ARTIGO
ORIGINAL
Elaboração
de manual sobre fibras alimentares e constipação intestinal
Elaboration of handbook about dietary fibers and bowel constipation
Sarah Maria Barneze
Costa*, Laís Hollara Medeiros*, Juliane Cristine Delfino Machado Zugaib*, Laís
Silveira de Souza*, Emiliana Tieppo Betting**, Suely Prieto de Barros***
*Nutricionista,
Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São
Paulo, **Nutricionista do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais
da Universidade de São Paulo, Especialista em Nutrição Clínica pela
Universidade Sagrado Coração, ***Nutricionista do Hospital de Reabilitação de
Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo, Doutora em Pediatria pela
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
Recebido 27 de julho
de 2016; aceito 15 de março de 2017.
Endereço
para correspondência:
Sarah Maria Barneze Costa, Rua Zico Grizzo, 98, Jardim Ferreira Dias 17209-670
Jaú SP, E-mail: sarahbarneze@hotmail.com; Laís Hollara Medeiros:
laishollara@gmail.com; Juliane Cristine Delfino Machado Zugaib:
ju_delfino@hotmail.com; Laís Silveira de Souza: lais_silveira@ymail.com;
Emiliana Tieppo Betting: emilianatb@centrinho.usp.br; Suely Prieto de Barros: suelyprietro@yahoo.com.br
Resumo
Objetivo: Elaborar um manual
com alimentos ricos em fibras para ser usado na composição da dieta líquida
homogênea dos pacientes em pós-operatório no Hospital de Reabilitação de
Anomalias Craniofaciais, Universidade de São Paulo (HRAC-USP), de todas as
idades, para reduzir ou prevenir a constipação intestinal. Métodos: O manual contém temática que esclarece sobre a importância
das fibras alimentares, fontes, quantidades de uso, interação com outros
nutrientes, forma de preparo, solubilidade, funções e problemas causados pelo
excesso de ingestão. Consta também de uma lista de alimentos com quantidade de
fibras presentes por 100 g de cada alimento. O manual foi elaborado pelas alunas
do programa de Aprimoramento Profissional da Fundação para o Desenvolvimento
Administrativo (FUNDAP) e será distribuído para todos os pacientes em
pós-operatórios submetidos à dieta líquida homogênea. Resultados: O uso das fibras será orientado de forma preventiva
para os pacientes que não apresentam constipação intestinal e de forma
corretiva para os já constipados. Conclusão:
A constipação intestinal tem seu quadro piorado quando indivíduos são
submetidos a dietas líquidas e homogêneas, sendo assim, a composição desta
dieta tem que ser enriquecida com fibras alimentares para prevenir ou corrigir
a constipação intestinal.
Palavras-chave:
manual, fibras alimentares, dieta, constipação intestinal.
Abstract
Objective: To elaborate
a handbook with high-fiber for liquid postoperative diet in in the Hospital de Reabilitação
de Anomalias Craniofaciais,
Universidade de São Paulo (HRAC-USP), all ages,
for reducing or preventing the bowel constipation. Methods: The handbook contained a set of importance about dietary
fibers, classification, food spring, amount of use, interaction with others
nutrients, solubility, functions and problems caused for excess of ingestion.
Also have a list of food with fibers quantities presents in 100 g of each food.
The handbook was elaborated by the students of Fundação
para o Desenvolvimento Administrativo
(FUNDAP) Professional Refinement Program and was distributed to all patients in
postoperative submitted to the homogeneous liquid diet. Results: The use of fibers will oriented for
the patients that not show bowel constipation (preventive form) and for the
already constipated (corrective form). Conclusion:
The bowel constipation increases when these individuals are submit
to liquid and homogeneous diet; in such case, the composition this diet must be
enriched with dietary fibers to prevent or correct the bowel constipation.
Key-words: handbook,
dietary fibers, diet, bowel constipation.
De acordo com a National Academy of Sciences [1], as
fibras totais dos alimentos são divididas em dois grupos: fibras funcionais e
fibras alimentares. As fibras funcionais exercem papel benéfico à saúde, quer
sejam acrescidas aos alimentos ou oferecidas na forma de suplementos
alimentares. Podem ser obtidas a partir de isolados de plantas não digeríveis
(amido resistente, pectinas, gomas), animais (quitina, quitosano) ou produzidas
industrialmente (inulina, polidextrose) [2].
De modo geral, as
fibras alimentares (FA) são polímeros de carboidratos não digeríveis e resistentes
à ação das enzimas do trato gastrintestinal. São encontradas em alimentos de
origem vegetal como as sementes, frutas, verduras, legumes e grãos integrais,
desempenhando diversas funções no organismo, são formadoras do bolo fecal,
normalizam a velocidade do trato gastrintestinal e influenciam o pH do cólon [3-6].
