ARTIGO
ORIGINAL
Análise
da postura e da flexibilidade de atletas de cheerleading
Analysis of posture and flexibility of cheerleading athletes
Hana Barros Bezerra
Lôbo de Brito, Ft.*, Levy Aniceto Santana, D.Sc.**
*Universidade
Católica de Brasília, UCB, **Docente do Curso de Fisioterapia da Universidade
Católica de Brasília
Recebido em 3 de novembro de 2015; aceito em 20 de setembro de 2016.
Endereço
para correspondência:
Levy Aniceto Santana, QS 07 Lote 1– Águas Claras, 72030-170 Taguatinga DF,
E-mail: levysantana@gmail.com, Hana Barros Bezerra Lôbo de Brito: hana_barros@hotmail.com
Resumo
O cheerleading é um esporte que,
antigamente, tinha como objetivo animar as torcidas nos intervalos de jogos,
entretanto evoluiu para um esporte com uma exigência física elevada para os
atletas que o competem. Uma boa postura e flexibilidade são importantes para
prevenir as lesões. O objetivo deste estudo foi analisar a postura e a
flexibilidade das atletas de cheerleading. Foi realizado um estudo transversal
com a participação de 17 atletas sendo a postura avaliada por meio de fotos
analisadas pelo software de avaliação
postural SAPO versão 0.68. A flexibilidade foi aferida pelo teste de sentar e
alcançar utilizando o Banco de Wells. Os dados da postura e da flexibilidade
foram relacionados com a posição do atleta no time. Os resultados mostraram que
os atletas flyers apresentaram maior
flexibilidade quando comparados às bases, que apresentam maiores alterações em
alinhamento horizontal de cabeça, ombro, EIAS, tuberosidade da tíbia, alteração
dos ângulos Q direito e esquerdo e o ângulo entre os acrômios e as EIAS, não se
observou alterações relacionadas com lateralidade. Conclui-se que as flyers são mais flexíveis que as bases,
as bases apresentam mais alterações e não houve predominância de alterações com
relação ao lado do corpo.
Palavras–chave: postura,
flexibilidade, atletas.
Abstract
The cheerleading is a sport with the purpose of encouraging the gaming
crowd animate, however evolved into a sport with high physical demand for the
athletes who compete it. Good posture and flexibility
are important to prevent injury. The aim of this study was to analyze the
posture and flexibility of cheerleading athletes. A cross-sectional study with
the participation of 17 athletes and posture assessed by photos analyzed by
postural assessment software SAPO version 0.68. Flexibility was measured by the
test sit and reach using the Wells’s Bank. The
posture and flexibility data were related to the athlete's position in the
team. The results shows that the flyers athletes are more flexible when
compared to the bases, which have more changes in horizontal alignment of head,
shoulder, ASIS, tibial tuberosity, change the Q right
angles and left and the angle between the acromial and the ASIS, there was no
change related to laterality. It follows that the flyers are more flexible than
the bases, the bases have more changes and no
predominance of change with respect to the sides.
Key-words: postures,
flexibility, athletes.
O cheerleading é um esporte que,
primeiramente, tinha como objetivo somente animar as torcidas nos intervalos de
jogos como o futebol americano e o basquete. Hoje em dia é considerado um
esporte que evoluiu significantemente e tem uma exigência física elevada para
os atletas que o competem [1].
É um dos esportes
mais populares entre as adolescentes nos Estados Unidos da América e o número
de praticantes vem crescendo nos últimos anos [2]. Em outros países é um
esporte como qualquer outro e está sujeito a regras e a regulamentos, o que
ainda não acontece no Brasil [3].
Em sua prática
existem posições especificas de acordo com a habilidade de cada praticante. As flyers são atletas que tendem a ser mais
leves e flexíveis e são levantadas acima da cabeça de suas bases para realizar
elementos de dificuldades. Por outro lado, as bases devem ser mais fortes e
sincronizadas, para suportar o peso das flyers
durantes as posturas realizadas. Ambas as posições procuram realizar elevações
e lançamentos buscando suas formas mais difíceis em busca de uma maior
pontuação. Esse pequeno grupo composto de bases e flyers é chamado de stunt e nele pode conter de uma a quatro
bases. Quando existe uma união de três ou mais stunts se torna um elemento chamado de pirâmide e durante esse
elemento as flyers dos stunts devem se ligar, unindo as mãos ou
os pés [1].
