Fisioter Bras 2022;23(6):813-26
ARTIGO ORIGINAL
Eficácia do uso do
surfactante exógeno em recém-nascidos de uma UTI Neonatal
Effectiveness of the use of exogenous surfactant in newborn in a
neonatal ICU
Eliane de Fátima dos Reis*,
Jéssica Vida Diniz Borges**, Juliana Gonçalves Silva de Mattos, M.Sc.***, Nilce Maria de Freitas Santos, M.Sc.****, Gisélia Gonçalves de
Castro, D.Sc.***, Adriana Nunes de Oliveira, M.Sc.***
*Graduanda em
Fisioterapia, Centro Universitário do Cerrado de Patrocínio (UNICERP), **Centro
Universitário de Patos de Minas (UNIPAM), ***Centro Universitário do Cerrado
Patrocínio (UNICERP), ****Instituto Brasileiro de Reabilitação e Aprimoramento
Especializado (IBRAESP)
Recebido em 20 de fevereiro
de 2022; Aceito em 20 de outubro de 2022.
Correspondência: Nilce Maria de Freitas Santos, Avenida
Bahia, 646, 38295-000 Limeira do Oeste MG
Eliane de
Fátima dos Reis: elianefatreis@hotmail.com
Jéssica
Vida Diniz Borges: jessicavida07@yahooo.com
Juliana
Gonçalves Silva de Mattos: julianamattoscoro@gmail.com
Nilce
Maria de Freitas Santos: dranilcesantos@gmail.com
Giselia Gonçalves de Castro:
giseliagcastro@gmail.com
Adriana
Nunes de Oliveira: drinunesfisio@gmail.com
Resumo
Introdução: A Doença da Membrana Hialina (DMH) é
provocada pela ausência ou deficiência de surfactante, acomete os
recém-nascidos prematuros, e o tratamento é realizado com surfactante exógeno. Objetivo:
Avaliar a eficácia da terapia com o uso do surfactante exógeno nos distúrbios
respiratórios em recém-nascidos. Métodos: Um estudo transversal,
descritivo e quantitativo foi realizado com 31 recém-nascidos admitidos na UTI
Neonatal do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Patrocínio, MG. Para a
coleta dos dados, foi elaborado um roteiro estruturado pelas pesquisadoras. Os
dados foram analisados por meio dos testes estatísticos: Kolmogorov-Smirnov,
Fisher (p ≤ 0,05) e Wilcoxon (p ≤ 0,05). Resultados:
O DMH prevaleceu no sexo feminino (51,6%), a maioria prematuros (83,9%) e com
baixo peso ao nascer (51,6%). Daqueles que necessitaram do corticoide antenatal, 38,7% usaram duas doses, sendo o Grau III da DMH
o mais evidente (35,5%). Todos os recém-nascidos usaram ao menos uma dose de
surfactante (58,1%), devido a DMH (87,1%) e a Síndrome da Aspiração Meconial (12,9%). Conclusão: Conclui-se que o
distúrbio respiratório mais encontrado nos prematuros foi a DMH, comprovando a
evolução positiva dos neonatos após administração do surfactante exógeno e
constatando a eficácia do medicamento como tratamento, utilizando-se apenas uma
dose.
Palavras-chave: Doença da Membrana Hialina;
prematuridade; surfactante pulmonar.
Abstract
Introduction: Hyaline Membrane Disease (HMD) is caused by the
absence or deficiency of surfactant affecting premature newborns, and the
treatment is performed with exogenous surfactant. Objective: To evaluate the
effectiveness of exogenous surfactant therapy in respiratory disorders in
newborns. Methods: Cross-sectional, descriptive and quantitative study
was conducted in 31 newborns admitted to the Neonatal ICU of the Hospital Santa
Casa de Misericórdia de Patrocínio,
MG. For data collection, a script structured by the researchers was elaborated.
The data was analyzed using the statistical tests: Kolmogorov-Smirnov, Fisher
(p ≤ 0.05) and Wilcoxon (p ≤ 0.05). Results: The HMD is
prevalent in females (51.6%), most premature newborns (83.9%) and with low
birth weight (51.6%). Among those who required antenatal corticosteroids, 38.7%
used two doses and the Grade III of HMD was the most evident (35.5%). All
newborns used at least one dose of surfactant (58.1%), due to HMD (87.1%) and
Meconium Aspiration Syndrome (12.9%). Conclusion: This study showed that
the respiratory disorder most commonly in premature newborn was HMD, and
proving the positive recovery of neonates after administration of the exogenous
surfactant, thus verifying the efficacy of this medicinal product as a
treatment, mainly using only one dose.