Na terapia
nutricional enteral, fornece proteção aos colonócitos, células do cólon, já que
evitam a translocação bacteriana [7].
Ainda são
classificadas em fibras solúveis (pectinas, gomas, inulina) e insolúveis
(ligninas, celulose), de acordo com a solubilidade em água. As fibras solúveis
são fermentadas no intestino grosso e formam géis durante a passagem no trato
gastrintestinal. Já as fibras insolúveis possuem fermentação limitada e sem a
formação de géis. Na composição nutricional das FA na maioria dos alimentos,
cerca de um terço é constituído de fibras solúveis e dois terços de fibras
insolúveis [3,6].
Para indivíduos que
necessitam perder peso, as FA não possuem calorias e seu mecanismo tem a função
de promover a saciedade. Alimentos com FA fornecem uma maior mastigação, o que
estimula a produção da saliva e do ácido gástrico, resultando em expansão do
estomago [6].
Na prevenção de
doenças como o diabetes mellitus, as FA agem na regulação dos níveis de glicose
no sangue por retardar o esvaziamento gástrico e liberar a colestocinina e
estimulação do nervo parassimpático [3,6,8].
Na melhora do
colesterol total e da lipoproteína de baixa intensidade (LDL), entretanto,
ainda não é claro o funcionamento deste mecanismo, mas algumas hipóteses
sugerem que as FA ligam-se aos ácidos biliares ou ao colesterol no momento da
formação das micelas. Desta forma, ocorre um aumento na regulação dos
receptores do colesterol LDL e sua depuração no organismo torna-se maior, porém
uma maior depuração dos ácidos biliares não é suficiente para explicar a
diminuição do colesterol [9]. Segundo Ripsin et al. [10], o consumo de 3 g de FA solúveis diárias, por exemplo, o
equivalente a aproximadamente 3 maçãs ou 2 colheres de sopa de aveia, é capaz
de reduzir em 2% o colesterol total em indivíduos com hipercolesterolemia.
Na prevenção do
câncer, como de mama, cólon e reto [11,12], uma dieta pobre em FA pode adiar o
tempo de transito gastrintestinal e a mucosa intestinal ficar
exposta a agentes carcinógenos, levando ao desenvolvimento de câncer de cólon e
reto. Já uma dieta rica em FA, aumenta a concentração de ácidos graxos de
cadeia curta pela fermentação e destrói as células cancerígenas [11]. No câncer
de mama, as FA auxiliam na diminuição do estrógeno no sangue e impede a
atividade da beta-glucuronidase bacteriana no intestino, enzima esta
responsável pela produção de substancias carcinogênicas.
A utilização mínima de 10 g diárias de FA, especificamente fontes de cereais,
frutas, verduras e legumes, reduz em 7% o risco de câncer de mama [12].
Na constipação
intestinal, as FA retêm água e chegam ao cólon
intactas, o que facilita a evacuação intestinal [2].
A recomendação diária
de FA em crianças e adolescentes, ainda não é coesa devido aos poucos estudos
realizados na área, porém, sugere-se que de 0,5 g de FA multiplicado pelo peso
corporal da criança em kg seja o suficiente [4].
Para os adultos, de
acordo com o [1], a recomendação diária é de 14 g por 1000 kcal, o que varia em
função da idade, sexo e gasto calórico [4-6,13].
Seu consumo em
excesso, é prejudicial à saúde e compromete a biodisponibilidade de minerais
[4,5]. Um estudo experimental demonstrou haver relação positiva entre o excesso
de FA e a menor absorção intestinal de carboidratos, lipídios, zinco e cálcio
[13].
A ingestão de água,
de acordo com as recomendações nutricionais, associada a uma dieta rica em FA,
aumenta o conteúdo do bolo fecal e regula o funcionamento intestinal [14].
Os prebióticos
(inulina, oligofrutose, fruto-oligossacarídeos) são FA que servem de alimento
para as bactérias benéficas do intestino (bifidobactérias e lactobacilos),
enquanto que impedem o crescimento de bactérias patógenas (clostridios), e
assim, constroem uma flora intestinal saudável. De acordo com alguns estudos,
os prebióticos são capazes de agir no sistema imune do intestino. Em adultos, a
suplementação de prebióticos esta associada à melhora clínica de doenças
inflamatórias como a colite ulcerativa e a doença de Crohn. E em crianças, a
fórmula infantil com prebióticos faz aumentar a secreção do anticorpo IgA e previne doenças causadas por vírus e bactérias
[15,16].
Após a significância
das FA em vários contextos experimentais e clínicos, foi elaborado um manual
contendo informações a respeito dessas e de seus benefícios alimentares quando
associadas a uma dieta líquida homogênea em pacientes submetidos a cirurgias
buco-maxilares.
