menor pontuação na UPDRS (p = 0,857) não apresentaram um melhor CG esquerdo (p = 0,442) e direito (0,377). Conclusão: Conclui-se que não houve diferenças significativas num comparativo entre as avaliações, mas destaca-se a importância de boas avaliações para que se busque a melhor intervenção para chegar a melhores resultados.

Palavras-chave: doença de Parkinson; equilíbrio postural; estado funcional; acidentes por quedas; telemonitoramento.

 

Abstract

Introduction: In Parkinson's Disease (PD), the center of gravity (CG) tends to move from the central axis of the body, making it difficult to perform compensatory movements that restore balance, directly related to motor functionality. Objective: This prospective study aimed to compare the CG and the motor functionality of individuals with PD. Methods: The Unified Parkinson's Disease Assessment Scale (UPDRS) was used to assess functionality and the FootWalk Pro electronic baropodometry platform to assess the CG, the intervention was carried out through telemonitoring in a period of 8 weeks with the sending of videos. Results: The results showed that individuals with PD who have a lower UPDRS score (p = 0.857) did not have a better left (p = 0.442) and right (0.377) CG. Conclusion: It is concluded that there were no significant differences in a comparison between the evaluations, but the importance of good evaluations is highlighted in order to seek the best intervention to achieve better results.

Keywords: Parkinson disease; postural balance; functional status; accidental falls; telemonitoring.

 

Introdução

 

A Doença de Parkinson (DP) é uma doença de ordem neurológica das mais comuns no mundo [1,2] em pessoas idosas, cuja faixa etária mais afetada está entre 50 e 70 anos, com maior incidência aos 60 anos [3] principalmente em indivíduos do sexo masculino. Esta é caracterizada por uma condição crônica, progressiva e degenerativa do sistema nervoso central que leva a deficiências cognitivas e motoras [1,4,5], caracterizada pelo tremor em repouso, movimentos lentos, acinesia, rigidez muscular, diminuição da amplitude dos movimentos [2,6], a postura curvada, tempo de apoio duplo, diminuição da velocidade, respostas posturais às perturbações, aumento na variabilidade do passo, tempo e comprimento do passo e da passada [2].

Coloca-se também em evidência a instabilidade postural, que é uma das predominantes, pois a frequência dos episódios de quedas tende a aumentar [6]. Com a progressão da DP, a marcha fica comprometida, nomeada festinação, caracterizada pela velocidade e passadas diminuídas, como se o indivíduo tentasse perseguir o seu próprio centro de gravidade (CG), com predisposição a se desequilibrar para frente.

      O CG, no qual a maioria dos parkinsonianos mostram uma interação não adequada do sistema vestibular, proprioceptivo e visual, é um dos sistemas encarregados pelo equilíbrio, e ele tende a deslocar-se, dificultando a realização de movimentos compensatórios para restabelecer sua estabilidade e equilíbrio [7,8]. O CG estará mais próximo do eixo central sempre que houver um bom alinhamento postural, promovendo sua melhora. Quando existe aumento da cifose torácica, por exemplo, a projeção do CG é para frente, gerando, dentre as consequências mencionadas, uma marcha insegura [9].

Uma maneira de avaliar este CG com eficácia e precisão é através da plataforma de baropodometria eletrônica FootWalk Pro, na qual se analisa o equilíbrio corporal estático, utilizando a estabilometria, com mensuração do desvio do centro de pressão corporal [10,11].

A estabilometria mensura o equilíbrio postural ortostático demonstrando oscilações ântero-posteriores e médio-laterais ao se posicionar sobre uma plataforma de pressão, variável importante quando se pensa em marcha e equilíbrio, que podem sofrer interferência de processos patológicos, sendo que deslocamentos extremos aumentam o risco de quedas [12]. Dessa forma, pode-se pensar de maneira mais eficiente no tratamento fisioterapêutico para indivíduos que apresentam esse deslocamento. Então, o telemonitoramento se fez ferramenta neste momento, permitindo que os indivíduos utilizassem objetos do seu domicílio como equipamentos auxiliares a terapia, pensando em favorecer uma prevenção ao declínio funcional dos mesmos [13].

