ARTIGO ORIGINAL

Aspectos higiênico-sanitários da cozinha de uma instituição de longa permanência para idosos

Hygienic-sanitary aspects of the kitchen of a long-term institution for elderly

 

Aline Cardoso Ferreira*, Sany do Nascimento Dias Paes**, Kamila de Oliveira do Nascimento, D.Sc.***

 

*Pós-graduada em Qualidade, Auditoria e Vigilância Sanitária em Alimentos, Faculdade Redentor, Volta Redonda/RJ, **Pós-graduada em Fitoterapia, Suplementação e Alimentação Funcional na Prática Clínica - Centro Universitário de Volta Redonda (UNIFOA), Volta Redonda/RJ, ***Docente do Curso de Nutrição do Centro Universitário de Volta Redonda (UNIFOA), Volta Redonda/RJ

 

Recebido 22 de abril de 2018; aceito 15 de dezembro de 2019

Correspondência: Kamila de Oliveira do Nascimento, Curso de Nutrição, Centro Universitário de Volta Redonda, Av. Paulo Erlei Alves Abrantes, 1325 Três Poços 27240-560 Volta Redonda RJ

 

Aline Cardoso Ferreira: a_cardosoferreira@hotmail.com

Sany do Nascimento Dias Paes: sanyndp@gmail.com

Kamila de Oliveira do Nascimento: kamila.nascimento@yahoo.com.br

 

Resumo

Embora todas as pessoas estejam suscetíveis a Doenças Transmitidas por Alimentos, sabe-se que os idosos fazem parte do grupo de risco a infecções de qualquer natureza, principalmente microbiológica, em função de alterações no sistema imunológico. Entende-se ainda que o fornecimento de uma alimentação saudável e higienicamente segura possui propriedades que colaboram para a manutenção da saúde dos indivíduos, especialmente dos idosos. Fez-se necessário avaliar os aspectos higiênico-sanitários da cozinha de uma Instituição de Longa Permanência para Idosos de Barra Mansa/RJ, a fim de colaborar para sua adequação. Foi elaborada uma lista de verificação (check list) para analisar os aspectos higiênicos sanitários da instituição embasada no cumprimento das boas práticas a partir das resoluções da Anvisa nº 216/04 e nº 275/02. Verifica-se que dos 241 subitens aplicáveis, apenas 8 foram satisfatórios e 233 foram caracterizados como insatisfatórios, ou seja, 59 % de irregularidades foram encontradas. Conclui-se através dos resultados encontrados, um perfil insatisfatório dos aspectos higiênico-sanitários na cozinha da instituição, sendo que é necessária uma intervenção nas condições higiênicos sanitárias da ILPI, a fim de evitar contaminações alimentares e garantir melhores condições de atendimento aos idosos residentes nesta instituição.

Palavras-chave: higiene, idosos, segurança de alimentos.

 

Abstract

Although all people are susceptible to Foodborne Diseases, it is known that the elderly are part of the risk group for infections of any nature, mainly microbiological, due to changes in the immune system. It is understood that the supply of a healthy and hygienically safe diet has properties that contribute to the maintenance of the health of individuals, especially the elderly. We evaluated the hygienic-sanitary aspects of the kitchen of a Long-stay Institution for the Elderly in Barra Mansa/RJ, in order to contribute to its adequacy. A check list was prepared to analyze the sanitary aspects of the institution based on compliance with good practices, based on Anvisa Resolutions 216/04 and 275/02. We verified that of the 241 subitens applicable, only 8 were satisfactory and 233 were characterized as unsatisfactory, and 59% of irregularities were found. Unsatisfactory profile of the hygienic-sanitary aspects in the institution's kitchen was concluded, and it is necessary to intervene in the hygienic sanitary conditions of the institution, in order to avoid food contamination and guarantee better conditions of care for the elderly residents of this institution.

Keywords: hygiene, elderly, food safety.

 

Introdução

 

A crescente expectativa de vida e consequente aumento do número de idosos, demonstram que a distribuição etária da população mundial tem apresentado visível alteração nas últimas décadas, e o Brasil não fica fora dessa realidade, passando por um processo de envelhecimento rápido e intenso. O envelhecimento é um processo biológico natural e universal. A população do mundo tem envelhecido devido ao aumento da expectativa de vida. Estima-se que a população de idosos no mundo vai ultrapassar a um bilhão em 2020, destacando que a maior parte da população idosa viverá em países em desenvolvimento [1].

Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), em 2012 o Brasil possuía 23 milhões de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, sendo que mais de 100 mil residiam em instituições de longa permanência [2] e de acordo com os resultados das projeções divulgadas pelo IBGE, configuravam, em 2010, um contingente de 19,6 milhões de pessoas, devendo aumentar para 66,5 milhões em 2050 [3].

A modernização tem gerado a modificação da estrutura familiar brasileira, já que a inserção da mulher no mercado de trabalho, a redução da fecundidade e o tempo acelerado vêm dificultando a relação do cuidado, tornando um problema para as famílias manterem seus antecessores em casa. Sendo assim, cada vez mais as famílias vêm buscando alternativas como a internação de seus idosos em instituições de longa permanência.

Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI) são instituições governamentais ou não governamentais, de caráter residencial, destinada a domicílio coletivo de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, com ou sem suporte familiar, em condição de liberdade, dignidade e cidadania [4].

O envelhecimento da população e aumento da sobrevivência de pessoas com redução da capacidade física, cognitiva e mental requerem que os asilos façam além de participar da rede de assistência social é necessário que integrem a rede de assistência à saúde, ou seja, ofereçam algo mais que um abrigo [5].

A RDC 283/2005 garante à população idosa a prevenção e a redução de riscos à saúde dos idosos residentes em Instituição de Longa Permanência, sendo que esta deve garantir uma alimentação saudável aos asilados, tanto do ponto de vista nutricional quanto microbiológico [4].

Embora todas as pessoas sejam suscetíveis a Doenças Transmitidas por Alimentos (DTAs), sabe-se que os idosos fazem parte do grupo de risco a infecções de qualquer natureza, principalmente microbiológica, devido ao fato de apresentarem diminuição e alteração do sistema imunológico. Atualmente, reconhece-se que os idosos apresentam um aumento da sensibilidade às infecções, ou um estado conhecido como “imunossenescência”, termo que se refere à noção de que existem disfunções do sistema imune relacionados à idade, que resultam em aumento do risco de infecções [6].

Em relação a esse grupo populacional, as doenças infecciosas são um importante problema a ser enfrentado, tendo em vista a redução da função imune. Dentre as doenças infecciosas, as veiculadas por água e alimentos podem ser avassaladoras para os idosos. Sendo assim, vale ressaltar a importância de se oferecer uma alimentação preparada seguindo as boas práticas de manipulação e fabricação, a fim de evitar qualquer ameaça à saúde deste grupo em questão. É possível evitar a maioria dos casos de DTAs, se comportamentos preventivos forem adotados em toda a cadeia produtiva de alimentos [7].

A RDC 216/2004 define Boas Práticas como procedimentos que devem ser adotados por serviços de alimentação a fim de garantir a qualidade higiênico-sanitária e a conformidade dos alimentos com a legislação sanitária. Já a RDC 275/2002 estabelece Procedimentos Operacionais Padronizados que contribuam para a garantia das condições higiênicas sanitárias necessárias ao processamento/industrialização de alimentos, complementando as Boas Práticas de Fabricação [8,9].

Sabendo que o fornecimento de uma alimentação saudável, íntegra e higienicamente segura, possui propriedades que colaboram para a prevenção e manutenção da saúde dos indivíduos, especialmente dos idosos assistidos, o presente artigo objetivou avaliar o perfil higiênico-sanitário da cozinha de uma Instituição de Longa Permanência para Idosos no município de Barra Mansa/RJ. A fim de colaborar para sua adequação, estimulando práticas de segurança de alimentos, assim como evitar possíveis intercorrências veiculadas pelos alimentos aos internos, já que estes estão mais vulneráveis a infecções.

 

O envelhecimento populacional e as instituições de longa permanência

 

Estudos comprovam que a expectativa de vida tem aumentado, o que, aliado à baixa taxa de natalidade e mortalidade a população tende a envelhecer cada vez mais. O crescimento da população idosa é fenômeno mundial, sendo que esta faixa etária é a que mais cresce em relação às outras faixas etárias. O envelhecimento populacional está relacionado à mudança de alguns indicadores de saúde, especialmente, a redução da fecundidade, da mortalidade infantil e do aumento da esperança de vida [10].

