ARTIGO ORIGINAL

Agilidade, equilíbrio e flexibilidade de atletas de futebol: avaliação por meio de testes funcionais e fotogrametria

Agility, balance and flexibility in soccer athletes: evaluation by functional tests and photogrammetry

 

Daiene Cristina Ferreira, Ft.*, Willian de Almeida Silva**, Lucas Rafael Heleno*, Eduardo Rossi Spartalis**, Camile Ludovico Zamboti*, Fernanda Bortolo Pesenti**, Jhaton Viera da Silva**, Matheus Elmer Finatti*, Ariobaldo Frisseli***, Christiane de Souza Guerino Macedo, D.Sc.****

 

*Universidade Estadual de Londrina (UEL), Residência em Fisioterapia Traumato-Ortopédica da UEL, **Residência em Fisioterapia Traumato-Ortopédica/UEL, ***Docente do Curso de Educação Física e Esporte/UEL, Docente do curso de Fisioterapia/UEL, Londrina/PR

 

Recebido em 23 de junho de 2015; aceito em 20 de dezembro de 2016.

Endereço para correspondência: Christiane de S. Guerino Macedo, Hospital Universitário da UEL/Centro de Ciências da Saúde/Departamento de Fisioterapia, Av. Robert Koch, 60, Vila Operária 86038-350 Londrina PR, E-mail: chmacedouel@yahoo.com.br; Daiene Cristina Ferreira: daiene_ferreira@hotmail.com; Willian de Almeida Silva: willianalmeida.fit@hotmail.com; Lucas Rafael Heleno: lrafaelfisio@hotmail.com; Eduardo Rossi Spartalis: eduardo.spartalis@hotmail.com; Camile Ludovico Zamboti: camileludovico@hotmail.com; Fernanda Bortolo Pesenti: fernanda_pesenti@hotmail.com; Jhaton Viera da Silva: jhaton_vieria@hotmail.com; Matheus Elmer Finatti: matheusfinatti@hotmail.com; Ariobaldo Frisseli: afrisselli@yahoo.com.br

 

Resumo

Introdução: Avaliar agilidade, equilíbrio e flexibilidade é importante para o desempenho esportivo e seus resultados podem estar associados a lesões no futebol. Objetivos: Avaliar a agilidade, equilíbrio e flexibilidade de atletas de futebol. Métodos: Foram submetidos 50 atletas de futebol masculino aos testes funcionais Figure 8 Test (F8), Side Hop Test (SHT) e Star Excursion Balance Test (SEBT) e à avaliação da flexibilidade dos músculos isquiotibiais e quadríceps, por fotogrametria. Estes foram distribuídos em grupos em função da dominância do membro inferior, queixas álgicas, posição de jogo e categoria, e comparados por meio dos testes t de Student e Anova. O nível de significância foi de 5%. Resultados: Os resultados dos testes funcionais não diferiram para dominância e posição de jogo e não apresentaram correlação com a dor. Os atletas de maior idade apresentaram melhores scores nos testes funcionais. A flexibilidade dos músculos quadríceps e isquiotibiais não apresentaram diferenças para a dominância e categorias; porém, todos os atletas demonstraram flexibilidade diminuída nos isquiotibiais quando comparados às referências literárias. Conclusão: Atletas profissionais apresentaram melhores escores na execução dos testes funcionais e flexibilidade diminuída. Os resultados valorizam as avaliações com testes funcionais e fotogrametria, pois são formas de baixo custo e fácil reprodutibilidade.

Palavras-chave: atletas, equilíbrio postural, fotogrametria, futebol.

