ARTIGO
ORIGINAL
Consumo
de antioxidantes por praticantes de musculação na cidade do Rio de Janeiro
Intake of dietary antioxidants by bodybuilders in the city of Rio de
Janeiro
Kelly dos Santos
Gomes*, Viviam Rodrigues das Neves**, Wilza Arantes Ferreira Peres, D.Sc.***
*Nutricionista,
Mestranda em Educação em Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Nutricionista monitora do
Programa SESI Cozinha Brasil - FIRJAN, **Nutricionista, Pós-Graduada em
Nutrição Aplicada ao Esporte e ao Fitness Corporativo da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, Instituto de Nutrição Josué de Castro, ***Nutricionista,
Professora Doutora Adjunta de Nutrição do Instituto de Nutrição Josué de Castro
da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Recebido em 17 de
outubro de 2012, aceito em 15 de junho de 2015
Endereço
para correspondência:
Kelly dos Santos Gomes, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de
Nutrição Josué de Castro, Departamento de Nutrição e Dietética, Av. Brigadeiro
Trompvski s/n, Ilha do Fundão 21941-590 Rio de Janeiro RJ, E-mail:
kelde@hotmail.com; Viviam Rodrigues das Neves: viviamrn@gmail.com; Wilza
Arantes Ferreira Peres: wilza@nutricao.ufrj.br
Resumo
O exercício físico
possui inúmeros benefícios para o organismo, contudo devido ao maior consumo de
oxigênio está associado à formação de radicais livres. Desta forma, para que o
organismo possa se defender destes efeitos deletérios é importante um sistema
antioxidante eficaz. As vitaminas A, E e C e os
minerais selênio e zinco são constantemente destacados como excelentes
antioxidantes. Foram estudados praticantes de musculação de academias da cidade
do Rio de Janeiro, no período de março a setembro de 2010. A composição da
dieta destes indivíduos foi analisada através do registro alimentar de três
dias. Participaram do estudo 94 indivíduos, sendo 61 mulheres e 33 homens. A
maioria visava hipertrofia (55,3%) e apresentava consumo dos antioxidantes
inferior ao preconizado. Sabendo que o consumo adequado destes micronutrientes
pode ser alcançado através de uma alimentação balanceada, o apoio do
profissional nutricionista a estes indivíduos apresenta-se como uma solução.
Palavras-chave: antioxidante,
treinamento de resistência, radicais livres, estresse oxidativo.
Abstract
Exercise has many benefits for the body, however due to the increased
oxygen consumption is associated with the production of free radicals. Thus, to
defend these deleterious effects is an important antioxidant system
effectively. Vitamins A, C and E and minerals like selenium and zinc are
frequently cited as excellent antioxidants. We studied practitioners of
resistance training gyms in the city of Rio de Janeiro, from march
to September 2010. The diet of these individuals was analyzed using the
three-day food record. The study included 94 people, 61 women and 33 men. They
aimed hypertrophy (55,3%) and had intake of
antioxidants lower than recommended. The adequate intake of these
micronutrients can be achieved through a balance diet, and support of
nutritionists can be a solution to this issue.
Key-words: antioxidant,
resistance training, free radicals, oxidative stress.
O exercício físico
possui inúmeros benefícios para o organismo humano, contudo é necessário
destacar sua associação à formação de radicais livres devido
ao maior consumo de oxigênio, o que pode ocasionar lesões oxidativas
[1]. Há um aumento na produção de substâncias oxidantes em praticantes de
musculação [2].
Radicais livres em
elevadas concentrações potencialmente causam danos celulares, tais como à
inativação enzimática, mutação, ruptura de membrana, aumento na aterogenicidade
de lipoproteínas plasmáticas de baixa densidade e até a morte celular [3].
Porém, quando existe um equilíbrio nesta concentração pode ocorrer a ação de mediadores dos processos de sinalização e
contração muscular. O estresse oxidativo só se configura quando a produção de
radicais livres é superior ao mecanismo antioxidante que o corpo dispõe [4].
Desta forma, para que
o organismo possa se defender dos efeitos deletérios gerados pelos radicais
livres é importante um sistema antioxidante eficaz, já que os mesmos são
agentes responsáveis pela inibição e redução das lesões causadas pelos radicais
livres nas células [5]. Esse sistema pode ser classificado em enzimático e não
enzimático, onde os últimos são exógenos, precisando ser ingeridos [5].
