ARTIGO ORIGINAL

Teor de compostos fenólicos totais em variedades de uvas roxas (Vitis labruscas)

Phenolic compounds in grapes (Vitis labruscas)

 

Decivalda Silva de Araújo*, Jucileide dos Santos*, Laise Cedraz Pinto, D.Sc.**

 

*Acadêmicas de Nutrição, Centro Universitário Estácio da Bahia, **Doutora em Processos Interativos dos Órgãos e Sistemas, Professora adjunto do Centro Universitário Estácio da Bahia

 

Recebido 12 de janeiro de 2017; aceito 15 de setembro de 2017

Endereço para correspondência: Laise Cedraz Pinto, Rua Xingu, 179 Jardim Atalaia, 41770-130 Salvador BA, E-mail: lcedraz@hotmail.com; Decivalda Silva de Araújo: decy-araujo@hotmail.com; Jucileide dos Santos: juhh_@hotmail.com.br

 

Resumo

Alguns alimentos apresentam propriedades biológicas que podem ser atribuídas à presença de compostos fenólicos, tais como em uvas (Vitis labrusca). O teor destes compostos pode apresentar variações a depender das condições de cultivo e variedades da espécie. O presente trabalho objetivou determinar o teor de fenólicos em uvas roxas das variedades Red globe, Isabel e Itália. As amostras foram coletadas e separadas em casca e polpa, seguidas de secagem. Os fenólicos totais foram determinados por redução do reagente Folin-Ciocalteau em meio alcalino. O ácido tânico foi utilizado como padrão analítico. As amostras apresentaram diferentes teores de fenólicos em relação às variedades, à parte da fruta estudada e ao tipo de extração. As cascas das variedades das uvas Itália apresentaram maior teor de fenólicos (4359,4 mg%), seguida da Red globe (3261,1 mg%). As variedades das polpas com maiores porcentuais foram da variedade Itália (3981,6 mg%) seguida da Isabel (3168,3 mg%). Dentre as amostras analisadas, a variedade Itália foi a que apresentou maior riqueza em fenólicos extraídos. O uso ou aproveitamento de subprodutos industriais à base de uvas pode ser estimulado como alternativa para enriquecer a dieta habitual com os compostos fenólicos.

Palavras-chave: Vitis labrusca, uvas roxas, compostos fenólicos

 

Abstract

Some foods are phenolic source compounds, such grape fruit (Vitis labrusca) and show activity in reducing oxidative stress. The aim of this work was to identify the content in phenolic compounds of purple grape of the varieties Red globe, Isabel and Itália, marketed in Salvador/BA, Brazil. The samples of bark and pulp were dried and stored at -20°C. Phenolic contents were determined by reduction of the Folin-Ciocalteau reagent in alkaline medium. Tannic acid was used as analytical standard. The bark of Italy grapes (4359,4 mg%) and Red globe grape (3261,1 mg%) showed higher phenolic totals. The pulp of Italy grapes (3981,6 mg%) and Isabel grapes (3168,3 mg%) showed higher phenolic content. Our results demonstrated that all samples studied are source of phenolic content and by-products of the grape industry may be used to promote intake of these compounds in the diet.

Key-words: Vitis labrusca, purple grapes, phenolics.

 

Introdução

 

Alimentos são considerados funcionais quando apresentam efeitos metabólicos e fisiológicos, que vão além das suas funções nutricionais [1]. O cuidado ao se ingerir uma alimentação saudável e equilibrada é um subsídio essencial para que os alimentos funcionais tenham melhor desempenho no organismo [2]. Os alimentos funcionais não levam à cura de doenças e enfermidades, entretanto são eficientes na prevenção de determinados males, como as doenças crônicas degenerativas. A incidência destas doenças pode ser minimizada com a propagação e conscientização da população quanto à ingestão frequente destes tipos de alimentos [3].

Muitos dos efeitos benéficos ao organismo humano, oriundos das substâncias ou compostos bioativos em alimentos, podem ser comprovados por análises e subsequentes experimentos clínicos [4]. Dentre os compostos bioativos encontrados no Reino Vegetal estão os compostos fenólicos, que são todas as substâncias que englobam o núcleo fenólico e possuem um anel aromático com um ou mais grupos hidroxilas [5].

Os principais compostos fenólicos apresentam capacidade de estabilizar os radicais livres, devido à sua estrutura química e inibe a oxidação do LDL, isto consequentemente, diminui o risco do surgimento da aterosclerose no qual é um processo preditor para doenças cardiovasculares [6]. Os compostos fenólicos existentes nos alimentos têm ação antioxidante, antialérgica, anti-inflamatória e anticarcinogênica [7] e são os principais responsáveis pela atividade antioxidante presentes nas frutas e hortaliças [8].

