ARTIGO ORIGINAL

Dor lombar e sua relação com a flexibilidade e os desvios posturais em trabalhadores rurais de municípios da microrregião sul do Vale do Rio Pardo/RS

Low back pain and its relation with flexibility and postural deviations on rural workers of cities of the south microregion of Rio Pardo Valley/RS

 

Rafael Kniphoff da Silva, M.Sc.*, Miriam Beatris Reckziegel, M.Sc.*, Miria Suzana Burgos, D.Sc.*, Hildegard Hedwig Pohl, D.Sc.*

 

*Programa de Pós-Graduação em Promoção da Saúde, Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC)

 

Recebido em 16 de maio de 2016; aceito em 1 de dezembro de 2016.

Endereço para correspondência: Hildegard Hedwig Pohl, Avenida Independência, 2293/4207, bloco 42, 96815-900 Santa Cruz do Sul RS, E-mail: hpohl@unisc.br; Rafael Kniphoff da Silva: rafaelsilva@unisc.br; Miriam Beatris Reckziegel: miriam@unisc.br; Miria Suzana Burgos: mburgos@unisc.br

 

Resumo

Introdução: Entre as doenças ocupacionais que acometem os trabalhadores, a dor lombar é a maior causa de afastamento, gerando custos sociais e econômicos, além de debilitar a qualidade de vida. Este estudo caracterizou o perfil dos trabalhadores rurais de municípios do Vale de Rio Pardo/RS em relação à dor lombar, à flexibilidade e aos desvios posturais. Métodos: Pesquisa descritiva, não-aleatória, realizada com trabalhadores rurais de três municípios que integram a microrregião Sul do Conselho Regional de Desenvolvimento do Vale do Rio Pardo. Para avaliar a dor lombar, utilizou-se a escala de Borg; a flexibilidade, o Teste de Sentar e Alcançar; e a avaliação postural, o Teste de Nova Iorque. Resultados: Dos sujeitos selecionados, 58% referiram algum tipo de dor, 74,4% trabalhavam predominantemente em pé, 83,7% não realizavam atividade física regular nem alongamentos diários. Na flexibilidade, os trabalhadores de Candelária apresentaram maior percentual de classificados como “ruim” e “regular” (76,9%). Em relação à postura, Pantano Grande não possuía indivíduos avaliados como “normal” e trouxe a maior porcentagem de sujeitos classificados como “grave”. Conclusão: Foi constatada uma tendência no aumento da dor lombar e dos desvios posturais nos trabalhadores que não incluem em seus hábitos diários atividades físicas regulares para o equilíbrio postural.

Palavras-chave: dor lombar, saúde do trabalhador, população rural, flexibilidade.

 

Abstract

Background: Among the occupational illnesses that affect workers, the low back pain is the leading cause of medical leave, generating social and economic costs, and deteriorating quality of life. This study characterized the profile of rural workers of cities of the Rio Pardo Valley/RS in relation to low back pain, flexibility and postural deviations. Methods: Descriptive research, non-randomized, conducted with rural workers from three cities located in the southern microregion of Regional Development Council of Rio Pardo Valley/RS. For evaluation of low back pain, we used the Borg scale; flexibility, Sit and Reach Test; and postural assessment, New York test. Results: 58% of the selected subjects reported pain, 74.4% worked predominantly in a standing position, 83.7% did not perform regular physical activity or daily stretching. Related to flexibility, workers of Candelária showed the highest percentage of classified as "bad" and "regular" (76,9%). In relation to posture, Pantano Grande did not have individuals assessed as "normal" and had the highest percentage of subjects classified as "serious". Conclusion: It has been found an upward trend in lower back pain and postural deviations in workers who do not incorporate regular physical activities in daily routine to improve postural balance.

Key-words: low back pain, occupational health, rural population, flexibility.

 

Introdução

 

As transformações ocorridas nos meios de produção determinaram novas relações laborais marcadas pela intensificação do trabalho, incorporação da mão de obra feminina e contratos temporários, gerando a precarização do trabalho [1]. Como decorrência desses aspectos, o trabalho passou de uma atividade produtora de identidade, de desenvolvimento pessoal e de inserção social para fonte de doenças, com prejuízo à saúde dos trabalhadores, levando à morbidade e à inatividade [2].

Ao reconhecer a centralidade do trabalho, cabe ressaltar que ele é uma referência econômica, psicológica, cultural e simbólica [1], levando o indivíduo a sentir-se útil, produtivo e valorizado. Ao proporcionar as condições necessárias à sobrevivência nas diferentes formas de organização do trabalho e contextos sociais, o trabalho é um suporte privilegiado de inserção na estrutura social. Entretanto, quando realizado em condições inadequadas, pode ser nocivo, prejudicando a saúde do trabalhador e provocando alterações nos diferentes sistemas orgânicos [3].

