ARTIGO ORIGINAL

Adequação da alimentação escolar a partir da elaboração de Fichas Técnicas de Preparação

Nutritional adequacy of menus to the recommendations of the National School Feeding Programme

 

Eloisa Porciúncula da Silva*, Ivana Loraine Lindemann**, Gicele Costa Mintem, D.Sc.***, Chirle de Oliveira Raphaelli****, Renata Brasil, M.Sc.*****, Graziele Guimarães Granada******

 

*Faculdade de Nutrição, Universidade Federal de Pelotas/RS, **Docente na Faculdade de Medicina, Universidade Federal da Fronteira Sul, Passo Fundo/RS, ***Docente na Faculdade de Nutrição, Universidade Federal de Pelotas/RS, ****Nutricionista, doutoranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos no Programa de Ciência e Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal de Pelotas/RS, *****Nutricionista do município de Capão do Leão/RS, ******Docente na Faculdade de Nutrição, Universidade Federal de Pelotas, Doutoranda em Patrimónios Alimentares: Culturas e Identidades, Universidade de Coimbra, Portugal

 

Recebido 3 de novembro de 2016; aceito 15 de setembro de 2017

Endereço para correspondência: Eloisa Porciúncula da Silva, Rua Armando Brião, 72 Centro, Capão do Leão RS, E-mail: eloisa_porciuncula@hotmail.com; Ivana Loraine Lindemann: ivanaloraine@hotmail.com; Gicele Costa Mintem: giceleminten.epi@gmail.com; Chirle de Oliveira Raphaelli: chirleraphaelli@hotmail.com; Renata Brasil: tata_brasil_@hotmail.com; Graziele Guimarães Granada: grazigrang@gmail.com

 

Resumo

Avaliou-se a adequação nutricional da alimentação servida a adolescentes de 11 a 15 anos, no município de Capão do Leão/RS, às recomendações do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Foram utilizados dados oriundos de um Projeto de Extensão do Curso de Nutrição da Universidade Federal de Pelotas, através do qual foram elaboradas Fichas Técnicas de Preparação de 16 receitas, servidas em 20 combinações diferentes. Todas as preparações foram analisadas através do Software ADSNutri e, a partir dessas análises, os valores de Energia, Carboidrato, Proteína, Lipídios, Vitamina A, Vitamina C, Cálcio, Ferro, Magnésio, Zinco e Fibras alimentares foram digitados em planilha do aplicativo Excel para verificação da adequação. Considerou-se ideal uma adequação de 100 % e como adequados valores entre 80 e 100 % do recomendado pelo Programa. As preparações salgadas obtiveram resultados mais próximos dos considerados adequados para Energia, Carboidratos, Proteínas e Fibras alimentares. As preparações doces e salgadas apresentaram valores adequados para os Lipídios. Com relação aos micronutrientes percebe-se que Vitamina C, Ferro, Magnésio e Zinco tiveram resultados mais satisfatórios para as preparações salgadas, enquanto Vitamina A, Cálcio e Sódio para as doces. Evidenciou-se a inadequação dos cardápios da alimentação escolar ao preconizado.

Palavras-chave: alimentação escolar, composição de alimentos, nutrição do adolescente, planejamento de cardápio.

 

Abstract

The nutritional adequacy of meals served in schools to teenagers  11 to 15 years old in the municipal district of Capão do Leão/RS was evaluated according to the recommendations of the National Program of School Feeding. Data were provided by an Extension Project of the Nutrition College of the Federal University of Pelotas and were used to elaborate Preparation Data Sheets for 16 recipes, served in 20 different combinations. All the preparation were analyzed by the ADSNutri software and, based on these analyses, values of Energy, Carbohydrate, Protein, Lipid, Vitamin A, Vitamin C, Calcium, Iron, Magnesium, Zinc and Dietetic Fibers were inputted into an Excel spreadsheet to verify the adequacy. An adequacy of 100% was considered ideal, and values between 80 to 100% of those recommended by the Program were considered adequate. The salty preparations had results closer to those considered adequate in the categories of Energy, Carbohydrate, Proteins and Dietetic Fibers. The sweet and the salty preparations had adequate values for Lipids. Regarding the micronutrients, it was noticed that Vitamin C, Iron, Magnesium and Zinc had satisfactory results in the salty preparations, whereas Vitamin A, Calcium and Sodium showed more satisfactory results in the sweet ones. It was noticed inadequacy of the school meals regarding the recommendations in which this study was based.

Key-words: school meals, food composition, adolescent nutrition;, menu planning.