Alguns alimentos são identificados como uma ótima fonte de compostos fenólicos, tais como certas variedades da fruta uva (Vitis labrusca) e apresentam atividade em reduzir o estresse oxidativo e estão implicados na prevenção de doenças cardiovasculares, câncer e outras doenças crônicas [9].

As uvas de colorações escuras têm maior conteúdo de compostos fenólicos e capacidade antioxidante, desta forma, quanto mais abundante a coloração da uva, mais relevante é a fruta do ponto de vista funcional [10]. Além da coloração da uva, os compostos fenólicos presentes podem ser dependentes de vários fatores, entre eles, a variedade da fruta, o método aplicado na extração e as condições de armazenamento [11].

Considerando que as variedades de uvas comerciais podem apresentar diferentes teores de compostos fenólicos totais, o presente trabalho objetivou determinar o teor de compostos fenólicos em casca e polpa de uvas roxas das variedades Red Globe, Isabel e Itália comercializadas em Salvador/BA.

 

Matérial e métodos

 

As amostras de uvas das variedades Isabel, Itália, Red globe foram adquiridas em comércio local, no município de Salvador/BA. O processamento das frutas para obtenção das amostras secas (casca e polpa) está apresentado na figura 1.

 

 

Figura 1 - Fluxograma do preparo das amostras de uvas para obtenção das amostras secas.

 

 

As amostras secas foram acondicionadas a -20°C até o momento das análises. Os extratos aquosos e metanólicos foram obtidos segundo o fluxograma apresentada na Figura 2.

 

 

Figura 2 - Fluxograma para obtenção do extrato das amostras secas da casca e polpa das uvas selecionadas.

 

Os extratos foram utilizados para quantificar teor de fenólicos totais, segundo normas analíticas do Instituto Adolpho Lutz [12]. Este método envolveu a redução do reagente Folin-Ciocateur em meio alcalino (carbonato de sódio) na presença de fenólicos. O ácido tânico foi utilizado como padrão e uma curva analítica de 0 a 40 ppm foi construída. A leitura foi realizada em espectrofotômetro Ultravioleta Digital Microprocessado Modelo: Q798U, a 760 nm. Os resultados foram expressos em ácido tânico equivalentes (ATE) em miligramas de fenólicos para cada 100 g da amostra (mg%). A análise estatística foi realizada de forma descritiva utilizando o programa Microsoft Excel para identificação das médias e desvio padrão.

 

Resultados

 

A Tabela I apresenta os resultados dos teores de compostos fenólicos identificados nas amostras analisadas.

 

Tabela I - Compostos fenólicos totais em ácido tânico equivalente (ATE) (mg%) das amostras secas da casca e polpa de variedades de uvas

 

ATE = ácido tânico equivalente. mg%: miligramas de ácido tânico para cada 100g da amostra seca.

 

As amostras analisadas apresentaram riqueza em compostos fenólicos. Os valores diferiram entre as variedades estudadas e conforme extração realizada. Nas amostras analisadas das uvas roxas, na tabela I, observou-se que a casca da variedade com maior concentração de compostos fenólicos na extração aquosa foi da Itália (4359,4 mg%) seguida da Red globe (3261,1 mg%). Na extração metanólica, o maior teor identificado foi na casca Itália (1078,2 mg%) seguida da casca Isabel (936,9 mg%).

As variedades das polpas que apresentaram as maiores concentrações de fenólicos totais, em ambas as extrações (aquosa e metanólica), foram a Itália (3981,6 mg% e 1864,6 mg%, respectivamente) seguida da Isabel (3168,3 mg% e 1264,6 mg% respectivamente).

Considerando os valores médios totais das amostras secas, foi identificado um maior teor de fenólicos na casca e polpa por extração aquosa. Das três variedades analisadas, a Itália apresentou maior riqueza em compostos fenólicos em ambas as extrações. A polpa da Red Globe apresentou o  menor teor extraído.

 

Discussão

 

Barros [13] identificou teores de compostos fenólicos totais de alguns frutos, dentre eles em cascas de uvas com valores de 0,6 a 0,8 expressos em mg de equivalentes de ácido gálico por grama de casca liofilizada. Convertendo estes valores para mg%, que seriam equivalentes a 600-800 mg% de ácido gálico, as variedades analisadas no presente estudo apresentaram valores superiores (Tabela I), mesmo sendo submetidas a processo de secagem à quente, por meio de estufa.