Com isso, o estudo objetivou avaliar o CG desses indivíduos com DP através da plataforma de baropodometria e sua funcionalidade através de uma escala validada, comparando-as. Posteriormente aplicar-se-á uma intervenção por telemonitoramento para expor se existe ou não uma influência do CG sobre essa funcionalidade, e após intervir com a terapêutica proposta, reavaliá-los.

 

Métodos

 

Participantes e critérios de elegibilidade

 

O estudo, de caráter prospectivo e com duração total de 8 semanas, selecionou indivíduos com DP acompanhados por um serviço de Fisioterapia e Reabilitação em uma clínica escola na cidade de Presidente Prudente/SP. Os participantes foram informados sobre as atividades da pesquisa e, claro, sobre seu objetivo. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi assinado após esclarecimento do mesmo, previamente aprovado pelo Comitê de Ética da mesma instituição (CAAE: 50495221.2.0000.5402).

Para serem incluídos na pesquisa, os voluntários apresentaram diagnóstico de DP encaminhado pelo médico, idade igual ou superior a 50 anos, ausência de qualquer outra patologia neurológica e/ou comprometimentos ortopédicos, classificação do estágio da lesão pela escala Hoehn e Yahr de I a III (incapacidade leve a moderada) [14], ser capaz de realizar deambulação ativa sem dispositivo auxiliar de locomoção e órteses, além da ausência de déficits cognitivos avaliados pelo instrumento Mini Exame do Estado Mental [15] (considerando o nível de escolaridade - sendo a nota de corte para população analfabeta 18/19 e para a população com instrução escolar 24/25) [16]. Considerou-se critérios para exclusão os participantes que apresentassem impedimento em realizar algum procedimento do estudo devido a alguma circunstância ou dificuldade.

 

Desenho do estudo

 

A princício uma entrevista individual foi realizada para coleta de dados pessoais e certificação dos critérios de inclusão. Todos foram questionados com relação ao lado de dominância do corpo (direita ou esquerda), e qual o lado que apresentava maior dificuldade para realizar suas atividades. A seguir, na avaliação inicial (AV1), foi aplicada a Escala Unificada de Avaliação da Doença de Parkinson (UPDRS) para avaliar os comprometimentos e comportamentos motores e avaliado o CG através da plataforma de baropodometria eletrônica FootWalk Pro. Após a AV1, por meio de um aplicativo de mensagem, os participantes receberam quinzenalmente 4 vídeos contendo 5 exercícios cada (descritos na Tabela I), para serem realizados em seus respectivos domicílios. A semana em que não havia o envio do vídeo, os terapeutas entravam em contato com o participante para atualizações quanto a realização dos exercícios propostos e sua frequência semanal. Ao final do período de 8 semanas realizou-se uma avaliação final (AV2), na qual foram aplicadas as mesmas avaliações da AV1 para serem comparadas posteriormente.

 

Tabela IDescrição dos exercícios enviados por vídeo

 

Instrumentos de avaliação

 

Escala Unificada de Avaliação da Doença de Parkinson (UPDRS) 

 

A UPDRS é composta por 42 itens subdivididos em 4 domínios. Domínio 1: estado mental/comportamento/estado emocional; domínio 2: atividades de vida diária; domínio 3: exame motor; domínio 4: complicações da terapia. Sua pontuação para cada item vai de 0 a 4, onde 0 é igual a normalidade e 4 apresenta maior comprometimento [17]. De acordo com os objetivos do estudo, viu-se necessário apenas a aplicação do domínio 3. Esse destaca atividades como a fala, expressão facial, tremor de repouso, tremor postural ou de ação nas mãos, rigidez, bater dedos continuamente, movimentos das mãos, agilidade das pernas, levantar da cadeira, postura, marcha, estabilidade postural e bradicinesia. Neste domínio a pontuação varia de 0 a 52 pontos, onde 0 é o menor comprometimento e 52 representa maior comprometimento. A UPDRS é uma das escalas mais utilizadas em pesquisa e em ambiente clínico, e apesar de não ter sido desenvolvida para ser aplicada especificamente pela fisioterapia, é mundialmente conhecida, confiável, válida e útil ao fisioterapeuta [14].

