ARTIGO ORIGINAL

Antropometria e consumo alimentar: identificador do estado nutricional de idosos

Anthropometry and food intake: identifier of the nutritional state of elderly

 

Rozinéia de Nazaré Alberto Miranda, D.Sc.*, Marinara Borges de Paiva**

 

*Docente da Faculdade de nutrição/Instituto de Ciências da Saúde/Universidade Federal do Pará (UFPA), **Bacharel em Nutrição, UFPA

 

Recebido 23 de abril de 2019; aceito 15 de outubro de 2019

Correspondência: Rozinéia de Nazaré Alberto Miranda, Universidade Federal do Pará, Instituto de Ciências da Saúde, Praça Camilo Salgado, 1 Umarizal 66050-060 Belém PA

 

Rozinéia de Nazaré Alberto Miranda: rozi@ufpa.br

Marinara Borges de Paiva: borgesmarinara@gmail.com

 

Resumo

O estado nutricional é um importante marcador da saúde geral do idoso. Objetivou-se neste estudo identificar através da antropometria e do consumo alimentar o estado nutricional de idosos frequentadores de uma ONG. Estudo transversal e descritivo de informações socioeconômicas e demográficas, antropometria e consumo alimentar. Participaram da pesquisa 101 idosos, 54,5% do sexo feminino, com faixa etária predominante entre 60 e 70 anos, solteiros e viúvos (36,6%), respectivamente, 53,5% declararam ter de 1 a 8 anos de estudos e 52,5% possuírem renda de um salário mínimo. Ocorreu predominância de excesso de peso através do índice de massa corporal, eutrofia pela circunferência braquial e desnutrição pela prega cutânea tricipital. Alto consumo diário de alimentos energéticos: arroz (90,1%) seguido pela farinha de mandioca (44,6%) e pão (44,6%). A respeito dos alimentos proteicos, 68,3% afirmaram consumir leite diariamente, 54% e 38% consumem de 1 a 3 vezes/semana carne vermelha e aves, respectivamente, e 39,6% relataram consumir feijão diariamente. O consumo de vegetais do grupo A foi o mais frequente (35,6%) entre os idosos. Os idosos apresentaram estado nutricional e hábitos alimentares inadequados, o que reforça a necessidade de orientações nutricionais específica para este grupo etário.

Palavras-chave: idosos, antropometria, consumo alimentar.

 

Abstract

Nutritional status is an important marker of elderly’s overall health. The objective of this study was to identify, through anthropometry and food intake, the nutritional status of elderly people attending an NGO. Cross-sectional and descriptive study of socioeconomic and demographic information, anthropometry and food intake. A total of 101 elderly people joined the study, 54.5% female, aged between 60 and 70 years, single and widowed (36.6%), 53.5% reported having between 1 and 8 years of schooling and 52.5% are earning a minimum wage income. There was predominance of overweight through body mass index, eutrophy by brachial circumference and malnutrition by tricipital skin fold. High daily intake of energetic foods: rice (90.1%) followed by cassava flour (44.6%) and bread (44.6%). Regarding protein foods, 68.3% reported consuming milk daily, red meat (54%) and poultry (38%) 1 to 3 times/week and 39.6% reported consuming beans daily. O consumo de vegetais do grupo A foi o mais frequente (35,6%) entre os idosos. The elderly presented inadequate nutritional status and eating habits, which reinforces the need for specific nutritional guidelines for this age group.

Key-words: elderly, anthropometry, food consumption.

 

Introdução

 

O envelhecimento, antes considerado um fenômeno, hoje, faz parte da realidade da maioria das sociedades. O mundo está envelhecendo e estima-se que, em 2025, o Brasil ocupará o sexto lugar quanto ao contingente de idosos, alcançando cerca de 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais [1].

Os principais determinantes dessa acelerada transição demográfica são a redução expressiva na taxa de fecundidade, associada à forte redução da taxa de mortalidade infantil e o aumento da expectativa de vida [2].

O envelhecimento é um processo biológico que submete o corpo humano a inúmeras alterações anatômicas e funcionais, com repercussão nas condições de saúde e nutrição. Alterações essas progressivas, ocasionando efetivas reduções na capacidade funcional, desde a sensibilidade para gostos primários até alterações nos processos metabólicos do organismo. Esses fatores podem ser tanto decorrentes de eventos genéticos como ambientais: estilo de vida, condições econômicas, cuidados com saúde e alimentação [3].