Nos treinos e
campeonatos durante a realização de stunts
é importante que sempre tenham pessoas por perto que não fazem parte do
elemento, chamadas de spotting, cujo
objetivo é garantir a segurança das flyers
caso haja uma possível queda. Além dos elementos característicos do cheerleading, o esporte também conta com
o uso de acrobacias e saltos que são também vistos na ginástica [1,2].
Em manobras como os stunts um atleta é elevado por um ou mais
colegas acima do nível da cabeça exigindo precisão, sincronia e equilíbrio dos
envolvidos. Essa manobra produz a elevação do centro de gravidade e por isso
podem provocar maiores oscilações corporais [4]. Essas oscilações acontecem
quando o corpo, por meio de contrações musculares, faz correções posturais para
que o centro de gravidade se mantenha dentro da base de sustentação,
independente de seu tamanho [5].
Outros estudos já
analisaram as alterações posturais associadas a diversos esportes. No estudo de
Silva et al. [6] foram analisadas a
flexibilidade e postura em 19 atletas de ginástica rítmica e observadas a
presença de hiperlordose lombar, anteroversão pélvica, hiperextensão dos
joelhos, escoliose e comprimento excessivo dos isquiostibiais. Entretanto, em
recente levantamento bibliográfico não foram encontrados estudos descrevendo
essas alterações em atletas praticantes de cheerleading.
O melhor entendimento
dessas alterações pode subsidiar o planejamento de um trabalho pela equipe de
saúde que atende esses atletas com objetivo de corrigi-las e, desse modo,
prevenir o risco de lesões, haja vista que é um esporte cuja prática vem
crescendo no país. Portanto, o objetivo deste estudo foi analisar a postura e a
flexibilidade de atletas de cheerleading.
Estudo transversal
realizado entre os dias 18 de abril e 2 de maio de
2015 com a coleta de dados e avaliação de atletas com idade entre 18 e 24 anos
do time de cheerleading competitivo
Brasília Xtreme. Os 20 atletas do time foram convidados a participar do estudo,
entretanto 3 foram excluídos da amostra por não
estarem presentes no time no período da coleta de dados. Esses atletas
realizavam treinamento uma vez por semana com 4 horas de duração composto por
treino de flexibilidade, força, resistência, prática de stunts e acrobacias.
O projeto de pesquisa
foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Católica de
Brasília (UCB) sob número CAAE 43515315.7.0000.0029.
Os atletas foram esclarecidos quanto aos objetivos e métodos do estudo e os que
concordaram assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
A coleta foi
realizada no local de treino do time sendo reservada uma sala para a realização
das fotos e o uso do banco de Wells. Inicialmente, os participantes responderam
um questionário de coleta de dados, elaborado pelos pesquisadores a partir da
adaptação do questionário utilizado por Lima [3] composto em sua primeira parte
de informações referentes aos dados pessoais, medidas antropométricas e do
histórico de patologias e a segunda parte de informações quanto à prática do
esporte.
Para a análise
postural, foram fixadas bolinhas de isopor utilizando fita antialérgica em
pontos anatômicos específicos seguindo o protocolo proposto por Siqueira, Costa
e Fernandes [7] e foi solicitada ao voluntário a permanência em posição
ortostática para o registro das imagens em vistas anterior, posterior e laterais direita e esquerda. Os pontos anatômicos utilizados
foram: tragos, acrômio, Espinha Ilíaca Ântero-Superior (EIAS), centro da
patela, tuberosidade da tíbia, espaço entre o segundo e o terceiro metatarsos,
processos espinhosos da primeira, quinta e décima primeira
vértebras torácicas e da quinta vértebra lombar, Espinha Ilíaca Póstero-Superior
(EIPS), trocânter maior do fêmur, linha interarticular do joelho, ângulo
inferior da escápula e nos pontos das inserções dos tendões calcâneos. Para
padronização das fotos, o voluntário foi posicionado sobre uma marcação de fita
adesiva no chão. Todas as fotos foram realizadas com a câmera fotográfica da
marca Sony, modelo DSC-WX7, Cyber-shot com 16.2 megapixels, fixada em tripé
localizado a 3,5 metros de distância do voluntário e a 90 cm de altura do solo.
