ARTIGO ORIGINAL

Análise eletromiográfica de indivíduos portadores de lombalgia crônica

Electromyographic analysis of individuals with chronic low back pain

 

Pryscila Louise Schmidt, Ft. *, Marcio Alessandro Cossio Baez, D.Sc.*, Graziela Morgana Silva Tavares, D.Sc.

 

*Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Uruguaiana/RS

 

Recebido em 27 de julho de 2016; aceito em 13 de dezembro de 2016.

Endereço de correspondência: Graziela Morgana Silva Tavares, BR 472, Km 592, Caixa Postal 118, 97508-000 Uruguaiana RS, E-mail: grazielatavares@unipampa.edu.br; Marcio Alessandro Cossio Baez: marciocossiobaez@hotmail.com; Pryscila Schmidt: pryschmidt@hotmail.com

 

Resumo

Introdução: A lombalgia crônica (LC) é uma das afecções musculoesqueléticas de maior incidência na clínica médica. Objetivo: Analisar e comparar o potencial de ação muscular de indivíduos com e sem LC. Métodos: O estudo avaliou 18 voluntários, os quais foram divididos em dois grupos, o grupo lombalgia constou de 8 indivíduos com LC, o grupo controle por sua vez, formado por 10 indivíduos sem lombalgia. Inicialmente. Avaliou-se a lombalgia através da ficha de avaliação, aplicação do Questionário Roland Morris e por último a avaliação eletromiográfica. Os sinais eletromiográficos foram filtrados por meio do filtro digital Butterworth, em sequência foram tabulados os dados no programa SPSS (versão 20.0)®, e posteriormente foram aplicados os Teste de Shapiro-Wilk e o Teste “t”. Resultados: Os indivíduos portadores de LC não apresentaram incapacidade funcional de acordo com a pontuação obtida no questionário de Roland Morris. Já na análise eletromiográfica houve diferença estatisticamente significativa no músculo eretor da espinha direito em decúbito ventral (ρ = 0,05) e na posição sentada no músculo multifídeo esquerdo (ρ = 0,01). Conclusão: Na análise eletromiográfica dos músculos eretores da espinha foi evidenciado que os indivíduos com LC apresentam menor potencial de ação quando comparados com o grupo controle.

Palavras-chave: lombalgia, eletromiografia, avaliação.

 

Abstract

Introduction: Low back pain (LBP) is one of the highest incidences of muscle skeletal diseases in clinical medicine. Objective: To analyze and compare the potential of muscle action of individuals with and without low back pain. Methods: The study evaluated 18 volunteers who were divided into two groups; the group LBP with 8 individuals, the healthy group with 10 individuals without LBP. Initially, we evaluated the LBP through evaluation form, application of the Roland Morris Disability Questionnaire and finally the electromyographic evaluation. The electromyographic signals were filtered through digital Butterworth, data were tabulated using SPSS (version 20.0) ®, and later were applied Shapiro-Wilk test and "t" test. Results: Individuals with LBP showed no functional disability according to the questionnaire score of Roland Morris. However, electromyographic analysis showed statistically significant difference in the right erector spinae muscle in a prone position (ρ = 0.05) and sitting position in the left muscle multifidus (ρ = 0.01). Conclusion: The electromyographic analysis of the erector spinae muscles showed that individuals with chronic LBP have lower potential action when compared with the control group.

Key-words: low back pain, electromyography, evaluation.

 

Introdução

 

A lombalgia é uma das afecções musculoesqueléticas de maior incidência na clínica médica e na reabilitação física [1]. A cada hora, cerca de 6% da população mundial é afetada por esta síndrome de etiologia multifatorial [2]. Estudos da Organização Mundial da Saúde (2007) mostraram que a lombalgia pode atingir cerca de 80% das pessoas em algum período de suas vidas e esta já é considerada um problema de saúde pública mundial [3].