Nesse contexto, observa-se que a população idosa está mais suscetível às alterações no estado nutricional, gerando desafios para o governo que precisa desenvolver meios para enfrentar as demandas específicas decorrentes dessa nova realidade etária [4].

A legislação brasileira, quanto às políticas para a pessoa idosa, é bastante abrangente, garantindo e regulando os direitos que foram assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, mas o desafio em todas as legislações é o seu eficaz cumprimento. Dificuldades na implementação englobam a obtenção precária de recursos ao sistema de informação para a análise das condições de vida e de saúde e também a capacitação inadequada de recursos humanos [5].

A mudança no perfil etário acarreta uma transição epidemiológica com consequentes impactos no sistema de saúde. Os idosos representam um segmento populacional com características próprias relacionadas ao estado nutricional [6]. A manutenção de um estado nutricional adequado é muito importante, pois, de um lado, encontra-se o baixo-peso, que aumenta o risco de infecções e mortalidade, e do outro o sobrepeso, que aumenta o risco de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como hipertensão, diabetes mellitus e hiperlipidêmicas [7].

O estado nutricional demonstra o grau no qual as necessidades fisiológicas por nutrientes estão sendo atingidas, para manutenção da composição e funções adequadas do organismo, assim a avaliação do estado nutricional pode identificar precocemente idosos com risco nutricional, visando à introdução de programas de intervenção adequados com o objetivo de reduzi-los [2].

No Brasil, observamos índices elevados tanto de obesidade como de desnutrição e/ ou subnutrição em idosos de baixa renda, especialmente em mulheres, em razão do seu maior número e longevidade em relação aos homens. Outro aspecto relevante é que elas procuram mais atendimento à saúde do que o sexo oposto, esse fato se reflete na maior taxa de mulheres em grupos etários mais velhos, correspondendo a aproximadamente dois terços da população acima de 75 anos, em países como Brasil [8].

Diante do exposto foi que o estudo se propôs a identificar através da Antropometria e do Consumo Alimentar o estado nutricional dos idosos frequentadores de uma Organização não Governamental no município de Benevides/PA.

 

Material e métodos

 

Estudo transversal, com características descritivas e analíticas, realizado a partir de informação obtida através da aplicação de um questionário semiestruturado elaborado para esta finalidade. O número de idosos atendidos foi de 101, durante o período de março de 2015 a dezembro de 2016, sendo definido este número através da média de atendimento nutricional.

Para traçar o perfil sociodemográfico dessa população, foi aplicado o questionário contendo as seguintes variáveis: sexo, idade, escolaridade, renda familiar e estado civil.

A antropométrica foi constituída das seguintes mensurações: peso (kg) e altura (m) para se conhecer o índice de massa corporal (IMC), dobra cutânea tricipital (DCT), circunferência do braço (CB), circunferência muscular do braço (CMB) e circunferência da panturrilha (CP).

O peso foi obtido pela medida realizada em balança Filizola, tipo plataforma, com capacidade de 150 kg e precisão de 100 g. O peso atual (PA) foi comparado com o peso ideal (PI) do paciente e com seu peso usual (PU) para chegar-se a uma classificação do indivíduo em relação a uma possível alteração nutricional [9]. A aferição da estatura foi realizada no estadiômetro acoplado à balança tipo plataforma. Ambas as medidas foram aferidas seguindo as técnicas descritas pelo Sistema de Vigilância Nutricional e Alimentar [10].

A DCT foi aferida utilizando adipômetro científico digital Prime Vision Med com capacidade de 0 a 60 (mm) e precisão de 0,1 (mm), sobre o músculo tríceps do braço, 1 cm acima do ponto médio entre a ponta do processo acromial da escápula e o elecrano da ulna, com os braços estendidos e relaxados lateralmente. Foi levantada a pele e o tecido gorduroso e o adipômetro Sanny foi posicionado 1 cm distalmente do polegar e do indicador, a meio caminho entre o ápice e a base da prega e a leitura feita com aproximação de 0,1 mm, sem que o adipômetro pressionasse por mais de três segundos. Essa medida foi repetida por três vezes, para que a média seja considerada. Sua interpretação foi realizada segundo o padrão de normalidade [11] e os resultados classificados utilizando os pontos de corte propostos por Blackburn e Bistian [12].

