ARTIGO ORIGINAL

Aceitação de suplemento hipercalórico e hiperproteico por pacientes oncológicos em um hospital escola de Pouso Alegre/MG

Acceptance of hypercaloric and hyperprotein supplement by cancer patients in a hospital school de Pouso Alegre/MG

 

Déborah Gomes Dias*, Andrea Tiengo, M.Sc.**, Ana Carolina Brasil e Bernardes, M.Sc.***

 

*Acadêmica do Curso de Nutrição da Universidade do Vale do Sapucaí, Pouso Alegre/MG, **Docente do Curso de Nutrição da Universidade do Vale do Sapucaí, Pouso Alegre/MG - Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas Samuel Libânio na cidade de Pouso Alegre/MG

 

Recebido 16 de julho de 2017; aceito 15 de dezembro de 2019.

Correspondência: Ana Carolina Brasil e Bernardes, Av. Cel. Alfredo Custódio de Paula, 320 Centro 37500-000 Pouso Alegre MG

 

Déborah Gomes Dias: deborahgdias@outlook.com

Andrea Tiengo: deiatiengo@yahoo.com.br

Ana Carolina Brasil e Bernardes: carolbrasil_pa@hotmail.com

 

Resumo

Objetivo: Desenvolver um suplemento alimentar hipercalórico e hiperproteico e verificar a sua aceitabilidade junto aos pacientes oncológicos de um hospital escola. Métodos: Foram escolhidos aleatoriamente 60 pacientes internados nas enfermarias de um hospital na cidade de Pouso Alegre/MG. Os pacientes receberam um complemento alimentar hipercalórico e hiperproteico, acrescido de triglicerídeos de cadeia média e após o consumo foi aplicado um questionário para avaliar a sua aceitação. Resultados: Observou-se aceitação do suplemento para ambos os sexos, entretanto mulheres de 18 a 70 anos atribuíram uma nota média de 6 pontos, indicando que comeriam muito frequentemente o suplemento. Os pacientes do sexo masculino com idade entre 35 e 45 anos tiveram uma melhor aderência ao suplemento e comeriam sempre, com nota média de 8 pontos. Conclusão: Os resultados sugerem que homens e mulheres aceitaram e avaliaram positivamente o produto e o quesito mais bem avaliado foi o sabor.

Palavras-chave: suplementos nutricionais, desnutrição proteico-calórica, terapia nutricional.

 

Abstract

Objective: To develop a hypercaloric and hyperprotein dietary supplement and verify its acceptability by oncology patients at a hospital school. Methods: Sixty patients were randomly assigned to the wards of a university hospital in the city of Pouso Alegre/MG. The patients received a hypercaloric and hyperproteic food supplement, plus medium chain triglycerides and after the consumption a questionnaire was applied to evaluate its acceptance. Results: Supplementation was observed for both sexes, however women aged 18-70 years gave an average score of 6 points, indicating that they would eat the supplement very often. Male patients aged 35-45 years had a better adherence to the supplement and would always eat, with an average score of 8 points. Conclusion: The results suggest that men and women accepted and positively evaluated the product and the most appreciate was the taste.

Key-words: dietary supplements, protein-energy malnutrition, nutrition therapy.

 

Introdução

 

Câncer define-se por uma união de patologias em que ocorre o crescimento acelerado e irreprimível das células, com predisposição de se alastrar por órgãos e tecidos do corpo humano e invadir outras partes do nosso sistema, induzindo metástase como uma ação provocada por alterações metabólicas de importante relevância. De acordo com a Organização Mundial De Saúde (OMS) surgem pelo menos nove milhões de casos por ano e sendo a segunda maior causa de morte na maioria dos países, inclusive no Brasil [1].

Pacientes oncológicos estão mais susceptíveis a desnutrição quando comparados aos demais pacientes hospitalizados, devido a agressividade do tratamento. Estima-se que 40% a 80% dos distúrbios nutricionais que acometem os pacientes oncológicos são a perda de peso e a desnutrição, e a introdução precoce de alimentos e nutrientes adequados para reduzir o catabolismo de proteínas, proteger o sistema imunológico de possíveis doenças, otimizar a qualidade de vida, diminuir os problemas resultantes do tratamento, posteriormente o encerramento desses agravos é a finalidade da terapia nutricional [2,3].