 

Abstract

Introduction: The assessment of agility, balance and flexibility is important in sports performances and the results obtained could be related to injuries in soccer. Objectives: To evaluate agility, balance and flexibility of soccer players. Methods: Fifty male soccer players were submitted to the following functional tests: Figure 8 Test (F8), Side Hop Test (SHT) and Star Excursion Balance Test (SEBT) and to the evaluation of flexibility of the hamstrings and quadriceps using photogrammetry. The athletes were divided into groups based on the dominant lower limb, pain complaints, position in the field and category and compared using the Student's t-test and ANOVA. The level of significance was set at 5%. Results: The results of the functional tests did not differ for dominance and position in the field and showed no correlation with pain. Older athletes presented better scores in functional tests. The flexibility of the quadriceps and hamstrings showed no differences to the dominance and categories; however, all athletes have demonstrated decreased flexibility in the hamstrings when compared to the literature references. Conclusion: Professional athletes presented higher scores in functional tests and lower flexibility. The results encourage the use of functional tests and photogrammetry because these assessment tools are less expensive and can be easily reproduced.

Key-words: athletes, postural balance, photogrammetry, soccer.

 

Introdução

 

O futebol é um esporte praticado no mundo por cerca de 400 milhões de pessoas [1]. Associado ao seu crescimento observa-se maior número de lesões, principalmente pelo constante contato entre os jogadores [2]. Entretanto, a etiologia das lesões esportivas engloba uma gama de fatores internos (idade, gênero, alterações anatômicas, nível de força muscular, agilidade, histórico prévio de lesão, alterações posturais e biomecânicas) e externos (relação com o ambiente, nível de competição, número de jogos efetuados, tipo e volume de treinamento). Segundo Zanuto et al. [3], as ações de chutar, driblar e cabecear associadas ao inadequado preparo físico e a prática esportiva em alta intensidade do futebol aumentam consideravelmente as lesões nos atletas. Neste sentido, as lesões do futebol são motivos de grande preocupação, pois comprometem o desempenho e afastam atletas de treinamentos e competições [4].

No sentido de associar dor e controle motor, Baroni et al. [5] estabeleceram que as entorses podem apresentar relação direta com a falta de controle motor e manutenção da estabilidade postural na realização de saltos, giros e mudanças de direção associados ao gesto esportivo do futebol. Os estudos sobre controle motor apontam que assimetrias, lesões dos membros inferiores, fadiga muscular, gesto esportivo inadequado e dominância poderão influenciar diferentes aspectos da motricidade, como precisão, velocidade de execução e coordenação para iniciar o movimento [6]. Entretanto, quando o treino específico é bem planejado observa-se um aprimoramento no controle motor e habilidade de equilíbrio [7,8] que diminuem os riscos de lesões.

O controle motor pode ser avaliado por testes funcionais como os Figure 8 Test, Side Hop Test e Star Excursion Balance Test, caracterizados como medidas dinâmicas de avaliação da função geral dos membros inferiores, que analisam a funcionalidade motora dos atletas e exigem controle postural e neuromuscular [9], além de apresentarem componentes de deslocamentos laterais (Side-Hop Test) e movimentos que levam a estresse rotacional (Figure-of-8-Hop Test) e de equilíbrio (Star Excursion Balance Test) que podem apresentar alterações após uma determinada lesão, disfunção ou assimetria.

Outro importante fator avaliado em atletas de futebol é a flexibilidade. Veiga et al. [1] afirmam que o déficit de flexibilidade pode estar associado as lesões musculares. Concordando, Sena et al. [10] demonstram que embora amenizada em atletas com idade superior a 18 anos, a presença de encurtamento global da cadeia posterior foi marcadamente importante, resultando em 14 vezes mais chances de instalação de lesões esportivas na vida adulta. Várias são as formas de se avaliar a flexibilidade, cita-se o Banco de Wells (também denominado de teste de “sentar e alcançar” - sit-and-reach test) [11], o teste de Elevação da Perna Estendida [12], o Teste do Dedo Médio ao Chão [13], a fotogrametria [14], entre outros.

Entre estas técnicas, a fotogrametria tem sido apontada como de baixo custo, com facilidade de fotointerpretação, alta precisão e reprodutibilidade dos resultados, além da possibilidade de arquivamento e acesso aos registros. Estas diversas vantagens defendem sua grande utilização e disseminação. O processo é um valioso registro das mudanças posturais ao longo do tempo porque é capaz de captar pequenas transformações e relacionar diferentes partes do corpo que são de difícil mensuração [14].