A CB foi aferida com o cotovelo dobrado a 90o, que fica entre o processo acromial e o ponto mais distante a ele (olecrano). As roupas do indivíduo foram arrumadas de maneira a permitir a aferição do ponto médio. Após ter marcado esse ponto com caneta dermatográfica, a medida foi realizada com o braço relaxado, estendido ao longo do corpo e palma da mão voltada para a coxa. A fita métrica, plástica, inextensível foi posicionada sobre o ponto médio, sem exercer pressão, e a leitura feita com aproximação de 0,1 cm. A sua interpretação foi realizada segundo o padrão de normalidade [11] e os resultados classificados utilizando os pontos de corte propostos por Blackburn e Bistian [12].

A CP foi mensurada na perna esquerda, com uma fita métrica inelástica, na sua parte mais protuberante. Esta medida é considerada a mais sensível para estimar a proteína somática em idosos. Valores inferiores a 31 cm indicam perda de massa muscular [13].

 Para a análise dietética foi aplicado questionário de frequência alimentar simples (QFAs) dividindo os alimentos em três grupos: energéticos, construtores e reguladores e avaliando o consumo diário, semanal, mensal e nunca dos alimentos. Esta divisão foi baseada nas recomendações alimentares presente no Guia Alimentar da População Brasileira [14].

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências da Saúde, da Universidade Federal do Pará – ICS/UFPA, parecer nº 1.179.249/2015. E os indivíduos idosos que aceitaram participar da pesquisa leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Os dados gerados da pesquisa foram compilados e armazenados em banco de dados no programa Microsoft Office Excel 2010. Para análises dos dados utilizou-se do programa Bioestat versão 5.3, onde foi realizada a estatística descritiva. A significância das associações das variáveis antropométricas foi verificada pelo teste Qui-quadrado, com nível de significância padrão de p < 0,05.

 

Resultados

 

Participaram da pesquisa 101 idosos, dos quais a maioria (54,5%) era do sexo feminino. Na tabela I, pode-se verificar que a faixa etária mais predominante (73,3%) é de idosos com 60 a 69 anos, a maioria (58,2%) das mulheres relatou serem viúvas. Dentre os avaliados (53,5%) possuíam ensino fundamental incompleto, a renda familiar foi de 1 salário mínimo, a situação profissional da população em sua maioria era de aposentadoria, equivalente a (48,5%).

 

Tabela I - Variáveis sociodemográfico de idosos atendidos em uma ONG, Benevides/PA.

 

*SM = Salário Mínimo; EF = Ensino Fundamental; = E.M = Ensino Médio; ES = Ensino Superior.

 

Em relação ao estado nutricional, ocorreu predominância de excesso de peso segundo o IMC (49,5%). A PCT apresentou prevalência de desnutrição (57,4%). Nas variáveis CB (59,4%) e CP (92,1%) apresentaram prevalência de eutrofia. Na aplicação do teste estatístico para verificação de significância estatística entre os sexos foram encontrados os seguintes resultados: Significância estatística para o IMC (p = 0,0101) e PCT (p = 0,0321), conforme Tabela II.

 

Tabela II - Avaliação antropométrica de idosos atendidos em uma ONG, Benevides/PA.

 

*Teste Qui-Quadrado; IMC = Índice de Massa Corporal; CB = Circunferência do Braço; CMB = Circunferência Muscular do Braço; PCT = Prega Cutânea Tricipital; CP = Circunferência da Panturrilha.

 

No questionário de frequência alimentar, Figura 1 observou-se consumo diário alto de alimentos energéticos: arroz (90,1%), seguido de farinha de mandioca (44,6%) e pão (44,6%).

 

 

Figura 1 - Frequência do consumo de alimentos energéticos entre idosos atendidos em uma ONG, Projeto Alegria, Benevides/PA.

 

Quanto aos alimentos proteicos 68,3% e 39,6% afirmaram consumir leite e feijão diariamente, respectivamente. Carne vermelha (54%) e aves (38%) apresentaram consumo de 1 a 3 vezes semanal (Figura 2).

 

 

 

Figura 2 - Frequência do consumo de alimentos proteicos entre idosos atendidos em uma ONG, Projeto Alegria, Benevides/PA.

 

No consumo de alimentos reguladores, os vegetais do grupo A foram os mais consumidos (35,6%) e 32,7% dos idosos referiram consumir algum tipo de frutas diariamente (Figura 3).

 

 

Figura 3 - Frequência do consumo de alimentos reguladores entre idosos atendidos em uma ONG, Projeto Alegria, Benevides/PA.

