ARTIGO ORIGINAL
Cotidiano alimentar das crianças de escolas de
educação infantil: visão dos funcionários
Daily
food for children in kindergarten schools: view of employees
Patricia
Mergen Ramos
Graduada em nutrição pelo departamento de Nutrição
pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo/RS, Pós-Graduação Latu
sensu em Nutrição Pediátrica no Instituto de Pesquisas, Ensino e Gestão em
Saúde (IPGS), Serrat, Porto Alegre/RS
Recebido
15 de setembro de 2017; aceito 15 de dezembro de 2018.
Correspondência: Patricia
Mergen Ramos, IPGS, Rua Dr. Freire Alemão, 225 Mont' Serrat, Porto Alegre RS,
E-mail: patriciamergenramos@gmail.com
Resumo
Objetivo: Detectar os problemas
que dificultam a efetiva educação alimentar e nutricional dentro de escolas de
educação infantil. Metodologia: Foram
selecionadas 55 mulheres que trabalham em escolas de educação infantil de
Esteio. A coleta de dados foi por meio de questionários, um sobre alimentação
saudável e o outro sobre hábitos e costumes. Resultados: 86,84% das participantes relataram não apresentarem
problemas de saúde. Sobre a educação, pode-se observar que existe uma
dependência do grau de instrução com o local pesquisado. Portanto, quanto mais
educação mais entendimento sobre o cotidiano alimentar das crianças. Sobre a
etnia, foi possível verificar que existe uma diferença entre o observado na
pesquisa e o panorama populacional da região, a etnia não influência no
cotidiano alimentar das crianças. Conclusão:
Há necessidade de capacitação dos profissionais da área da saúde e da
pedagogia, assim como auxiliares e proprietários, que possam ter orientações
sobre as questões alimentares. Nesse sentido o trabalho multidisciplinar com a
presença do profissional nutricionista, para transmissão do conhecimento
técnico em relação à alimentação saudável é de suma importância.
Palavras-chave: alimentos formulados,
alimentos infantis, nutrição da criança.
Abstract
Objective: To detect the
problems that difficult the effective food and nutritional education in schools
of childhood education. Methods:
Fifty-five women working at the school of childhood education of Esteio were selected. The data collection was through two
questionnaires, one about health eating and the other about habits. Results: 86.84% of the participants
reported that they did not have health issues. Regarding education, there is a
dependence of the degree of education with the location researched. Therefore,
the more education one has, more the understanding about the children daily
food habits. When it comes to ethnicity, it could be verified that there is a
difference from the observed in the research and the region population,
ethnicity does not play a role in the children daily food habits. Conclusion: We conclude that there is a
need for well-trained health and education professionals, as well as teachers,
assistants and owners who can provide guidelines on food issues. In this sense,
the multidisciplinary work with the presence of the nutrition professional as
facilitator in the transfer of technical knowledge about healthy eating,
orienting subjects to be raised in health and nutritional education, will
contribute to the qualification of the services to the school students.
Key-words: formulated
foods, child foods, child nutrition.
A
partir da década de 90 a promoção da saúde, tem sido mais evidenciada e
discutida com o objetivo principal é habilitar os indivíduos a reivindicarem
seus direitos por meio de ações do Estado [1].
Porém,
a educação alimentar e nutricional ainda não é um instrumento de ligação entre
disciplinas e ações de grupos. Pois, ainda está faltando a união entre as
políticas públicas e as ações desenvolvidas no local, fato este observado pela
falta de formação profissional e de experiência da área de conhecimento de
campo [2].
Portanto,
as escolas se tornaram uma forma eficaz de implantação de políticas de educação
alimentar e nutricional (EAN), uma vez que as crianças passam uma grande parte
do seu dia nesses locais; onde o educador tem um fator importante de influência
por meio de exemplo. Nesse contexto o nutricionista atua como mediador,
orientando questões técnicas específicas para alunos e professores [3].
Em
alguns casos não são observados bons resultados nestes programas de educação
alimentar e nutricionais em escolas, muitas vezes devido à falta de incentivo
pelas autoridades educacionais e precariedade das condições de trabalho.
Professoras do ensino infantil tem um conhecimento sobre alimentação saudável,
porém as estratégias para educação nutricional, que podem ser desenvolvidas
pelas suas ações pedagógicas, em um trabalho multidisciplinar, são deixadas
para um segundo plano [4].
Por
outro lado, limitações de horários de trabalho de nutricionistas e, também a
sua rotatividade em escolas públicas, dificulta o trabalho de educação
alimentar e nutricional de alimentos [5].
A
conquista da merenda escolar foi uma vitória, contudo a população tem o direito
à alimentação como uma garantia de melhora da aprendizagem, na saúde e na
evasão escolar. Portanto, a importância de eliminar agravos à saúde da
merendeira no seu meio de trabalho, para a efetividade dos processos de
aprendizagem de educação [6].
Diante
disso, o pressente trabalho teve como objetivo detectar os problemas que
dificultam a efetiva educação alimentar e nutricional dentro de escolas de
educação infantil.