 

Plataforma de baropodometria eletrônica FootWalk Pro

 

Esta avalia a marcha, equilíbrio corporal e pressões plantares por meio de um baropodômetro eletrônico de dois metros de comprimento (FootWalk Pro®, AM CUBE, França) com frequência de amostragem de 200 Hz12,13. As análises dos dados foram realizadas com o auxílio do software FootWork Pro® versão 3.2.0.1 (IST Informatique - Intelligence Service et Tecnique, França) [18]. Neste estudo, apenas a análise estática das pressões plantares foi coletada, utilizando-se a estabilometria, com mensuração do desvio do centro de pressão corporal. Os voluntários são orientados a ficarem descalços em posição ortostática sobre o baropodômetro, em apoio bipodal e assumem a “posição nominal dos pés” [18], braços ao longo do corpo, olhar voltado para um ponto fixo a sua frente, sem contato oclusal [19]. O teste é realizado três vezes, com 30 segundos de duração cada. Caso o avaliado saia da posição inicial antes do tempo, a contagem é interrompida. Para análise dos dados será utilizada a média das três tentativas. 

A análise aprecia os valores referentes a pressão plantar média, máxima e área de superfície plantar. Os diferentes pontos de pressões plantares resultantes do peso corporal sobre os pés são expressos em Kgf/cm2. Simultaneamente, se visualizam áreas coloridas por meio do software, variando do vermelho para as áreas de maior pressão, ao azul para as de menor pressão (Figura 1).

 

 

Figura 1Visualização da distribuição de pressão plantar

 

Análise estatística

 

Os dados coletados foram tabulados e dispostos em planilha pré-definida no software Microsoft Excel. Através do teste de normalidade de Shapiro Wilk, os valores de HY foram rodados e analisados para caracterização da amostra. Depois de confirmada a normalidade dos dados, o Teste - T pareado foi utilizado, a fim de realizar a comparação entre a UPDRS, CG esquerdo e CG direito. Os dados expressos em média e desvio padrão foram analisados pelo software estatístico Statistical Package for Social Science (SPSS – versão 22.0). Considerou-se significativo o valor de p < 0,05 e intervalo de confiança de 95%.

 

Resultados

 

Fizeram parte do estudo 10 indivíduos com DP, 7 do sexo masculino e 3 do sexo feminino, apresentando idade média de 69,80 ± 6,16 anos e classificação média da escala Hoehn e Yahr modificada de 1,30 ± 0,48. A média apontada no Mini-exame do Estado Mental foi de 26,20 ± 1,22 pontos.

Em relação ao lado de dominância e ao lado de maior dificuldade apontados pelos participantes, obtiveram-se valores em porcentagem, por média e desvio padrão (dp), dispostos na Tabela II.

 

Tabela II Resultados do lado dominante e lado de maior dificuldade

 

 

Os valores médios, o desvio padrão e o resultado do Teste – T pareado que não demonstrou diferença estatística entre AV1 e AV2 da UPDRS e CG direito e esquerdo, estão dispostos na Tabela III.

 

Tabela IIIResultados da UPDRS, CG esquerdo e CG direito em AV1 e AV2

 

UPDRS = Escala Unificada de Avaliação da Doença de Parkinson; CG = centro de gravidade; AV1 = avaliação inicial; AV2 = avaliação final; DP = desvio padrão; *p-valor = diferença significativa com p < 0,05 para o teste-t pareado

 

Diante da análise dos resultados, pode-se afirmar que os indivíduos com DP que apresentam menor pontuação na UPDRS, ou seja, que estão mais próximos da normalidade, não necessariamente irão apresentar um melhor controle do seu CG, pelo contrário, podem apresentar um desvio maior mesmo pós-intervenção. Assim como os que apresentam maior pontuação na UPDRS, ou seja, que estão mais distantes da normalidade, não necessariamente irão apresentar um controle inferior do seu CG.