Em função da alta frequência de lesões no futebol e da grande variabilidade em protocolos de avaliação desta modalidade, o conhecimento do perfil físico ideal para cada posição e das lesões que mais acometem cada atleta é essencial para o sucesso de uma equipe. Com isso, faz-se necessário o desenvolvimento de estudos que evidenciem uma maneira diferenciada de avaliação do controle motor e flexibilidade, de forma acessível, reprodutível e com baixo custo. Para que, deste modo, possam ser detectadas precocemente as assimetrias, disfunções e queixas álgicas não traumáticas do atleta. Assim, o presente estudo tem o objetivo de avaliar o controle motor e a flexibilidade em atletas de futebol, bem como associar o desempenho dos testes e dos níveis de flexibilidade à dominância, queixas álgicas, idade e posição de jogo.

 

Material e métodos

 

A amostra, de conveniência, constou de 50 atletas de futebol, do sexo masculino, idade entre 13 e 17 anos, com tempo mínimo de treinamento de 3 anos, frequência de treinamento semanal de 6 vezes, 2 horas por dia e que participassem dos treinamentos e competições estaduais pelo mesmo clube. Os atletas com queixas álgicas foram submetidos à avaliação clínica e fisioterápica antes dos testes para verificar a presença ou não de riscos. Como critérios de exclusão, adotou-se o afastamento completo dos treinamentos por lesões ou problemas de saúde, dor incapacitante para realizar os testes, e atletas submetidos à cirurgia do membro inferior nos últimos seis meses.

Os atletas selecionados para o estudo foram orientados quanto aos objetivos e procedimentos a serem desenvolvidos na pesquisa e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, assim como seus responsáveis legais. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da instituição (Parecer 050/2011). A coleta de dados foi realizada em dias diferenciados no ginásio de musculação da equipe e os atletas trajavam roupas e calçados apropriados para realização de exercícios, testes e avaliação de flexibilidade.

No primeiro dia de coleta, os atletas (N = 50) responderam o questionário de avaliação e realizaram os testes funcionais. O questionário de caracterização da amostra constava de nome, idade, peso, altura, tempo de prática esportiva, frequência de treino semanal e horas por dia, queixas álgicas, lesões e cirurgias prévias, entre outras; e aleatorizaram a sequência de desenvolvimento dos testes funcionais e membro inferior de início dos testes. Assim, realizaram aleatoriamente os testes funcionais Side Hop Test (SHT), Figure 8 Test (F8), e Star Excursion Balance Test (SEBT), três repetições em cada membro inferior, com intervalo de 30 segundos entre cada realização do mesmo teste, e um minuto para a troca entre os testes e entre os membros inferiores.

Para o Side Hop Test o atleta foi posicionado em apoio unipodal, calçando tênis, e realizou 10 saltos laterais, distantes em trinta centímetros, o mais rápido possível [15,16]. Foram orientados a não pisar sobre as duas fitas que delimitavam a distância estipulada. No Figure 8 Test o atleta, em apoio unipodal, calçando tênis, percorreu uma distância de 5 metros delimitada por dois cones, contornando-os de forma a desenhar um “8” por duas vezes consecutivas o mais rápido possível [9]. Para ambos os testes considerou-se o menor tempo de realização como resultado. Para a realização do Star Excursion Balance Test (SEBT) três fitas métricas foram colocadas no chão nas direções anterior, póstero-medial, póstero-lateral, cada uma delas com 120 cm partindo do centro, com uma distância de 45º graus entre elas [17,18]. O atleta posicionou um pé, descalço, na intersecção entre todas as diagonais, de maneira que a linha maleolar ficasse no centro da intersecção das fitas; e, com o outro pé, foi orientado a tocar levemente a fita com a ponta do hálux, o mais longe possível, em cada uma das três direções mantendo o equilíbrio corporal, com o calcâneo do pé de apoio fixo no solo. Para estabelecer os valores de análise considerou-se a maior distância alcançada, em centímetros, para cada direção [19].