O crescimento desse segmento populacional, associado à evolução tecnológica, faz com que as famílias busquem alternativas para o cuidado de seus idosos. O surgimento de instituições de longa permanência para idosos (ILPIs) não é novidade e o número de asilos vem crescendo de forma rápida, acompanhando desta forma a velocidade da expectativa de vida [11]. A procura por ILPIs decorre da escassez de alternativas das famílias em manterem seus idosos em casa.

É notório o aumento significativo da demanda por ILPIs no Brasil devido a diversos fatores como, estruturas familiares modificadas com mudanças dos papéis desempenhados pelos seus membros, a redução do tamanho e diferentes arranjos familiares, alterações essas que interferem na disponibilidade de pessoas para cuidar dos idosos dependentes em casa, e ainda com os idosos acometidos, em sua maioria, por doenças crônicas e incapacidades, falta de recursos e de serviços públicos, tanto no âmbito social quanto na saúde; altos custos para manter o cuidado domiciliar; espaços físicos das residências muitas vezes inadequados expondo o idoso a riscos de quedas e violências [12].

No Brasil, não diferente da tendência mundial, o aumento da longevidade também tem trazido o aumento da demanda por Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) e dentro desse contexto, em 2005 passou a vigorar no país a Resolução da Diretoria Colegiada, RDC nº 283. A RDC adotou o termo ILPI e estabeleceu normas de funcionamento desta modalidade assistencial. Segundo o documento, ILPIs são "instituições governamentais ou não-governamentais, de caráter residencial, destinadas a domicílio coletivo de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, com ou sem suporte familiar, em condições de liberdade, dignidade e cidadania" [4]. 

A qualidade de vida dos idosos em uma ILPI foi avaliado em vários aspectos e apresentou-se de maneira insatisfatória como a capacidade funcional onde a maioria dos idosos foi classificada como dependente, apresentando ainda comorbidades como Diabetes e/ou Hipertensão Arterial, associado a uma ou mais patologias fatores esse que interferem na qualidade de vida sendo necessária a adoção de medidas preventivas, diminuindo comorbidades e consequências do envelhecimento, amparando os idosos nas práticas no dia a dia, no vínculo com familiares, devendo-se pensar em estratégias que proporcionem a melhoria na assistência ao idoso nas ILPI, possibilitando ao idoso a manutenção de suas capacidades físicas e mentais contribuindo para uma boa qualidade de vida [13].

Um ciclo vicioso de doença e desnutrição é estabelecido com o consumo de alimentos não seguros que afetam particularmente crianças, idosos e doentes, que são os mais vulneráveis as mais de 200 doenças causadas por bactérias, vírus, parasitas ou substâncias químicas prejudiciais à saúde presentes nesses alimentos, doenças que vão desde diarreia ao câncer. Doenças diarreicas matam cerca de 2 milhões de pessoas por ano. Essas doenças prejudicam a produtividade, sobrecarregam o sistema de saúde pública e reduz os ganhos econômicos, impedem o desenvolvimento socioeconômico, prejudicando as economias nacionais, turismo e comércio [14].

De acordo com os dados demográficos atuais, os idosos constituem uma grande parte da população mundial e que muitas vezes sofrem de deficiências cognitivas e físicas. Como resultado, nos deparamos com um crescimento significativo de enfermidades acometendo esses idosos [15]. O que evidencia a importância de garantir não só uma sobrevida maior, mas de boa qualidade, tendo em vista a vulnerabilidade do grupo em questão acerca de inúmeras infecções, principalmente ao que diz respeito à intoxicação alimentar.

 

Segurança de alimentos e idosos

 

Atualmente, reconhece-se que os idosos apresentam um aumento da sensibilidade às infecções, ou um estado conhecido como “imunossenescência”, termo que se refere à noção de que existem disfunções do sistema imune relacionados à idade, que resultam em aumento do risco de infecções [6]. Associado às alterações decorrentes do envelhecimento, é frequente o uso de medicamentos que influenciam na digestão e absorção de alimentos, além da falta de higiene na preparação das refeições, o que pode comprometer a necessidade nutricional e o estado de saúde do idoso.

A vulnerabilidade da população idosa a DTAs são confirmadas pelas altas taxas de incidência e mortalidade em comparação a população geral. Inúmeras pesquisas comprovam que as DTAs são resultado do não atendimento as regras básicas de higiene e de segurança alimentar durante o preparo e conservação de alimentos [7]. É possível evitar a maioria dos casos de DTAs se comportamentos preventivos fossem adotados em toda a cadeia produtiva de alimentos.