 

Discussão

 

O presente estudo avaliou a influência do CG sobre a funcionalidade motora de indivíduos com DP, por meio da plataforma de baropodometria eletrônica FootWalk Pro e da UPDRS, respectivamente, pré e pós-intervenção por telemonitoramento. Os resultados obtidos na AV1 e AV2 da UPDRS e CG direito e esquerdo não apresentaram significância estatística, expondo que quando relacionadas comprovam que os indivíduos com DP que apresentam menor pontuação na UPDRS não necessariamente apresentam um CG melhor.

Ribeiro [20] afirmou que a DP, nos estágios iniciais da doença, apresenta assimetrias na estabilidade entre os hemicorpos durante a descarga de peso, demonstrando instabilidade postural. Por mais que a DP acometa bilateralmente nos estágios mais avançados, como já demonstrou Goulart et al. [14], um hemicorpo é sempre mais acometido que o outro, geralmente sendo o lado dominante, igualmente representado nos resultados deste estudo.

Nos achados de Caland [21], os avaliados foram questionados no momento inicial sobre seu lado de dominância e, em seguida a UPDRS também foi utilizada apenas o domínio III, assim foi possível classificá-los de acordo com o lado mais acometido pela doença. Na atual pesquisa a maioria dos pacientes são destros, ou seja, com dominância do lado direito, e relataram no dia da avaliação que o lado mais acometido é o direito. De acordo com a AV1 e AV2, o CG esquerdo teve maior alteração, mesmo que com pouca diferença com relação ao lado oposto, o que nos leva a interpretar que pelo lado direito ser mais acometido, os indivíduos tentam compensar e alinhar o centro de massa, restabelecendo o alinhamento postural do corpo levando a maior descarga de peso no lado oposto, o esquerdo, o que explica o CG esquerdo com maior desvio. Achado válido, mesmo que estatisticamente não influencie diretamente no resultado da UPDRS.

Para Mello et al. [4] e Saito [22], a UPDRS é uma escala confiável e válida, o que a qualifica como um método adequado para a avaliação da DP através de autorrelato e observação clínica. Indo de encontro a Mirelman et al. [23], que também avaliaram alguns itens da UPDRS em seu estudo, focando nos aspectos da marcha associados a limitações funcionais, apontam que ainda não está totalmente comprovado a avaliação por meio de tapetes e pranchas sensíveis a descarga de peso e que não estão à altura de avaliações clínicas pontuais, questionando ainda se tal tecnologia deve substituir ou apenas aumentar as atuais avaliações padrão-ouro, como o UPDRS.

Mas o que se vê no presente estudo é que a tecnologia e a avaliação clínica pontual se somam, e que não necessariamente uma substitui a outra, pelo contrário, a alteração de funcionalidade pode gerar uma desconfiança clínica sobre o desvio do CG, ou vice-versa, levando pesquisadores a avaliarem os dois e ter mais precisão dos resultados. Estes, que no atual estudo, apontam que um discreto desvio do CG não levará a uma alta pontuação na escala da UPDRS, ou seja, a funcionalidade não é diretamente afetada por esse desvio, mas defende-se que mesmo um não influenciando o outro (CG e funcionalidade), saber avaliar e relacionar os aspectos da doença com essas avaliações, ter o auxílio de boas tecnologias, e uma boa interpretação das pontuações nos ajuda a desempenhar melhor a nossa função como terapeutas, podendo traçar objetivos e metas para alcançar resultados melhores mediante intervenção.