Os tratamentos para pacientes oncológicos podem causar reações adversas e prejudicar o seu estado nutricional. Intervenções cirúrgicas, radioterapia e quimioterapia podem estar relacionados aos sintomas de dores, constipação, enjoo, vômito, inflamações na região oral gerando problemas mecânicos para mastigar e deglutir alimentos e também a inapetência, contribuindo para uma menor ingesta alimentar e consequentemente a desnutrição. O aumento de infecções se dá após a piora do estado nutricional, interferindo na resposta ao tratamento [4-6].

Para terapia nutricional, a utilização da via oral deve ser considerada a primeira opção para nutrir o paciente, pois é a forma mais fisiológica, o que torna o tratamento menos agressivo, auxiliando no aumento do aporte nutricional, com a inclusão de alimentos hipercalóricos e hiperproteicos. Entende-se por terapia nutricional, todos os procedimentos terapêuticos capazes de manter ou recuperar o estado nutricional [7,8].

Em pacientes oncológicos a terapia nutricional deve ser otimizada para atender as necessidades do paciente, isso porque, uma dieta individualizada é mais efetiva para a aceitabilidade, palatabillidade e eficiência do tratamento dietoterápico. Quanto mais precoce o início da terapia, melhor será a resposta ao tratamento e a recuperação do estado nutricional [9].

Muitos dos pacientes oncológicos são acometidos por sinais e sintomas de enjoos, vômitos, anorexia e caquexia, distúrbio hidroeletrolítico, alterações no olfato e nas papilas gustativas e obstrução intestinal, resultantes dos tratamentos quimioterápicos ou radioterápicos, assim como, a utilização de determinados fármacos [10]. Essas alterações recorrentes provocam redução na ingesta de alimentos e cabe ao nutricionista modificar a dieta e deixá-la da forma mais agradável e saborosa para que o paciente a aceite e mantenha o consumo dentro de padrões minimamente estabelecidos [2].

O objetivo deste projeto é desenvolver um suplemento alimentar hipercalórico e hiperproteico e verificar a sua aceitabilidade junto aos pacientes oncológicos de um hospital escola.

 

Material e métodos

 

Trata-se de um estudo quantitativo e experimental, realizado em um hospital universitário na cidade de Pouso Alegre/MG no ano de 2016. A pesquisa teve aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) sob o protocolo n.:1.381.225.

Para iniciar a pesquisa realizou-se uma busca bibliográfica nas bases de dados relacionadas com a área da Ciências da Saúde.

Foi ofertado um suplemento hipercalórico e hiperproteico, composto por água fervida e filtrada, módulo de carboidrato, módulo proteico, módulo lipídico, morangos e açúcar, servido congelado e porcionado em sacos específicos para “chup-chup”1, em porções de 100 ml.

O suplemento foi preparado um dia antes da coleta no setor do lactário do próprio hospital, acondicionados a temperatura de -5°C.

Para distribuição do suplemento o transporte foi feito em caixas térmicas.

A abordagem ao paciente foi feita de forma clara e objetiva, e somente após a entrega e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) era entregue o questionário para avaliação.

O questionário foi composto por questões com: idade, grau de escolaridade, gênero e data, além de uma ficha de avaliação, com escalas de aceitação, conforme tabela I.

 

Tabela I - Legenda de notas de avaliação para o suplemento.

 

 

Foram incluídos no estudo pacientes de ambos os sexos, com idade acima de 18 anos, com alimentação exclusivamente por via oral, com prescrição dietoterápica de dieta livre e que aceitassem e autorizassem a participação na pesquisa, após assinatura do TCLE. Pacientes em uso do quimioterápico oxaliplatina foram excluídos, a fim de reduzir os riscos de danos ao sistema nervoso central.

A composição nutricional do suplemento foi calculada através da tabela brasileira de composição de alimentos (TACO) 4ªed. (2011), tabela para avaliação de consumo alimentar em medidas caseiras e rótulos dos módulos utilizados no preparo, conforme tabela II.

