ARTIGO ORIGINAL
Perfil nutricional e
risco de distorção de imagem corporal de adolescentes brasileiros
Nutritional profile and risk of
distortion of body image of
brazilian adolescents
Hugo
Mayron Assis Santos*, Danielle Cristina Guimarães da
Silva, D.Sc**
*Nutricionista graduado
pela Faculdade de Minas, FAMINAS Campus Muriaé/MG, **Professora Adjunta do Curso
de Nutrição da Universidade Federal do Oeste da Bahia – UFOB
Recebido
14 de maio de 2019; aceito 15 de setembro de 2019.
Correspondência: Danielle Cristina
Guimarães da Silva, Rua B, 42 Vilage Santa Maria 47810-225
Barreiras BA
Danielle
Cristina Guimarães da Silva: daniellenut@hotmail.com
Hugo
Mayron Assis Santos: hugomayron@hotmail.com
Resumo
Introdução: A adolescência é um
período de grandes transformações, dentre elas estão o peso e a composição
corporal, logo o estudo a seguir apresenta os fatores determinantes e suas
prevalências que podem estar envolvidos no excesso de peso. Objetivo: Identificar o perfil
nutricional e o risco de distorção de imagem corporal de adolescentes de um
município mineiro. Métodos: Trata-se
de um estudo transversal, com 40 adolescentes entre 16 e 17 anos de uma escola
pública e uma escola privada, realizado a partir da coleta de um questionário
estruturado, da aferição de medidas antropométricas e da identificação de
distorção corporal, a partir da aplicação de uma escala de silhuetas. Resultados: Foram identificados 5
adolescentes com excesso de peso (12,5%), sendo que 4 estavam em sobrepeso
(10%) e 1 obeso (2,5). Verificou-se baixa distorção de imagem corporal
(p<0,01) e insatisfação corporal (p<0,01) entre os participantes do
estudo. Conclusão: Esse estudo
concluiu que, apesar da prevalência de excesso de peso ser inferior as
encontradas nas capitais dos estados brasileiros, os resultados são semelhantes
aos dos estudos realizados em cidades interioranas do país e por isso, devem
ser controlados.
Palavras-chave: nutrição,
adolescente, distorção corporal.
Abstract
Introduction: Adolescence
is a period of great transformation,
among them are weight and body
composition, so the following study
presents the determinants and their prevalence that may be
involved in overweight. Objective: To identify the
nutritional profile and the risk of
body image distortion of adolescents
from a city of Minas Gerais. Methods: This is
a cross-sectional study with 40 adolescents between 16 and 17 years of age from
a public school and a private school,
based on the collection of a structured questionnaire, the measurement of anthropometric data and the identification of corporal distortion, from the application
of a scale of silhouettes. Results: Five overweight adolescents (12.5%) were identified, 4 of whom were
overweight (10%) and 1 were obese (2.5). There was low
body image distortion (p <0.01) and body dissatisfaction (p <0.01)
among study participants. Conclusion: This study concluded that, although the prevalence of excess weight
is lower than those found
in the capitals of Brazilian states,
they are similar to studies conducted in inner cities of
the country and therefore should be controlled.
Key-words: nutrition,
adolescent, body distortion.
A adolescência é caracterizada como um período
de grande transformação comportamental, cognitiva, psicológica e física, além
de diversas mudanças hormonais [1]. De acordo com o censo do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), em 2010, 34,15% da população
brasileira se encontrava na faixa etária de 10 a 19 anos de idade [2].
A prevalência de excesso de peso, que engloba o
sobrepeso e a obesidade vem aumentando nos países em desenvolvimento [3,4].
Segundo a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) conduzida em 2008-2009, o
déficit de peso em adolescentes é de apenas 3,4% enquanto que o excesso de peso
atinge 20,5%, sendo 21,5% e 19,4% dos adolescentes masculinos e femininos,
respectivamente, e 4,9% dos adolescentes estão em obesidade [5]. Outro estudo
de âmbito nacional, a Pesquisa Nacional da Saúde do Escolar (PENSE) de 2015,
revelou que a prevalência de baixo peso entre adolescentes de 13 a 17 anos é de
3,1%, em contrapartida, 23,7% dos adolescentes, encontram-se com excesso de
peso [6]. O Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA) mostrou
que num universo de 73.399 adolescentes avaliados por todo o Brasil, a
prevalência de sobrepeso e obesidade é de 17,1% e 8,4% respectivamente [7].
