ARTIGO ORIGINAL

Reprodutibilidade interavaliador do teste de discriminação de dois pontos na região plantar

Intra-observer reproducibility of two-point discrimination test on the sole of the foot

 

Armando Ferreira Filho, Ft.*, Airton Fialho da Silva, Ft.*, Guilherme Eckhardt Molina, D.Sc.**, Adriano Drummond, M.Sc.***

 

*Centro Universitário Euro Americano (UNIEURO), Brasília/DF, **Docente da Universidade de Brasília,***Docente do UNIEURO

 

Recebido em 29 de abril de 2014; aceito em 15 de setembro de 2014.

Endereço para correspondência: Armando Ferreira Filho, Centro Universitário Euro Americano (UNIEURO), Avenida das nações, trecho 0 conjunto 05, Brasília DF, E-mail: affisio09@hotmail.com, Guilherme Eckhardt Molina: gmolina@unb.br

 

Resumo

Introdução: A avaliação sensitiva periódica permite detectar perdas sensoriais para acompanhar a evolução do quadro. O teste de discriminação de dois pontos (DDP) é um teste clássico, de fácil aplicação e baixo custo, que determina a sensibilidade tátil funcional, e a reprodutibilidade deste pode facilitar o acompanhamento do tratamento e das condutas adotadas. Objetivo: Verificar a reprodutibilidade interavaliador do DDP em idosos institucionalizados e em jovens adultos. Material e métodos: Foram selecionados 12 idosos residentes em uma Instituição de Longa Permanência (grupo 1 – G1) e 24 adultos jovens (grupo 2 – G2), os quais foram submetidos ao teste DDP por meio do aparelho TouchTest®, por dois avaliadores. Para o tratamento estatístico dos dados, aplicou-se o teste de normalidade pelo método Shapiro-Wilk, e teste T para amostras independentes, com nível de significância p < 0,05; e os resultados processados pelo programa SPSS, versão 13. Resultados: No G1 pôde-se perceber uma tendência para que houvesse diferença dos resultados obtidos entre os avaliadores (p = 0,08); no G2 p = 0,95 praticamente não houve diferença entre os resultados (p = 0,95). Conclusão: O teste de DDP mostrou-se reprodutível quando aplicado interavaliador para a mensuração da sensibilidade plantar de idosos e adultos jovens.

Palavras-chave: Fisioterapia, propriocepção, percepção do tato, idoso, sensibilidade.

 

Abstract

Introduction: Periodic sensory evaluation allows detecting sensory loss to follow the evolution of the clinical picture. The test of two-point discrimination (2PD) is a classic, easy to use and low cost one, which determines the functional tactile sensitivity and reproducibility of this can facilitate monitoring, treatment and conduct adopted. Aim: To verify inter-observer reproducibility of 2PD in institutionalized elderly and young adults. Methods: Twelve elderly from a long-stay institution (group 1 - G1) and 24 young adults (group 2 - G2) were select and performed the 2PD through TouchTest™ device, by two evaluators. For statistical treatment of data, we applied the normality test Shapiro - Wilk method and T-test for independent samples, with significance level p < 0.05 and processed using SPSS 13 version. Results: In G1 we could notice a tendency for there to be differences of results between evaluators (p = 0.08), in G2 we did not observe difference between the results (p = 0.95). Conclusion: The test 2PD proved reproducible when applied inter-evaluator for measurement of plantar sensitivity of elderly and young adults.

Key-words: Physical Therapy, proprioception, touch perception, elderly, sensibility.

 

Introdução

 

A Organização das Nações Unidas estima que, em 2050, 22,1% da população mundial terá sessenta anos ou mais. Com o envelhecimento, vários fatores interferem na capacidade funcional e na qualidade de vida dos idosos, dentre eles estão as alterações nas estruturas anatômicas e fisiológicas dos pés, que desenvolvem uma instabilidade postural e um aumento maior no risco de quedas. As modificações que ocorrem nos pés dos idosos podem ser decorrentes de doenças sistêmicas, de transtornos da marcha, maus tratos ou traumatismo nos pés, os quais comprometem a integridade da pele, dos nervos, dos vasos e das estruturas ósseas [1].