Keywords: Hyaline Membrane Disease; prematurity; pulmonary
surfactant.
Segundo a
Organização Mundial de Saúde (OMS) são contabilizados 15 milhões de
recém-nascidos (RN) pré-termos no mundo anualmente, desses 1 milhão falece [1].
O nascimento prematuro tornou-se um importante problema de Saúde Pública em
nível mundial. Em 2018, aproximadamente 15 milhões de crianças nasceram com
idade gestacional abaixo de 37 semanas [2]. Desde 2000, a taxa média de
recém-nascidos pré-termos no Brasil é de 6,6% e o desenvolvimento de Unidades
de Terapia Intensiva (UTI) para cuidados neonatais aumentou a taxa de sobrevida
desses prematuros [3].
Em
estudos, alguns autores relatam que os prematuros possuem risco aumentado para
várias alterações clínicas, como as doenças respiratórias, destacando-se a
doença da membrana hialina (DMH), insuficiência respiratória grave, apneia,
pneumotórax, enfisema intersticial, displasia broncopulmonar
e dependência prolongada de oxigênio [4].
É
essencial para o recém-nascido a maturação adequada dos pulmões. Os alvéolos
devem ser capazes de se encherem de ar no momento do nascimento e de
permanecerem abertos para o prematuro respirar de modo independente. Isto se
torna plausível sobretudo por causa do surfactante, uma substância produzida
nos pulmões que age diminuindo a tensão superficial alveolar [5].
A DMH é
provocada pela ausência ou quantidade inadequada de surfactante, um distúrbio
associado à imaturidade pulmonar. Considerada a doença respiratória mais comum
no período neonatal, é uma das principais razões de morbidade e mortalidade em
recém-nascidos com idade gestacional menor que 28 semanas, com peso inferior ou
igual a 1500 g, sendo mais comum naqueles nascidos de parto cesáreo, sexo
masculino e raça branca [6].
O
surfactante pulmonar é produzido a partir da 20ª semana de gestação pelos pneumócitos tipo II, com produção aumentada gradativamente
e com pico na 35ª semana. Sua principal função é reduzir a tensão superficial
na interface ar-líquido alveolar e nos bronquíolos distais, evitando colapso
alveolar e garantindo adequada expansão pulmonar, além de ser importante na
defesa do pulmão [7].
Desde
1990, o desenvolvimento da terapia com o surfactante exógeno foi considerado
seguro e eficaz e se tornou um avanço histórico e marcante no cuidado neonatal,
sendo preconizado seu uso terapêutico nas primeiras duas horas de vida [8].
Atualmente,
o surfactante exógeno é utilizado no tratamento de recém-nascidos pré-termos
com SDR e além disso, usado em outras patologias pulmonares. A utilização da
terapia de reposição do surfactante, altera os efeitos gerados por sua
disfunção endógena no sistema respiratório do prematuro [6].
Diante do
contexto apresentado, questiona-se: o uso do surfactante exógeno nos distúrbios
respiratórios em recém-nascidos possui eficácia como conduta de tratamento?
Portanto,
este estudo busca avaliar a melhora da incidência dos distúrbios respiratórios
em recém-nascidos, submetidos ao tratamento com surfactante exógeno em uma
unidade de terapia intensiva neonatal.
Trata-se
de um estudo transversal, com caráter descritivo e quantitativo.
O estudo
foi realizado em RN, admitidos na UTI Neonatal do Hospital Santa Casa de
Misericórdia de Patrocínio, MG, entre fevereiro e junho de 2021 e que estiveram
inclusos nos critérios de indicação para o uso do surfactante exógeno.
Para a
coleta de dados foi elaborado um roteiro estruturado pelas pesquisadoras,
baseado no estudo de Freddi et al. [9], que
buscou investigar critérios como exposição ao corticoide antenatal;
presença de sofrimento fetal; peso de nascimento; idade gestacional; sexo; apgar
ao nascer; doença prévia materna; diagnóstico do
RN;
avaliação fisioterapêutica; avaliação
radiológica pulmonar; necessidade de
administração de surfactante exógeno e
número de doses; administração do
surfactante (protocolo usado na unidade); avaliação
fisioterapêutica após a
administração do surfactante e sua evolução
clínica; avaliação radiológica após
a administração do surfactante.