Devido às mudanças corporais ocorridas nessa
fase da vida, adolescentes obesos possuem, além da tendência de desenvolverem
certas doenças, maior propensão a serem excluídos da sociedade devido a cultura
de que o corpo belo deva ser magro, exigências impostas pela mídia gerando
desconforto e insatisfação destes com a própria imagem corporal [8].
Objetivo
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho
foi o de identificar o perfil nutricional e o risco de distorção de imagem
corporal de adolescentes de um município mineiro.
Tratou-se de um estudo transversal com
adolescentes com idade entre 16 e 17 anos, ambos os sexos, de uma escola
pública e uma escola privada do município de Muriaé/MG. A coleta de dados foi
constituída pelo preenchimento de um questionário estruturado com questões
sociodemográficas e comportamentais, aferição antropométrica e aplicação da
escala de silhuetas. Após o preenchimento do termo de consentimento livre e
esclarecido pelos pais dos adolescentes, deu-se início à coleta de dados.
A primeira etapa foi consistiu da aplicação do
questionário com as seguintes questões: sexo, idade e aspectos comportamentais
(tabagismo, alcoolismo e atividade física).
Para as questões relacionadas à prática de
atividade física, bem como tabagismo e alcoolismo, foram utilizadas algumas
questões propostas pelo questionário da Vigilância de fatores de risco e
proteção para doenças crônicas por Inquérito Telefônico [9].
Para se determinar fatores de risco
relacionados a hábitos comportamentais, as variáveis foram consideradas eram o
habito de fumo, considerado como fumante o indivíduo que utilizou qualquer
derivado do tabaco nos últimos 30 dias anteriores a pesquisa e ingestão de
bebida alcoólica, doses bebidas em uma semana normal e se houve exagero na
ingestão alcoólica nos últimos 30 dias. Foi utilizado como ponto de corte para
consumo abusivo de álcool, o consumo igual ou superior a 5 doses numa única
ocasião, sendo que foi considerado como dose, ½ garrafa de cerveja, um cálice
de vinho ou 1 dose e bebida alcoólica destilada (conhaque, cachaça, vodka ou whisky) [10].
Quanto as variáveis que envolvem atividade
física, foram listados, tempo em frente à TV somado ao tempo de internet (tempo
de tela), prática de exercícios físicos, duração e frequência. Para o tempo de
tela, foi considerado a somatória do uso de computadores, videogames, internet,
televisão e smartphones. Somatórios iguais ou superiores a 4 horas diárias,
seja em dias de semana ou finais de semana foi considerado como indicador de
comportamento sedentário [11]. Considerou-se como insuficientemente ativo,
adolescentes cujo tempo de atividade física no lazer fosse inferior a 150
minutos semanais e suficientemente ativo, estudantes que obtiveram somatória
total superior a 150 minutos semanais [12].
A segunda etapa da pesquisa consistiu na aferição
de medidas antropométricas de peso corporal, avaliado por meio de uma balança
de vidro da marca G-Tech© com capacidade para 120 kg e precisão de 100 g,
estatura e circunferência da cintura, determinada no ponto médio entre a última
costela e a crista ilíaca [13], com auxílio de uma trena métrica, marca Cescorf©, de resolução de 1 mm e campo de uso de 200 cm. A
partir da aferição de peso corporal e estatura, calculou-se o índice de massa
corporal e determinou-se o estado nutricional dos adolescentes com auxílio das
curvas de crescimento da Organização Mundial de Saúde [14].
Foram avaliados com auxílio de um adipômetro da marca Cescorf, 2
pregas cutâneas: tricipital e subescapular. Para a Prega Cutânea Tricipital
(PCT), foi utilizado o ponto médio entre o acrômio e o olécrano
como referência e para a Prega Cutânea Subescapular (PCS), dois centímetros
abaixo do ângulo inferior da escápula [13]. Classificou-se a adiposidade a
partir do somatório das dobras cutâneas tricipital e subescapular seguindo a
preconização de Frisancho [15], para percentis <
5, baixa reserva de gordura corporal (GC), dentro da média, percentis de 5 a 85
e excesso de GC para percentis > 85.