Com o envelhecimento, há a redução do número de mecanorreceptores nos pés e o aumento do limiar de excitabilidade vibratória e cutânea plantar, causando, assim, alteração do equilíbrio corporal. O cérebro emite reflexos posturais para manter o equilíbrio e a postura do corpo conforme as informações recebidas pelos mecanorreceptores localizados na região plantar, pois codifica as mudanças de pressão [2].

A avaliação sensitiva é um recurso muito útil para o auxílio ao diagnóstico da perda da sensibilidade e, associadamente, do desequilíbrio corporal, pois os distúrbios ocorrem em todas as formas clínicas. Quando realizada periodicamente, permite detectar alterações sensoriais e acompanhar a evolução do quadro. Os resultados obtidos fornecem parâmetros para avaliar os efeitos do tratamento realizado [3].

Estudos demonstram que há correlação entre alteração de sensibilidade cutânea plantar e distúrbios do equilíbrio em indivíduos com queixas de sensibilidade, com doenças neurológicas ou sistêmicas e, principalmente, com Diabetes Mellitus. Idosos saudáveis podem apresentar redução significativa da sensibilidade cutânea plantar e, por consequência, o desequilíbrio [4].

A sensação de instabilidade provoca medo de cair, comprometendo a qualidade de vida, principalmente se o idoso já caiu alguma vez. O risco de queda nos idosos é acentuado devido às doenças sistêmicas, à degeneração neurossensorial e às alterações neuromusculares. A queda leva o idoso a uma redução de mobilidade, aumento do sedentarismo, dentre várias outras consequências, gerando um círculo vicioso [2].

Assim sendo, acerca da avaliação da sensibilidade plantar, a densidade de inervação das fibras de adaptação lenta e a dos receptores cutâneos presentes na pele estão diretamente ligadas com a distância percebida entre as duas pontas das hastes do aparelho Touch-test TM (figura 1), uma vez que quanto menor a distância entre elas maior é a densidade das fibras e a quantidade de receptores na área [5].

 

Figura 1 - Aparelho Touch Test.

 

 

O DDP é clássico, de fácil aplicação e baixo custo e é utilizado para detectar pequenos déficits sensitivos não diagnosticados por outros testes [3]. Trata-se de um instrumento rígido de hastes, com pontas móveis que são levemente posicionadas sobre a área avaliada [6]. O teste é frequentemente associado à utilização dos monofilamentos de Semmes-Weinstein (estesiometria) e da percepção de vibração, fazendo parte de alguns protocolos de avaliação da sensibilidade cutânea. Mais recentemente foi empregado em estudo sobre pé diabético [7].

Ferreira et al. [8] em sua pesquisa, sugeriu que o DDP associado ao Pressure Specified Sensory Device (PSSD) é útil para examinar pacientes diabéticos com neuropatias em membros inferiores e fornecer diagnóstico da progressão da morbidade, assim como para o estudo crítico e desenvolver tratamento.

Vale ressaltar que já houve a preocupação de se avaliar a reprodutibilidade do DDP intra-avaliadores, confirmando a possibilidade de uso do instrumento com segurança [6]. O que proporcionou a hipótese de discussão sobre a reprodutibilidade interavaliadores.

Diante do exposto, o objetivo desta pesquisa foi verificar a reprodutibilidade interavaliadores do teste de discriminação de dois pontos em idosos institucionalizados e adultos jovens.

 

Material e métodos

 

Trata-se de um estudo transversal do tipo cego, com a participação de idosos residentes na Instituição de Longa Permanência Lar Maria Madalena (Núcleo Bandeirantes/DF). Voluntariaram-se 17 idosos, mas somente 12 foram selecionados para a coleta dos dados. Dos 42 jovens voluntários, estudantes do Centro Universitário Euro Americano – Unieuro (Brasília/DF), somente 24 foram considerados aptos.