Para
avaliar a DMH e seus níveis de agravamento, foi utilizado o exame radiológico
feito nos RN quando admitidos e após o período de internação, método rotineiro
na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.
A
instituição foi informada sobre os objetivos da pesquisa, autorizando a coleta
de dados.
A
normalidade das variáveis foi realizada por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov, apresentando distribuição não normal
dos dados, sendo considerados não paramétricos. Para calcular a associação
entre as variáveis, utilizou-se o teste de Fisher (p ≤ 0,05), enquanto
que a comparação do período pré e pós surfactante foi
feito pelo Teste de Wilcoxon (p ≤ 0,05).
O
presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro
Universitário do Cerrado de Patrocínio (COEP/UNICERP), através do Protocolo
20201450FIS006, estando em conformidade com o disposto nas resoluções 466/2012
e que regulamentam o desenvolvimento de pesquisas com seres humanos.
Foram
coletados dados de 31 RN, sendo 51,6% do sexo feminino. A maioria nasceu
pré-termo (83,9%), com média de 33,8 semanas de gestação, variando de 26 a 40
semanas gestacionais. Os dados referentes ao nascimento dos RN são apresentados
na Tabela I.
Tabela I – Caracterização dos recém-nascidos
analisados. Patrocínio, MG, 2021
Fonte:
Dados da pesquisa. 2021
O peso
médio ao nascimento foi de 2,22 kg, variando de 0,730 a 4,33 kg.
Daqueles
que necessitaram do corticoide antenatal, 38,7%
usaram duas doses, 12,9% usaram uma dose e 3,2% três doses.
Os RN
foram submetidos a uma avaliação fisioterapêutica e classificados quanto ao
grau da Doença da Membrana Hialina (DMH) pré e pós
utilização do surfactante.
O Grau
III da DMH foi o mais evidente (35,5%) (Tabela II).
Tabela II – Distribuição dos RN quanto ao grau
da Doença da Membrana Hialina. Patrocínio, MG, 2021
A
avaliação dos padrões iniciais dos RN é apresentada na Tabela III.
Tabela III – Avaliação fisioterapêutica sobre a
situação de saúde dos RN pré e pós uso de
surfactante. Patrocínio, MG, 2021
Fonte:
Dados da pesquisa. 2021. *Boletim de Silverman-Anderson
O Teste
de Wilcoxon mostrou que após o uso do surfactante
pelos RN houve melhoria do BSA (Z = -4,972; p = 0,000), da expansão torácica (Z
= -1,933; p = 0,05), da FiO2 (Z = -4,875; p = 0,000), da PIP (Z = -3,880; p =
0,000), da PEEP (Z = -2,906; p = 0,004) e da FR (Z = -3,111; p = 0,002).
Os
critérios de administração do surfactante exógeno no tratamento dos RN foram
baseados no quadro clínico (Tabela IV). Todos os RN usaram surfactante,
variando de uma (58,1%) a três doses (3,2%), devido a SDR/DMH (87,1%) e a SAM
(12,9%). Dos RN, 15 apresentaram melhora do quadro clínico após a primeira dose
do surfactante, 12 após duas doses e um após a terceira dose.
Tabela IV - Relação do número de doses de
surfactante de acordo com o quadro clínico. Patrocínio, MG, 2021
Fonte:
Dados da pesquisa. 2021
O teste
exato de Fisher mostrou que não há associação entre o número de doses recebidas
e a SDR/DMH (X2(2) = 2,670; p: 0,327) e a SAM (X2(2) = 1,089; p = 0,679),
inferindo que o diagnóstico influi no critério do uso do surfactante, mas não
no número de doses.
O
protocolo utilizado em todos foi o mesmo. O Protocolo de administração de
surfactante da unidade foi baseado no: "I Consenso Brasileiro de VM em
Pediatria e Neonatologia: uso do surfactante no RN (2015)" e
"Terapêutica de reposição de Surfactante do Jornal de Pediatria (2001)".