No segundo dia de coleta os atletas (N = 35; 15 atletas apresentaram impossibilidade de horário para avaliação) foram submetidos à avaliação da flexibilidade dos músculos isquiotibiais (IT) e quadríceps por meio de fotogrametria. Pontos reflexivos foram fixados no trocânter maior do fêmur, interlinha do joelho e maléolo lateral. Para a análise da flexibilidade do quadríceps, considerou-se o grau de flexão de joelho em decúbito ventral (figura 1A) e, para os músculos IT, a flexão de quadril com extensão de joelho em decúbito dorsal (figura 1B). Utilizou-se a câmera Sony® Cyber-Shot de 14,1 Mega Pixels para a coleta da imagem e o programa Image J para a análise angular. Todos os participantes foram submetidos a uma única avaliação para evitar o ganho de flexibilidade imediato.

 

 

Figura 1 - Análise da flexibilidade do musculo quadríceps (A) e músculo isquiotibial (B) por fotogrametria.

 

Os resultados dos testes funcionais foram descritos em função da dominância (considerou-se o membro inferior utilizado para chutar uma bola), da presença ou não de queixas álgicas, da posição de jogo (goleiro, zagueiro, volante, lateral ou atacante), divididos por categorias (sub-15, sub-17 e profissional) e para análise da flexibilidade, foram consideradas as categorias e dominância. Aplicou-se o teste de Shapiro Wilk, e em função da normalidade, foram utilizados o teste t de Student pareado e não pareado e ANOVA. O nível de significância foi de 5%. O programa utilizado para a análise foi o SPSS® 20.

 

Resultados

 

No total, os atletas (n = 50) submetidos à análise do controle motor por meio dos testes funcionais apresentaram idade de 16,49 (3,12) anos, peso 66,35 (9,06) kg, 1,74 (0,06) metros e IMC de 21,59 (2,26) kg/m2.

Quando separados em função da dominância não foram observadas diferenças significativas para os testes funcionais (tabela I).

 

Tabela I - Resultados dos testes funcionais entre membro inferior dominante e não dominante (n = 50).

 

Teste t de student.

 

Os resultados dos testes funcionais entre atletas de futebol com e sem queixas de dor estão descritos na tabela II. Foi observado que os atletas com dor apresentaram melhor desempenho quando realizaram o teste no membro inferior não dominante.

A análise da comparação entre o controle motor para o desenvolvimento dos testes funcionais também foi realizada em função da posição de jogo. Pode-se observar na tabela III diferenças de tempo de desenvolvimento para o SH, F8 e SEBT entre as posições. Entretanto os valores não apresentaram significância estatística.

 

Tabela II - Resultados dos testes funcionais entre atletas com e sem queixas de dor.

 

Teste t de Student não Pareado.

 

Tabela III - Resultados do desenvolvimento dos testes funcionais em função da posição de jogo dos atletas de futebol (n = 50).

 

D = Dominante; ND = Nao Dominante. Teste ANOVA.

 

Quando os atletas foram distribuidos em função das categorias, algumas diferenças foram encontradas. A tabela IV apresenta a diferença significativa entre o sub-15 e o sub-17 no F8 Dominante e Não Dominante. Entre o sub-15 e os Profissionais, houve diferença significativa no F8 Dominante, SHT Não Dominante, SEBT póstero-medial Não Dominante, SEBT póstero-lateral Dominante e Não Dominante. Entre o sub-17 e os Profissionais, somente houve diferença significativa no SEBT póstero-lateral Não Dominante.

 

Tabela IV - Resultados dos testes funcionais entre as categorias (n = 50).

 

SEBT = Star Excursion Balance Test; Teste ANOVA; *diferença significativa entre sub 15 e sub 17. Teste t de Student não pareado; **diferença significativa entre sub 15 e profissionais. Teste t de Student não pareado; ***diferença significativa entre sub 17 e profissionais. Teste t de Student não pareado.