Segundo dados da Pesquisa Nacional por Domicílio (2008) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) [4], a lombalgia é a segunda doença crônica mais comum do País com 13,5% de ocorrências, perdendo apenas para a hipertensão (14%). Além de ser a que mais provoca limitações nas atividades diárias e incapacidade [5].

Os episódios de lombalgia ocorrem com maior frequência em homens com a idade de 25 a 50 anos [6], atingindo principalmente a população economicamente ativa, gerando um enorme custo econômico e social.

A lombalgia crônica é definida como uma síndrome incapacitante a qual se caracteriza por dor que perdura após o terceiro mês a contar do primeiro episódio de dor aguda e pela gradativa instalação de incapacidade. Tendo, muitas vezes, início impreciso com períodos de melhora e piora [7,8].

De acordo com Bayramoglu et al.[9], a diminuição da força muscular do tronco está diretamente relacionada com os quadros de lombalgia crônica. Segundo alguns autores [10-13], os músculos paraespinhais da coluna vertebral asseguram o posicionamento correto do tronco na posição ereta e agem como sinergistas para os movimentos dos segmentos corporais. O déficit no desempenho deste grupo muscular, desencadeia a instabilidade da coluna, resultando em frouxidão ligamentar, alteração no controle muscular, dor, predisposição à fadiga muscular e diminuição da força durante atividades de sustentação ou repetição.

Tradicionalmente são utilizados por médicos e fisioterapeutas métodos subjetivos de avaliação para o diagnóstico clínico e o acompanhamento da evolução do quadro da lombalgia. Atualmente, a ação muscular deixou de ser estudada apenas pelos relatos clínicos dos pacientes, para ser estudada através da eletromiografia (EMG), que se tem mostrado um método mais apropriado para o estudo dos potenciais de ação muscular, sendo utilizada para registrar e analisar a atividade elétrica produzida quando as unidades motoras são ativadas. A EMG surgiu como resposta a uma necessidade de se aumentar o conhecimento sobre as ações e funções musculares [14].

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi analisar e comparar o potencial de ação muscular de indivíduos com e sem LC nas posições, decúbito ventral e sentado em cadeira sem encosto.

 

Material e métodos

 

O estudo avaliou dois grupos, um grupo denominado lombalgia, formado por 8 indivíduos com LC, e o segundo grupo denominado grupo controle, o qual foi formado por 10 indivíduos hígidos.

Para a realização deste estudo tanto os indivíduos com lombalgia bem como os indivíduos hígidos obedeceram aos seguintes critérios de inclusão: serem do sexo masculino, idade entre 18 e 50 anos, sem alterações cognitivas e disponibilidade de tempo para participar da pesquisa. Os sujeitos com lombalgia deveriam apresentar LC com tempo de duração dos sintomas de três meses. No caso dos indivíduos hígidos, estes autorrelataram não terem sintomas álgicos na região lombar.

Como critério de exclusão, nenhum dos participantes poderia estar em uso de medicamento específico para a dor lombar, ter sido submetido à cirurgia da coluna, apresentar sintomas de raiz nervosa, identificados pela presença de bandeiras vermelhas e/ou presença de parestesia e irradiação da dor para os membros inferiores.

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Pampa (Protocolo 127.762) e seguiu as orientações da Resolução n.º 196/96 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). Os participantes foram informados sobre a pesquisa, concordaram e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Para o presente estudo, utilizaram-se os seguintes instrumentos, Questionário Roland-Morris, balança, cadeira com regulagem de altura sem encosto, maca, estadiômetro, eletromiógrafo EMG System 811C 8 canais e ficha de avaliação para registro de informações pessoais.

A coleta de dados foi realizada no Laboratório de Avaliação da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Campus Uruguaiana.

Foram coletados os dados de identificação e antropométricos, posteriormente apenas o grupo lombalgia foi avaliado por uma ficha de avaliação quanto à dor e respondeu ao Questionário Roland-Morris de incapacidade funcional, validado para língua portuguesa que vai de 0 a 24 pontos [15].