Convém
ressaltar que a administração do surfactante exógeno foi realizada como forma
terapêutica, pois a maioria dos RN foram diagnosticados com a DMH. A
administração foi realizada de forma invasiva em todos os bebês da amostra,
através de um tubo endotraqueal, pois todos estavam sob ventilação mecânica
invasiva e utilizaram o surfactante de origem animal (suíno) conhecido como Curosurf. O manejo do medicamento na unidade estudada, foi
realizado pela fisioterapeuta de plantão com auxílio de uma técnica de
enfermagem/enfermeira de forma estéril, após a prescrição do surfactante e sua
dosagem pelo médico plantonista, e análise do raio x para verificar
posicionamento do tubo endotraqueal e possível necessidade de mudança do mesmo,
caso estivesse mal posicionado (introduzido ou tracionado), impedindo assim uma
ventilação homogênea [10].
A técnica
deve ser realizada nas primeiras duas horas de vida do recém-nascido,
administrada em bolus e depois de sua administração,
é orientado que o RN permaneça sobre manuseio mínimo por seis horas e se houver
necessidade de aspiração endotraqueal, que seja feita após duas horas do
procedimento. A necessidade de outras doses é avaliada através da evolução
clínica do bebê e das imagens radiológicas seguintes [10,11].
No
presente estudo, foi observado um percentual mais elevado de recém-nascidos do
sexo feminino, diferentemente de resultados encontrados por alguns autores que
apontaram que a prematuridade predominou em recém-nascidos do sexo masculino.
Porém a literatura retrata que essa variável não exerce influência sobre a
ocorrência de partos prematuros e afirmaram que a predominância nesse gênero
ocorre porque a maturidade pulmonar no sexo masculino possui um processo mais
lento de maturação [3,6,12,13].
De acordo
com a idade gestacional (IG), foi observado que a maioria nasceu pré-termo
(83,9%), prevalecendo os nascidos com média de 33,8 semanas de gestação. Tais
resultados assemelham-se aos encontrados no estudo em que verificaram que 81,5%
dos partos prematuros ocorreram entre a 33º e a 36º semana de gestação, assim
como em outro estudo em que 85% dos partos avaliados ao longo dos cinco anos
estudados eram prematuros e ocorreram entre 32 a 36 semanas de idade
gestacional, observando que embora os partos ocorreram prematuramente, estavam
próximos do término [14,15].
Entretanto,
ao analisar a evolução clínica dos prematuros, a IG de nascimento não deve ser
utilizada como critério isolado para avaliação, devido a diversidade desse
grupo, pois os mesmos apresentam distinção dos pesos de nascimento, morbidade,
mortalidade e estado nutricional [16].
Em
relação ao peso de nascimento, em resultados de alguns autores, encontraram
dados similares ao desta pesquisa, caracterizando o baixo peso ao nascer [13].
Outros autores frisaram que o baixo peso ao nascer é um fator de risco
associado a morbimortalidade neonatal e possui quatro vezes mais chances de
estar relacionado ao nascimento prematuro. Além disso, estudos demonstraram
clara relação entre a idade gestacional e o peso ao nascer, pois quanto menor o
tempo de desenvolvimento intrauterino, menor será o peso do RN [17,18].
Já em
estudo semelhante ao presente, obtiveram Apgar de 7 a
10 no 1º e 5º minutos de vida, respectivamente. Além do peso de nascimento, foi
analisado o Índice de Apgar, que avalia as condições
do RN ao nascer e suas condições vitais. Consiste na avaliação de 5 itens do
exame físico do recém-nascido e para cada um desses itens é atribuída uma nota
de zero a dois. O total é a soma das notas de cada item, podendo dar uma nota
mínima de 0 e máxima de 10. Os aspectos avaliados são frequência cardíaca,
esforço respiratório, tônus muscular, irritabilidade reflexa e cor da pele
[14].
Neste
estudo, observou-se que 38,7% dos RN usaram duas doses de corticoide antenatal (CA), dados que corroboram a literatura
consultada, em que de 493 neonatos, a maioria recebeu duas doses de CA (40,8%),
e segundo ela foi possível constatar que receber duas doses de corticoide antenatal culminou em menor mortalidade [19]. Contudo, de
acordo com outra pesquisa, existem resultados positivos em todos os grupos de
idade gestacional e com qualquer número de dose [20].