Segundo o Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do Ministério da Saúde, de 1999 a 2004, ocorreram 3.410.048 internações por DTA, com uma média anual de cases de 568.341. De acordo com o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), de 1999 a 2002, ocorreram 25.281 óbitos por DTA, com uma média de 6.320 óbitos/ano. Estima-se que o custo das DTA no Brasil com internações por DTA nesse período chegam a 280 milhões de reais, com média de 46 milhões de reais por ano [14].

Desse modo, uma alimentação saudável e, consequentemente, a manutenção do estado nutricional adequado são fatores importantes para a saúde e, portanto, para um envelhecimento bem sucedido. Alimentação saudável é aquela constituída por alimentos variados, em quantidades adequadas aos indivíduos, associada às boas práticas de manipulação e fabricação, a fim de evitar qualquer ameaça à saúde deste grupo em questão. Sendo assim, é indiscutível o valor das medidas preventivas a serem tomadas junto aos manipuladores de alimentos, promovendo melhorias contínuas no processo produtivo para melhor atender as necessidades dos internos.

Sendo que a deficiência no controle higiênico-sanitário é um dos fatores que contribuem para a intoxicação alimentar e aliada a vulnerabilidade dos idosos é notória a necessidade de avaliar o perfil higiênico sanitário da cozinha desta instituição, a fim de detectar as não conformidades e introduzir medidas de intervenção na prevenção de infecções de origem alimentar.

 

Material e métodos

 

Neste trabalho a pesquisa foi realizada com base nos aspectos exploratório, descritivo, qualitativo e de campo em uma Instituição de Longa Permanência para Idosos no município de Barra Mansa/RJ. Os dados foram coletados através da aplicação de um check list pautado nas Resoluções RDC nº 275/02 e RDC nº 216/04, através de visitas técnicas à instituição no mês de julho de 2014 com intuito de avaliar os aspectos higiênico-sanitários da cozinha da instituição, bem como o cumprimento das boas práticas dos manipuladores de alimentos [8,9].

Através da observação sistemática e da aplicação do check list foram avaliados os seguintes itens: higiene dos funcionários, do ambiente e dos equipamentos, armazenamento de alimentos, estrutura física, manipuladores, armazenamento de resíduos.

Os itens observados foram classificados como conforme e não conforme de acordo com as legislações vigentes. Após a aplicação da lista de verificação dos itens, o estabelecimento foi classificado qualitativamente de acordo com as categorias: Grupo 1: alta adequação (acima de 76% - 100% de atendimento dos itens), Grupo 2: média adequação (51% - 75% de atendimento dos itens) e Grupo 3: baixa adequação (0-50% de atendimento dos itens).

 

Resultados e discussão

 

O check list utilizado possui um total de 264 itens, dos quais 23 deles não foram aplicados à realidade do local em estudo. Os 241 itens avaliados foram divididos em 35 subitens e alocados em 8 macro categorias, as quais são mostradas na figura 2, com o objetivo de ponderar e equilibrar estatisticamente o peso de cada uma delas sobre a média global. Dessa forma, observa-se que a média ponderada global de não-conformidades por categoria é da ordem de 59%, o qual é mostrado na figura 1.

 

 

Figura 1 - Índice global de conformidades e não conformidades.

 

Verifica-se que resultados semelhantes foram encontrados em diversos tipos de estabelecimentos que manipulam alimentos [16], onde os autores avaliaram 10 restaurantes do município de Rio Vermelho, na Bahia, e concluíram que apenas 45,8% atendiam as legislações.

No diagnóstico da cozinha asilar, de maneira global, foi possível verificar conforme a Figura 1, que apenas 41% dos itens avaliados estavam em conformidade com as legislações, e de acordo com a classificação da RDC 275 [8], a cozinha em estudo se enquadra no grupo 3, de baixa adequação, com menos de 50 % de atendimento aos itens analisados.

Em 2010 um estudo realizado em um shopping center em Porto Alegre demonstrou que em vinte estabelecimentos de alimentação analisados, onze foram classificados como insatisfatórios, enquanto apenas nove foram considerados satisfatórios [17].