Objetivo
Elaborar um manual
com alimentos ricos em fibras para ser usado na composição da dieta líquida
homogênea dos pacientes em pós-operatório no Hospital de Reabilitação de
Anomalias Craniofaciais, Universidade de São Paulo (HRAC-USP), de todas as
idades, para reduzir ou prevenir a constipação intestinal.
Foi elaborado um
manual intitulado como: “Coma muita fibra após sua cirurgia!” no Departamento
de Nutrição e Dietética do HRAC-USP, por alunas do programa de Aprimoramento
Profissional da Fundação para o Desenvolvimento Administrativo (FUNDAP) com
destinação, principalmente, aos pacientes em pós-operatório de cirurgias
buco-maxilares no HRAC-USP submetidos à dieta líquida homogênea pelo período de
30 a 60 dias.
O
manual possui
informações sobre as FA: definição;
principais funções na prevenção de
doenças
e de sua ação no mecanismo fisiológico no
organismo; quantidades recomendadas
em gramas por dia para adultos e crianças; importância da
água para o funcionamento
intestinal; consequências ocasionadas pela falta e pelo excesso;
forma de
preparo em dietas líquidas homogêneas e quantidades
fornecidas por determinados
alimentos.
A tabela do manual é
provida de uma lista com vários grupos alimentares e as quantidades de FA em
gramas presentes em 100 g de cada alimento. Para a elaboração da tabela
utilizaram-se duas referencias: a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos
da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e a Tabela Brasileira de
Composição de Alimentos da Universidade de São Paulo (USP), sendo os alimentos
selecionados segundo a maior quantidade de FA e os mais usualmente consumidos
pela população brasileira.
O manual foi entregue
aos pacientes no primeiro dia pós-operatório das cirurgias de enxerto ósseo,
ortognática, expansão e demais cirurgias com recomendação de dieta liquida
homogênea. Os pacientes receberam orientações de forma preventiva para os que
não eram constipados e de forma corretiva para os constipados.
Assim, a dieta
liquida homogênea fornece pouca quantidade de FA aos pacientes submetidos às
cirurgias buxo-maxilares atendidos no HCRA-USP, o que
resulta na constipação intestinal aguda, prejudicando a saúde dos pacientes em
recuperação. Estes pacientes podem permanecem com esta dieta líquida de 30 a 60
dias.
Markland [19],
demonstrou que cerca de 14% da população mundial é
acometida pela constipação, trazendo prejuízos a qualidade de vida, sendo o
tratamento ineficiente na maioria dos casos e visto seu tratamento
medicamentoso não satisfatoriamente pelos pacientes. Desta forma, a ingestão de
FA é uma alternativa para tal finalidade junto a dieta
líquida homogênea. As FA fornecem saciedade e beneficiam o estado nutricional
do paciente. Segundo Ho [20], a saciedade é diferente para cada tipo de FA em
relação as suas propriedades físico-químicas e ações no trato gastrointestinal.
As que melhor possuem características sacietógenas são as fibras viscosas como
pectinas e as beta-glicanas, ambas adicionadas no líquido podem fornecer
quantidade adequada de FA e promover maior saciedade. As recomendações são de
pectina em pó, de 1 a 20 g, adicionadas em 54-448 ml de líquido e as
beta-glicanas, de 1,1 a 10,5 g adicionadas em 250-400 ml de líquido. Exemplo de
enriquecimento de líquido com beta-glicanas foi realizado no estudo de Lyly
[21], em que foi adicionado farelo de aveia no líquido e observou-se nas 3
horas seguintes aumento da saciedade regulado pelo hormônio colecistoquinina
que retardou o esvaziamento gástrico.
Outro estudo
realizado por Mostafa [22], demostrou que a constipação intestinal em pacientes
críticos hospitalizados em UTIs com nutrição enteral pobre em FA e portando
ventilação mecânica (VM), cerca de 42% dos pacientes
que estavam constipados, tiveram falha no desmame da VM por uma maior força
exercida na evacuação e incapacidade respiratória. O tempo de internação desse
paciente aumentou, bem como as infecções (peritonite), uso de laxantes e
desestabilização do equilíbrio dos fluidos corporais.
O manual de FA
proposto para os pacientes em pós-operatório de cirurgias buco-maxilares do
HRAC-USP é um projeto piloto para futuros estudos nesta área da saúde pública.
Popularmente, a constipação intestinal é um problema de saúde pública no
Brasil, acometendo principalmente os pacientes hospitalizados submetidos a
dietas liquidas homogêneas por um longo período de tempo. Nesta dieta líquida
homogênea, os alimentos são liquidificados e coados, retirando-se as FA, responsáveis
pelo bom funcionamento intestinal e outros efeitos benéficos ao organismo.
Assim, com a utilização do manual, os pacientes poderão repor as FA na dieta
com o intuito de prevenir e/ou corrigir a constipação intestinal.