ARTIGO ORIGINAL

Associação entre fatores antropométricos e desempenho de escolares em tarefas motoras de equilíbrio

Association between anthropometric factors and the performance of schoolchildren in balance motor tasks

 

Monalisa da Silva Reis, M.Sc.*, Tailine Lisboa**, Juliano Maestri Alexandre**, Renata Capistrano**, João Otacilio Libardoni dos Santos, D.Sc.***, Thais Silva Beltrame, D.Sc.****

 

*Mestre em Ciências do Movimento Humano, Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis/SC, **Doutorando em Ciências do Movimento Humano UDESC, ***Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Manaus AM, ****Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis/SC

 

Recebido em 10 de dezembro de 2016; aceito em 21 de agosto de 2017.

Endereço para correspondência: Monalisa da Silva Reis, Centro de Ciências da Saúde e do Esporte, Rua Pascoal Simone, 358, Coqueiros, 88080-350 Florianópolis SC, E-mail: monalisareis-bassal@hotmail.com; Tailine Lisboa: tai-lisboa@hotmail.com; Juliano Maestri Alexandre: julianom.alexandre@gmail.com; Renata Capistrano: recapis@gmail.com; João Otacílio Libardoni dos Santos: jlibardoni@yahoo.com.br; Thais Silva Beltrame: tsbeltrame@gmail.com

 

Resumo

Objetivo: Verificar possiveis associações entre fatores antropométricos (IMC e tipo de pé) e o desempenho em tarefas motoras de equilíbrio. Métodos: Participaram do estudo 284 escolares, com oito anos de idade (55,6% do sexo masculino) matriculados em escolas públicas do Município de São José/SC. Para avaliar o equilíbrio foram utilizadas as tarefas específicas das baterias motoras MABC-2 e KTK; a base de apoio plantar foi avaliada por meio de um pedígrafo (PODO tech) e o índice de massa corporal (peso/estatura²). Para análise estatística foi utilizado o programa estatístico SPSS, sendo realizada uma estatística descritiva e inferencial. Resultados: Verificou-se que meninos apresentam 2,09 vezes mais chances de dificuldade nas tarefas de equilíbrio no teste MABC-2. Na tarefa caminhando sobre a trave os meninos e escolares acima do peso apresentaram 1,72 e 1,94 vez mais chance, respectivamente, de desequilíbrio quando comparados aos com peso normal. Em relação à tarefa salto monopedal escolares acima do peso apresentam 1,94 vez mais chance de dificuldade na tarefa. Conclusão: Os dados apontam que o estado nutricional e o sexo associam-se com a dificuldade em tarefas de equilíbrio, possivelmente sendo mais influente sobre o desempenho nessas tarefas do que as características morfológicas do pé, mesmo que essas apresentem diferenças na execução das tarefas.

Palavras-chave: crianças, equilíbrio, IMC, pé.

 

Abstract

Objective: To verify possible associations between anthropometric factors (BMI and foot type) and performance in motor tasks of balance. Methods: 284 schoolchildren participated in the study, with 8 years of age (55.6% male) enrolled in public schools of São José/SC. To evaluate balance, the specific tasks of the MABC-2 and KTK motor batteries were used; the base of plantar support was evaluated by means of a pedigraph (PODO tech) and the body mass index (weight/height²). For statistical analysis, the SPSS statistical program was used, and a descriptive and inferential statistic was performed. Results: We verified that boys presented 2.09 times more chances of difficulty in the tasks of MABC-2 balance. In the task walking on the crossbar the boys and schoolchildren above the weight presented 1.72 and 1.94 more chance, respectively, of imbalance when compared to children with normal weight. In relation to the task monopedal jump, overweight students presented 1.94 times more chance of difficulty on task. Conclusion: The data indicate that nutritional status and sex are associated with difficulty in balance tasks, possibly being more influential on performance in these tasks, than the morphological characteristics of the foot, even if they present differences in task performance.

Key-words: child, postural balance, body mass index, foot.