Como critérios de inclusão consideraram-se: idosos que obtiveram 27 pontos ou mais no Mini Exame do Estado Mental (minimental) [9], residentes da referida instituição; e adultos jovens considerados não sedentários de acordo com o Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ) [10]. Os critérios de exclusão foram: participantes com alterações cognitivas, com lesões nervosas periféricas, amputações de extremidades inferiores, sequelas de alterações e síndromes neurológicas e aqueles que apresentaram úlceras nas regiões do pé correspondentes ao teste de sensibilidade, e participantes que não compareceram para o segundo momento da coleta de dados.

Para a coleta dos dados foi utilizado um aparelho discriminador de dois pontos tipo Touch-test TM, modelo NC 12776, medidas de 1 a 25 mm, North Coast Medical (Figura 1) como se pode ver na figura 1.

Os pesquisadores coletaram os dados dos idosos em duas visitas realizadas no Lar Maria Madalena com um intervalo de 24 horas entre elas. Em cada uma delas os dados foram colhidos por pesquisadores diferentes. Nos dois momentos o protocolo de coleta foi o mesmo.

Da mesma forma, a coleta de dados dos jovens foi realizada em duas visitas à Clínica Escola de Fisioterapia do Unieuro, com intervalos e protocolos idênticos aos dos idosos.

Os resultados eram colocados em uma caixa selada e analisada por um terceiro pesquisador, evitando que, durante os testes, aqueles que avaliaram a sensibilidade tivessem acesso aos dados e, portanto, não fossem influenciados.

Antes da realização do DDP, para melhor acomodação dos tecidos plantares e para se evitar movimentos que afetassem a sensibilidade cutânea, os participantes foram orientados a permanecerem por aproximadamente 3 minutos em repouso na posição de decúbito ventral, o que impediu que o voluntário visualizasse o teste.

O aparelho foi posicionado de forma que somente uma ou duas pontas das hastes tocassem ao mesmo tempo a área a ser avaliada sem que o avaliador fizesse pressão excessiva. Somente o peso do aparelho devia ser aplicado sobre a área avaliada.

A cada posicionamento do aparelho o participante foi questionado se uma ou duas hastes estavam tocando a pele. Foram testadas três vezes aleatoriamente cada distância. Considerou-se como a menor distância aquela que o participante identificou no mínimo duas vezes em três tentativas.

Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Unieuro sob o parecer número 266.098, datado de 07 de Maio de 2013.

Para análise dos dados, primeiramente os dados foram tabulados no programa Excel®, posteriormente foi aplicado o teste de normalidade para o método, Shapiro-Wilk, para distribuição normal. Ainda, utilizou-se o teste T-student para amostras independentes, com nível de significância menor que 0,05 (p < 0,05). Para análise estatística utilizou-se o software SPSS (Statistical Package for Social Science) versão 13.

 

Resultados

 

De acordo com o critério de inclusão e exclusão foi possível estabelecer um grupo controle com jovens (G1) com uma amostra de 24 voluntários (n = 24 dos quais 67% mulheres e 33% homens) e uma amostra de idosos (G2) com 12 voluntários (n = 12 dos quais 17% mulheres e 83% homens), conforme descrito na Tabela I.

 

Tabela ICaracterização dos grupos.

 

G1 = Grupo de jovens; G2 = Grupo de idosos; DP = desvio padrão.

 

 

Os resultados do teste DDP apresentam insignificância estatística de acordo com as Tabelas II e III. Contudo há uma tendência de diferença estatística entre avaliadores do G1, diante do valor de p.

 

Tabela II - Média de distância (em milímetros) referida pelos voluntários (grupo de jovens).

 

 

Tabela III - Média de distância (em milímetros) referida pelos voluntários (grupo de idosos).