 

Os resultados da análise da flexibilidade foram estabelecidos com 35 atletas. Cabe observar que a amostra inicial foi de 50 atletas, entretanto 15 não retornaram para a análise da flexibilidade e foram considerados como perda amostral. Assim, a amostra foi reestabelecida em 35 indivíduos, que posteriormente foram divididos por categorias (sub-15, sub-17 e profissional). Entre os 35 encontrou-se idade de 16,3(3) anos; 66,5(10,18) kg, altura de 174,65 (0,06) cm e IMC de 21,67 (2,55) kg/m².

Os resultados da flexibilidade dos músculos quadríceps e isquiotibiais estão apresentados nas tabelas V e VI. Não foram observadas diferenças para a dominância ou para as diferentes categorias.

 

Tabela V - Análise da flexibilidade dos músculos quadríceps e isquiotibiais em função da dominância (n = 35).

 

Teste t de Student.

 

Tabela VI - Análise da flexibilidade dos músculos quadríceps e isquiotibiais em função das categorias (n = 35).

 

Valor do P estabelecido pelo teste Anova.

 

Pode-se observar na Tabela VI que os atletas do Sub-15 obtiveram a melhor flexibilidade na análise dos ísquiotibiais não dominante e o quadríceps dominante menos flexível. Os atletas do sub-17 foram melhores no quadríceps dominante e ísquiotibiais dominantes, enquanto que no quadríceps não dominante foram os menos flexíveis. Os atletas profissionais foram melhores no quadríceps não dominante, enquanto foram os mais encurtados no isquiotibiais dominante e não dominante.

 

Discussão

 

A importância de estudos com atletas de futebol tem sido apresentada e bem discutida. Entretanto, a maioria dos autores aborda a incidência ou o tratamento de lesões já desenvolvidas e poucos apontam estratégias de avaliação para caracterização de assimetrias ou déficits que possibilitem a prevenção destas disfunções. Na tentativa de avaliar o controle motor, agilidade, velocidade e equilíbrio de atletas jovens de futebol, o presente estudo buscou comparar os resultados dos testes funcionais (side hop test, figure 8 test e Star Excursion Balance Test) em função da dominância, queixas álgicas ou lesões, posição de jogo e categorias. E também a flexibilidade dos músculos quadríceps e isquiotibiais em função da dominância e categorias.

Em relação à análise da dominância dos membros inferiores, autores afirmam que o futebol é um esporte assimétrico, no qual o membro não dominante é utilizado para o apoio e estabilidade e o dominante para tarefas como chute e passes [20]. Concordando, Weber et al. [21] afirmam que raramente os jogadores de futebol usam suas pernas com igual ênfase e normalmente priorizam o membro dominante para desenvolver atividades específicas do jogo, desta forma o programa de treinamento específico poderia desencadear em maior força de um membro. Entretanto, nossos resultados apontaram semelhanças entre membro dominante e não dominante, e os testes de velocidade, agilidade e equilíbrio (side hop test, figure 8 test e Star Excursion Balance Test, respectivamente) não evidenciaram diferenças significativas para a dominância. Concordando com nossos achados, Teixeira et al. [6] revelaram que há diferença do membro de preferência em exercícios estáticos e dinâmicos, entretanto os mesmos autores encontraram desempenho funcional similar entre membro direito e esquerdo quando comparados em tarefas de habilidade. Em complemento, uma análise isocinética de atletas de futebol estabeleceu que apesar de algumas habilidades específicas deste esporte serem realizadas com preferência lateral, os resultados dos testes em isocinético sugerem que, independentemente da função desempenhada, os atletas são funcionalmente equilibrados bilateralmente [22]. Estes resultados se justificam em função da participação ativa, porém diferenciada quanto ao modo contrátil, do membro não dominante como perna de apoio, nas ações de passe e chute. Os atletas, pela facilidade natural de utilizar o tornozelo do membro inferior dominante para os passes, chutes e “divididas” características do futebol, transmitem ao membro inferior não dominante a função de estabilização, o que caracteriza o uso dos músculos do quadril/tronco (glúteos, ísquios e lombar) para a manutenção do equilíbrio [23].

