Fisioter Bras. 2023;24(2):215-30

doi: 10.33233/fb.v24i2.5169

REVISÃO

Análise dos desfechos do uso da banqueta durante o trabalho de parto: revisão sistemática

Analysis of outcomes with birthing stool during labor: literature review

 

Ramine Fagundes Baigorra1, Yasmin Podlasinski da Silva2, Magda Patrícia Furlanetto1

 

1Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter)

2Universidade Luterana do Brasil (ULBRA)

 

Recebido em 14 de maio de 2022; Aceito em 20 de fevereiro de 2023.

Correspondência: Yasmin Podlasinski da Silva, yasminpodlasinski97@gmail.com

 

Como citar

Baigorra RF, Silva YP, Furlanetto MP. Análise dos desfechos do uso da banqueta durante o trabalho de parto: revisão sistemática. Fisioter Bras. 2023;24(2):215-30 doi: 10.33233/fb.v24i2.5169

 

Resumo

Introdução: A humanização do parto é preconizada pelo Ministério da Saúde e incentivada dentro das maternidades. Com ela, várias técnicas e acessórios vem sendo utilizados, a fim de proporcionar à parturiente uma melhor experiência de parto. Um deles é a banqueta de parto que, ainda hoje em dia, apresenta opiniões contraditórias a seu respeito. Objetivo: Revisar sistematicamente os estudos publicados nos últimos 10 anos sobre o uso da banqueta de parto, principalmente durante o segundo estágio do trabalho de parto. Métodos: Revisão sistemática de literatura realizada através de busca bibliográfica digital em artigos científicos publicados em revistas eletrônicas, ensaios clínicos e estudos randomizados, no período compreendido entre os anos de 2011 a 2021, nas bases de dados eletrônicas PubMed, BVS, Scielo e PEDro. Resultados: A banqueta reduziu o tempo de trabalho de parto no 1º e no 2º estágio do trabalho de parto. Também apresentou maior frequência de parto vaginal espontâneo. Ela apresentou maior dor quando comparada com outras posições e também maior perda de sangue. Conclusão: O uso da banqueta mostrou-se benéfica quando analisados os desfechos tempo, episiotomia e parto vaginal espontâneo. Contudo, não apresentou resultados melhores que posições horizontalizadas para perda de sangue e dor.

Palavras-chave: trabalho de parto; parto humanizado; parto normal; dor do parto.

 

Abstract

Introduction: The humanization of childbirth has been advocated by the Ministry of Health and encouraged within maternity hospitals. With it, several techniques and accessories have been used in order to provide the mother with a better delivery experience. One of them is the birthing stool, which even today, presents contradictory opinions about it. Objective: To systematically review studies published in the last 10 years on the use of the birthing stool, especially during the second stage of labor. Methods: Systematic literature review conducted through a digital bibliographic search in scientific articles published in electronic journals, clinical trials and randomized studies, from 2011 to 2021, in the electronic databases PubMed, BVS, Scielo and PEDro. Results: The stool reduced labor time in the 1st and 2nd stage of labor. It also had a higher frequency of spontaneous vaginal delivery. She had more pain when compared to other positions and also more blood loss. Conclusion: The use of a stool proved to be beneficial when analyzing the outcomes of time, episiotomy and spontaneous vaginal delivery. However, it did not show better results than horizontal positions for blood loss and pain.

Keywords: labor, obstetric; humanizing delivery; natural childbirth; labor pain.

 

Introdução

 

      O parto é uma experiência única na vida da mulher. Ele vem carregado de emoções, expectativas, incertezas e mudanças, tanto no plano físico, mental e emocional, bem como em um âmbito social. Quando vivenciado plenamente, o parto inaugura novos aprendizados na vida da mulher e a busca por melhorar a ocasião do parto é uma maneira de não apenas empoderar a gestante, mas também de proporcionar maior conforto e segurança neste momento tão importante [1].

      Diversas transformações aconteceram no parto e na assistência ao parto ao longo dos séculos. Passaram da residência ao hospital, de um evento que envolvia parteiras a um evento médico, da não-medicalização à medicalização, da gestante como protagonista à gestante como objeto, sem poder de decisão [2]. Nas últimas três décadas, é perceptível a vontade de retomar as características naturais e fisiológicas do parto e do nascimento. E por esse motivo, surgiu um movimento de humanização do parto em todo o mundo [3].