 

Introdução

 

O equilíbrio é uma função evolutiva importante que permite um maior repertório motor, considerado como primordial para as habilidades motoras fundamentais, sejam elas locomotoras, manipulativas ou estabilizadoras. Mantê-lo é um desafio constante para o ser humano, embora pareça simples é um processo complexo, pois exige um sistema apropriado para responder com rapidez e eficiência a perturbações, evitando quedas e lesões [1,2].

A diminuição da estabilidade durante a infância pode ocorrer devido às modificações nas proporções corporais diretamente relacionadas às alterações antropométricas e fisiológicas, aumentando a necessidade de readequação do equilíbrio corporal, causando danos no controle motor [1-6]. As alterações antropométricas e fisiológicas que ocorrem durante a infância são inúmeras, uma delas é o aumento da massa corporal. Durante esta fase o sistema musculoesquelético encontra-se em desenvolvimento, tornando-se sensível a deformidades devido ao aumento da massa corporal, diminuindo assim a estabilidade e aumentando a demanda de readaptação do corpo [4].

Outro aspecto também a ser destacado são alterações morfológicas dos pés, pois desde os primeiros meses de vida até sua especialização como estrutura de suporte e membro para a locomoção, o pé é fundamentalmente um órgão táctil que permite a criança explorar o ambiente. O pé é uma fonte constante de estímulos sensitivos originados do contato do pé com o exterior, os quais são conduzidos através do sistema nervoso e constituem a informação principal necessária para manter o equilíbrio durante a locomoção e o desempenho das atividades humanas [7]. Deste modo os pés configuram-se como essenciais na absorção de impacto, ajuste corporal e distribuição de forças, e mudanças em suas estruturas podem acarretar limitações no decorrer da vida prejudicando a marcha [8,9].

Neste contexto, é importante identificar estudos que buscam associar variáveis que interferem no equilíbrio, pois não há consenso sobre o nível de influência antropométrica no equilíbrio [10]. Além disso, sabe-se que o tipo de pé interfere no equilíbrio, porém não se sabe exatamente se são os pés planos, cavos ou normais [6]. Algumas pesquisas observaram que sujeitos com pés planos e cavos tendem a ter pior equilíbrio quando comparados a sujeitos com pés normais [10-12]. No entanto, sabe-se que a estatura, massa corporal, base de apoio plantar, largura e ângulo de abertura dos pés respondem por 84% da variação do equilíbrio corporal [13].

Portanto, é de suma importância a realização de estudos que buscam verificar a interferência de fatores antropométricos no equilíbrio, visto que a maior parte dos trabalhos encontrados na literatura procura avaliar o equilíbrio como meio de prevenção a quedas e lesões em idosos, sendo escassas as pesquisas relacionadas ao equilíbrio em crianças. Assim, o estudo teve como objetivo verificar possiveis associações entre fatores antropométricos (IMC e tipo de pé) e o desempenho em tarefas motoras de equilíbrio.

 

Material e métodos

 

O estudo é parte do projeto de pesquisa intitulado “Avaliação das tarefas de equilíbrio corporal associado a fatores antropométricos em crianças”. Aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UDESC, sob número 1.111.625.

Fizeram parte deste estudo escolares com 8 anos de idade, de ambos os sexos, matriculados no ensino fundamental I, em duas escolas públicas do Município de São José/SC. Os participantes deste estudo foram selecionados de forma intencional. A escolha das escolas atribuiu-se a viabilidade quanto ao custo da pesquisa, à parceria do grupo de avaliadores e ao tempo da coleta. Foram aceitas crianças cujos pais e/ou responsáveis tivessem assinado o Terno de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que não apresentassem algum tipo de comprometimento motor, bem como a disposição da criança em participar das atividades.

Para a avaliação de equilíbrio, foram utilizadas tarefas específicas das baterias: Movement Assessment Battery for Children (MABC-2) [14] e Korperkoordinationstest fur Kinder – (KTK) [15].