Convém
destacar que a administração de CA às gestantes com risco de parto prematuro,
reduz o risco de morte perinatal, de morte neonatal, de síndrome de dificuldade
respiratória e de hemorragia intraventricular (HIV), além de promover a
aceleração da maturidade pulmonar fetal antes do RN nascer [21]. O
recém-nascido pré-termo, exposto ao CA em até sete dias do seu nascimento
apresenta maior complacência e volume pulmonar, menor permeabilidade da
vascularização pulmonar e melhor resposta ao tratamento pós-natal com
surfactante [20].
Em
pesquisa feita por Avery e Mead,
ambos foram os responsáveis pelos primeiros estudos que relacionaram à SDR
neonatal a carência de surfactante ao nascimento. Porém alguns autores
concluíram que a incidência da DMH é inversamente proporcional ao peso de
nascimento e à idade gestacional [22,23].
O
diagnóstico da DMH é realizado segundo a suposição clínica aos achados
radiológicos [24]. O aspecto radiológico é de infiltrado retículo-granular
difuso (vidro moído) espalhado de maneira uniforme na região pulmonar, com
presença de broncogramas aéreos e elevação de líquido no pulmão [16].
Dentre os
principais sintomas decorrentes da doença, destacam-se: desconforto
respiratório, insuficiência respiratória podendo se agravar progressivamente,
aumento das frequências respiratória e cardíaca, redução da expansibilidade
torácica, necessidade de cada vez mais aporte de oxigênio e assistência
ventilatória, dentre outros [25].
O Grau
III da DMH foi o mais evidente neste estudo. Contudo, em função do pequeno
número de estudos com o intuito de avaliar a predominância dos graus da DMH e o
que isso causa na evolução do RN, entendemos que existe a necessidade de uma
maior quantidade de estudos sobre o tema. Todavia, alguns autores abordam em
seus estudos, que a necessidade de uma nova dosagem de surfactante exógeno é
prevalente ao escore radiológico grau 3 ou 4 da SDR [26].
No
presente estudo, foi observado que, após a administração do surfactante
exógeno, houve redução em vários parâmetros ventilatórios, além da melhora da
expansibilidade torácica e dos níveis de BSA (Boletim de Silverman-Andersen,
1956). Corroborando estudos encontrados na literatura que observaram que a
utilização dessa terapia aumenta os níveis de oxigenação do sangue, diminui os
picos de pressão da ventilação, dos níveis de oxigênio inspirado e melhora a
imagem radiológica dos pulmões desse neonato [27].
O escore
de BSA é utilizado para estimar o nível de desconforto respiratório e
quantificar a gravidade do comprometimento pulmonar [28]. O BSA possui escores
que variam entre zero, indicando ausência de desconforto, até dez, expressando
máximo desconforto respiratório [29]. Os escores médios do BSA observados neste
estudo foram em sua maioria de dificuldade respiratória severa (51,6%) antes do
tratamento com surfactante, e de 90,3% sem dificuldade respiratória no
pós-tratamento.
Além
disso, é possível observar que grande parte dos neonatos da amostra
apresentaram expansibilidade torácica reduzida (80,6%) e todos tiveram que ser
intubados, em sua maioria, com parâmetros ventilatórios altos. Isso se
justifica através do Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica (2015) no qual
é descrito que a recomendação para o uso de ventilação mecânica invasiva (VMI)
acontece quando há necessidade de uma concentração de oxigênio maior que 60%,
acompanhado de desconforto respiratório grave. No que se refere aos parâmetros
altos de VMI, aqui destacados apenas a PIP, FR, PEEP e FiO2, o consenso
discorre que a melhora do volume pulmonar se inicia com o recrutamento dos
alvéolos seguida de estabilização alveolar para manter os pulmões abertos
durante o ciclo respiratório por meio dos ajustes do pico de pressão
inspiratória (PIP) e da PEEP [30].
Convém
ressaltar que após a administração do surfactante foi possível avaliar o aumento
da expansibilidade torácica (71%), devido a melhora da complacência pulmonar e
consequentemente redução dos parâmetros de ventilação.
Além da
DMH, a terapia de reposição de surfactante é utilizada em outras patologias
pulmonares em que existe a inibição do surfactante pulmonar, como a SAM e
hemorragia pulmonar, sendo o mecônio causador de alterações na vasculatura
pulmonar, incluindo remodelação e espessamento das paredes [24,27].