Destaca-se então a importância de considerar intervenção fisioterapêutica para garantir a melhora do CG da DP, e os achados de Silva et al. [24] reforçam que a falta de exercícios pode agravar um dos sinais típicos da doença, que é a instabilidade postural, totalmente ligada ao CG. Sua intervenção apresenta critérios de inclusão semelhantes ao do presente estudo, além da avaliação da UPDRS e da telerreabilitação como método de comunicação para intervenção, composta através do envio de vídeos contendo exercícios de movimentação ativa para ganho de mobilidade, amplitude de movimento e de fortalecimento muscular com objetos que podem ser encontrados em suas próprias casas. Semelhante a intervenção do atual estudo, composta por exercícios multifuncionais que trabalharam capacidades funcionais, alguns deles para equilíbrio e coordenação. O autor [24] concluiu que as intervenções com exercícios promovem melhora na força, mobilidade, marcha e equilíbrio de pessoas com DP, consequentemente mantendo o CG alinhado. Os avaliados, assim como deste estudo, aderiram a terapia e obtiveram melhora, mesmo que pequena, na escala da UPDRS, estando mais próximos da normalidade após intervenção.

A prática regular de exercícios, segundo Afshari et al. [25] é fundamental na minimização de sintomas motores, apontando que o exercício físico tem efeito positivo no processo de controle de evolução da doença [6], aumentando a força muscular e melhorando equilíbrio e a marcha, fatores que contribuem para a autoestima e na confiança do paciente, influenciando em sua qualidade de vida [23].

No estudo de Oliveira et al. [13] é demonstrada a satisfação dos pacientes em relação a aceitação e realização de exercícios em seu domicílio, visto que o atual contexto pandêmico intensifica os sintomas de ansiedade e estresse psicológico, acarretando na piora dos sintomas motores. Então o telemonitoramento foi a alternativa encontrada neste estudo de manter os indivíduos ativos enquanto em domicílio, e investigar se a prática contínua dos exercícios proporcionaria uma melhora ou ao menos manteria o quadro desses indivíduos.

Entretanto, os resultados revelam que o desvio do CG apresenta um ligeiro aumento de AV1 para AV2 mesmo após a intervenção, o que leva a crer que o telemonitoramento, apesar de ser aceito pela maioria, não seja a maneira mais eficaz de tratamento, seja por insegurança, medo de quedas ou não entendimento da parte de quem recebe virtualmente o conteúdo. Considera-se então o atendimento presencial e individualizado, respeitando as regras sanitárias, para continuidade do serviço, gerando mais eficácia e segurança aos envolvidos.

Considera-se que novos estudos relacionados ao CG e a funcionalidade motora devem ser realizados para melhor conhecimento da relação entre o controle postural e os diferentes estágios da DP, além do papel terapêutico na reabilitação do equilíbrio corporal e na diminuição do risco de quedas nos parkinsonianos [7], afirmando também que a terapia por telemonitoramento deve ser considerada, já que um restabelecimento do alinhamento postural, mediante a continuidade dos exercícios, pode proporcionar uma melhora na projeção deste CG e, consequentemente, a melhora de seu estado funcional e qualidade de vida.

 

Conclusão

 

Conclui-se então que avaliar o estado funcional do parkinsoniano é muito importante para um bom planejamento de tratamento fisioterapêutico, visando sempre a melhora do alinhamento do seu CG para que mantenha um bom equilíbrio, o que determinará o impacto global da intervenção na vida do indivíduo. Para isso, várias escalas de avaliação para DP estão na literatura, e no geral focam na avaliação de estruturas e funções corporais e/ou em certas atividades funcionais. Pode-se destacar como limitação do estudo o baixo número amostral e o risco de não aderência ou de desistência durante o processo.

 

Conflito de interesses

Os autores declararam não haver qualquer potencial conflito de interesse que possa interferir na imparcialidade deste trabalho científico.

 

Fontes de financiamento

Não houve financiamento para realização da pesquisa

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Souza MC, Carvalho AC, Fregonesi CEPT, Uliam NR; Coleta de dados: Souza MC, Uliam NR, Furuta DT, Oliveira DF, Leoci IC; Análise e interpretação dos dados: Souza MC, Furuta DT, Oliveira DF; Análise estatística: Furuta DT, Oliveira DF, Tacao GY; Redação do manuscrito: Souza MC, Valença EM, Akiyama IT, Silva JTM, Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Carvalho AC, Tacao GY, Barbato LM

 

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