O MABC-2 é uma bateria de testes que avalia o desempenho motor em crianças entre 3 e 16 anos de idade. O teste possui tarefas específicas e diferenciadas para cada faixa etária. O MABC-2 é composto por tarefas de destreza manual, habilidades de lançar/receber e equilíbrio (estático e dinâmico). Para este estudo foi utilizado somente tarefas que avaliam o equilíbrio estático e dinâmico (caminhando sobre a linha reta, equilíbrio na tábua e salto no tapete). Assim, a descrição dos dados é analisada da seguinte forma, nas tarefas de equilíbrio quanto maior o escore bruto, maior o escore padrão. Em relação à somatória de cada componente, uma maior pontuação indica um maior escore padrão e, consequentemente, um maior percentil.

Como resultados deste protocolo os escores são classificados por meio de um percentil e uma avaliação descritiva do desenvolvimento geral podendo enquadrar o sujeito: Abaixo de 5% com dificuldades de equilíbrio (CDE); entre 5 e 15% em risco de equilíbrio(RE) e acima de 15% sem dificuldades no equilíbrio (SDE).

O KTK é um instrumento composto por quatro tarefas (traves de equilíbrio, saltos monopedais, saltos laterias e transferência sobre plataforma). Neste estudo foram utilizadas as tarefas trave de equilíbrio e saltos monopedais. A tarefa trave de equilíbrio consiste em caminhar a retaguarda sobre três traves com espessuras diferentes. Para cada trave são contabilizadas três tentativas válidas. Durante a execução da tarefa conta-se a quantidade de passos dados podendo atingir 8 pontos em cada tentativa somando 72 pontos como pontuação máxima. O salto monopedal consiste em saltar com um único pé, primeiramente com o preferido e depois com o não preferido, por cima de placas (espumas) sobrepostas transversalmente à direção do salto, colocadas à medida que o sujeito obteve êxito e atribuídos de 0 a 3 pontos decorrentes do sucesso nas tentativas, somando no máximo 72 pontos. Os escores relacionados às tarefas incluem dados brutos, padrão e percentil, e quanto maior o escore obtido pelo participante, melhor é seu desempenho [16].

Para fins de análises estatísticas, conforme o objetivo do trabalho, as tarefas do equilíbrio da bateria MABC-2 são classificadas em dificuldade de equilíbrio; risco de dificuldade de equilíbrio e equilíbrio normal. Escolares que apresentaram dificuldade ou risco de equilíbrio foram classificados como (com dificuldades) e escolares com equilíbrio normal classificaram-se como (sem dificuldade). As tarefas do teste KTK são classificadas em (perturbação do equilíbrio; insuficiência do equilíbrio; equilíbrio normal; equilíbrio bom e equilíbrio muito bom); escolares cuja classificação foi perturbação e insuficiência de equilíbrio foram classificados como (com dificuldade) e escolares com equilíbrio normal, equilíbrio bom e equilíbrio muito bom foram classificados como (sem dificuldade).

Para a identificação do tipo de pé foi utilizado o pedígrafo marca PODO Tech. Para a análise foi utilizado o índice de Chippaux-Smirak (ICS), que é o resultado da divisão entre a menor largura do médio pé e a maior largura do antepé. Este classifica em arco elevado (ICS = 0% pé cavo), morfologicamente normal (ISC entre 0,1 e 29,9%), intermediário (entre 30,0 a 39,9%), rebaixado (entre 40,0 a 44,9%) e pé plano (a partir de 45%). Pés indicando arco intermediário também são classificados como arco normal. Para o estudo os escolares foram classificados em dois grupos (pés normais e pés planos), considerando-se como pés normais escolares que apresentaram arco plantar entre 0,1% a 39,9% e pés planos arcos acima de 40,0% [17].

A massa corporal foi mensurada por uma balança marca Tânita e a estatura por um estadiômetro profissional Sanny, para cálculos do IMC (peso/estatura²). O índice de massa corporal foi classificado por meio dos valores utilizados por Cole et al. [18,19] que classifica o IMC em baixo peso, eutrofia, sobrepeso e obesidade. Assim, no presente estudo escolares que apresentaram sobrepeso e obesidade foram classificados como (acima do peso) e escolares eutróficos.