Na sequência da coleta de dados todos os indivíduos realizaram avaliação eletromiográfica nas posições decúbito ventral e sentado em cadeira sem encosto.

Para avaliação eletromiográfica, utilizou-se um o eletromiógrafo de superfície de 8 canais (EMG System do Brasil, São José dos Campos/SP, Ltda.®). Cada canal é acoplado a dois eletrodos ativos e um de referência. A frequência de amostragem para o sinal EMG superficial foi da ordem de 2000 Hz.

Os voluntários permaneceram deitados em decúbito ventral enquanto os músculos foram localizados por meio da palpação, procedido por tricotomia e limpeza do local para diminuir a impedância da pele. Os eletrodos ativos foram colocados sobre a região dos músculos multifídios, eretor da espinha e iliocostal, do lado direito e esquerdo. O eletrodo de referência foi colocado no acrômio direito. Todos os procedimentos de colocação dos eletrodos seguiram as recomendações do SENIAM (Surface-EMG for the Non Invasive Assessment of Muscle) [16].

Após a colocação dos eletrodos os sujeitos foram submetidos a três contrações volumétricas máximas dos músculos extensores do tronco, por dez segundos, com dois minutos de intervalo entre as séries. Posteriormente, os mesmos foram submetidos à avaliação eletromiográfica na posição sentada em uma cadeira sem encosto, para aquisição do valor de contração dos músculos extensores do tronco realizando três tentativas de dez segundos com dois minutos de descanso entre as tentativas.

Para evitar diferenciação na atividade muscular, os indivíduos foram posicionados em uma cadeira com regulagem de altura, propiciando a adequação entre joelhos e quadril, mantendo os joelhos em um ângulo de 90º.

Os sinais brutos das análises eletromiográficas foram armazenados em formato txt e posteriormente filtrados por meio de filtro digital Butterworth de quarta ordem e pelo passa banda de 10-500 Hz.

Os dados foram tabulados no programa SPSS (versão 20.0)®, e posteriormente foram aplicados os seguintes testes: Teste de Shapiro-Wilk: utilizado para testar a normalidade de todas as variáveis do presente estudo e Teste “t” para amostra independente, para testar a homogeneidade dos sujeitos (idade, altura e massa).

 

Resultados

 

Foram avaliados 18 indivíduos do sexo masculino. Os resultados referentes aos dados antropométricos se encontram na tabela I.

 

Tabela IDados antropométricos dos indivíduos do grupo controle e lombalgia.

 

*ρ ≤ 0,05

 

Referente ao IMC, entre o grupo lombalgia, 25% dos indivíduos apresentaram peso normal, 50% sobrepeso e 25% obesidade. Já os indivíduos do grupo controle, 40% dos indivíduos apresentaram peso normal, 50% sobrepeso e 10% obesidade.

Entre os 18 indivíduos avaliados, apenas dois apresentaram doenças associadas como hipotireoidismo e osteoma osteoide, ambos faziam parte do grupo lombalgia.

Referente aos hábitos de vida, todos os participantes do grupo lombalgia realizavam atividade física ao menos uma vez durante a semana, 50% destes jogavam futebol, 12,5% praticavam corrida, 12,5% caminhada e 25% realizavam duas atividades diferentes. Entre os indivíduos do grupo controle, apenas 9 destes praticavam alguma atividade, dos quais 55,5% jogavam futebol, 11,1% praticavam corrida, 11,1% ciclismo, 11,1% lutavam karatê e 11,1% praticavam duas atividades diferentes.

Em consideração a dor referida pelos indivíduos do grupo lombalgia, 12,5% dos participantes apresentaram dor em horário matutino, 25% noturno e 62,5 % sem horário fixo, 50% deles apresentaram dor súbita no início do episódio atual.

Entre os participantes do grupo lombalgia, 62,5% se encontravam no estágio crônico com exacerbação aguda, enquanto 37,5% se enquadravam no estágio crônico, com duração de mais de 12 semanas. Quanto à duração da lombalgia, a média para este grupo foi de 56,65 ± 49,14 meses.