 

Introdução

 

Criado na década de 1940, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é o mais antigo programa brasileiro voltado à alimentação escolar e à Segurança Alimentar e Nutricional. É gerenciado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), responsável pelo repasse complementar de verba aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal, com a finalidade de que todos os matriculados na educação básica do país tenham acesso a uma alimentação adequada e saudável durante o período em que permanecem em ambiente escolar [1].

O Programa estipula valores de referência às diferentes faixas etárias, com o propósito de que os escolares atinjam as recomendações nutricionais diárias (RDA). Nos adolescentes (10 a 19 anos de idade), as transformações físicas ocorrem de forma acelerada e o crescimento abrange o aumento de massa corporal e o desenvolvimento físico, que compreende a maturação de órgãos e sistemas para a aquisição de novas capacidades específicas, o que gera maior demanda de nutrientes [2]. A alimentação escolar ofertada a esse grupo deve atender 20% de suas necessidades nutricionais diárias. Por exemplo, aos escolares com idades compreendidas entre 11 e 15 anos, que permanecem um turno em ambiente escolar, refeições com valor calórico de 435 kcal, sendo esse teor energético proveniente de 70,7 g de Carboidratos, 13,6 g de Proteínas e 10,9 g de Lipídios. Em relação aos micronutrientes, é recomendado que a refeição contenha 140 µg de Vitamina A, 12 mg de Vitamina C, 260 mg de Cálcio, 2,1 mg de Ferro, 63 mg de Magnésio, 1,8 mg de Zinco e até 400 mg de Sódio. A quantidade de Fibras a ser alcançada é de 6,1 g [2,3].

A referida faixa etária é propícia para o desenvolvimento de sobrepeso e obesidade, principalmente por apresentarem tendência ao sedentarismo, associada a uma alimentação inadequada, com baixo consumo de alimentos que contêm vitaminas, minerais e fibras, como as frutas e hortaliças, e o consumo de lanches hipercalóricos em substituição às principais refeições [2]. Estes últimos, normalmente representam uma elevada ingestão de açúcar, sal, carboidratos refinados e gordura saturada, típicos de fast food. Portanto, estabelecer bons hábitos alimentares na infância e mantê-los no decorrer dos anos tem um grande impacto na saúde e bem-estar, reduzindo o risco de doenças crônicas [4].

São escassos os estudos que avaliam a adequação dos cardápios da alimentação escolar às recomendações do PNAE. Silva & Gregório [5] mostraram inadequações na alimentação escolar frente às recomendações do PNAE. Para os escolares com idades entre 11 e 15 anos, foi verificada carência de Energia, Carboidratos, Proteínas, Cálcio e Zinco e excesso de Lipídios, Vitamina C e Ferro. Portanto, levando em consideração o impacto que uma alimentação adequada e saudável exerce sobre o crescimento e o desenvolvimento e que a alimentação escolar representa, muitas vezes, a principal ou a única refeição do dia para alunos de condições socioeconômicas menos favorecidas [6], é de grande relevância avaliar a composição nutricional das preparações ofertadas aos escolares e adequá-las quando necessário.  Diante disso, este estudo teve por objetivo avaliar a adequação de cardápios da alimentação escolar no Município de Capão do Leão/RS, às recomendações do PNAE para adolescentes de 11 a 15 anos.

 

Material e métodos

 

Para a realização deste estudo foram utilizados dados oriundos de um projeto de extensão desenvolvido pela Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) intitulado “Padronização de receitas da alimentação escolar da rede municipal de educação do Capão do Leão/RS”,  realizado entre fevereiro e dezembro de 2015. No projeto foram elaboradas as Fichas Técnicas de Preparação (FTP) da lentilha com frango, do macarrão, do molho de frango, da vitamina de banana, do arroz com frango, do molho de carne, da jardineira de legumes, do feijão preto, do arroz, do carreteiro, do leite com achocolatado, do arroz com leite, do arroz com couve e carne, do creme com banana caramelada, do creme de chocolate e da polenta com carne.

O trabalho foi realizado a partir do acompanhamento do pré-preparo e preparo efetuado pelas merendeiras de uma das 14 escolas que integram a rede municipal de ensino e da adequação das receitas pela equipe do projeto. A partir das FTP, as receitas foram testadas quanto à aceitabilidade, visando à definição da sua permanência ou não no cardápio escolar.

As 16 preparações que obtiveram mais de 85% de aceitação pelos escolares, foram mantidas nos cardápios, de forma combinada ou não, sendo sua composição nutricional analisada no Software ADSNutri. Os valores de Energia (kcal), Carboidratos (g), Proteínas (g), Lipídios (g), Vitamina A (µg), Vitamina C (mg), Cálcio (mg), Ferro (mg), Magnésio (mg), Zinco (mg), Sódio (mg) e Fibras alimentares (g) obtidos na análise nutricional foram digitados em planilha do aplicativo Microsoft Excel®, de acordo com as combinações de cardápios nos quais as preparações eram servidas, como por exemplo, carreteiro e feijão preto.