Foram realizadas reuniões com a equipe pedagógica para exposição dos objetivos da pesquisa, bem como para informação sobre os turnos disponibilizados pela escola para a coleta de dados. As avaliações ocorreram em ambiente adequado e iluminado cedido pela escola no período de setembro a dezembro.

As avaliações tiveram um tempo total de 30 a 40 minutos, variando de acordo com a habilidade dos escolares para a realização das tarefas. Os testes foram aplicados individualmente por avaliadores previamente capacitados, seguindo a ordem dos protocolos. Primeiramente foram realizadas as avaliações antropométricas (massa corporal e estatura) e antropometria dos pés, seguindo das tarefas de equilíbrio (caminhando sobre a linha, saltando em tapete, equilíbrio na tábua, andando de costas sobre a trave e salto monopedal).

A identificação dos participantes foi registrada por números, de modo a preservar os escolares e atender aos princípios éticos. O retorno das informações à escola e aos alunos (e seus responsáveis) aconteceu por meio de relatórios individuais e gerais, nos quais foram descritos os objetivos do estudo, os resultados das avaliações e sugestões.

Os dados foram analisados no programa estatístico SPSS, versão 20.0. Para caracterização dos dados foi utilizado à estatística descritiva (média, desvio-padrão e distribuição de frequência). A normalidade dos dados foi verificada por meio do teste Komolgorov-Smirnov para amostras com n>50. Para as análises estatísticas as classificações das tarefas de equilíbrio foram agrupadas em (sem dificuldade e com dificuldade) e o índice de massa corporal em (normal e acima do peso). Para comparar as médias entre os grupos, usou-se o teste U de Mann Whitney. Para identificar os fatores associados à variável dependente (tarefas de equilíbrio) utilizou-se o teste Qui-quadrado e regressão logística binária, com método enter. Foi realizada análise bruta para cada variável independente e posteriormente análise ajustada por todas as variáveis. Para todas as análises foi adotado o nível de significância de p < 0,05.

 

Resultados

 

Ao comparar o desempenho dos escolares nas tarefas de equilíbrio considerando o tipo de pé foi possível observar diferenças estatisticamente significativas com médias superiores para escolares com pé normal (Tabela I).

 

Tabela I - Comparação das variáveis de equilíbrio entre os grupos pé plano e pé normal.

 

*valor de p teste U-mann Whitney nível de significância p<0,05; DP = Desvio-Padrão.

 

Nas associações entre o desempenho dos escolares nas tarefas de equilíbrio com sexo, IMC e tipo de pé (Tabela II) foram encontrados resultados significativos (p < 0,05) do sexo com os valores brutos do conjunto de tarefas do equilíbrio do teste MABC-2. O teste trave de equilíbrio do KTK apresentou associação entre sexo, IMC e tipo de pé. E no teste salto monopedais do KTK somente a variável IMC associou-se significativamente.

 

Tabela II - Associação do desempenho dos escolares nas tarefas de equilíbrio com sexo, IMC e tipo de pé.

 

*p-valor referente ao teste Qui-quadrado.

 

Na Tabela III, é possível observar o efeito bruto e ajustado dos possíveis preditores para o desempenho nas tarefas do MABC-2. Na análise bruta, o sexo masculino apresentou-se associado ao desfecho. Após o ajuste por todas as variáveis, observou-se que escolares do sexo masculino (OR = 2,09; IC95%: 1,07-4,10) apresentaram 2,09 chances de terem dificuldade em realizar o conjunto de tarefas de equilíbrio do MABC-2, quando comparados aos do sexo feminino independentemente do IMC e do tipo de pé. Logo nessas tarefas percebemos pouca influência do IMC e do tipo de pé.

 

Tabela III - Razão de chance bruta e ajustada para o escore padrão do MABC-2 com sexo, IMC e tipo de pé.

 

*p-valor<0,05, a análise ajustada para todas as variáveis.