 

Tabela II - Informação calórica do suplemento.

 

AFF = água fervida e filtrada, M.PTN = módulo proteico, M.LIP = módulo lipídico, M.CHO = módulo de carboidrato, p = pequeno, col. = colher, uni. = unidade.

 

Para estatísticas descritivas foi utilizado média, desvio padrão qualitativas e para variáveis categóricas proporções em porcentagem [11-13] e para o cálculo dos dados de avaliação e aceitação foi utilizado o teste T student para amostras independentes e estatística descritiva [14,15].

 

Resultados

 

A amostra foi composta por 60 pacientes, sendo 22 do sexo masculino e 38 do sexo feminino com idade entre 18 e 70 anos, pacientes do serviço de oncologia de um hospital universitário na cidade de Pouso Alegre/MG.

A aceitação do suplemento pelo público feminino baseou-se numa média de 8 pontos (gostei muito) para todos os quesitos avaliados, tendo uma melhor aceitação de pacientes com idade entre 25-35 anos. O desvio padrão do quesito cor e sabor foi de 0,2 pontos tanto para mais como para menos, e para textura 0,5 pontos e para o aspecto aroma não houve desvio padrão.

 

 

Figura 1 - Avaliação de cor, aroma, sabor e textura do suplemento em pacientes do sexo feminino.

 

Para o público masculino a aceitação também manteve-se com média 8, destacando-se os pacientes com idades entre 25-35 anos que aceitaram muito bem todos os quesitos. No aspecto de cor notou-se um desvio padrão de 0,3 pontos, para o sabor de 0,5 pontos, para a textura 0,2 e para o aroma 0. Isso explica a boa aceitação do suplemento.

 

 

Figura 2 - Avaliação de cor, aroma, sabor e textura do suplemento em pacientes do sexo masculino.

 

Podemos ainda fazer algumas considerações, no quesito cor houve uma pequena diferença na faixa etária de 18-25 anos, a aceitação da cor pelo público feminino foi maior que o masculino. Nas faixas de 25-35 e 35-45 anos os valores permaneceram os mesmos tanto para os homens como para as mulheres. Os pacientes com idade acima de 45 anos do sexo masculino aceitaram melhor a cor do suplemento em relação ao público feminino.

Em relação ao aroma verificou-se que este é apreciado de maneira constante pelo público masculino até a faixa de 45 anos, e pelo o público feminino a partir dos 45 anos.

Quanto a textura, os pacientes com idade de 18-25 anos e acima dos 45, nota-se que o público masculino é mais perceptível em relação ao feminino. Na faixa etária de 25-35 anos o valor foi o mesmo para ambos os gêneros.

Quanto ao sabor verificou-se que, nas faixas etárias de 18-25 e 25-35 anos, a percepção feminina foi maior que a masculina. Para os pacientes com idades de 35-45 anos houve uma melhor aceitação entre o público masculino, e aos entrevistados acima de 45 anos o mesmo resultado foi observado para ambos os sexos.

Já para aceitação global e avaliação global obtivemos os seguintes resultados. Os pacientes do gênero masculino na faixa etária de 35-45 anos apenas, houve uma menor aceitação do suplemento com uma média de nota 6 para gostei ligeiramente. As demais idades aceitaram bem o suplemento com a classificação de gostei muito (média de nota 8).

Em questão de avaliação global podemos notar que os pacientes do sexo masculino com idades entre 18-25, 25-35 e acima de 45 anos comeriam frequentemente o suplemento (com a nota média de 5 pontos), já os de 35-45 anos tiveram uma melhor aderência ao suplemento e comeriam sempre (com nota média de 8 pontos).

 

 

Figura 3 - Demonstrativo de notas de avaliação e aceitação global para o sexo masculino.

 

Analisando a aceitação global podemos observar que se obteve um número significativo de pacientes que gostou muito (notas 7 e 8 ) do suplemento com as idades de > 18 e > 45 anos para o sexo feminino.

As mulheres avaliaram o suplemento com nota média de 6 pontos, indicando que comeriam muito frequentemente o suplemento.