A extração aquosa apresentou teores de fenólicos mais elevados do que a metanólica em todas as amostras analisadas. Isso corrobora com a literatura que aponta que a água é um melhor solvente para extrair compostos fenólicos devido a seus aspectos moleculares hidrofílicos [14].  Freire et al. [15] ressaltaram que os compostos fenólicos extraídos das frações hidrofílicas são os responsáveis por mais de 90% da atividade antioxidante. No estudo de Pesco et al. [16] o extrato hidroalcoólico obtido a partir das cascas da uva apresentou uma boa atividade antioxidante, justificando a importância na alimentação para a prevenção de doenças.

Carvalho et al. [17] avaliaram as mesmas variedades estudadas Red Globe, Isabel e Itália e observaram que estas são importantes fontes de compostos fenólicos. Os autores discutem que o consumo desta fruta é recomendado, graças exatamente à presença dos compostos fenólicos e as atividades benéficas a eles atribuídas.

As amostras analisadas foram submetidas a um processo de secagem (Figura 1), seguidas por acondicionamento (-20°C) em embalagens herméticas. Este processo foi realizado para preservar as características das amostras e evitar contaminação microbiana durante armazenamento até execução de todas as análises. Mesmo havendo possibilidade de perdas de compostos fenólicos durante a secagem e armazenamento das amostras, estas ainda apresentaram riqueza destes compostos e podem ser identificadas como uma boa fonte alimentar dos mesmos.

Angelo e Jorge [18] discutem que não há ainda disponível um método padronizado para preparação de amostra e extração de componentes como os fenólicos. Portanto, há necessidade de uma investigação sistemática para preparação de amostra e determinação de fenólicos em alimentos, seja quantificação total, individual e/ou de um grupo ou classe de componentes fenólicos. Além disso, as metodologias utilizadas para análise de fenólicos não são totalmente padronizadas, sendo deste modo, de extrema importância o desenvolvimento e divulgação de métodos por órgãos oficiais.

A depender do tipo de extração ou tratamento adotado nas amostras os valores de fenólicos extraídos podem variar. Cataneo et al. [19] avaliaram teor de flavonóides nas variedades de uvas Couderc 13 e Pinot gris e observaram um aumento significativo do teor de flavonóides totais nos extratos acetônicos, com o tratamento térmico a 45°C. Os autores discutiram que a utilização das biomassas residuais das indústrias vinícolas pode ser uma fonte alternativa de compostos fenólicos.

Devido às suas propriedades antioxidantes já descritas na literatura, há grandes perspectivas de aproveitamento da fruta uva como subproduto industrial, principalmente como fitoterápicos ou desenvolvimento de alimentos com propriedades funcionais, ainda mais considerando variedades com maior potencial de compostos fenólicos como a variedade Itália.

 

Conclusão

 

As amostras diferiram quanto ao teor de fenólicos, no entanto, todas as amostras estudadas apresentaram riqueza nestes compostos. A variedade Itália apresentou teor mais elevado tanto na casca como na polpa da fruta.

A utilização da biomassa da uva, que contém parte da polpa e casca das frutas advindas da indústria de vinhos, pode ser objeto de posteriores estudos como uma forma alternativa para aproveitamento alimentar e elaboração de preparações alimentícias com riqueza em compostos fenólicos.

 

Referências

 

  1. Vidal AM. A Ingestão de alimentos funcionais e sua contribuição para a diminuição da incidência de doenças. CGBS 2012;1(15):43-52.
  2. Carvalho JA. O alimento como remédio: considerações sobre o uso dos alimentos funcionais. Revista Científica do ITPAC, Araguaína 2013;6(4).
  3. Basho SM, Bin MC. Propriedades dos alimentos funcionais e seu papel na prevenção e controle da hipertensão e diabetes. Interbio 2010;4(1):48-58.
  4. Ikeda AA. Considerações sobre tendências e oportunidades dos alimentos funcionais. Revista P&D Engenharia de Produção 2010;8(2):40-56.
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  8. Soares M. Compostos fenólicos e atividade antioxidante da casca de uvas Niágara e Isabel- Rev Bras Frutic 2008;30:1059-64.
  9. Torquato A.S., Vituri TV, Bittencourt PRS, Bittencourt PRS, Arantes VP. Ações e benefícios da uva e seus derivados à saúde. Uningá Review 2012;12(1):58-65.
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  11. Falcão AP. Índice de polifenóis, antocianinas totais e atividade antioxidante de um sistema modelo de geléia de uvas. Ciênc Tecnol Aliment 2007;27:3:637-42.
  12. Instituto Adolfo Lutz. Métodos físico-químicos para análise de alimentos. 4 ed. São Paulo; 2008. p.1020.
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