      Humanizar o parto significa colocar a mulher no centro e no controle como sujeito de suas ações, participando íntima e ativamente das decisões sobre seu próprio cuidado [4]. Essas percepções são importantes para um modelo de atenção centrado na mulher, no qual toda a equipe deve apoiá-la em suas preferências, escolhas e decisões [2]. Desde 2011, o Governo Brasileiro instituiu a Rede Cegonha no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a fim de assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, assim como à criança, o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e desenvolvimento saudáveis [4].

      Em âmbito internacional, a Organização Mundial da Saúde (OMS) defende que, para uma boa condução do parto, os profissionais devem nortear sua prática nas melhores evidências científicas existentes e defende as “Boas Práticas de Atenção ao Parto e ao Nascimento”. Dentre elas, estão a liberdade de posição e movimentação durante o trabalho de parto, o estímulo às posições verticalizadas e a prática restritiva da episiotomia. Esse documento foi atualizado em 2018, e reforça a recomendação de que o profissional de saúde não deve impor uma posição de parto à mulher e, sim, estimular a livre escolha de posição, incluindo as verticais, priorizando o conforto e respeitando o desejo da mulher [5].

      Historicamente, antes do século XVII, as posições de parto eretas (agachada, ajoelhada, em pé, semisentada e sentada) eram as mais comuns em países ocidentais [1]. Com o advento de instrumentos obstétricos, como o fórceps, a posição supina tornou-se mais popular nesses países, pois permitia melhor assistência do médico à gestante e ao bebê [6]. Atualmente, 68% das parturientes realiza o parto em posição supina e apenas 32% dos partos acontecem em outros decúbitos, sendo 23% em posição semisentada, 4% sentada, em pé ou agachada, 3% em decúbito lateral e 1% eretas com as mãos apoiadas nos joelhos [7].

      Vários benefícios foram relatados no uso de posições verticalizadas, tais como o efeito da gravidade sobre o útero, menor risco de compressão aortocava, melhores resultados ácido-base em neonatos, contrações mais fortes e eficientes, melhor alinhamento do feto e aumento das dimensões da pelve, tanto anteroposterior quanto transverso. Portanto, as posições eretas facilitam o parto vaginal e trazem melhores resultados para mães e bebês, principalmente durante a segunda fase do trabalho de parto, que é o momento em que as lesões obstétricas acontecem [8].

      O Ministério da Saúde preconiza que, durante o parto humanizado, sejam usadas condutas para conforto e analgesia da gestante [9]. Dentre as opções de analgesia disponíveis é possível elencar práticas como imersão na água, massagem, acupuntura, musicoterapia, hipnose, aromaterapia e analgesia medicamentosa [9,10]. Existem outras técnicas e acessórios que vêm sendo amplamente utilizados dentro das maternidades, como, por exemplo, bola suíça, técnicas respiratórias, dança circular, deambulação e a banqueta de parto [11,12,13,14,15].

      A banqueta ou cadeira de parto, ou assento de parto, objeto deste estudo, é provavelmente o mais antigo aparelho postural obstétrico. Os registros mais antigos vêm do Egito, onde é mencionada em vários papiros médicos [16]. Sua utilização, no entanto, tem se mostrado contraditória na literatura [15]. Para Gupta et al. [15], ainda existem dados conflitantes sobre as possíveis vantagens e desvantagens do uso de uma banqueta de parto, pois os estudos realizados apresentam baixo número amostral ou não apresentam diferenças estatisticamente significativas quando comparada a posição de cócoras versus posições horizontalizadas. Segundo Rocha et al. [17], a posição horizontal (litotomia) deve ser utilizada com cautela, pois pode aumentar o risco de lacerações perineais graves e de intervenções obstétricas desnecessárias, tais como a episiotomia.

      Baseado nesse contexto e, com a finalidade de averiguar a real contribuição deste equipamento, este estudo tem por objetivo revisar sistematicamente os desfechos disponíveis na literatura nos últimos 10 anos sobre a utilização da banqueta na condução do trabalho de parto.

 

Métodos

 

            Trata-se de uma revisão sistemática de literatura realizada através de busca bibliográfica digital em artigos científicos publicados em revistas eletrônicas de ensaios clínicos (EC) e ensaios clínicos randomizados (ECR) de acordo com as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses (PRISMA, 2009), no período compreendido entre os anos de 2011 a 2021, nas bases de dados eletrônicas PubMed, BVS, Scielo e PEDro [18]. Foram selecionados estudos com idioma de publicação em português e inglês em diferentes estratégias para assegurar uma busca abrangente, conforme Tabela I. Pesquisas manuais também foram realizadas com base nas referências dos estudos incluídos. A questão norteadora deste estudo foi verificar os desfechos disponíveis na literatura quanto a utilização da banqueta na condução do trabalho de parto.