Utilizando o Software de Avaliação
Postural (SAPO) versão 0.68, as imagens foram analisadas para cálculo do
alinhamento horizontal da cabeça, dos acrômios, das EIAS, das tuberosidades
tíbiais, dos ângulos Q (direito e esquerdo) e alinhamento vertical da cabeça
(direito e esquerdo). Os resultados foram transferidos para o programa
Microsoft Excel para geração dos gráficos seguindo metodologia de análise
utilizada por Siqueira, Costa e Fernandes [7].
Na análise de
flexibilidade, o teste de sentar e alcançar utilizando o Banco de Wells foi realizado
conforme a metodologia descrita por Kato, Alves e Santana [8]. O atleta recebeu
instruções para sua realização sendo orientado a sentar-se sobre um colchonete
com os joelhos em extensão posicionados debaixo do banco, com os pés descalços
e pouco afastados. Em seguida, com uma mão em cima da outra e os cotovelos
estendidos, foi instruído a alcançar seu máximo ponto a
frente, flexionando o tronco, mantendo a extensão dos joelhos. Esse processo se
repetiu três vezes e o maior valor foi considerado como a medida da
flexibilidade. A classificação do grau de flexibilidade foi realizada segundo
tabela desenvolvida por Pollock e Wilmore [9] que classifica em cinco níveis,
ajustados pela idade e sexo.
A análise estatística
foi realizada utilizando o software
Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 20.0 para Windows
no qual foram calculadas as médias, variâncias e as frequências. O teste de
Kolmogorv Smirnov mostrou distribuição normal dos dados e por isso as
diferenças entre as médias das medidas foram verificadas pelo teste t
adotando-se 5% como nível de significância.
Dos 17 participantes
do estudo, 14 (82,4%) eram mulheres e 3 (17,6%) homens
com média de idade de 21,2 ± 1,6 anos, Índice de Massa Corporal (IMC) de 21,1 ±
2,5 kg/m2 e tempo de prática do esporte de 28,3 ± 22,1 meses. Em
relação à posição do atleta no time, 9 (52,9%) atuavam
como base, 6 (47,1%) como flyer.
Quanto ao grau de
flexibilidade, a Tabela I demonstra que a categoria com maior percentual de
atletas é a excelente com a prevalência entre os que atuavam como flyer, os
quais apresentaram valor médio de 46,7 ± 3,0 cm enquanto as bases 32,4 ± 11,0
cm no teste de sentar e alcançar no banco de Wells. O teste t para amostras
independentes encontrou diferença estatisticamente significativa entre essas
medidas com p = 0,009.
Tabela I – Distribuição percentual dos atletas de
cheerleading por grau de flexibilidade.
Pelo fato de não ter
sido encontrados estudos analisando a postura e a flexibilidade de atletas
nesse esporte, os resultados foram comparados com resultados de estudos que
avaliaram atletas de outras modalidades. Em praticantes de ginástica rítmica na
qual são realizados movimentos similares, esses achados são concordantes com os
descritos por Silva et al. [6], pois foi observada a diferença
na amplitude de movimento entre crianças que praticavam ou não a ginástica
rítmica com maior flexibilidade para as praticantes. Os atletas que praticam
essa modalidade realizam movimentos de coluna e de quadril de grande amplitude
tanto para flexão quanto extensão e por isso apresentam maior flexibilidade.
A Tabela II apresenta
as variáveis avaliadas quanto à postura e seus respectivos valores de ângulos.
Observa-se que não foi encontrado um padrão de alterações posturais à direita
ou esquerda sendo justificado pelo fato do esporte exigir do
atleta movimentos similares entre as lateralidades do corpo, ao contrário de
outros esportes, como o voleibol, que há predominância do uso do membro
dominante [7].
Foi observada uma
tendência para anteriorização de cabeça nos atletas que pode estar relacionada
com a característica do esporte de realizar movimentos que possam causar
sobrecarga na coluna cervical, como a extensão cervical durante as elevações
das flyers e as acrobacias. Moreira e
Rodrigues, ao analisar a postura de ginastas da modalidade rítmica observaram o
mesmo comportamento postural de extensão e anteriorização da cabeça [10].