Os antioxidantes
endógenos não tem capacidade para proteger totalmente os componentes celulares,
sendo assim, antioxidantes obtidos da dieta são indispensáveis para proteção
das células contra a oxidação [3].
Segundo Cerqueira et al. [3] os principais mecanismos de ação dos
antioxidantes incluem captadores de radicais e supressores de estados
excitados; sistemas catalíticos que neutralizam ou eliminam radicais livres e a
ligação de íons metálicos a proteínas, o que os torna indisponíveis para a
produção de espécies oxidantes.
A literatura científica
destaca constantemente as vitaminas A, E e C além dos
minerais selênio e zinco como excelentes antioxidantes, devido as suas
capacidades de sequestrar os radicais livres com grande eficiência [3,6-8].
Em virtude do seu
potencial antioxidante e de seu papel no desenvolvimento e na diferenciação
celular, os carotenóides podem proteger o organismo de desordens degenerativas
[9]. Além disso, os carotenóides captam energia do oxigênio singlete, que volta
ao estado fundamental [3].
A vitamina E é a
designação dada a um grupo de compostos antioxidantes lipossolúveis, entre os
quais o α-tocoferol é a forma mais ativa [10]. Este grupo atua em nível
celular, inibindo a agregação plaquetária, a adesão de monócitos à parede do
endotélio, a produção de citocinas e a captação de lipoproteína de baixa
densidade (LDL) oxidada, principal responsável pelo transporte de ácidos graxos
e colesterol do fígado para os tecidos periféricos [3].
A vitamina C é um
nutriente hidrossolúvel envolvido em múltiplas funções biológicas. O ácido
ascórbico participa dos processos celulares de oxirredução, é importante na
defesa do organismo contra infecções e é fundamental na integridade das paredes
dos vasos sanguíneos [11].
O selênio funciona
associado às seleno-proteínas, muitas das quais são enzimas que protegem contra
a oxidação descontrolada no organismo [6]. Níveis reduzidos de selênio nas
células e tecidos tem como consequência concentrações
menores da enzima antioxidante glutationa peroxidase, resultando em maior
suscetibilidade das células e do organismo aos danos oxidativos induzidos pelos
radicais livres [5]. O selênio parece agir sinergicamente a vitamina C,
neutralizando os radicais livres e preservando a função endotelial [12].
O zinco desenvolve
várias funções no organismo, é componente estrutural e catalítico da enzima
superóxido dismutase presente no citoplasma de todas as células; a ação dessa
enzima reduz a toxicidade das espécies reativas de oxigênio, transformando uma
espécie altamente reativa em uma forma menos danosa às células [13].
Por tudo o que fora
exposto é aconselhável o consumo de alimentos fontes de antioxidante. Desta
forma, devido à carência de trabalhos científicos brasileiros sobre a ingestão
alimentar de antioxidantes em praticantes de atividade física, o presente
estudo tem como objetivo avaliar a ingestão dietética de antioxidantes em
praticantes de musculação.
A população estudada
foi constituída por indivíduos praticantes de treinamento de resistência de
academias de ginástica das Zonas Norte e Oeste da cidade do Rio de Janeiro/RJ.
O tamanho amostral
foi proporcional à demanda da clientela das academias, considerando-se a
modalidade musculação, no período de março a setembro de 2010.
A amostra
constituiu-se de pessoas de ambos os sexos, indiferente de raça ou classe
social. Com a finalidade de assegurar a equiprobabilidade na participação do
estudo, a amostra contemplou os praticantes de musculação clientes da academia,
de forma que cada aluno teve a mesma probabilidade de ser escolhido de acordo
com a demanda de atendimento.
Para inclusão no
estudo os pacientes deveriam ser alfabetizados. Foram usados como critérios de
exclusão: analfabetos e menores de 16 anos. Os indivíduos que atendiam ao
critério de inclusão eram informados sobre a pesquisa e, aqueles que
demonstravam interesse em participar, assinavam o termo de consentimento
aprovado pelo comitê de ética em pesquisa do Hospital Universitário Clementino
Fraga Filho (protocolo de pesquisa nº 052/10 – CEP).