Posteriormente, avaliou-se a adequação às recomendações do PNAE para adolescentes de 11 a 15 anos, considerando ideais os valores que atingiram 100% do preconizado pelo Programa (suprimento de 20% das necessidades diárias dos escolares do ensino fundamental, que permanecem um turno em ambiente escolar) e adequados os valores entre 80% e 120%, segundo Cuppari [7]. Cabe salientar que o percentual de adequação do Sódio não foi calculado, visto que o PNAE não estipula um valor ideal de seu consumo, apenas sugere que seja inferior ou igual a 400 mg.

 

Resultados

 

Tabela I - Quantidade de energia, macronutrientes e fibras alimentares e percentual de adequação às recomendações do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Cardápios da rede municipal de ensino do Capão do Leão/RS (2016).

 

 

A avaliação incluiu vinte cardápios, sendo quinze deles compostos por preparações salgadas e cinco por doces.

Na Tabela I estão descritas as combinações de preparações servidas aos escolares, bem como os valores de Energia (kcal), Carboidratos (g), Proteínas (g), Lipídios (g) e Fibras alimentares (g) de cada uma e seus respectivos percentuais de adequação. Dos 20 cardápios analisados, 16 (80%) estavam adequados em relação à Energia, 11 (55%) aos Carboidratos, 07 (35%) às Proteínas, 11 (55%) aos Lipídios e 07 (35%) às Fibras alimentares.

      A Tabela II demonstra as informações sobre os micronutrientes Vitamina A (µg), Vitamina C (mg), Cálcio (mg), Ferro (mg), Magnésio (mg), Zinco (mg) e Sódio (mg). Observa-se que um cardápio (5%) apresentou adequação em relação ao preconizado para a Vitamina C, cinco (25%) para Cálcio e Magnésio, seis (30%) para Ferro e quatro (20%) para Zinco. Nenhum cardápio estava adequado em relação à Vitamina A. Três cardápios (15%) obtiveram valores de Sódio iguais ou inferiores aos 400 mg preconizados pelo Programa.

 

Tabela II - Quantidade de micronutrientes e percentual de adequação às recomendações do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Cardápios da rede municipal de ensino do Capão do Leão/RS, 2016.

 

 

A Tabela III apresenta as quantidades médias de Energia (kcal), Carboidratos (g), Proteínas (g), Lipídios (g) e Fibras alimentares (g) considerando o total de cardápios, preparações salgadas e doces, bem como o percentual de adequação dos valores médios. Os valores de Energia foram considerados adequados para a média geral (88%) e para as preparações salgadas (92%), entretanto, inadequados para as doces (77%). Carboidratos estiveram inadequados na média geral e nas preparações doces (71% e 74%, respectivamente) e adequados nas salgadas (81%). Com relação às Proteínas, foi verificado excesso entre a média geral das preparações e nas preparações salgadas (122% e 140%, nesta ordem), contudo, déficit nas doces (68%). Para os Lipídios, os valores encontrados estiveram adequados nos três grupos, sendo 96% a média de adequação, 97% entre as preparações salgadas e 91% entre os doces. As fibras alimentares alcançaram valores inadequados na média geral (65%) e nos cardápios doces (16%), entretanto, adequado nas preparações salgadas (82%).

 

Tabela III - Quantidade média de energia, macronutrientes e fibras alimentares e percentual adequação às recomendações do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Cardápios da rede municipal de ensino do Capão do Leão/RS, 2016.

 

PNAE: recomendação do Programa

 

A Tabela IV apresenta as quantidades médias e o percentual de adequação dos micronutrientes Vitamina A (µg), Vitamina C (mg), Cálcio (mg), Ferro (mg), Magnésio (mg), Zinco (mg) e Sódio (mg), considerando o total de cardápios, as preparações salgadas e as doces. A Vitamina A e o Cálcio apresentaram déficit nas médias gerais (25% e 34%) e nas combinações salgadas (1% e 15%), e adequação entre as preparações doces (99% e 91%), respectivamente. Para a Vitamina C, os resultados estiveram acima do preconizado na média geral (183%) e nas preparações salgadas (238%), e abaixo nas doces (17%). Em relação ao Ferro (86%), adequado na média geral e o Magnésio (79%) inadequado, apresentando adequação nas preparações salgadas (99% e 86%, respectivamente) e inadequação nas doces (47% e 58%, nesta ordem). Quanto ao Zinco, inadequação em todos os grupos: excesso na média geral das preparações (158%) e nas preparações salgadas (191%) e déficit nas doces (60%). O nível de Sódio ficou acima do limite de 400 mg preconizado pelo PNAE na média geral (666,4 mg) e entre as preparações salgadas (818,2 mg) e de acordo nas doces (211,0 mg).