O presente estudo correlacionou as queixas de dor apresentadas pelos atletas avaliados e os resultados apresentados nos testes funcionais, e os resultados encontrados corroboram os de Demeritt et al. [24] cujo desempenho dos indivíduos foi semelhante para o membro com queixa álgica e no membro sem qualquer queixa. Entretanto esses autores observaram que é possível uma compensação de outros componentes motores requisitados, não percebidos pelos testes funcionais aplicados. Ainda, foi observado que a análise do equilíbrio no teste Star Excursion Balance Test na direção póstero-lateral no membro não dominante apresentou melhor desempenho no membro com queixas de dor, com diferença significativa. Este resultado não era esperado, porém pode-se discutir que o teste é realizado em posição estática, e que o bom preparo físico dos atletas, principalmente para os músculos da cintura pélvica e tronco, pode ter compensado os déficits causados pela dor. Também, todos os atletas, mesmo os que apresentavam queixa de dor em tornozelos e joelho, desenvolviam normalmente os treinamentos e competições.

A análise dos testes funcionais em atletas das variadas posições de jogo foi desenvolvida a fim de estabelecer as possíveis diferenças entre elas, ou seja, se o controle motor de goleiros, zagueiros, laterais, volantes, meio campistas e atacantes eram similares ou não. Como resultados, nosso estudo não evidenciou diferença significativa no controle motor para o desenvolvimento dos testes funcionais entre as posições de jogo. Porém, mesmo sem diferenças significativas, verificou-se que os atacantes, provavelmente por apresentar menor estatura e maior agilidade, apresentaram melhor execução nos testes; entretanto, os goleiros, que geralmente são mais estáticos, comparados às outras posições de jogo, foram os que obtiveram a melhor performance nos testes que exigiam equilíbrio. Concordando com nossos resultados, o estudo de Weber et al. [21] que realizou avaliação isocinética em jogadores de futebol profissional e comparou o desempenho entre as diferentes posições ocupadas no campo, evidenciou que mesmo atletas de diferentes posições possuem as mesmas características adquiridas pelo esporte, e afirma que ao analisar o índice de fadiga durante 30 repetições consecutivas os atletas apresentam valores semelhantes, independente da função desempenhada e posição ocupada no campo.

Outro ponto a ser discutido é a influência da idade, categoria e o tempo de treinamento no desempenho motor dos atletas. Segundo Hrysomallis [25], ainda não está estabelecido até onde o treino aprimora o desenvolvimento da habilidade do indivíduo e a partir de que ponto é ganho devido ao condicionamento físico. Sabe-se que apesar dos benefícios à saúde, a prática regular aumenta a probabilidade da instalação de desequilíbrios mecânicos, pois a carga excessiva de treinamentos e competições pode resultar em mudanças no sistema articular e muscular [21], o que contribui para o surgimento de alterações biomecânicas específicas do esporte.

Ekegren et al. [26] analisaram o padrão postural de jogadores da categoria infantil e observaram que existem alterações nos joelhos em flexão e desvio em varo provenientes da utilização de músculos flexores e abdutores durante os movimentos repetitivos de chute. De acordo com Malina et al. [27], os jovens que apresentam maior nível de maturação possuem maiores níveis de força, potência e velocidade. Também os atletas com maior idade e maturação física têm acesso a melhores processos de treino, tanto em relação aos equipamentos como de treinadores, e com aumento do tempo de prática da modalidade atingem um alto nível de rendimento [28]. Assim, ao relacionar alguns aspectos dos estudos citados acima, com os nossos resultados encontrados nos testes funcionais, pode-se inferir que a idade influência tanto no desempenho estático dos atletas quanto no dinâmico, onde os profissionais obtiveram melhor desempenho, seguido da categoria sub-17 e por fim da categoria sub-15, com diferenças significativas.