A composição da dieta
destes indivíduos foi analisada através do registro alimentar de três dias
preenchido pelos participantes num formulário que consta de informações sobre a
refeição, o horário, o local de consumo, os alimentos e a quantidade ingerida
expressas em medidas caseiras, sendo feitos três dias, nos quais dois dias da
semana não consecutivos e um dia do final de semana.
Apesar deste método
de avaliação de ingestão de alimentos ser subjetivo é
um dos mais utilizados para este tipo de cálculo, quantitativamente, em
populações.
O treinamento de
resistência foi classificado de acordo com as fichas dos alunos preenchido pelo
profissional de educação física sendo coletadas as seguintes informações:
objetivo do treino, frequência semanal, tempo de duração e tempo de prática.
A análise dos dados
foi feita utilizando o cálculo de médias e do desvio padrão conforme a
distribuição da amostra pelo Office Excel® 2007. Para a análise da composição
dietética utilizou-se o software Avanutri.
Foram estudadas 94
pessoas, sendo 61 (64,9%) mulheres e 33 (35,1%) homens. A idade média foi de
29,31 anos, (± 10,31 anos). Destes 10,7% (10 participantes) possuíam o ensino
fundamental, 60,6% (57) o ensino médio e 28,7% (27) o ensino superior.
Tabela I - Objetivos do treino.
Verificou-se uma
duração média de 88,94 minutos (± 45,7 minutos) no que se refere à duração do
treino de resistência, segundo informações das fichas dos avaliados. A
frequência semanal aproximou-se de quatro vezes na semana (média de 4,48 vezes
com DP = 1,02 vezes). O tempo de prática dos participantes foi de 27,53 meses
em média (± 41,95 meses) não sendo critério de exclusão pessoas com pouco tempo
na atividade.
Tabela
II -
Consumo de antioxidante nos indivíduos
do sexo masculino.
Análise descritiva,
dados apresentados em média, desvio padrão. Percentuais de adequação de acordo
com as recomendações do Dietary ReferenceIntake
Tabela
III
- Consumo de antioxidante nos indivíduos
do sexo feminino.
Análise descritiva,
dados apresentados em média, desvio padrão. Percentuais de adequação de acordo
com as recomendações do Dietary Reference Intake
Quando se analisa o
objetivo do treino ilustrado na tabela I, verifica-se que a maioria absoluta da
amostra frequenta a academia visando hipertrofiar (55,3%). Moya et al. [14] em 2009 encontrou em sua amostra um percentual
ainda maior, 87,50% declararam procurar hipertrofia muscular como principal
objetivo do treino. Possivelmente, devido à maioria ser do sexo feminino neste
estudo, o grande desejo de emagrecer apareça entre os objetivos.
Quanto à frequência e
tempo de duração de treino, os valores encontrados são equivalentes ao
encontrado por Pereira e Cabral [15] em 2007 quando estudaram 141 praticantes
de musculação em Recife, com frequência de 02 a 05 dias
semanais e duração de 01 a 02 horas diárias. Tais resultados demostram
que, em geral, os praticantes de musculação apresentam boa assiduidade, fator
essencial à obtenção dos resultados desejados.
Da Mata, Espig e Dos
Santos [16] em 2011 sugerem que o acompanhamento nutricional é importante para
que os resultados pretendidos pela amostra do atual estudo sejam alcançados.
Desta forma, deveriam ser observados entre os praticantes de musculação,
principalmente aqueles com objetivo de hipertrofia, uma alimentação que
oferecesse os macro e micronutrientes necessários a uma melhor performance e a prevenção de lesões oxidativas.
Contudo, ao observar
a ingestão média das vitaminas antioxidantes, demostrada na tabela III,
verifica-se que entre as mulheres o consumo é bem inferior às recomendações
para todas as vitaminas. Já entre os homens, constando na tabela II, a vitamina
C foi a único nutriente essencial à prevenção do estresse oxidativo que obteve
média de consumo compatível à recomendada. Em Caxias do Sul, no ano de 2009
quando Theodoro, Ricalde e Amaro avaliaram a ingestão de vitaminas
antioxidantes em praticantes de musculação, também obtiveram como resultado um
consumo inferior ao recomendado para todas as vitaminas antioxidantes [17].