Entre as doenças ocupacionais que acometem os trabalhadores, a dor lombar é a maior causa de absenteísmo e afastamento do trabalho, gerando custos sociais e econômicos, além de debilitar a qualidade de vida dessa população [4]. Ela é uma das causas mais frequentes de atendimentos médicos e hospitalares, acometendo homens acima de 40 anos e mulheres da faixa etária de 50 a 60 anos, com uma prevalência de 50 a 80% na população em geral [4,5]. Dessa forma, a dor lombar é a causa mais comum de deficiência em nações desenvolvidas e também o mais comum distúrbio osteomuscular [6,7].

O Brasil tem 189 milhões de habitantes, dos quais cerca de 90 milhões são trabalhadores e mais de 16 milhões trabalham no meio rural [8]. Ao contrário de outros setores econômicos, o trabalho na agricultura é classificado como não estruturado, por não possuir um posto de trabalho definido, com um conjunto de tarefas variáveis, muitas delas exigindo grande esforço físico. As principais causas que afetam diversas regiões corporais dessa população incluem: transporte manual, cargas mecânicas, posturas inadequadas, movimentos repetitivos, aplicação de força excessiva com as mãos, vibrações externas, ritmos e repetições excessivas e muitas vezes um trabalho monótono, marcado fortemente por fatores psicossociais que podem desencadear adoecimento e processos de compensações físicas, emocionais e laborais de grande relevância [9].

Ao enfocar os trabalhadores das agroindústrias e produtores rurais, observa-se uma carência de pesquisas que busquem estabelecer o nível de saúde e o bem-estar deste segmento populacional. Embora se trate de uma população importante para a economia da região dos Vales, poucas pesquisas [10] foram realizadas enfocando a saúde desses trabalhadores, em especial as relacionadas à dor lombar.

Diante da situação apresentada, objetiva-se caracterizar o perfil dos trabalhadores rurais de três municípios da microrregião Sul do Vale de Rio Pardo/RS em relação à dor lombar, à flexibilidade e aos desvios posturais.

 

Material e métodos

 

Trata-se de uma pesquisa descritiva, não-aleatória, realizada com trabalhadores rurais dos municípios de Pantano Grande, Rio Pardo e Candelária, que integram a microrregião Sul do Conselho Regional de Desenvolvimento do Vale do Rio Pardo (COREDE/VRP) do estado do Rio Grande do Sul. Os trabalhadores selecionados foram dos municípios citados, pelo maior número de sujeitos que aderiram voluntariamente à primeira fase da pesquisa “Triagem de fatores de risco relacionados ao excesso de peso em trabalhadores da agroindústria, usando novas tecnologias analíticas e de informação em saúde” e pela assiduidade nas avaliações.

O COREDE/VRP é composto de 23 municípios da região centro-oeste do Rio Grande do Sul e objetiva proporcionar um espaço de construção de parcerias sociais e econômicas em nível regional. A microrregião Sul possui sete municípios, com uma população total de 95.423 habitantes e uma média no Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) de 0,533.

Dos municípios selecionados, 81 trabalhadores participaram na fase inicial do projeto, dos quais 43 manifestaram dor lombar e aderiram voluntariamente à pesquisa (figura 1). Destes, 72,1% eram do sexo feminino e 27,9% do masculino, maiores de 18 anos. Esses trabalhadores integram uma pesquisa mais ampla acima referida, desenvolvida na Universidade de Santa Cruz do Sul. O projeto foi solicitado pelo COREDE/VRP e financiado pela Secretaria da Ciência, Inovação e Desenvolvimento Tecnológico do Rio Grande do Sul. Estes trabalhadores em sua maioria trabalham na agricultura e produção rural.

 

 

Figura 1 - Inclusão de sujeitos à pesquisa.

 

Os trabalhadores do presente estudo foram selecionados a partir da manifestação de desconforto e dor na região lombar, relatados no questionário de Estilo de Vida. O questionário, já validado em outro estudo [14], foi utilizado na primeira fase do projeto-mãe e aborda questões referentes à identificação, indicadores socioeconômicos, organização do cotidiano no trabalho, atividades físicas, indicadores de saúde e presença ou ausência de dor e desconforto. Foram incluídos trabalhadores rurais maiores de 18 anos, que participaram de todas as fases da pesquisa e que manifestaram dor lombar, em uso ou não de medicamentos. Foram excluídos os trabalhadores que não compareceram às avaliações e os que manifestavam patologias que as impediam.