Outro fator analisado no presente estudo foi a flexibilidade muscular. Os músculos analisados foram os isquiotibiais e quadríceps dos atletas de futebol, que são os mais utilizados para o gesto esportivo do chute. A flexibilidade adequada pode evitar substancialmente lesões osteomusculares agudas e crônicas, além de desvios posturais e limitações da marcha [29]. Sabe-se que o corpo é formado por diversas estruturas interligadas, uma alteração em uma delas leva a um desarranjo global das outras, portanto uma alteração nos músculos anteriores da coxa, como o quadríceps, pode advir de encurtamento ou fraqueza dos músculos posteriores, por isso a importância de avaliar e treinar o atleta de forma global. Assim, quando há um encurtamento muscular, as fibras tornam-se incapazes de desenvolver toda a sua potência quando em contração, e irá limitar a amplitude de movimento. Um atleta, com os músculos posteriores da coxa tensos terá um comprimento de passada limitado, como consequência aumentará o número de passos em uma determinada distância, em comparação ao número de passos necessários se tivesse maior flexibilidade [30], o que se torna uma desvantagem para a função desportiva.

Dada a importância de avaliar a flexibilidade muscular dos atletas de futebol, nossos resultados apontaram grande encurtamento dos músculos isquiotibiais em 100% dos atletas avaliados quando comparados aos valores já estabelecidos pela literatura - a flexão de quadril para a avaliação da flexibilidade dos isquiotibiais deve estar entre 110 e 125 graus. Os valores de referência para avaliar a flexibilidade do músculo quadríceps são de 120 a 160 graus de flexão do joelho [31]. Como visto na Tabela V, a média de flexibilidade dos isquiotibiais são 62,54 e do quadríceps de 137,09, evidenciando maior encurtamento muscular na musculatura posterior de coxa e flexibilidade adequada em musculatura anterior de coxa. Pode-se ver, que a flexibilidade pode não estar relacionada com o tempo de treino e a idade dos atletas, pois do mesmo modo que os profissionais foram melhores na flexibilidade de extensores de joelhos, foram também os mais encurtados nos extensores de quadril e flexores de joelho; também, com o passar dos anos, pode haver o efeito compensatório que favorece a flexibilidade do quadríceps e encurtamento dos isquiotibiais. Portanto, nossos resultados demonstram a necessidade de uma intervenção através de técnicas que aprimorem o alongamento muscular, com o objetivo de aumentar a flexibilidade muscular e a amplitude de movimento das articulações, o que possivelmente possibilitaria um melhor desempenho físico do atleta.

Os testes desenvolvidos e os resultados encontrados no presente estudo afirmam que a avaliação do controle motor por meio de testes funcionais e da flexibilidade com o uso da fotogrametria é uma opção aplicável em qualquer local de treinamento e até mesmo competições, além de apresentar facilidade na aplicação e baixo custo, o que facilita a análise do atleta quando não se tem acesso a laboratórios científicos de movimento e marcha. Também, vale ressaltar a importância da avaliação de cada atleta para que, na presença de assimetrias ou alterações, como os déficits de flexibilidade encontrados, possam ser desenvolvidas condutas que reequilibrem o atleta na busca de seu melhor desempenho.

 

Conclusão

 

Para grande parte das variáveis analisadas, como dominância, posição de jogo e queixas álgicas, não foram encontradas diferenças significativas. Entretanto, em relação ao desempenho na execução dos testes funcionais, os atletas profissionais apresentaram melhores resultados, o que confirma o desenvolvimento motor associado à idade e à experiência adquirida com os anos de treinamentos e competições. Em relação à flexibilidade, as comparações entre dominância e categorias não evidenciaram diferenças, entretanto todos os atletas de futebol avaliados apresentaram amplitudes menores caracterizando encurtamentos musculares para a avaliação dos músculos isquiotibiais, e flexibilidade adequada para o músculo quadríceps. O estudo mostra a importância de avaliações do controle motor e flexibilidade em atletas de futebol, possibilitando o desenvolvimento de programas que favoreçam o melhor desempenho do atleta.

 

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