 

Na Tabela IV são apresentados os resultados da análise de regressão logística para a dificuldade de caminhar sobre a trave em relação ao sexo, IMC e tipo de pé. No modelo simples, foi verificada associação da dificuldade de caminhar sobre a trave e todas as variáveis. Quanto ao modelo ajustado para todas as variáveis, a dificuldade de caminhar sobre a trave manteve-se associada ao sexo e IMC, mostrando que escolares do sexo masculino apresentam 1,72 chances de terem dificuldade na tarefa. E escolares em geral acima do peso apresentam 1,94 chances de desequilíbrio.

 

Tabela IV - Razão de chance bruta e ajustada entre dificuldade no Caminhar sobre a trave no KTK com sexo, IMC e tipo de pé.

 

*p-valor<0,05. a análise ajustada para todas as variáveis.

 

Em relação à dificuldade no salto monopedal, os resultados da regressão logística mostram que na análise bruta apenas o IMC apresentou associação com o desfecho. Quando realizada a análise ajustada, a dificuldade no salto manteve-se associada com IMC, e os escolares acima do peso apresentaram 1,94 chance de desequilíbrio no salto sobre a espuma quando comparada a crianças com peso normal, independentemente do sexo e do tipo de pé (Tabela V).

 

Tabela V - Razão de chance bruta e ajustada entre dificuldade no salto monopedal no KTK com sexo, IMC e tipo de pé.

 

*p-valor<0,05. a análise ajustada para todas as variáveis.

 

Discussão

 

O presente estudo teve como objetivo verificar possiveis associações entre fatores antropométricos (IMC e tipo de pé) e o desempenho em tarefas motoras de equilíbrio. Dentre os pontos fortes do estudo, destaca-se a análise de possíveis associações de fatores antropométricos com o desempenho nas tarefas de equilíbrios, uma vez que o equilíbrio corporal é apontado como uma capacidade de suma importância para a execução de demais competências motoras [1].

Os resultados apontam diferenças entre os grupos (pés planos e normais) nas tarefas de equilíbrio do teste MABC-2 (caminhando sobre a linha, equilíbrio na tábua pé direito e esquerdo) e nas tarefas do teste KTK (andando de costas nas traves), observando médias melhores para os grupos com pés normais. Crianças com pés planos podem sofrer alterações no equilíbrio corporal, pois tendem a realizar movimentos descoordenados e irregulares, caracterizando um equilíbrio ineficaz e postura inadequada [18]. Sujeitos com pés cavos e planos apresentam pior equilíbrio postural, quando comparados àqueles que possuem pés normais [19].

Devido ao desenvolvimento, no decorrer da infância há uma série de alterações nas dimensões e formato dos pés [20]. As alterações nas estruturas dos pés e arcos plantares podem causar limitações no decorrer da vida [8]. Deste modo, os pés apresentam-se como estruturas fundamentais na distribuição de forças, absorção e ajustes posturais, intermediando condições de equilíbrio, e os arcos plantares podem interferir nessa biomecânica prejudicando o apoio e marcha [9].

Além disso, foi possível identificar que entre os meninos 21,5% apontaram dificuldades nas tarefas de equilíbrio do MABC-2 e 50,6% na tarefa de andar de costas nas traves, valores significativamente maiores que apontados como dificuldade entre o sexo masculino. Um estudo realizado na região sul do Brasil, com 380 escolares com idade média de 8,5 anos, mostrou que meninos apresentaram uma tendência de desempenho mais fraca do que as meninas nas tarefas de equilíbrio do teste MABC-2 [21]. Estudo realizado por Carminato [22], o qual avaliou o desempenho motor de escolares de 7 a 10 anos de ambos os sexos, identificou que sujeitos do sexo masculino apresentaram índice abaixo do esperado nas tarefas de equilíbrio. No entanto, no teste de salto monopedal obtiveram melhores resultados quando comparados com as meninas. Já para o presente estudo não foi possível identificar associações significativas entre os sexos para a referida tarefa. Nesse contexto Gorla, Duarte e Montagner [23] ao avaliar a coordenação motora de 283 escolares de 6 a 8 anos de ambos os sexos, constataram que meninas apresentaram melhores médias quando comparadas aos meninos, com exceção na idade de 8 anos, na qual meninos apresentaram média superior nos saltos monopedais.