O risco de distorção de imagem corporal foi
avaliado a partir da aplicação da escala de silhuetas, desenvolvida por Kakeshita et al.
[16] e validada por Laus et al. [17].
O risco de distorção da imagem corporal foi identificado a partir da diferença
entre o IMC real e o IMC ideal, em que resultado igual a zero era considerado
como sem distorção e resultados diferentes de zero, como distorção, sendo os
positivos como superestimação do tamanho corporal e negativos, como
subestimação [16].
A insatisfação corporal foi feita subtraindo-se
o IMC desejado pelo IMC atual em que resultados iguais a zero, foram
considerados como satisfeitos e resultados diferentes de zero como
insatisfeitos em que, para resultados positivos indicaram o desejo de aumentar
o tamanho corporal ou engordar e para resultados negativos o desejo de
diminuí-lo ou emagrecer [16].
Para as variáveis categóricas foram descritas
as frequências relativas e absolutas. Para as variáveis numéricas foram calculados as médias, desvios padrão e o teste de correlação
de Pearson aplicado à imagem corporal. Os dados estatísticos foram tratados no
programa STATA versão 13.1.
O presente estudo foi realizado com 40
adolescentes pertencentes à rede pública e privada do município de Muriaé/MG,
em que 23 estudantes eram do sexo masculino (57,5%), 19 adolescentes eram da
escola privada (47,5%), sendo 13 meninas (76,47%) e 6 (26,08%) meninos enquanto
na escola pública, eram 17 meninos (73,91%) e 4 meninas (23,52%), conforme
tabela I.
Tabela I - Características sociodemográficas e comportamentais dos participantes
do estudo, Muriaé/MG.
Neste trabalho foi constatado que apenas 2
adolescentes (5%) relataram fumar regularmente, ambos pertencentes à escola
particular, sendo que apenas um deles relatou também consumir bebida alcoólica
regularmente. Estudo realizado na cidade de Pelotas/RS com 632 adolescentes
entre 12-17 anos, revelou que 11,1% dos adolescentes eram fumantes, 6,8% eram
ex-fumantes e 82,1% relataram nunca ter fumado [18]. Estudo de Malcon [19] conduzido em Pelotas/RS mostrou a evolução da
prevalência de tabagismo entre os adolescentes, sendo que no ano 2000
constatou-se prevalência de 12,1% entre os adolescentes. Em um estudo de base
populacional envolvendo 1056 participantes com idades de 11 a 15 anos na cidade
de Pelotas/RS entre 2005 e 2006, constatou-se que 23% dos adolescentes usavam
bebida alcoólica e 6,9%, fumavam [20].
Em relação à prática de atividade física, houve
predominância para os adolescentes que relataram permanecer entre 6 a 10 horas
de tempo de tela/dia e eram considerados insuficientemente ativos. Em estudo
sobre a prática de atividade física em adolescentes no nordeste do Brasil,
envolvendo 2874 adolescentes entre 14 e 19 anos, a prevalência de praticantes
de atividade física que foram considerados fisicamente ativos, foi de 50,2%,
sendo maior frequência para os meninos [21]. Também foi realizado um estudo em
Salvador/BA com 803 adolescentes entre 10 e 14 anos de idade, e foi evidenciado
que, 51,3% dos participantes apresentavam hábitos sedentários, assistindo
televisão por tempo igual ou maior a 3,3 horas por dia [22]. Em estudo
realizado na cidade do Rio de Janeiro com três escolas públicas municipais,
verificou-se que 59,1% dos participantes dos adolescentes acumulavam pelo menos
150 minutos de atividade física na semana [23].
Em relação ao perfil nutricional,
identificou-se a maior prevalência de eutrofia
(87,5%), seguido de sobrepeso (10%), de acordo com o índice de massa corporal e
normalidade de percentual de gordura corporal, de acordo com o somatório das
dobras cutâneas (Tabela II). A frequência de eutrofia
foi maior na escola privada que na pública e o diagnóstico de obesidade foi
ausente na rede de ensono privado. Na rede pública, somente dois alunos
apresentaram-se obesos.