 

Discussão

 

No presente estudo, observou-se predomínio da população feminina. Tal resultado assemelha-se ao encontrado no estudo de Ferreira et al. [15] no qual foi constatado elevada participação de mulheres. Para Freitas et al. [16] as mulheres participam mais de grupos de convivência, buscam mais atendimento em saúde e possuem uma vida social mais ativa. Além disso, outro fator relevante é a diferença na expectativa de vida entre os gêneros, onde as mulheres vivem em média oito anos a mais que os homens, evidenciando um maior cuidado com o domínio da saúde física.

A faixa etária prevalente foi de 60 a 70 anos, correspondeu à maioria dos idosos atendidos, resultado semelhante encontrado em estudo realizado por Previato et al. [17] em idosos do Programa Terceira Idade no estado de MG, indicando que com o avançar da idade a representatividade percentual tende à diminuir em programas sociais, por dificuldades diversas na saúde e locomoção dos idosos. De acordo com os indicadores sociais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [18] essa faixa etária é a que predomina na população idosa brasileira.

A predominância dos idosos avaliados declarou-se solteiro e viúvos. Similar ao obtido por Tavares et al. [19], o qual ressalta ainda no que concerne ao estado conjugal que a ausência de suporte familiar, associado a solidão pode favorecer problemas nutricionais. A família quase sempre constitui a principal fonte de recurso financeiro e apoio emocional aos idosos.

Outro aspecto que merece atenção é a escolaridade, que apresentou resultado semelhante com o estudo retratado por Ferreira et al. [20]. É considerada um fator determinante do estado de saúde, especialmente pela repercussão na ocupação e na renda da pessoa. Infere-se que a maior escolaridade possivelmente favorece o processo de entendimento acerca do estado nutricional e assimilação das informações necessárias, contribuindo para minimizar quadros de excesso de peso, decorrentes de escolhas erradas de alimentos e ausência de atividade física [21].

Com relação à renda individual dos idosos, o baixo nível socioeconômico também é identificado como um fator que dificulta o controle efetivo do estado nutricional. A elevação da renda e da escolaridade interfere na disponibilidade e/ou acesso aos alimentos, afetando as escolhas dietéticas e o padrão alimentar ao longo da vida [22].

Ao analisar a antropometria verificou-se que o estado nutricional, encontrado através do IMC, apresentou prevalência de excesso de peso entre os idosos atendidos na ONG, semelhante ao estudo de Ferreira et al. [20] onde encontraram 57,5% dos idosos avaliados por inquérito telefônico na cidade de Rio de Janeiro/RJ com excesso de peso e Coelho et al. [23] em 55,1% dos idosos atendidos em Unidades de Saúde da Família na cidade de Pelotas/RS.

Neste estudo observou-se IMC elevado nas mulheres, equivalente resultado foi encontrado nos estudos de Pereira et al. [22] e Lehn et al. [24]. Segundo Previato et al. [17] uma possível explicação para a maior prevalência de excesso de peso em mulheres se deve ao fato de que elas acumulam mais gordura visceral quando comparadas aos homens, o que seria agravado pela falta de atividade física.

Ao analisar a PCT encontrou-se desnutrição na maior parte dos idosos e com maior prevalência dentro do sexo feminino, resultado demonstrado nos estudos de Cruz et al. [25]. Em contrapartida, o estudo de Silva et al. [26] a respeito dos valores da PCT, revelou medidas eutróficas. Schmidt et al. [27], referem que a medida da PCT tem sido reconhecida como um marcador indireto de reservas de gordura corporal.

Ao avaliar as variáveis de CB e CP neste estudo foi observado prevalência de eutrofia. Confirmando estes dados, Fernandes e Mezzomo [28] e Schmidt et al. [27] também encontraram valores considerados eutróficos. Segundo Alvares et al. [29] a verificação do estado nutricional utilizando a CB irá refletir a redução da massa, pois esta medida representa a soma das áreas constituídas por tecidos gordurosos, muscular e ósseo do braço, se correlacionando diretamente com a desnutrição proteica, refletindo o déficit muscular.

A CP apresenta forte associação com a reserva de massa muscular e tem sido recomendada como medida sensível da perda de massa muscular em idosos, especialmente se a redução ocorrer em função da diminuição da atividade física. No estudo em questão foi encontrado predominância de adequação desta medida. Cruz e Santos [25] destacam que após os 60 anos, o ser humano tende a perder massa magra, refletindo diretamente no peso corporal existindo uma tendência para a diminuição das variáveis antropométricas com o passar da idade, sendo de extrema importância avaliar mudanças no estado nutricional nessa população periodicamente.