Trata-se
de uma pesquisa observacional descritiva transversal, com controle concomitante
e tempo de coleta de três meses. O presente estudo é parte integrante do
levantamento de dados com professores, auxiliares e cozinheira, realizado em
quatro escolas de educação infantil em Esteio, que detecta as dificuldades
encontradas no entendimento do cotidiano alimentar das crianças de 0 a 5 anos
de idade nestas escolas.
A
amostra foi selecionada por meio de amostragem não probabilística de
conveniência. As escolas de educação Infantil possuíam entre 7 a 12
profissionais, em média, totalizando uma amostra de 55 trabalhadores
pesquisados.
A
coleta de dados foi realizada através de visitas quinzenais, por um período de
três meses.
O
material foi coletado através de dois questionários, observações descritivas e
gravações. Um questionário de alimentação saudável foi usado na primeira
visita, o outro questionário foi usado na segunda visita.
Para
as variáveis qualitativas nominais, como etnia e local de origem e qualitativas
ordinais, como condição clínica particular, foi usado o teste Q-Quadrado e para a variável quantitativa idade, foi usado
o teste Anova.
Para
a variável o entendimento que os profissionais de escolas de educação infantil
de Esteio, têm sobre o cotidiano alimentar em que as crianças de 0 a 5 anos de
idade estão inseridas, foi usado à análise qualitativa, através de descrições e
tabelas.
As
questões foram escolhidas a partir de três eixos temáticos: alimentação, higiene
e saúde; onde a alimentação preencheu as questões dos questionários, e a
higiene e saúde nas visitas de observações.
O
projeto foi desenvolvido de acordo com normas e resoluções de Ética em
pesquisa, através da submissão junto à plataforma Brasil.
Foram
distribuídos 55 questionários, porém somente 33 funcionários responderam as
questões, totalizando 60%, 22 não preencheram os questionários, devido ao fato
de demissão, esquecimento e não aceitaram preencher, e dentre esses cinco
preencheram errado.
Os
entrevistados foram todas mulheres entre 21 e 55 anos. Quando sua formação
educacional, 57,89% possui nível médio, 23,68% ensino fundamental e 15,79%
possuem ensino fundamental. No momento da pesquisa, 86,84% relataram não apresentar
problemas de saúde e 57,89% são oriundas da região metropolitana de Porto
Alegre, em Esteio. Nos estabelecimentos pesquisados, as colaboradoras são
71,05% Caucasianas, 26,32% Afrodescendentes e 2,63% Pardas.
Os
dados obtidos através da aplicação do questionário sobre os hábitos alimentares
de acordo com os profissionais das escolas infantis avaliadas estão expostos na
Tabela I, e sobre os hábitos e costumes na Tabela II.
Tabela I - Resultados do questionário sobre os hábitos alimentares, de acordo com
os profissionais das escolas avaliadas.
Tabela II - Resultados do questionário sobre os hábitos e costumes, de acordo com
os profissionais das escolas avaliadas.
Variáveis nominais
Sobre
a educação, foi possível observar que existe uma dependência do grau de
instrução com o local pesquisado, onde o Qui Quadrado
calculado é 0,8 e menor que o valor tabelado para α = 0,95, isto é,
podemos afirmar com 95% de certeza que há uma correlação com o grau de
instrução e a natureza do espaço pesquisado.
Um
estudo do PNDS (Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde, 2006), que avalia o
consumo alimentar entre crianças de dois a cinco anos, demonstram que mães que
tem uma maior idade e escolaridade tinham filhos que se alimentavam de forma
mais saudável, principalmente as meninas. Embora alguns aspectos demonstram um
aumento de 400%, no período de 1974 a 2003, de alimentos como bolachas,
refrigerantes, o que leva a rever as estratégias de abordagem de alimentação
saudável [7].
Sobre
a etnia, observou-se que existe uma diferença entre o observado na pesquisa e o
panorama populacional da região. Para legitimar a afirmação, foi feito o teste Qui Quadrado com 95% de certeza (α = 0,05) e g.l. = 2 onde Quitab =
5,99 e Quicalc = 0,86, assim se aceita a
hipótese nula onde não há associação dos dados. Sobre a região ou as patologias
existentes nas pesquisadas não foi possível afirmar nada a partir de testes
estatísticos devido à natureza dos dados e construção do questionário de
prospecção.
Foi
possível observar através das respostas obtidas sobre os alimentos in natura e
o processado, que não há muito discernimento a respeito destes conceitos. Desde
o marco legal do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) sempre houve a
preocupação de eliminar ou reduzir os alimentos processados da alimentação das
crianças nas escolas. Por isso, surgiu o incentivo à agricultura familiar
saudável, fazendo com que seja garantida a ingestão de alimentos in natura pelas crianças, uma vez que as
políticas públicas pareciam mercantilizar a agricultura familiar [8].
Demonstrou-se
através dos questionários e das visitas de observações descritivas que há certo
entendimento, porém ocorre a aplicação de forma errônea de forma que não se
obtém um resultado satisfatório. Há a necessidade de envolver várias outras
questões como sustentabilidade social, direito a
alimentação adequada, segurança alimentar durante o preparo das refeições,
preenchimento de planilhas que garantem a segurança alimentar, falta de tempo e
conforto durante o horário das refeições, pois refeitórios são pouco decorados.