 

Tabela IV - Quantidade média de micronutrientes e percentual adequação às recomendações do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Cardápios da rede municipal de ensino do Capão do Leão/RS, 2016.

 

PNAE = recomendação do Programa

 

Discussão

 

A adolescência é uma fase de profundas transformações físicas, psicológicas e sociais. Com o objetivo de que essas transformações ocorram da forma mais adequada possível, é importante que esse grupo receba o suporte necessário, no qual está compreendido o acesso a uma alimentação de qualidade, de acordo com as especificidades da faixa etária [8].

Dos cardápios analisados foi possível observar que as preparações salgadas obtiveram resultados mais próximos dos considerados adequados para Energia, Carboidratos, Proteínas e Fibras alimentares. Ambos os grupos apresentaram valores adequados para os Lipídios. Com relação aos micronutrientes percebe-se que Vitamina C, Ferro, Magnésio e Zinco tiveram resultados mais satisfatórios para as preparações salgadas, enquanto Vitamina A, Cálcio e Sódio para as doces.

No que diz respeito à Energia, os valores mostraram-se adequados para a média geral dos cardápios (88%), resultado semelhante ao encontrado por Silva & Gregório [5]. Entretanto, tal adequação não compreende todas as preparações, visto que nos cardápios doces esse percentual esteve abaixo do preconizado.

Um aporte energético adequado é necessário na adolescência, sendo essa energia essencial para a manutenção da saúde, para a promoção de ótimo crescimento e para a prática de atividade física. Nessa fase há elevação das demandas energéticas em decorrência do aumento de massa corporal magra [8].

Com relação aos macronutrientes, Carboidratos são os principais fornecedores de energia da alimentação humana, preferencialmente os complexos, os quais fornecem também as Fibras alimentares, importantes na prevenção de diversas situações, como a constipação intestinal, a obesidade, as dislipidemias e o diabetes mellitus tipo 2 [8,9]. Cabe salientar que a inadequação apresentada para os dois nutrientes citados diz respeito apenas aos cardápios doces, os quais supriram menos de 80% de adequação ao preconizado para os Carboidratos e apenas 16% em relação às Fibras alimentares.

Proteínas, essenciais ao crescimento e ao desenvolvimento do organismo e que, devem ser oferecidas através de fontes com boa biodisponibilidade e em quantidade adequada aos adolescentes [9], ultrapassaram o valor recomendado na média geral das preparações. Entretanto, estiveram aquém do valor preconizado nos cardápios doces, o que pode influenciar negativamente o desenvolvimento dos escolares, sobretudo para os quais a alimentação escolar representa a principal refeição realizada no dia.

Ainda, dentre os macronutrientes, os Lipídios foram os únicos a apresentar adequação tanto nas preparações salgadas quanto nas doces. Resultado relevante pela importância deste nutriente não só no aporte calórico, como em processos dislipidêmicos que seu consumo excessivo poderia desencadear. Estudo realizado por Pereira[10], ao avaliar escolares adolescentes em Recife/PE, identificou uma prevalência de 63,8% de alteração em pelo menos uma fração do perfil lipídico. Um adequado consumo de lipídios impacta na correta absorção de vitaminas lipossolúveis, prevenindo assim o aparecimento de hipovitaminoses. Além disso, está relacionado com o controle da temperatura corporal [11].

Para os micronutrientes foi verificado que a oferta de Vitamina A esteve muito abaixo do preconizado nas preparações salgadas (1%), entretanto atingiu 99% entre os cardápios doces. Cabe ressaltar que as preparações doces que apresentaram maior teor desse micronutriente continham achocolatado em pó, no qual há adição de vitaminas e minerais, visando a sua ingestão adequada. A Vitamina A tem papel fundamental no crescimento e desenvolvimento humano, atuando na manutenção da visão, do sistema imunológico e da saúde das mucosas, protegendo contra infecções [12,13]. Com relação à Vitamina C, os resultados obtidos para a média geral dos cardápios superaram o valor preconizado pelo PNAE, corroborando os achados de Silva & Gregório [5]. O excesso dessa vitamina não pode ser visto como um resultado negativo, por ser uma vitamina hidrossolúvel e considerando-se sua importância no aproveitamento do Ferro dietético, sobretudo o não-heme [14]. Salienta-se que nas preparações doces a adequação foi extremamente baixa (17%). Tal vitamina participa de importantes funções, como a cicatrização, a formação dentária, a integridade dos capilares, sendo imprescindível na garantia de crescimento adequado [8].