Quando questionados sobre os fatores de piora do quadro álgico, foram citados como agravantes: esforço físico (50%), repouso (12,5%), frio (12,5), posição em pé (12,5%) e flexão de tronco (12,5%). Em relação aos fatores que aliviam o quadro álgico, 50% dos indivíduos optaram pelo repouso, 25% faziam uso de medicamentos, 12,5% utilizavam calor local e 12,5% realizavam tratamento fisioterapêutico.

Somente o grupo lombalgia respondeu o Questionário Roland-Morris de funcionalidade que vai de 0 a 24 pontos, na qual “0” representa nenhuma e “24” grande incapacidade funcional, a média para este grupo de participantes foi de 5,5 ± 2,82.

A tabela II evidencia os dados da análise eletromiográfica dos indivíduos participantes.

 

Tabela IIDados eletromiográficos dos indivíduos do grupo controle e lombalgia durante a CVM (contração voluntária máxima) em decúbito ventral e sentado em cadeira sem encosto. 

 

*ρ ≤ 0,05

 

Discussão

 

No presente estudo, todos os indivíduos participantes eram do sexo masculino. Em relação à idade, verificou-se uma maior frequência de indivíduos na faixa etária de 18 a 32 anos. Resultados semelhantes foram encontrados no estudo de Ponte [17], no qual houve uma prevalência de 43,9% de indivíduos portadores de lombalgia na faixa de 18 a 39 anos. Acredita-se que esses resultados possam ser justificados pelo fato da lombalgia acometer, principalmente, indivíduos economicamente ativos, os quais podem estar expostos às cargas excessivas de trabalho.

Além das atividades relacionadas ao trabalho, estudos apontam que o surgimento da lombalgia crônica pode estar relacionado ao excesso de peso corporal do indivíduo. Neste estudo, observou-se a presença de sobrepeso e obesidade em 75% dos casos de indivíduos com lombalgia, enquanto os indivíduos do grupo controle permaneceram em sua maioria na faixa peso normal e sobrepeso. Este fato sustenta o que muitos estudos afirmam: o excesso de peso provoca um desequilíbrio biomecânico no corpo, alterando o eixo de gravidade e, consequentemente, aumentando o recrutamento da musculatura antigravitacional, podendo assim promover o aparecimento das dores lombares [18,19].

Além disso, o excesso de peso corporal aumenta a ocorrência de patologias ortopédicas, já que estes indivíduos estão mais suscetíveis a lesões devido a uma sobrecarga elevada nos segmentos corporais decorrentes do excesso de massa corporal em algumas regiões do corpo humano [20].

A lombalgia crônica tem origem multifatorial, entre eles o excesso de peso tem sido um dos mais expressivos no crescimento de dores lombares na população brasileira junto com a má postura [21]. Em uma pesquisa realizada com acadêmicos que apresentavam sobrepeso e obesidade constatou-se que 100% queixavam-se de dor lombar [22].

Ao serem questionados sobre a prática de exercício físico regular, os resultados do presente estudo evidenciaram que todos os indivíduos com LC, realizavam atividades físicas pelo menos uma vez durante a semana, enquanto no grupo controle, não se observou essa totalidade. Apesar de haver evidências de que grupos ativos têm menor probabilidade de sofrer lesão e dor na região lombar, ou seja, menos episódios que indivíduos sedentários, somente o fato de realizar uma atividade física não implica como fator de proteção para a coluna [23].

Corroborando este fato, Harreby et al. [24] afirmam que os cuidados com o tipo de exercício, nível de atividade, carga de trabalho, postura corporal na infância/adolescência são merecedores de criteriosos cuidados. A repetição de determinadas posições, movimentos, o período e a sobrecarga da atividade podem provocar um processo de adaptação orgânica que resultará em efeitos deletérios para a postura, com alto potencial de desequilíbrio muscular, assim como os erros na técnica de execução dos movimentos podem aumentar a prevalência de lesões e exacerbação de quadros álgicos [12].