 

 

Discussão

 

Observou-se que não houve diferença significativa entre os resultados colhidos pelos avaliadores com o teste DDP utilizando o aparelho Touch-test, indicando a possibilidade de reprodutibilidade entre avaliadores. Já no estudo realizado [11] para a avaliação da reprodutibilidade e sensibilidade intra e interavaliador do teste de sensibilidade cutânea com DDP e monofilamentos de Semmes-Weinstein, em pessoas assintomáticas, houve alta variação dos resultados entre eles.

Há controvérsias sobre a confiabilidade nos resultados do teste DDP[6], acerca da padronização da técnica, bem como é questionado o próprio uso do aparelho para se avaliar sensibilidade tátil [11]. Diante disso, os avaliadores deste estudo optaram por não aplicar pressão sobre o discriminador durante o teste, além do próprio peso do aparelho, deixando que as duas pontas das hastes tocassem a pele simultaneamente. Desta forma, buscou-se reduzir as possibilidades de diferentes pressões exercidas pelos distintos pesquisadores.

Assim, o resultado do teste interavaliador neste estudo apresentou pequena diferença, não significativa estatisticamente (p > 0,05), entre as médias da distância, obtidas pelos avaliadores e a serem conferidas nas Tabelas II e III. Contudo, na tabela III, pode-se analisar que houve maior similaridade dos resultados entre avaliadores com o grupo de idosos do que com o de jovens. Semelhante resultado foi obtido em outro estudo [6], no qual se discute a possibilidade deste fato ter relação com a própria integridade nervosa dos jovens, o que leva os autores a perceberem melhor pequenas alterações de estímulos, percepção esta que pode estar comprometida nos idosos.

Os métodos de medição do limiar de sensibilidade e discriminação tátil são padrões para avaliação da mão após lesão de nervo. Foi comprovada a confiabilidade do DDP no resultado da avaliação interavaliador para testar a sensibilidade da mão em estudo comparativo com outros testes. A avaliação da sensibilidade da mão pode ser obtida com a medição da vibração e do limiar de pressão cutânea, DDP e identificação do objeto [13,14].

Em pesquisa realizada para comparar o desempenho dos sistemas sensoriais e motor entre jovens e idosos e identificar as contribuições das possíveis diferenças para o controle postural, constatou-se que os idosos tiveram menor sensibilidade dos pés e pior controle postural do que os jovens, já que com o envelhecimento são esperadas alterações nestes sistemas [15]. No presente estudo, embora o G1 seja constituído de um número maior de voluntários em relação ao G2, verificou-se maior variação entre os dados aferidos no grupo dos idosos.

A facilidade da avaliação quantitativa do teste DDP com este aparelho vem somar-se à praticidade e à confiabilidade do resultado comparada à avaliação da sensibilidade realizada com testes quantitativos como os monofilamentos de Semmes-Weinstein, diapasões e estudos eletrodiagnósticos [8].

Mas apesar das vantagens deste método de avaliação, há poucos estudos que indiquem utilizá-lo para membros inferiores e para a sola dos pés [6]. Assim sendo, sugere-se que outras pesquisas sejam realizadas para determinar em qual das diferentes regiões da planta do pé este teste obteria resultado mais fidedigno, pois a sensibilidade plantar é variável em diferentes partes do pé devido às características dos tecidos moles e músculos. Este fator pode interferir consideravelmente no controle postural [16] e, portanto, deve ser considerado no momento de avaliação física e funcional.

É importante considerar também que a avaliação da sensibilidade por si não implica em um diagnóstico de perda sensitiva. Assim sendo, indica-se a aplicação bilateral do teste para efeito de comparação entre extremidades e determinação de porcentagem de perda sensitiva [17].

 

Conclusão

 

Este estudo demonstrou que há reprodutibilidade para o teste de DDP, quando realizada na sola do pé, na região do hálux de adultos jovens e idosos, por diferentes avaliadores.

 

Referências

 

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