Essas diferenças entre os sexos nas habilidades motoras estão associadas a fatores biológicos, culturais e cobranças do ambiente em que meninos e meninas estão inseridos [24]. Dentre os aspectos biológicos pode-se destacar que a maturação das estruturas corporais, no que diz respeito à idade óssea, no sexo feminino, aponta um amadurecimento etário adiantado ao comparar com o sexo masculino [25]. Considera-se ainda que os meninos sejam encorajados a praticar atividades que exigem maior repertório motor em movimento amplo, como: correr, saltar e jogar [26], enquanto as meninas se apropriam de tarefas mais minuciosas, que exijam concentração e equilíbrio [22], o que é o caso das tarefas dos testes empregados.

Outro fator que se mostrou interferente nas tarefas de equilíbrio é o índice de massa corporal. O índice de massa corporal elevado tende a limitar o desempenho motor, principalmente em tarefas que demandam a projeção do corpo, como: saltos, corridas, e levantamento do corpo [27]. Corroborando Zhu, Wu e Cairney [28], ao investigar possíveis associações entre coordenação motora e IMC em crianças taiwanesas, observaram que tanto meninos, quanto meninas apresentaram pobre coordenação motora devido ao aumento do IMC, sendo evidente nas avaliações do equilíbrio postural.

Castetbon e Andreyeva [29] avaliaram 9.800 crianças de 4-6 anos nos Estados Unidos e encontraram uma associação entre as habilidades motoras e estado nutricional. Resultado similar foi encontrado no estudo de Graf et al. [30] ao investigar 669 crianças alemãs entre 5-8 anos de idade. Tais estudos reportam que crianças com IMC elevado apresentam dificuldades na locomoção e em atividades que envolvam saltos. Luz et al. [31] encontraram associação positiva entre os maiores valores do IMC e o menor desempenho nas tarefas no teste KTK. Berleze, Haeffner e Valentini [32] verificaram em seu estudo que crianças com IMC elevado, apresentaram desvantagem ao executar tarefas motoras, dentre elas saltar, correr, arremessar e equilibra-se. A falta de estabilidade pode explicar as dificuldades durante as atividades diárias, devido ao aumento da força relacionada ao peso corporal e a problemas ortopédicos [33].

As limitações encontradas no presente estudo foram à ausência de investigar a maturação biológica, maturação óssea, hábitos de vida e atividades extracurriculares praticadas pelos escolares, as quais podem interferir no equilíbrio postural. Ressalta-se, ainda que essas limitações necessitem ser consideradas em futuros estudos. No entanto os resultados apontados destacam a importância da avaliação da pressão plantar e outros fatores antropométricos, pois tem um grande potencial para predizer alterações durante as tarefas de equilíbrio e locomoção, proporcionando subsídios para a compreensão do fenômeno, e para a elaboração de novos estudos expandindo para outras idades, incluindo também avaliações de outras variáveis que possam interferir no equilíbrio postural de crianças.

 

Conclusão

 

Os dados do estudo indicam que crianças com sobrepeso indicaram maior chance de dificuldade nas tarefas de equilíbrio do KTK. Foi possível, também, identificar que, para as tarefas de equilíbrio do MABC-2, os meninos apontaram mais chances de dificuldade, quanto ao tipo de pé; apenas na análise bruta foi possível identificar associação com dificuldade nas tarefas caminhar de costas sobre a trave; no que se refere ao ajuste por sexo e IMC se sobressaem quanto ao tipo de pé. Desta forma o estudo contribui para investigações sobre o tema, uma vez que corrobora indícios anteriores em que aponta que o estado nutricional e o sexo associam-se com a dificuldade em tarefas de equilíbrio, possivelmente sendo mais influente sobre o desempenho nessas tarefas do que as características morfológicas do pé, mesmo que essas apresentem diferenças na execução das tarefas.

 

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