Quanto à análise do questionário de frequência alimentar simples, observou-se que o arroz foi o principal cereal representante do grupo de alimentos energéticos. Seu consumo mais frequente é na mistura com o feijão, sendo um alimento extremamente versátil é também consumido em preparações com legumes, verduras, ovos e carnes [30].

Essa informação citada por Coelho et al. [23], pode estar indicando um consumo maior de carboidratos, principalmente os carboidratos simples, cuja densidade energética é elevada. Destaca ele como o principal fator associado ao excesso de peso e o balanço energético positivo, ou seja, um consumo energético acima da necessidade associado a prática de atividade física insuficiente.

Ainda no grupo de alimentos energéticos, destaca-se a farinha de mandioca que apresentou nível elevado de consumo. O estudo de Picanço [30] salienta que a farinha opera de tal modo na vida dos paraenses que, no ano de 2016, o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos do Pará (DIEESE/PA), constatou que, os paraenses tiveram uma das alimentações mais caras do Brasil, isto pelo alto preço da farinha d’água que foi reajustada em até 62,24%, fato que conferiu a Belém, a terceira posição no ranking nacional entre as capitais com maior inflação do país. Este também argumenta que a farinha de mandioca pode ser pensada como um alimento emblemático que, de alguma maneira, ajuda na definição da identidade coletiva do povo paraense.

O Guia Alimentar da População Brasileira [14] recomenda o consumo diário, ou de pelo menos cinco vezes por semana, do feijão com arroz, sabendo-se que o consumo associado desses alimentos contribui para a ingestão de proteínas de alto valor biológico, neste estudo o consumo de feijão foi menor que as recomendações.

O leite apresentou percentual significativo de consumo diário entre os idosos atendidos, diferente do que a Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição [31] aborda, que em ambos os sexos, o consumo de leite integral tendeu a diminuir com o aumento da idade e aponta que a inadequação da ingestão de cálcio é observada em estudos realizados no Brasil, bem como em outros países emergentes e desenvolvidos, relacionando-se ao baixo consumo de leite e derivados, que são suas principais fontes alimentares.

Em concordância com a Pesquisa de Orçamento Familiar [32] que aponta a carne bovina como sendo a de maior consumo no país, o consumo de carne bovina seguido de aves se ratificou na pesquisa. O estudo de Lima-Filho et al. [33] cita que a carne de frango não é consumida com tanta frequência como a carne bovina. Considera que a carne de frango pode ser um substituto da bovina, visto que existem entre esses dois produtos uma relação inversamente proporcional em termos de consumo. Conforme o consumo de carne bovina diminui, o consumo de carne de frango aumenta, podendo ser explicado pelo elevado preço que a carne bovina apresenta.

Conforme Orlando et al. [34] os alimentos de origem animal são nutritivos, desde que consumidos com moderação. O consumo moderado é recomendado devido ao alto teor de gorduras saturadas nesses alimentos, que aumentam o risco de desenvolvimento da obesidade, de doenças cardíacas e outras patologias.

Os idosos apresentaram baixo consumo de alimentos embutidos e enlatados. De acordo com Gomes et al. [35] este fato define como uma característica positiva dessa população, uma vez que estes alimentos são, em sua maioria, ultraprocessados, os quais possuem elevado teor calórico, gorduras e sódio e são pobres em nutrientes. Ainda cita que o baixo consumo desses alimentos ultraprocessados pode estar relacionado com à formação dos hábitos alimentares, ocorrida em época cuja oferta e, consequentemente, consumo, era menor, ou ainda, ao entendimento popular de que esses alimentos são menos digestivos e inapropriados para o consumo após determinada idade.

Conforme observou-se no consumo de alimentos reguladores (verduras, legumes e frutas), a ingestão de vegetais para a maioria desta população ocorreu semanalmente, com frequência de uma a três vezes por semana, distante do preconizado pelo Guia Alimentar da População Brasileira [14], que orienta o consumo de pelo menos três porções diárias destes alimentos. O estudo de Coelho et al. [23] também apresentou consumo reduzido de alimentos in natura, como vegetais e frutas, ricas em fibras que aumentariam a saciedade do indivíduo e auxiliariam na redução do tamanho das porções consumidas nas grandes refeições.

 

Conclusão

 

Os dados obtidos neste estudo são variáveis importantes de risco nutricional. O baixo nível socioeconômico associado à baixa escolaridade, o excesso de peso aliado ao consumo alto de alimentos energético e a inadequada ingestão de alimentos reguladores, são determinantes preocupantes da saúde nutricional de idosos.

 

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