O Cálcio apresentou adequação apenas para as preparações doces, devido à presença de leite nos cinco cardápios desta categoria. Entretanto, para a média geral, o percentual de adequação mostrou-se muito inferior ao recomendado, o que pode acarretar respostas negativas no desenvolvimento dos adolescentes, principalmente durante o estirão de crescimento. Do crescimento esquelético, 45% ocorre durante a adolescência, para tanto, o consumo adequado de alimentos fontes de Cálcio se faz necessário, visando ao adequado crescimento e maturação dos ossos. Tal mineral também está associado ao desenvolvimento muscular e endócrino [15].

Na adolescência, a necessidade de Ferro é aumentada em ambos os sexos: nos meninos em função da construção de massa muscular e nas meninas devido ao início da menstruação. Um aporte adequado desse micronutriente tem como principal objetivo prevenir a anemia, capaz de causar prejuízos na capacidade de aprendizado, diminuição de apetite, no crescimento e na resposta imunológica, ou seja, comprometer o crescimento e o desenvolvimento do adolescente [16]. Com relação ao Ferro e aos possíveis prejuízos causados por um consumo deficiente, vale ressaltar que, embora a média geral de adequação tenha ficado dentro do preconizado pelo Programa, nas preparações doces a adequação desse micronutriente ficou em apenas 47%.

A inadequação média de Magnésio, resultante da inadequação dos cardápios doces, pode ter reflexos no metabolismo de carboidratos, proteínas, lipídios e eletrólitos.  Além disso, o Magnésio auxilia na integridade da membrana celular, nas contrações musculares e na transmissão de impulsos nervosos [11].

Um consumo adequado de Zinco é imprescindível para o crescimento e maturação do adolescente. Inadequações nesse consumo são capazes de gerar prejuízos como retardo de crescimento e diminuição da acuidade gustativa [8]. Dessa forma, a maior preocupação em relação aos cardápios oferecidos aos escolares diz respeito às preparações doces, que atingiram apenas 60% do valor ideal preconizado pelo PNAE.

A média geral de Sódio superou em 66,6% o valor máximo de 400 mg sugerido pelo Programa. A inadequação verificada para esse mineral nas preparações salgadas resulta da adição de sal de cozinha (NaCl). Um consumo excessivo está associado com elevação da pressão arterial, a qual pode levar a complicações cardiovasculares no futuro [17]. Cureau & Reichert [18], avaliando escolares adolescentes na cidade de Santa Maria, RS, verificaram uma prevalência de hipertensão arterial de 23,6% e, devido à relação existente entre tal condição e o consumo excessivo de Sódio, é importante a execução de medidas visando à redução desse micronutriente nas preparações da alimentação escolar.

 

Conclusão

 

De modo geral, evidencia-se a inadequação dos cardápios da alimentação escolar no município de Capão do Leão/RS às recomendações do PNAE para adolescentes de 11 a 15 anos, o que, em grande parte devido às preparações doces, as quais não alcançaram os valores preconizados para a maioria dos nutrientes analisados, fazendo com que a média geral apresentasse déficit mesmo quando as preparações salgadas mantiveram-se dentro dos valores de referência.

Os resultados encontrados confirmam observações empíricas dos nutricionistas que atuam no PNAE, principal motivação para a realização deste estudo. Diante disso, cabe salientar a necessidade de estudos adicionais que abordem os determinantes da seleção de preparações para os cardápios da alimentação escolar, incluídas de forma isolada ou combinada. Determinantes estes que contemplam além da aceitabilidade dos escolares, também os valores per capita do programa, a infraestrutura física, de equipamentos e de pessoal nas escolas, a relação entre número de nutricionistas atuantes, carga horária e atividades sob sua responsabilidade, pois é possível que, por necessidade do serviço, sejam priorizadas atividades de gestão do programa, como: logística, quantidade e de qualidade sanitária, em detrimento da adequação nutricional.

Ressalta-se ainda que a análise realizada refere-se apenas a cardápios da alimentação escolar no município. Não foram avaliadas a frequência de consumo, a quantidade consumida, nem a alimentação realizada fora do ambiente escolar. Dessa maneira, os resultados não permitem inferir sobre a alimentação dos escolares, mas possibilitam concluir que as metas estipuladas pelo PNAE não estão sendo cumpridas adequadamente no município avaliado.

 

Referências

 

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