Verifica-se na ILPI avaliada na presente pesquisa, que os itens são representados no check list por: 42% para os Aspectos Gerais da Produção, 21% para Projeto e Instalações, 12% para Manipuladores, 10% para Higiene, 6% para Controles e Registros, 3% para amostras, 3% para Equipamentos e Utensílios e 2% para Documentação. Onde em uma análise sistêmica verificada na Figura 2, constata-se que dos 8 itens apenas 2 itens analisados, como: Projeto e Instalações e Equipamentos e Utensílios possuem um nível satisfatório de adequação com 72% e 63% respectivamente de conformidade e podem ser considerados de média adequação. Os demais estão com níveis gerais abaixo de 50% de conformidade, destacando-se os Aspectos Gerais da Produção e Higiene do estabelecimento, os quais possuem média global de apenas 29% de conformidade, sendo, portanto, consideradas as categorias com maior déficit, apresentando total baixa adequação.

Em estudo de uma ILPI da cidade de Curitiba- PR, avaliou-se através da aplicação de um questionário, o conhecimento dos manipuladores de alimentos quanto a aplicação das normas de Boas Práticas de Manipulação de Alimentos constatou-se que a maior quantidade de erros dos manipuladores ficou evidente nos itens de contaminação, temperatura e descongelamento, e ainda que o treinamento aplicado sobre boas práticas de manipulação foi efetivo, havendo 100% de acerto nas respostas na segunda aplicação do questionário [18].

 

 

Figura 2 - Avaliação geral por divisão de macro categorias.

 

Uma pesquisa realizada numa indústria de alimentos em Minas Gerais, destacou que apenas 18,5% das instalações, equipamentos e utensílios analisados encontravam-se corretamente higienizados [19]. A higienização inadequada aumenta a probabilidade de contaminação por micro-organismos patogênicos, portanto, a higiene da instalação, equipamentos e utensílios deve ser considerada um fator crítico na segurança dos alimentos.

Conforme evidenciado na Figura 3, destaca-se os itens: Controle e Registro e Amostras, os quais não apresentaram conformidade em nenhum dos subitens avaliados nessa pesquisa (0% de conformidade), bem como os subitens Controle de pragas e Edificação, dentro do item Projeto e Instalações, tendo, portanto, apresentado 100% de não conformidade. Podem-se destacar subitens em descumprimento total de conformidade, na unidade avaliada nesse estudo, dentro do item Aspectos Gerais da Produção, sendo eles, descongelamento, resfriamento e distribuição, e os subitens com conformidade abaixo de 30%, recebimento de matérias primas, pré-preparo de carnes, cocção/reaquecimento, critérios de uso, os quais também são considerados como baixa adequação.

Uma pesquisa foi realizada em três cozinhas comunitárias em Leopoldina, MG [20], sendo que duas delas destacaram a não conformidade no item edificação, apresentando layout inadequado com cruzamento de atividades, sem separação da área suja e área limpa, aumentando assim o risco de contaminação aos alimentos.

 

Figura 3 - Resultado da aplicação por itens na ILPI.

 

Em seis restaurantes em Maringá, estado do Paraná [21], foram avaliados quanto ao preparo de alimentos constatou a inexistência de critérios de controle no pré-preparo de carnes e o resfriamento de alimentos foram a não conformidade mais encontradas.

Por outro lado, no presente estudo avaliando a ILPI, observam-se que os subitens pertencentes ao item Projeto e instalações: localização, paredes e divisórias, teto e forros, janelas e telas, iluminação e instalação elétrica, pias para higienização de mãos, sanitário e vestiários, apresentaram alta adequação, ou seja, com 100% de conformidade a legislação vigente. Aponta-se o subitem Lixo, caixa de gordura e esgoto com alta adequação e dentro desse mesmo item.

Ter uma alimentação saudável não está apenas ligado à oferta de alimentos nutritivos, mas também está diretamente relacionado ao conceito de segurança dos alimentos. O manipulador é essencial na produção de alimentos, entretanto, tem sido considerado um dos principais responsáveis pela contaminação dos alimentos, mas não o único, o ambiente também pode contribuir para que isto ocorra, como por exemplo, o local de armazenamento dos alimentos, utensílios, o ar, poeira, umidade entre outros fatores. A contaminação alimentar acontece quando o alimento é contaminado por micro-organismos patogênicos ou suas toxinas, substâncias ou agentes estranhos podendo ser de natureza química, física ou biológica causando danos à saúde. Por isso a importância dos treinamentos, para que as pessoas que exercem esta atividade se conscientizem de sua responsabilidade com a saúde dos consumidores, pois muitos deles têm baixos conhecimentos sobre manipulação adequada dos alimentos e muitas vezes o pouco conhecimento que eles possuem são os adquiridos ao longo da vida e passado de geração à geração [22].