Tabela II - Características antropométricas e de composição corporal dos
participantes do estudo, Muriaé/MG.
*GC = Gordura Corporal
A obesidade é um distúrbio metabólico de causa
multifatorial definido pelo aumento de massa adiposa refletindo no aumento de
peso corporal relacionado a capacidade de gerar doenças crônicas não
transmissíveis como dislipidemias, diabetes mellitus tipo 2, doenças
cardiovasculares dentre outras [24]. Estudo realizado na cidade de Vitória/ES
com 43 estudantes de 14 a 17 anos revelou que, nenhum deles se encontravam em
baixo peso ou obesos, porém, 14% estavam em sobrepeso e o restante, eutróficos [25]. Estudo na cidade de São Matheus do Sul/PR,
com amostra de 170 adolescentes entre 12 e 16 anos, mostrou que 3,6% dos
adolescentes estavam abaixo do peso, 12,3% apresentavam sobrepeso e o restante
(84,1%), eutrofia [26].
A frequência de distorção e insatisfação
corporal, segundo rede de ensino, encontra-se na tabela III.
Tabela III - Distorção e insatisfação corporal estratificado por rede de ensino,
Muriaé, 2016.
Segundo os dados estatísticos foi verificado
que a média de IMC real, ou seja, o aferido foi de 22,26 kg/m² com desvio
padrão de ± 3,6, IMC atual (relatado por eles através da imagem) médio de 22,12
kg/m² com desvio padrão de ± 5,62.
A imagem corporal nada mais é que o produto do
pensamento do indivíduo sobre como o próprio corpo é a respeito da forma e
tamanho, podendo ser influenciada por fatores biológicos, históricos, culturais
e sociais [27].
Zenith et
al. [27] constataram que, 81,6% das mulheres e 62,5% dos homens estavam
insatisfeitos com a imagem corporal e que 75% da amostra apresentou distorção
na imagem corporal sendo que, 50% dos homens e 77% das mulheres tinham
distorção sobre a própria imagem corporal.
Os resultados da aplicação da escala de
silhuetas mostraram que 52,5% dos adolescentes apresentavam distorção da imagem
corporal, sendo que 33,3% se viam maiores do que realmente são e que 80%
adolescentes estavam insatisfeitos com o próprio corpo sendo que 59,37%
gostariam de ter o corpo menor (mais magro).
Realizando-se o teste de correlação de Pearson para IMC real e IMC
“atual”, o resultado foi de 0,80 (p<0,01), indicando forte correlação,
mostrando que os valores de IMC que os participantes acham que têm (IMC atual)
corroboram com os valores de IMC que apresentam (IMC real), embora pouco mais
da metade da amostra apresente distorção corporal, verificou-se que esta não é
discrepante.
Para os dados de distorção de imagem corporal,
verificou-se distorção média de 0,14 kg/m² e desvio padrão de ±3,45 kg/m².
Nota-se que houve mais adolescentes se enxergando maiores do que realmente são,
enquanto para a insatisfação, dada pela diferença de IMC atual (que foi dado
pela imagem que os alunos escolheram) e IMC desejado (dado pela imagem
escolhida com a pergunta como gostariam de ser) encontrou-se insatisfação média
-0,87 kg/m² e desvio padrão de ± 4,18 kg/m². O teste de correlação resultou em
0,68, (p<0,01) indicando de forma semelhante, alta correlação entre o IMC
real e IMC desejado, ou seja, baixo grau de insatisfação considerando a
diferença de ambos.
Levando em consideração a tendência de
prevalência crescente de indivíduos em sobrepeso e obesos, são necessárias
medidas públicas, não só na esfera municipal, mas como também na estadual e
federal, a fim de minimizar a incidência e a prevalência de sobrepeso e
obesidade, economizando milhões dos cofres públicos em tratamento do excesso de
peso bem como das enfermidades relacionadas e advindas deste uma vez que se tem
verificado que o excesso de peso não só tem atingido as famílias mais abastadas
como também as famílias com renda mais baixa.