Tabela I - Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e operadores booleanos utilizados nas buscas em bases de dados

 

 

As buscas foram realizadas por dois avaliadores independentes que selecionaram os estudos potencialmente relevantes a partir dos títulos e resumos dos resultados obtidos nas bases de dados. Quando essas seções não forneceram informações suficientes para serem incluídas, o texto completo foi verificado. Posteriormente, os mesmos revisores avaliaram independentemente os estudos completos e realizaram a seleção de acordo com os critérios de elegibilidade, ou seja, o uso de uma metodologia que tenha envolvido uma intervenção voltada para o uso do assento de parto durante a fase ativa do trabalho de parto comparado com outros grupos que poderiam estar em qualquer outra posição. Os casos discordantes foram resolvidos por consenso. Autores, ano de publicação, participantes, tipo de intervenção e resultados das variáveis de interesse foram obtidos de forma independente pelos dois revisores, utilizando um formulário padronizado. A análise dos dados foi realizada de forma descritiva, procedendo-se a categorização dos dados extraídos em grupos temáticos a partir das variáveis de interesse.

      A qualidade metodológica e a confiabilidade estatística dos ensaios clínicos foram testadas através da escala PEDro, que é composta por 11 itens que são respondidos com o binômio “sim” ou “não” [19,20]. Cada item respondido como “sim” recebe a pontuação “1” (um) quando a questão corresponde aos critérios de avaliação, e a ausência dos critérios não recebe pontuação. Destes onze itens, nove são baseados na escala Delphi e dois foram inseridos, sendo um para verificar o período de acompanhamento (“follow-up”) e outro para a comparação entre grupos [21]. A escala utiliza o escore de 0 a 10, mas são utilizados apenas os itens de 2 a 11, visto que o item 1 não apresenta valor estatístico na escala PEDro, por se referir à validade externa. Nestes critérios estão incluídos aspectos como cegamento, acompanhamento, medidas de precisão e variabilidade, randomização, entre outros. A pontuação é aplicada apenas pela contagem dos números de itens que foram cumpridos, sendo assim quanto mais alta a pontuação recebida no estudo, melhor a qualidade apresentada (pontuação máxima de 10).

 

Resultados

 

      Na busca realizada, 164 referências foram localizadas, das quais 40 foram encontradas através de busca manual nos estudos incluídos por meio da seleção inicial. Dessas, 106 artigos foram oriundos na base de dados PubMed, e 96 foram excluídos, pois não se aplicavam ao tema ou faziam parte de um dos critérios de exclusão do estudo, 1 foi excluído por duplicidade, 9 foram excluídos após leitura do resumo. Na base de dados BVS foram encontrados 17 artigos: 2 foram excluídos por duplicidade, 14 foram excluídos, pois não se aplicavam ao tema e 1 não foi localizado. Na base Scielo, apenas 1 artigo foi localizado e foi excluído por não se aplicar ao tema. Nenhum artigo foi localizado na plataforma PEDro. Na busca manual foram encontrados 40 artigos, 35 foram excluídos após leitura do resumo, já que traziam desfechos diferentes dos pesquisados e 1 por não se aplicar ao tema. Por fim, 8 estudos foram selecionados e, após a leitura na íntegra, 4 foram excluídos por não contemplarem desfechos. Desta forma, 4 estudos foram selecionados como objeto de análise, por apresentarem aspectos que respondiam à questão norteadora. A figura 1 representa o fluxograma de pesquisa, que demonstra que destes quatro selecionados, um trata-se de um Ensaio Clínico (EC) e três foram Ensaios Clínicos Randomizados (ECR).

     

     

Figura 1 - Fluxograma de pesquisa. PRISMA, 2009 [18]

 

Características dos estudos incluídos e participantes

 

            A Tabela II descreve as fontes bibliográficas com seus respectivos locais, ano de publicação e as principais características de amostra das 4 publicações incluídas. Os estudos selecionados foram publicados entre os anos de 2011 e 2017 nos países Suécia, Irã e Inglaterra, todos no idioma inglês. Os artigos incluídos utilizaram a cadeira de parto durante o segundo estágio do trabalho de parto. Todos os artigos compararam o uso da cadeira de parto com outras posições e tiveram seus desfechos analisados incluindo dor, chance de parto vaginal, chance de parto instrumental, perda de sangue, entre outros.