Das variáveis coletadas no questionário, foram selecionadas: idade, estado civil, horas de trabalho diário, postura predominante no ambiente de trabalho, realização de atividade física regular e alongamentos diários, além de presença de dor e/ou desconforto na coluna lombar. Algumas variáveis foram dicotomizadas, sendo idade dividida em duas faixas (< 50 anos e ? 50 anos), estado civil em “casados e não casados” e horas de trabalho em “até 8 horas” e “igual ou maior de 8 horas”, enquanto a postura predominante foi agrupada em “de pé”, “sentado” e “alternado de pé/sentado”. Realização de exercício físico regular, prática de alongamentos diários e presença de dor e/ou desconforto foram dicotomizadas em “sim” ou “não”. Os sujeitos foram agrupados segundo o munícipio de residência.

Para avaliação da percepção de dor lombar, no teste clínico-funcional, utilizou-se a escala de dor de Borg (EB), estratificada de zero a dez, sendo zero ausência de dor e dez a percepção máxima de dor experimentada pelo indivíduo.

A flexibilidade foi avaliada através do Teste de Sentar e Alcançar (TSA), utilizando o Banco de Wells, sendo os resultados expressos em centímetros. Os valores de classificação utilizados foram os recomendados por Wells e Dillon (1952), segmentados por faixa etária, estão expressos na tabela I [11].

 

Tabela I - Valores de flexibilidade recomendados no Teste Sentar e Alcançar (TSA), por faixa etária.

 

*Dados expressos em centímetros (cm). Fonte: Wells e Dillon [11].

 

Na avaliação postural, utilizou-se a fotogrametria e o método de avalição postural de Nova Iorque (TNI), baseado no método de Portland State University (PSU), adaptado por Althoff, Heyden e Robertson (1988), em que se avaliam 13 pontos corporais, considerando-se para a classificação a pontuação 5,0 para a postura normal, 3,0 para postural com alteração moderada e 1,0 para postural com alteração grave (Anexo 1). Este instrumento de análise visual visa detectar simetrias, assimetrias, desvios e possíveis alterações posturais dos segmentos corpóreos contemplados. Neste método que permite uma análise quantitativa, com proposição de classificar as desordens posturais, para tanto são considerados no plano posterior os pontos anatômicos da cabeça, ombros, coluna vertebral, quadril, pés e arco plantar, e, no plano lateral direito, pescoço, tórax, ombros, coluna torácica, tronco e pelve, coluna lombo-sacral e abdome, pontuando cada um desses itens de 1,0 a 5,0. A classificação postural foi obtida a partir de um escore decorrente da soma de ponto dos diferentes segmentos avaliados. Considerou-se postura normal o escore entre 56-65, alteração postural moderada entre 40-55 e alteração postural grave até 39 pontos [12,13].

As fotografias utilizadas para a avaliação postural foram realizadas com a câmera digital Nikon modelo D3000 e tripé da marca VIVITAR series one 63.7’’, estando o sujeito posicionado a 3 metros da câmera [14], que estava a 1,1 metros do solo. As imagens foram calibradas e alinhadas através do fio de prumo com o software de avaliação postural Sapo v. 0.68 e analisadas para então definir a classificação postural de cada indivíduo.

Os resultados foram expressos em frequência e percentuais, médias e desvio padrão, analisando-se a normalidade da amostra pelo teste Shapiro-Wilk. Para avaliar as variáveis categóricas, foi usado o teste Qui-quadrado, e os testes Mann-Whitney e Kruskal-Wallis, utilizando-se o software Statistical Package for Social Sciences for Windows (SPSS – IBM, Armonk, NY, EUA, versão 20.0), considerando o nível de significância p ? 0,05.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNISC sob protocolo nº665.642. Todos os trabalhadores que participaram voluntariamente do projeto assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), com informações a respeito dos procedimentos.

 

Resultados

 

Os resultados apontam que, dos 81 trabalhadores que integraram a pesquisa inicialmente, 58% referiam algum tipo de dor lombar e destes 53,1% aceitaram participar da pesquisa. O índice de manifestações de dor lombar observado pode estar relacionado à média de idade de 53,3 ± 10,5 anos dos trabalhadores e a atividade por eles desenvolvida.

Observa-se similaridade no perfil dos trabalhadores pertencentes aos três municípios em algumas características como: predominância do sexo feminino, idade e estado civil. Verifica-se também que 74,4% dos indivíduos trabalham predominantemente em pé, 83,7% não realizam exercício físico regular e não praticam alongamentos diários (Tabela II).