Ao avaliar o tipo de lombalgia, tempo de duração da lombalgia e o tipo de quadro álgico dos indivíduos do grupo lombalgia do presente estudo, todos se enquadravam no estágio crônico, a maioria deles apresentava exacerbação aguda. A duração média da dor era de 56,65 meses. Este quadro álgico alerta-nos para as consequências da dor crônica, tais como: o aumento dos custos com a saúde, absentismo laboral e uma diminuição da qualidade de vida desses indivíduos [25].

Quando questionados sobre o horário de surgimento e/ou piora da dor, os integrantes do grupo LC descreveram que esta, na maioria dos casos, não tem horário fixo. Divergindo do presente estudo, Haldeman [26] cita que a lombalgia e as limitações físicas impostas pela mesma podem ficar mais evidentes durante a noite, após atividades e sobrecargas excessivas durante o dia.

Com relação aos fatores de melhora, o que mais é relatado entre os entrevistados do grupo lombalgia foi “repouso”. Segundo alguns estudos citados por Negrelli [27], a posição horizontal alivia a dor em muitos pacientes por diminuir a tensão na região lombar. Já, entre os fatores de piora citados pelo grupo lombalgia, os que mais se destacaram foram: “esforço físico”, “posição em pé” e “flexão de tronco”; que são condições que geram tensão na coluna vertebral. Além disso, posturas inadequadas, movimentos repetitivos, tensão muscular e estresse são sabidamente alguns dos fatores envolvidos na gênese da dor lombar [28]. Assim percebe-se que o conhecimento empírico dos participantes deste estudo mostrou-se de acordo com o conhecimento científico exposto na literatura.

Além disso, diversos estudos relacionam a má postura com a lombalgia. De acordo com Da Silva [29], a dor localizada na região lombar, sem irradiação, que se exacerba na posição ortostática, provavelmente está atribuída a tensão e fadiga da musculatura paravertebral lombar desencadeada por posturas ortostáticas inadequadas e mantidas por longos períodos.

Segundo Macedo e Blank [30], o trabalho sentado por longas horas, o trabalho pesado, o levantamento de peso, a falta de exercícios físicos e os problemas psicológicos representam alguns dos principais fatores que contribuem para a cronicidade da dor lombar.

Quanto à incapacidade funcional, a amostra do presente estudo apresentou um escore médio de 5,5 (± 2,82) pontos no Questionário Roland-Morris. Este questionário tem como ponto de corte o escore “14”, ou seja, os indivíduos avaliados com um escore igual ou maior que “14” são classificados como incapacitados funcionalmente [31]. Este resultado mostrou-se inferior ao ponto de corte recomendado pelos autores, indicando, que em média, os avaliados não apresentaram incapacidade funcional significante.

Já na avaliação EMG de superfície para verificação da eficiência neuromuscular dos extensores lombares em indivíduos com e sem lombalgia, com os resultados obtidos na análise é possível afirmar que quando comparado com o grupo controle, os indivíduos com lombalgia apresentaram menor atividade eletromiográfica, ou seja, menores potenciais de ação que o grupo controle.

De acordo com Potvin & O’Brien [32], fatores fisiológicos individuais relacionados à falha no sistema de controle motor, que determina a velocidade de ativação muscular e coordenação, além de alterações na capacidade de força e resistência muscular, têm sido relatados na literatura como associados à lombalgia.

A redução no tempo de resposta e os níveis baixos de pré-ativação muscular diminuem a capacidade de suporte de carga da coluna, aumentando assim o risco de lesão. Além disso, níveis menores de resistência e força muscular do que a necessária para o trabalho tem sido associada a alterações no padrão de recrutamento muscular e consequentemente à lombalgia [32].