      Dentre os artigos selecionados, dois usaram analgesia durante a primeira fase do trabalho de parto. Um deles comparou mulheres no assento de parto versus em qualquer outra posição horizontal (lateral ou em decúbito dorsal em ângulo de até 30 graus) para determinar se a posição vertical aumenta a chance de parto vaginal espontâneo. O outro comparou o assento de parto com qualquer outra posição e tinha por objetivo estudar a relação entre o aumento da ocitocina sintética e a perda de sangue materno. Os outros artigos que não usaram analgesia compararam o assento de parto com qualquer outra posição e estudaram se ela reduz o número de partos instrumentais, trauma perineal e perda de sangue. Por fim, o último artigo compara o parto em três posições (litotomia, sentada no assento de parto e agachada) e tem por objetivo comparar a intensidade da dor no segundo, terceiro e quarto estágio do trabalho de parto. Entre os estudos, o número de participantes variou de 96 a 3.236 e apresentaram mulheres a partir de 16 anos, até 35 anos ou mais.

 

Tabela II - Fontes bibliográficas identificadas, local de realização do estudo, tipo de estudo, número amostral, idade das participantes e desfechos investigados

 

EC = Ensaio Clínico; ECR = Ensaio Clínico Randomizado; EPTCG = Epidural and Position Trial Collaborative Group

 

Avaliação do risco de viés dos estudos

 

      No que se refere às pontuações obtidas por meio da Escala PEDro, os três ECR obtiveram média de 6 e um EC restante apresentou nota 4, considerando a pontuação máxima de 10 pontos. Nesta escala que avalia apenas EC e ECR, o critério que mais apresentou falha metodológica foi o parâmetro de cegamento, que avalia o recrutamento aleatório e cegado das intervenções e avaliações pré e pós-tratamento. Dos quatro trabalhos analisados, somente um apresentou pontuação menor do que 5 e um apresentou pontuação 7 - como a Escala PEDro tem seus principais fundamentos nos critérios de viés interno, a maior parte não obteve uma boa pontuação, conforme demonstrado no quadro 1.

     

Quadro 1 - Avaliação do risco de viés através da Escala PEDro [20]

Critérios de avaliação

 

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

Escore Total

EPTCG

2017/UK [22]

6/10

Valiani et al.,

2016/Irã [23]

4/10

Thies-Lagergren et al., 2012/Suécia [24]

5/10

Thies-Lagergren et al., 2011/Suécia [25]

7/10

 EPTCG = Epidural and Position Trial Collaborative Group. Símbolos em verde: “sim”; Símbolos em vermelho: “não”. Símbolos em cinza: não pontuam na Escala PEDro

 

Análise dos desfechos

 

      Os resultados obtidos em relação aos desfechos do uso da cadeira de parto, durante o trabalho de parto, e as principais conclusões estão dispostos na Tabela IV.

Tabela III - Resultados dos desfechos sobre o uso da cadeira de parto durante o processo do parto nas revisões selecionadas

 

Discussão

 

      Os quatro estudos selecionados para esta revisão abordaram os temas relacionados a diferentes posições de parto abordando tempo de duração do trabalho de parto (especialmente durante o segundo estágio) [14,27], possibilidade de lesões obstétricas (lacerações) [22,24,25], uso de instrumentação no parto (fórceps, vácuo) [25,27], episiotomia [22,24,25], uso de analgesia [14,27], encaminhamento para parto cesáreo [22,25], perda de sangue [24,25] e edema [24,25]. Apenas um dos trabalhos avaliou a dor nas quatro fases do trabalho de parto [23]. Desses estudos, dois foram realizados na Suécia [24,25], um no Irã [23] e um no Reino Unido [22].

      Em termos metodológicos, de acordo com a escala PEDro, um único estudo apresentou maior robustez e os demais foram classificados como moderados ou insatisfatórios. Dentre os indicadores de qualidade omissos estão principalmente o cegamento dos indivíduos que participaram, o cegamento dos terapeutas que administraram o recurso e também dos avaliadores. Alguns estudos também não apresentam critérios claros de aleatoriedade e de alocação de participantes. Estes critérios colocam em voga a importância da randomização e cegamento para um trabalho científico com maior confiabilidade e menor risco de viés. O estudo conduzido por Kamper et al. [26] ratifica o caráter crucial da randomização e do cegamento nos estudos, pois a aleatoriedade equilibra os fatores de confusão, assim como o cegamento diminui os riscos de viés e a influência sobre os resultados.