Nesse
estudo, os critérios utilizados para administração do surfactante exógeno no
tratamento dos RN foram baseados no quadro clínico. Todos os RN usaram
surfactante, sendo a patologia respiratória predominante para utilização da
terapêutica, a DMH (87,1%) e secundariamente a SAM (12,9%). Destes, 15
apresentaram melhora do quadro clínico após a primeira dose do surfactante, 12
após duas doses e um após a terceira dose, mostrando que não há associação
entre o número de doses recebidas e que o diagnóstico influi no critério do uso
do surfactante, mas não no número de doses.
Estudos
semelhantes ao presente sugeriram que a necessidade de nova dosagem de
surfactante varia e depende da condição clínica do RN. Grande parte dos
pediatras repetem a dosagem de surfactante de acordo com a gravidade da
insuficiência respiratória. Porém, ainda há informações limitadas sobre a
eficácia e os critérios clínicos para redosagem de
surfactante [26].
Geralmente,
há uma melhora clínica inicial após a administração do surfactante, porém,
horas depois, pode ocorrer a degradação da função pulmonar, exigindo
retratamento. Isso é necessário para neonatos, que oferecem maior consumo de
surfactante relacionado a uma condição radiológica mais grave e a uma condição
pulmonar mais grave, como aqueles com menor peso ao nascer [31].
Em
relação a técnica de administração, no presente estudo, todos os RN receberam a
dosagem por VMI (via endotraqueal), porém alguns autores em seus estudos
mostraram que o surfactante exógeno pode ser realizado por diversos métodos:
pela técnica que originou essa terapia, administrado pela cânula orotraqueal
(COT), permanecendo o RN em ventilação mecânica, sendo a técnica mais eficaz e
sua distribuição é feita de forma uniforme nos pulmões; com o método INSURE (intubation-surfactant-extubation) que consiste na entubação, aplicação do surfactante e extubação; pelo
método LISA (less invasive surfactant administration) e MIST
(minimally invasive surfactant therapies), o RN é
ventilado com CPAP, por meio de uma pronga nasal e o
surfactante é infundido na traqueia por um cateter; CALMEST (catheter and laryngeal
mask endotracheal surfactant therapy), o neonato é
submetido a uma máscara laríngea e um cateter, para a administração do
surfactante, e nela posicionado; e a técnica por aerossol e nebulização, que é
uma promessa para o futuro, porém por não serem confiáveis, não são aceitas
como indicação de rotina [27].
Nesse
contexto, o fisioterapeuta na UTI neonatal possui a finalidade de avaliar a
mecânica respiratória do neonato, proporcionando os cuidados necessários ao
mesmo, além de uma boa evolução da doença, tendo em vista a fragilidade desse
recém-nascido [6].
Conclui-se
que a Doença da Membrana Hialina foi o distúrbio respiratório mais encontrado
dentre os neonatos estudados. Diante disso, os critérios utilizados para o uso
do surfactante exógeno seguem as indicações necessárias e é administrado de
maneira adequada. Quanto a sua eficácia, é possível comprovar a evolução
positiva dos recém-nascidos após a utilização do medicamento, em boa parte com
apenas uma dose. Entretanto, convém ressaltar que foi notada a ausência de
outras práticas na administração do surfactante exógeno, estas que poderiam ser
feitas de maneira não invasiva e reduzir a necessidade de intubação. Outro
ponto a ser mencionado é que além da ação do fármaco, os atendimentos
fisioterapêuticos são de suma importância no processo evolutivo desses
neonatos.
Conflitos
de interesse
Sem
conflito de interesses
Fontes
de financiamento
Sem
financiamento
Contribuição
dos autores
Concepção
e desenho da pesquisa:
Reis EF, Borges JVD, Castro GC, Oliveira NA; Coleta de dados: Reis EF,
Borges JVD; Análise e interpretação dos dados: Mattos JGS, Santos NMF,
Castro GG, Oliveira NA; Análise estatística: Santos NMF, Castro GG;
Redação do manuscrito: Reis EF, Borges JVV, Mattos JGS, Santos NMF,
Castro GG, Oliveira NA; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo
intelectual importante: Castro GG, Oliveira AN