Entre os trabalhadores dos municípios avaliados, destaca-se que 35,3% dos sujeitos de Pantano Grande possuem menos de 50 anos, nos outros dois municípios o percentual de trabalhadores nesta faixa etária foi menor (23,1%). Em relação às horas de trabalho diário, 76,9% dos sujeitos de Rio Pardo trabalham oito horas diárias ou mais, enquanto os trabalhadores de Pantano Grande e Candelária apresentam 52,9% e 46,2%, respectivamente. Cabe ressaltar que todos os indivíduos de Candelária relataram trabalhar em pé ao longo de toda a jornada de trabalho (Tabela II).

 

 

Tabela II - Características demográficas, de trabalho e de atividade física dos trabalhadores.

*Dados expressos em média ± desvio padrão, frequência e percentual e o valor de p obtido pelo teste Qui-quadrado (p < 0,05).

 

Nos resultados obtidos pelos sujeitos dos três municípios na percepção de dor (EB) e na flexibilidade (TSA), não se observam diferenças nas comparações por faixa etária e por horas de trabalho diárias. Contudo, os sujeitos da faixa etária < 50 anos do município de Pantano Grande foram os que manifestaram maior nível de dor na EB (8,3 ± 1,4), o que pode estar relacionado à forma de organização do trabalho familiar nessa localidade. Nos resultados dos testes de flexibilidade, também se observou similaridade entre os trabalhadores dos três municípios, apresentando a maioria dos indivíduos a flexibilidade classificada como regular (Tabela III).

 

Tabela III - Relação das variáveis de dor (EB) e flexibilidade (TSA) por faixa etária e horas de trabalho.

 

Dados expressos em média ± desvio padrão; Valor de p obtido pelo teste Mann-Whitney* e Kruskall Wallis**.

 

Embora os resultados médios da EB tenham ficado muito próximos entre os trabalhadores dos três municípios (Rio Pardo e Pantano Grande – 7,2 e Candelária 5,6), os resultados estratificados apresentaram valores mais positivos entre os trabalhadores de Candelária, com menor percentual de indivíduos com manifestação de dor intensa. Já em relação à classificação da flexibilidade (TSA), os trabalhadores de Candelária obtiveram resultados mais negativos, com maior percentual de indivíduos classificados como “ruim” e “regular” (76,9%). Esses resultados podem estar relacionados ao trabalho na agricultura, porém, em todos os grupos, a média dos resultados encontrados pelos indivíduos foi classificada como “regular”, considerando a média de idade dos trabalhadores (Tabela IV).

Não obstante, os valores semelhantes obtidos pelos trabalhadores na avaliação postural (TNI), nos três municípios, em Pantano Grande não se observou indivíduos classificados com “postura normal”, além de maior percentual de classificados com “alterações graves” (Tabela IV).

Na avaliação postural, constatou-se que a maioria dos sujeitos apresentaram alterações posturais “moderadas” e “graves”, tendo os trabalhadores de Candelária resultados mais positivos. Entre as principais alterações posturais encontradas estão: desvios no ângulo da cabeça, alinhamento dos ombros, abdome protuso e acentuação da lordose lombar (Tabela IV).

 

Tabela IV - Valores de EB, TSA e TNI em trabalhadores do Vale do Rio Pardo.

*Dados expressos em média ± desvio padrão, frequência (%) e o valor de p obtido pelo teste Qui-quadrado (p < 0,05).

 

Discussão

 

A agricultura é um dos setores produtivos em que os trabalhadores enfrentam os maiores riscos ergonômicos para o desenvolvimento de alterações musculoesqueléticas e incapacidades decorrentes [15]. Não obstante, há falta de informações sobre a prevalência de dor lombar no Brasil, no cenário mundial a média é de 23,5% na população geral [16], enquanto em países industrializados essa prevalência é estimada em 70% [18]. Estudo realizado com trabalhadores de limpeza urbana da cidade de Salvador encontrou uma prevalência de 45,5% [17], resultado semelhante aos encontrados na presente pesquisa.

Outro fator que influencia nas alterações posturais é o incremento da idade, pois quanto maior a idade maior a tendência de aumento da dor lombar [4]. As mudanças demográficas que vêm sendo observadas indicam que o índice de envelhecimento populacional, principalmente nas áreas rurais do sul do Brasil, pode levar a um aumento da prevalência de limitação no trabalho decorrente de distúrbios musculoesqueléticos.