      Nesta pesquisa, o desfecho mais estudado foi o risco de lesões obstétricas com o uso de fórceps ou vácuo, descrito em quatro graus de laceração perineal. Destes, três [22,24,25] abordaram este tema e em nenhum dos grupos houve diferença significativa entre as posições de parto. Sabe-se que a lesão do esfíncter anal externo (EAE) trata-se do 4º grau de laceração e, quando comprometido, pode levar a eventos de incontinência urinária e fecal, disfunção sexual, dor e redução da qualidade de vida, bem como diminuição da força muscular do assoalho pélvico e prolapso dos órgãos pélvicos [27,28,29]. Ratificando estes achados, o estudo de Gupta et al. [15] também não apresentou diferença significativa no número de mulheres com lacerações perineais graves entre aquelas que deram à luz na posição vertical ou supina. No entanto, para Zang et al. [8], mulheres sem anestesia epidural e em posição vertical tendem a ter menor risco de trauma perineal grave, mas parecem ter um risco aumentado de lesões de 2º grau que atingem além de tecidos superficiais, a fáscia e a musculatura perineal.

      O tempo de trabalho de parto durante o 2º estágio foi abordado em dois estudos Thies-Lagergren et al. [24] e Epidural and Position Trial Collaborative Group [22]. Ambos os estudos foram realizados em nulíparas com peridural e encontraram diferenças de duração do 1º e 2º estágios do trabalho de parto no grupo que utilizaram a cadeira de parto [22,24]. Thies-Lagergren et al. [24] demonstraram redução do tempo nos 1º e 2º estágios, porém, no estudo conduzido por Epidural and Position Trial Collaborative Group houve menor duração do 2º estágio ativo no grupo em posição horizontal, mas não houve diferença significativa entre os grupos no período latente do 2º estágio [22,24]. Corroborando Thies-Lagergren et al. [24], o estudo de Zang et al. [8] analisou mulheres sem analgesia, e concluiu que posições eretas reduzem o tempo durante 2º estágio do trabalho de parto [24]. Para Kibuka et al. [29], analisando mulheres que receberam anestesia peridural, também não houve diferença significativa na duração do 2º estágio do trabalho de parto com base na posição, mas a qualidade dessa evidencia foi muito baixa. Tal resultado pode ser devido ao fato de que as epidurais tradicionalmente resultam em um 2º estágio de parto mais longo. E também na revisão sistemática de Gupta et al. [15], em mulheres sem analgesia, considerando posturas eretas, houve uma redução geral na duração do 2º estágio do trabalho de parto com uso da “birth cushion” (uma espécie de banco estofado), mas nenhuma diferença clara foi encontrada com o uso de cadeira de parto, banco de parto ou banco de cócoras.

      Diferentes tipos de parto foram abordados em três estudos, parto vaginal espontâneo, vaginal instrumental por fórceps ou vácuo e o vaginal com episiotomia e a cesárea [22,24,25]. Dois autores descreveram os desfechos em relação à incidência dos tipos de parto, ambos em nulíparas sem analgesia. Segundo o estudo de Thies-Lagergren et al. [25], 79,9% das parturientes se encaminharam para parto vaginal espontâneo. Já no estudo do Epidural and Position Trial Collaborative Group (2017), houve maior incidência de parto vaginal espontâneo no grupo com posição de parto horizontalizada [22]. Analisando os desfechos dos estudos para parto vaginal instrumental, com mulheres nulíparas, com ou sem analgesia, os resultados não foram significativos. Em contraponto, no estudo conduzido por Zang et al. [8], posições verticais reduziram o risco de parto vaginal instrumental, porém o resultado não foi robusto. De forma geral, os resultados demonstram que, em nulíparas e sem analgesia, o parto vaginal espontâneo ocorre com mais frequência.

      Em relação à episiotomia, os estudos analisados demonstram maior incidência em partos verticalizados, porém não houve diferença significativa entre os grupos [22,25]. Corroborando estes achados, Kibuka et al. [29] analisaram mulheres sem analgesia, e também não encontraram diferença significativa entre grupos que adotaram diferentes posições de parto. Estes mesmos estudos investigaram a possibilidade de encaminhamento para o parto cesáreo de emergência, comparando grupos em posições diferentes e em parturientes com e sem analgesia peridural, e os valores não foram significativos na comparação entre os grupos, apresentando baixos percentuais do procedimento nos dois trabalhos [22]. Segundo Kibuka et al. [29], em mulheres sem analgesia, há uma taxa 30% maior de parto cesáreo no grupo ereto.