 

 

Figura 4 - Demonstrativo de notas de avaliação e aceitação global para o sexo feminino.

 

Discussão

 

Alimentos com altos valores calóricos auxiliam na diminuição da perda de peso e no combate à desnutrição. Para o paciente oncológico, isso é de suma importância, pois pode auxiliar em uma melhor aderência ao tratamento garantindo e uma melhor qualidade de vida [16].

Observou-se na pesquisa que 68% dos pacientes tinham idade acima de 45 anos, corroborando com o estudo de Vale [17] e Vieira [18], que descrevem que o câncer é uma patologia em que sua maior incidência ocorre em pacientes já com idade avançada, principalmente em indivíduos do sexo masculino.

Os tratamentos mais frequentes do câncer são a radioterapia, quimioterapia e cirurgias. Estas intervenções causam efeitos colaterais nos pacientes como: mucosite, xerostomia, disgeusia, hipersensibilidade dentária, infecções fúngicas e bacterianas e trismo, devido a esses sintomas o paciente terá uma diminuição na ingestão de alimentos e consequentemente a perda de peso e desnutrição [19].

A terapia nutricional ofertada de forma adequada é a principal maneira de evitar e tratar a desnutrição do paciente internado, podendo ser via oral, enteral ou parenteral, procurando sempre oferecer as necessidades de nutrientes indispensáveis. Para os pacientes que tenham condições fisiológicas a via oral é prioridade. Além dos suplementos industrializados existem também os artesanais, que por sua vez são menos aceitos pelo sabor repetitivo [9].

Muitos estudos indicam a eficácia do uso de suplementos em pacientes oncológicos, a maioria destes estudos mostram que ao serem vinculados ao tratamento quimioterápico o complemento alimentar irá auxiliar no ganho ou na redução do peso do doente, melhorando seu sistema imunológico e a qualidade de vida [20].

Segundo Bentes e Paes [21] o uso de suplementos depende da aceitação do produto por parte dos doentes, tendo como fatores indispensáveis para se ter uma boa aderência o sabor, textura e a quantidade. O sabor e a textura são os principais aspectos a serem levados em conta, uma vez que, os tratamentos de quimioterapia e radioterapia causam alterações no paladar e isso associado a gostos menos apreciados pelos pacientes pode ocasionar numa diminuição da ingestão alimentar.

Vários autores indicam que a utilização de suplementos nutricionais orais pode ser iniciada logo que o paciente apresente sinais de desnutrição ou se houve uma diminuição da ingesta alimentar nos últimos de 7 dias, podendo ser mantida durante todo o tratamento. Os suplementos nutricionais aumentam a ingestão de energia, proteínas e micronutrientes, melhorando o estado nutricional [16].

A Lei de Saúde e Educação Sobre Suplemento Dietéticos classifica os complementos alimentares como um a forma de aumentar o valor calórico das dietas, mas não sendo uma forma exclusiva de alimentação [22].

Um estudo realizado na faculdade de ciências e tecnologia em Lisboa fez um comparativo da aceitação de suplementos artesanais na forma gelada e observou-se após a análise sensorial que os suplementos artesanais são bem aceitos pela maioria dos pacientes, entretanto o uso do leite gerou menos aceitação em relação a textura. 71% dos pacientes aceitaram melhor o suplemento artesanal em relação ao suplemento industrializado. O seu suplemento continha 205 kcal em 125 ml [20].

 

Conclusão

 

Os suplementos hipercalóricos e hiperproteicos têm sido amplamente utilizados como uma alternativa dietética para pacientes oncológicos. Sabe-se que tratamentos como a quimioterapia e radioterapia pode impactar o estado nutricional, prejudicando o resultado do tratamento. Conclui-se que formas alternativas de suplementação, como a apresentada neste estudo, são eficazes para melhor aceitação do consumo e se mostrou benéficas por se tratar de uma alternativa dietética para a recuperação do estado nutricional dos pacientes, que se torna tão importante na redução das complicações de morbimortalidade relacionadas ao câncer.

 

Referências

 

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1nomes populares: sacolé, chupa-chupa, flau, geladinho.