Apesar de estar presente em quantidades significativas em diversos
alimentos, principalmente frutas, verduras e legumes [3,9], apenas 05 de um
total de 33 homens apresentaram um consumo adequado de vitamina A, entre as
mulheres este número foi ainda menor onde somente 02 entre 46 apresentaram
ingestão recomendada deste micronutriente. Lopes et al.
[18] ao estudar o consumo de nutrientes em adultos, encontrou quase 100% de
inadequação em relação à vitamina A.
Quanto à vitamina C,
embora a média de consumo dos homens esteja dentro do adequado, observando o
percentual de adequação verifica-se que mais de 60% da amostra masculina não
consumia as recomendações para este antioxidante. Fato ainda mais evidente
entre as mulheres onde, 78% não atingiam as necessidades do nutriente.
Montilla, Marucci e Aldrighi em 2003 encontraram valores médios adequados para
a vitamina C, porém quando se analisa o percentual de adequação somente 7,8%
encontravam-se dentro das recomendações [19].
A amostra também
revelou que o consumo de vitamina E ficou abaixo do recomendado em ambos os
sexos, somente 17,39 % dos homens apresentaram ingestão compatível ao
recomendado. Lopes et al. [18] em 2005 obteve
resultados ainda mais alarmantes, nenhum dos 660 indivíduos estudados
apresentaram consumo do micronutriente dentro das recomendações. A Pesquisa de
orçamento familiar (POF) 2008/2009 também encontrou inadequação para este
antioxidante em todas as faixas etárias e em todas as regiões do país [20]. Tal
situação se deve possivelmente ao fato de que as principais fontes alimentares
desta vitamina não fazem parte do hábito alimentar da população em geral.
Em relação à média de
ingestão de zinco pela população feminina, a mesma encontrou-se dentro do
recomendado, todavia quando se analisou o percentual de adequação de consumo
entre as mulheres, 73,91% não se encontrava dentro do esperado, tal análise
junto ao desvio padrão da média indica que as mulheres que alcançam as
recomendações têm um consumo elevado deste micronutriente. Já quando se
verifica a população masculina a média encontra-se a abaixo do recomendado e o
percentual de adequação também é pequeno, somente 18,18% encontravam-se dentro
das recomendações. Theodoro, Ricalde e Amaro [17] ao estudar a ingestão
alimentar de praticantes de musculação em Caxias do Sul no ano de 2009
encontraram resultados contrários, onde 55,2% da amostra consumiam quantidades
recomendadas de zinco. Cabe ressaltar que no estudo do sul não houve
diferenciação entre sexos.
Ao analisar o
selênio, mais uma vez o consumo foi inferior ao recomendado tanto na média de
consumo quanto o percentual de adequação em ambos os sexos. Ao contrário do
encontrado neste estudo a POF [20] não encontrou inadequações no consumo de
selênio assim como Theodoro, Ricalde e Amaro [17] onde 72,4% apresentaram
ingestão do mineral dentro do recomendado. Apesar disto, Ferreira et al. [21] em 2002 encontraram baixos níveis de selênio nos
alimentos consumidos pelos brasileiros.
Deve-se considerar
que as análises realizadas neste estudo foram baseadas nos registro alimentares
preenchidos pelos voluntários, tal método apesar de ter respaldo científico,
apresenta restrições como a alteração de ingestão devido ao registro, a falta
de conhecimento para mensurar a porção, entre outros [22], configurando uma
limitação do estudo.
Segundo os dados
colhidos no presente trabalho, a maior parte da população estudada apresentou
consumo de antioxidantes não enzimáticos abaixo do recomendado pela Dietery
reference intake, que pode facilitar lesões oxidativas. Considerando que o
consumo adequado destes micronutrientes pode ser alcançado através de uma
alimentação balanceada, se faz necessário um maior suporte do profissional de
nutrição a estes praticantes de musculação para que possam atingir seus
objetivos sem, contudo, influenciar negativamente sua saúde.
Devido o pequeno
número de trabalhos que estudam o consumo de antioxidante entre praticantes de
atividade física não-profissionais e conhecendo os
perigos de uma ingestão insuficiente de tais nutrientes, se fazem necessárias
mais pesquisas sobre tal assunto, em especial o selênio, que apresentou
resultados discrepantes; a fim de confirmar os resultados deste artigo e
possibilitar a construção de soluções para esta situação.