      Três trabalhos se dedicaram a investigar outras situações clínicas de parto, incluindo dor, uso de analgesia e perda de sangue [23,24,25]. Foram realizados em mulheres nulíparas com e sem aplicação de anestesia peridural e, de modo geral, as parturientes eram mais propensas a ter perdas de sangue de 500 ml ou mais na posição vertical, principalmente entre 500-999 ml. O estudo de Valiani et al. [23], em mulheres primíparas e sem analgesia, avaliou a intensidade da dor (EVA) nos quatro estágios do trabalho de parto. Para o segundo estágio latente (fase de repouso e redução das contrações uterinas), tanto para intensidade quanto para frequência da intensidade da dor, um menor nível de dor foi relatado nas posições em agachamento ou litotomia e maior dor quando sentadas na cadeira de parto. Para o segundo estágio ativo (fase de contrações uterinas mais fortes e dos puxos), a frequência da intensidade da dor foi menor dor quando em agachamento e maior dor quando sentada ou litotomia (P = 0,024). Para o terceiro estágio, tanto para intensidade da dor quanto para frequência da intensidade da dor, ambos encontraram menor dor quando em agachamento e maior dor quando sentada ou litotomia. Para o quarto estágio, nenhum dos resultados foi significativo. Estes dados ressaltam que a posição sentada, dentre as estudadas, demonstrou maiores níveis de dor. Níveis de hemoglobina entre 36 e 48 horas pós-parto e de 8 a 12 semanas foram mensurados. Além disso, no estudo de Thies-Lagergren et al. [25], foram mensurados edema e os níveis de hemoglobina entre 36 e 48 horas pós-parto e de 8 a 12 semanas, em ambos os critérios, não houve diferença significativa entre os grupos.

      Diante desses achados, o acompanhamento de um fisioterapeuta durante o trabalho de parto tem se mostrado cada vez mais relevante, visto que é o profissional responsável por dar a parturiente mobilidade corporal e oferecer técnicas não farmacológicas de analgesia e conforto, bem como apoio físico, mental e afetivo. Tais condutas auxiliam a gestante a ter uma redução da percepção de dor e na redução do tempo do trabalho de parto. Por fim, ajuda a mulher a ter consciência de que seu corpo pode ser uma ferramenta para facilitar o parto e trazer-lhe satisfação com a experiência do nascimento [30]. Esses fatos reforçam cada vez mais a importância da presença da fisioterapia nas salas de parto como estratégia de segurança na prevenção de complicações e morbidades maternas e neonatais.

     

Conclusão

 

      Apesar da qualidade metodológica da maioria dos trabalhos ser de baixa a moderada, há um consenso de que a cadeira de parto tem sido responsável pelo aumento da perda de sangue no parto, inclusive relatado no estudo de maior rigor metodológico. A cadeira de parto foi responsável por maior presença de dor em relação a outras posições em todas as fases do parto. Apesar de haver uma redução do tempo de parto em mulheres nulíparas e com analgesia, durante o primeiro e segundo estágio do trabalho de parto, durante o 1º estágio este resultado é mais significativo. Cabe ressaltar que é no segundo estágio em que mais ocorrem as lesões obstétricas e o uso da cadeira de parto no primeiro estágio parece representar maior segurança. Em mulheres nulíparas e com analgesia, o uso da posição vertical foi protetora contra episiotomia e também para parto vaginal espontâneo. No entanto, o alto risco de viés dos estudos incluídos constitui uma limitação importante e, desta forma, é preciso avaliar a relação custo e benefício na utilização da banqueta no trabalho de parto.

 

Conflitos de interesse

Os autores declaram que não possuem conflitos de interesse ao realizarem esse estudo.

 

Fontes de financiamento

O estudo não recebeu financiamento, foi realizado por meios próprios dos autores.

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Baigorra RF, Furlanetto MP, Silva YP; Obtenção de dados: Baigorra RF, Furlanetto MP, Silva YP; Análise e interpretação dos dados: Baigorra RF; Furlanetto MP; Silva YP; Análise estatística: Baigorra RF, Furlanetto MP, Silva YP; Redação do manuscrito: Baigorra RF; Furlanetto MP; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Baigorra RF; Furlanetto MP, Silva YP

 

Referências

 

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