Na Coréia do Sul [6], por exemplo, foi observada a prevalência de dor lombar em agricultores na faixa etária de 31-40 (49,04%), e com menor frequência (7,7%) entre os sujeitos de 51-60, faixa etária predominante entre os trabalhadores da presente pesquisa e contradizendo a outros estudos [4]. Por outro lado, estudo realizado em Salvador em população com dor lombar crônica [16], a faixa etária de maior prevalência (53,4%) foi de 40-59 anos, constatando-se que 71,5% dessa população não praticava exercício físico regular, resultado semelhante ao encontrado no presente estudo (83,7%).

Diferente do trabalho formal realizado em outros setores profissionais que limitam a carga horária diária em 8 horas, no trabalho rural a rotina é árdua e muitas vezes prolongada. Segundo um estudo realizado no nordeste do Rio Grande do Sul [19], a carga horária de trabalho é de 6 a 8 horas por dia para 27,7% dos trabalhadores rurais entrevistados e 10 horas diárias ou mais para 72,7%. No atual estudo, verifica-se que 58,1% dos sujeitos trabalham mais de 8 horas, havendo relatos de até 16 horas trabalhadas por dia.

O exercício físico pode ser indicado como terapia para pessoas com dor lombar crônica, reduzindo a dor e ampliando a função motora e a qualidade de vida [20,21]. Foi constatado que indivíduos que apresentavam dor lombar crônica afirmam que os exercícios de alongamento são eficazes na redução da dor e da incapacidade funcional, assim como no aumento da flexibilidade global [22]. Pesquisa realizada no Sul do país indica que indivíduos com dor lombar crônica acabam deixando de realizar, com frequência, atividades que requerem maiores demandas do sistema musculoesquelético [23].

Estudos que investigaram a flexibilidade, utilizando o TSA, encontraram o valor médio de 22,57cm em trabalhadores administrativos com dor lombar [24], enquanto em trabalhadores sem episódios de dor lombar, a média foi de 21 cm; já em trabalhadores administrativos sedentários, com dor nas costas, foi encontrado o valor de 15,5 cm [25], índices inferiores aos constatados neste estudo. Isso se deve provavelmente a manutenção da postura sentada no que tange a jornada de trabalho de funcionários administrativos, diferente dos sujeitos da presente pesquisa que, em sua maioria, trabalham predominantemente em pé.

A posição em pé apresenta a vantagem de facilitar a movimentação de membros superiores e inferiores nas tarefas produtivas, permitindo grande mobilidade desses segmentos; porém, a tensão muscular permanentemente desenvolvida para manter o equilíbrio desta postura dificulta a execução de tarefas de precisão, principalmente em posturas antinaturais, tais como: braços acima dos ombros, inclinação ou torção de tronco ou de outros segmentos corporais, tarefas estas muito exigidas no trabalho rural [26].

Diferenças significativas no alinhamento dos ombros e no ângulo da cabeça foram encontradas em mulheres com dor pélvica crônica, através da fotogrametria [27]. Estudo com praticantes de academia constatou que 73,2% dos avaliados apresentaram algum tipo de alteração na curvatura fisiológica considerada normal, o que pode levar à dor crônica na região lombar [28]. Alterações no alinhamento sagital e as características da lordose lombar são potencialmente responsáveis por alterações degenerativas e dores lombares sintomáticas [29]. Esses estudos vão ao encontro desta pesquisa, em que foram descritos desalinhamentos posturais semelhantes.

Cabe ressaltar que o método da fotogrametria utiliza uma quantificação bidimensional do corpo para determinar possíveis alterações posturais, nesta perspectiva pode configurar um viés de informação, pois outras alterações posturais podem não ser evidenciadas. Desse modo, configurando uma limitação deste método de avaliação [30]. Outra limitação a ser mencionada é a subjetividade do método fulcrado na experiência do examinador ao avaliar as imagens obtidas, o que sugere a necessidade de uma análise interavaliador.

 

Conclusão

 

Diante do exposto, ficou evidenciado que os trabalhadores rurais da região pesquisada apresentaram prevalência de dor/desconforto toracolombar. Aqueles com altos índices de dor lombar mostraram ter menos flexibilidade e importantes desvios posturais. Constatou-se também tendência de aumento da dor lombar e dos desvios posturais nos trabalhadores que não incluíam em seus hábitos diários os exercícios físicos regulares.

Devido às dores lombares apresentadas pelos indivíduos do estudo, é de suma importância que novas pesquisas com um maior número de sujeitos sejam realizadas com a população de trabalhadores rurais, evidenciando diferenças estatisticamente significativas que possam ampliar o conhecimento do perfil de saúde dos trabalhadores rurais dos municípios da microrregião Sul da região do Vale de Rio Pardo/RS, subsidiando ações de intervenção.

 

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 Anexo 1Teste de Nova Iorque (TNI)