A pouca resistência da musculatura paraespinhal é comum em pacientes com LC [33]. Segundo Kankaanpãã et al. [34], estes indivíduos evitam movimentos na coluna nas atividades do cotidiano, devido ao medo da dor e suas consequências. Isto leva principalmente a atrofia de fibras do tipo II nos músculos multífidios, e consequentemente a maior dor e também ao desuso da musculatura da região lombar. Estes eventos determinam um ciclo, no qual quanto mais o acometimento dos paraespinhais, menos uso destes músculos e, consequentemente, o surgimento de atrofia e dor.

Quando comparado à ação muscular dos extensores durante a contração voluntária máxima em decúbito ventral e sentado sem encosto, é possível observar que o grupo com lombalgia apresentou maiores potenciais de ação na posição sentada, enquanto o grupo controle apresentou maior atividade eletromiográfica durante a contração voluntária máxima em decúbito ventral.

Além disso, estudos apontam que o tempo de resistência isométrica tem sido relacionado com a ocorrência da dor lombar [35,36], visto que a baixa resistência isométrica da musculatura lombar de voluntários portadores de lombalgia tem mostrado ser significantemente menor que o de voluntários saudáveis [37,38].

Uma possível explicação para essa relação entre força e resistência isométrica dos músculos eretores da espinha lombar com a manutenção da integridade física e funcional da coluna vertebral é que, com a fadiga muscular, definida como redução na capacidade do sistema neuromuscular em gerar força ou realizar trabalho [39], ocorre sobrecarga sobre os elementos passivos (cápsulas, ligamentos e discos intervertebrais) responsáveis pela estabilidade da coluna vertebral durante a execução de padrões de movimento específicos de determinados esportes, resultando em danos a estruturas sensíveis à distensão e produzindo dor [40].

De acordo com estudos realizados por Hides et al. [41,42], após um episódio de dor lombar, ocorre rápida atrofia dos músculos eretos da espinha lombares e essa atrofia persiste mesmo após a regressão dos sintomas. No presente estudo foi possível observar também que o músculo que apresentou maior atividade no grupo lombalgia, tanto na posição sentada quanto em decúbito ventral foi o multifídeo esquerdo. Já no grupo controle, na posição em decúbito ventral observam-se maiores potenciais de ação do músculo eretor direito, enquanto na posição sentada sem encosto, a maior atividade é realizada pelo músculo iliocostal direito.

Segundo Wilke et al.[43], próximo a L4-L5, o múltifídeo contribui com 2/3 do aumento da rigidez segmentar resultante da contração. Assim, qualquer lesão no segmento pode comprometer a estabilidade da região lombar [42].

Estudos [41,42] mostraram que ocorre uma disfunção do multifídeo após um primeiro episódio de lombalgia unilateral. Uma das explicações para a alta taxa de recidivas em lombálgicos pode ser o fato deste músculo não recuperar o volume mesmo após a redução do quadro álgico, comprometendo assim a estabilidade lombar.

 

Conclusão

 

Por meio dos resultados obtidos no presente estudo é possível concluir que apesar de indivíduos com lombalgia crônica realizarem atividade física de forma regular, alguns aspectos devem ser levados em conta na realização desta, visto que a prática errônea pode intensificar as lesões e exacerbar o quadro álgico.

Além disso, ao avaliar a capacidade funcional dos indivíduos do grupo lombalgia, por meio do Questionário Roland-Morris, ficou evidenciado neste estudo que apesar de apresentarem quadros de lombalgia crônica, os indivíduos não foram considerados incapacitantes.

Referente à análise eletromiográfica dos músculos eretores da espinha, é possível observar que os indivíduos com lombalgia apresentam menor potencial de ação quando comparados com o grupo controle.

Sugere-se que sejam realizados novos estudos com uma amostra maior a fim de verificar melhor a atividade eletromiográfica dos músculos extensores do tronco em indivíduos com e sem lombalgia crônica, de modo a se poder estabelecer a real relação entre os músculos extensores do tronco na dinâmica de estabilização deste.

 

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