Nos dias atuais, grande parte das pessoas envolvidas com manipulação acha que entende sobre alimentação, o que tem se observado que existe um despreparo e falta de conhecimentos, principalmente em relação à higiene pessoal e preparo dos alimentos de forma segura.

Na avaliação feita nesse estudo foi detectado que apenas 15% dos manipuladores da ILPI estão em conformidade em relação a higiene pessoal, pois foi observado o uso de adornos, unhas esmaltadas e objetos pessoais dentro da área de produção. Já em relação ao item Documentação, nota-se que essa instituição apresenta 67 % de não conformidade, não possuindo os documentos obrigatórios, como o Manual de Boas Práticas (MBP) e os Procedimentos Operacionais Padronizados (POPs).

Cabe salientar que os resultados encontrados neste trabalho são semelhantes aos resultados encontrados por Oliveira [24] em estudo realizado em restaurantes populares no estado do Rio de Janeiro, onde alcançaram apenas 40% e 30% relacionados aos documentos MBP e POP respectivamente.

Em um relato de experiência de um nutricionista dentro de uma Instituição de Longa Permanência para Idosos no município de Rio Paranaíba/MG, ficou evidenciado que na unidade em questão possuía um MBP, embora esse manual não contasse com o POP, a partir da elaboração do POP para integração do MBP, execução de treinamentos, periodicidade de higienização, a implantação, registro e acompanhamento dos processos de manipulação de alimentos houve, de acordo com relatos de funcionários do ILPI notória diminuição dos casos de diarreia entre os idosos institucionalizados [25].

De maneira geral, na ILPI avaliada nesta pesquisa, 41% de conformidade dos itens do check list avaliado é atribuído principalmente ao item Projeto e instalações, o qual pode ser considerado o ponto forte do estabelecimento avaliado. O item Equipamentos e utensílios possuem em média 63% de conformidade, sendo considerada como média adequação.

            

As demais categorias podem ser consideradas de maneira global com baixa adequação e devem ser trabalhadas como proposta de melhoria, sendo que o principal déficit está dentro dos aspectos gerais da produção, o qual tem peso importante no resultado global do check list em questão (42%), seguido por controles e registros, e amostras, os quais estão 100% não conformes, porém possuem peso menor no global (9% se somados).

Destacando que a qualidade higiênico-sanitária constitui fator crucial para inocuidade dos alimentos, a qual tem sido amplamente estudada e discutida, considerando que as DTAs são as principais causas que contribuem para os índices de morbidade [26]. Perante este evento e juntamente com resultado obtido com a lista de verificação, a unidade de alimentação da ILPI necessita se adequar aos itens importantes do check list, de acordo com o cumprimento das boas práticas a partir das resoluções da Anvisa nº 216/04 e nº 275/02, a fim de promover uma alimentação segura e consequentemente, uma melhor qualidade de vida aos internos.

 

Conclusão

 

Diante da realidade demográfica conta-se com uma população cada vez mais envelhecida, evidenciando a importância de garantir uma sobrevida maior e de melhor qualidade, tendo em vista a vulnerabilidade do grupo em questão acerca de inúmeras infecções, principalmente ao que diz respeito à intoxicação alimentar.

A cozinha da Instituição de Longa Permanência para Idosos apresentou um elevado número de itens inadequados, revelando um grande percentual de não conformidades, evidenciando uma deficiência nos aspectos higiênico-sanitários, comprometendo a qualidade e segurança dos alimentos das refeições servidas.

Conclui-se através dos resultados encontrados, um perfil insatisfatório dos aspectos higiênico-sanitários na cozinha da instituição, sendo que se faz necessária uma intervenção nas condições higiênicos sanitárias da ILPI, a fim de evitar contaminações alimentares e garantir melhores condições de atendimento aos idosos residentes nesta instituição.

Questões de segurança de alimentos, incluindo principalmente a adequada manipulação de alimentos, pode ser a parte essencial do aconselhamento dietético praticado na cozinha da instituição, sobretudo para esta faixa etária vulnerável em estudo.

 

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