Foram
observadas, que não são realizadas ações diárias referentes a uma alimentação
saudável para as crianças, como por exemplo: Unhas compridas e pintadas;
refeitórios pouco decorados; falta de preenchimentos de planilhas; dificuldade
com os proprietários com o entendimento de questões de nutrição, falta do uso
de uniformes completos, compra de refrigerantes, guloseimas, para as
professoras ingerirem e alunos ficam vendo, falta da realização de projetos
referente à nutrição, conceitos errôneos referentes a quantidades conforme a
idade, tempo inadequado para a realização das refeições, materiais e utensílios
inadequados, falta da realização de orientações nutricionais referente à
alimentação e pouca oferta de saladas pelas professoras para com as crianças e
as ofertas realizadas são feitas de uma forma inadequada.
Para
que houvesse um melhor resultado na questão da nutrição infantil, seria
necessário um maior envolvimento dos funcionários com outros profissionais,
como o nutricionista, porém este contato se torna difícil, pois os
nutricionistas quando estão presentes nas escolas [5], geralmente ficam ali
pouco tempo, e por outro lado não é promovido o encontro deles com outros
funcionários, como os professores, talvez pelo fato de não terem substitutas
para acompanharem as crianças em sala de aula.
Para
promoção da saúde em escolas de educação infantil, deverá haver o
impulsionamento da cultura e valorização da alimentação; por meio do
construtivismo, troca de experiências, com o objetivo de formar indivíduos
críticos. Através do trabalho em equipe multidisciplinar e com todos os
integrantes da escola, através de ações norteadoras, podemos construir
metodologias que possam mudar o perfil epidemiológico atual [9].
Nota-se
que nas respostas dos questionários e durante as visitas que as professoras,
auxiliares e cozinheiras, tem certo conhecimento sobre a nutrição, no qual
envolve o cotidiano alimentar das crianças. Porém, esse conhecimento não tem
uma continuidade, são respostas vagas, que não são oriundas de um treinamento
sistemático, com supervisão continua.
Com
isto, é possível induzir que o PNAE não está sendo praticado conforme deveria.
Este programa tem como objetivo contribuir para que a criança tenha um completo
desenvolvimento e crescimento, contribuindo para o rendimento escolar e fazendo
com que adquiram hábitos alimentares saudáveis, através da educação alimentar e
nutricional e da oferta de refeições que contemplam todos os nutrientes
necessários ao bom desempenho da criança enquanto ela estiver na escola [10].
Foi
possível observar que os proprietários das escolas pesquisadas não demonstram
muito interesse em questões referente à alimentação e sim ao custo. E estas
escolas são o reflexo que os proprietários pensam. Os proprietários não acham
necessário, a presença de nutricionistas nas reuniões pedagógicas, o que
dificulta o trabalho. E por outro lado, também, não realizam reuniões com os
pais para expor as dificuldades encontradas no que consiste com a Nutrição.
Foi
observado que os proprietários ou diretores das escolas avaliadas dificultam
várias atividades envolvendo a alimentação adequada, e por outro lado, permite
o uso de doces em geral, em festas de aniversários, o uso de guloseimas pelas
professoras na frente das crianças, o uso do doce para acalmar, o uso de
refrigerantes pelos professores na frente das crianças.
Algumas
questões trabalhadas, como horário em que as refeições são servidas, oferta de
doces para tranquilizar as crianças, refeitórios mal planejados, postura dos
profissionais de educação frente às escolhas alimentares, mostraram a falta de
orientação e necessidade de direcionamento das ações.
Durante
o tempo de coleta de dados, das visitas de observação e de algumas questões
levantadas dos questionários, demonstrou- se a necessidade de mais ações
educativas diárias de educação alimentar e nutricionais bem planejadas e
direcionadas para todos os profissionais de escolas de educação infantil, sendo
baseadas em políticas públicas e sendo orientadas por nutricionista e
psicopedagoga, e estes, utilizando-se das matérias trabalhadas, possam passa as
informações e ações para as crianças [3].
Pode-se
concluir que há necessidade de profissionais da área da saúde e da pedagogia
bem capacitados, assim como professores, auxiliares e proprietários, que possam
ter orientações sobre as questões alimentares. Isto pode ser conseguido com o
aumento da carga horária das nutricionistas na escola, para que possam ter um
trabalho mais abrangente, para a educação alimentar e nutricional, com os
funcionários e as crianças.
Nesse
sentido o trabalho multidisciplinar com a presença do
profissional
nutricionista é indispensável, pois ele atuará
como facilitador da transmissão
do conhecimento técnico em relação à
alimentação saudável, orientando questões
a serem trabalhadas em educação alimentar e nutricional.
O
levantamento de dificuldades de cada escola contribuirá para a qualificação do
atendimento aos alunos na escola; com intervenções bem planejadas, baseadas em
políticas públicas, com o envolvimento de todos na escola, o que acarretará
mudança e consolidação de hábitos alimentares saudáveis.