Esporte o qual realiza movimentos semelhantes ao do cheerleading, com movimentos que exigem maior extensão da coluna
vertebral.
Tabela
II –
Descrição das variáveis posturais
analisadas.
*Padrão de normalidade
= 0o; ** Padrão de normalidade = 15o; EIAS: Espinha Ilíaca Ântero-Superior.
Ao se comparar as
alterações posturais entre as bases e as flyers,
observou-se maior prevalência nos atletas que atuavam como base, correspondendo
a 8 (47%) com desalinhamento da cabeça (Figura 1), 6
(35,3%) com desalinhamento horizontal dos ombros (Figura 2), 6 (35,3%) com
desalinhamento horizontal das EIAS (Figura 3), 9 (52,9%) desalinhamento
horizontal entre os acrômios e as EIAS (Figura 4), 9 (59,9%) com alteração do
ângulo Q direito, (Figura 5), 7 (41,6%) com alteração do ângulo Q esquerdo (Figura
6), 8 (52,9%) com desalinhamento vertical entre os tragos e os acrômios (Figura
7). A assimetria dos lados pode se dar, devido ao maior tônus muscular no lado
dominante, ao ser mais utilizado a musculatura, a mesma é também mais
estimulada e, assim, a diferença de força leva ao desequilíbrio muscular,
alterando o alinhamento postural [10].
A maior prevalência
de alterações nas bases pode ser devido ao maior esforço físico que essa
posição cobra, por ter de suportar peso acima da cabeça e sustentar a queda das
flyers em stunts que exigem lançamentos e devido à menor flexibilidade em
relação aos atletas flyers.
Em praticantes de
ginástica rítmica, observaram-se alterações nos níveis de força entre os dois
membros inferiores, e o lado dominante das atletas era mais desenvolvido.
Como já mencionado anteriormente ocasiona uma alteração postural, pois o
organismo começa a gerar compensações em busca do equilíbrio musculoesquelético
[11].
Figura
1 – Distribuição dos atletas de
cheerleading por alinhamento horizontal de cabeça.
Figura
2 – Distribuição dos atletas de
cheerleading por alinhamento horizontal de ombros.
Figura
3 – Distribuição dos atletas de
cheerleading por alinhamento horizontal de EIAS.
Figura
4 – Distribuição dos atletas de cheerleading
por ângulo entre os acrômios e as EIAS.
Figura
5 – Distribuição dos atletas de
cheerleading por ângulo Q direito.
Figura
6 – Distribuição dos atletas de
cheerleading por ângulo Q esquerdo.
Figura
7 – Distribuição dos atletas de
cheerleading por alinhamento vertical acrômio e tragos.
Figura
8 – Distribuição dos atletas de
cheerleading por alinhamento das tuberosidades tíbial.
A Figura 8 demonstra
que foram encontradas alterações do alinhamento horizontal das tuberosidades
tibiais e as bases e flyers juntas somam 70,2%. As alterações de valgo podem
levar a essa discrepância entre os membros, já que a média dos valores de alinhamento
dos joelhos esquerdos e direitos foram maiores que o grau de normalidade que é
15º. Essa medida demonstra a discrepância entre o tamanho das tíbias direitas e
esquerda e como foram iguais entre os atletas, talvez não sejam influenciadas
pela posição do atleta no esporte.
Uma das limitações
deste estudo foi o número reduzido de atletas na amostra, apesar de terem sido
incluídos todos os atletas da equipe Brasília Xtreme, com idade igual ou
superior a 18 anos. Tal fato se justifica pela existência de apenas um time em
Brasília e pela carência de praticantes em função de se tratar de um esporte
pouco difundido no país.
Sugere-se que outros
estudos sejam realizados avaliando essas alterações em atletas praticantes
desse esporte em outros times no Brasil e no exterior para verificar se os
padrões observados neste estudo se repetem.
Conclui-se que os
atletas que atuavam na posição de flyer
apresentaram maior flexibilidade quando comparados às bases. Não foi verificado
padrão de predominância de lateralidade e os atletas que atuavam como bases
apresentaram maior percentual de alterações posturais quando comparado com os flyers, com exceção do alinhamento das
tuberosidades tibiais.