ARTIGO ORIGINAL
Avaliação do estado
nutricional e hábito alimentar de pacientes com síndrome coronariana aguda do
Projeto ERICO
Assessment of nutritional status and dietary habits of patients with
acute coronary syndrome in ERICO Study
Ludmila Macêdo Naud, D.Sc.*, Alessandra Carvalho
Goulart, D.Sc.**, Itamar de Souza Santos, D.Sc.***, Isabela Judith Martins Benesenor,
D.Sc.****, Paulo Andrade Lotufo, D.Sc.*****
*Nutricionista,
Consultora na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Coordenadora do
Observatório de Pesquisas Científicas Registradas na Plataforma Brasil,
**Médica, Hospital Universitário da Universidade de São Paulo, ***Médico,
Professor Associado da Universidade de São Paulo,*** Médica, Professora
Associada da Universidade de São Paulo, ****Médico, Professor titular da
Universidade de São Paulo
Recebido 12 de ferreiro
de 2020; aceito 15 de março de 2020
Correspondência: Ludmila Macêdo Naud, ludmilanaud@gmail.com
Ludmila Macêdo Naud: ludmilanaud@gmail.com
Alessandra Carvalho
Goulart: alessandragoulart@gmail.com
Itamar de Souza Santos:
itamars@usp.br
Isabela Judith Martins Benesenor: isabelabensenor@gmail.com
Paulo Andrade Lotufo:
paulolotufo@gmail.com
Resumo
Introdução: A síndrome
coronariana aguda é uma doença isquêmica do coração cuja etiologia é complexa e
multifatorial e a alimentação tem ligação com muitos fatores de risco. Objetivo:
Descrever a dieta e estado nutricional de uma população com síndrome
coronariana aguda no estudo Estratégia de Registro de Insuficiência Coronariana
(Projeto ERICO). Metodologia: Foram selecionados 290 pacientes de uma
população de 841 com diagnóstico de síndrome coronariana aguda. Foram avaliados
dados demográficos, IMC e variáveis de nutrição a partir de um Questionário de
Frequência Alimentar. Resultados: A idade média dos pacientes foi de
61,8 ± 12,0 anos, com 62,8% de homens, 74,1% de brancos, 31,4% com infarto do
miocárdio com elevação do segmento ST. A média de IMC foi de 27,1 ± 4,5 kg/m²,
consumo calórico total diário de 4311,8 ± 3043,1 kcal. A dieta em geral foi hipoglicídica, normoprotéica e hiperlipídica, com consumos elevados de ácidos graxos
saturados, trans e colesterol, consumo insuficiente
de ácidos graxos linolênico e linoleico e consumo adequado das demais
variáveis. O Índice de Qualidade da Dieta-Revisado foi de qualidade regular. Conclusão:
A dieta foi considerada de insatisfatória, sendo hipercalórica com má
distribuição dos nutrientes, em especial, ácidos graxos saturados.
Palavras-chave: síndrome coronariana
aguda, hábito alimentar, índice de qualidade da dieta revisado, projeto ERICO
Abstract
Introduction: Acute coronary syndrome is an ischemic heart disease whose etiology is
complex and multifactorial, and diet is linked to many risk factors. Objective:
To describe the diet and nutritional status of a population with acute coronary
syndrome in the Coronary Failure Registration Strategy study (ERICO Project). Methodology:
290 patients were selected from a population of 841 diagnosed with acute
coronary syndrome. Demographic data, BMI and nutrition variables were evaluated
using a Food Frequency Questionnaire. Results: The mean age of the
patients was 61.8 ± 12.0 years, with 62.8% men, 74.1% white, 31.4% with ST
segment elevation myocardial infarction. The mean BMI was 27.1 ± 4.5 kg/m²,
total daily caloric consumption of 4311.8 ± 3043.1 kcal. The diet in general
was hypoglycidic, normoproteic
and hyperlipidic, with high consumption of saturated,
trans and cholesterol fatty acids, insufficient intake of linolenic and
linoleic fatty acids and adequate consumption of the other variables. The
Quality Index of the Diet-Revised was of regular quality. Conclusion:
The diet was considered unsatisfactory, being hypercaloric with poor
distribution of nutrients, especially saturated fatty acids.
Keywords: acute coronary syndrome, feeding habit, revised healthy eating index,
ERICO study.
A síndrome coronariana
aguda é uma doença isquêmica do coração com etiologia complexa e multifatorial.
Cada fator de risco tem sua própria causa associada, e muitos têm associação em
uma complexa cadeia de eventos, incluindo causas socioeconômicas, ambientais e
comportamento individual. De acordo com dados recentes, 84.664 das mortes no
Brasil foram decorrentes de infarto agudo do miocárdio no período de janeiro a
novembro de 2012, sendo 25.086 só no estado de São Paulo [1].
A alimentação tem
ligação direta e indireta com muitos dos fatores de risco para doenças
cardiovasculares. Apesar de existirem alguns estudos a respeito do impacto da
dieta no desenvolvimento das doenças coronárias, ainda é difícil mensurar de
maneira exata o grau de sua importância, de maneira quantitativa e/ou
qualitativa [2].
Os objetivos desse
estudo são descrever a dieta de uma população com síndrome coronariana aguda no
estudo Estratégia de Registro de Insuficiência Coronariana (Projeto ERICO) na
unidade de emergência do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo
(HU-USP) a partir de um Questionário de Frequência Alimentar, caracterizar a
população de acordo com o estado nutricional e descrever o Índice de Qualidade
da Dieta Revisado e seus componentes.
Estudo transversal
aninhado à linha de base de uma coorte denominada Estratégia de Registro de
Insuficiência Coronariana (Projeto ERICO), um estudo de sobrevida [3]. O estudo
ocorreu no Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP), cuja
coleta ocorreu de 19 de janeiro de 2009 até março de 2012.
Foram selecionados e
incluídos 290 indivíduos adultos e idosos diagnosticados com síndrome
coronariana aguda, independentes de gênero, classe, grupo social ou raça.
Após cerca de 30 dias
de evento coronariano agudo, os pacientes retornaram para análise nutricional e
preenchimento de inquérito dietético.
Foram excluídos os
pacientes que excederam o prazo de retorno de 160 dias após evento coronariano
agudo, pacientes sem inquérito alimentar completo e pacientes sem diagnóstico
confirmado de síndrome coronariana aguda segundo critérios definidos em artigo
prévio [3]. Coletaram-se informações sobre o consumo alimentar, peso e estatura
por uma equipe de enfermeiros e nutricionista previamente treinada do
ambulatório de Clínica Médica do HU-USP. O nutricionista foi responsável pela
entrevista sobre consumo alimentar e a enfermeira, pela medida de peso e
estatura.
Para a aferição do
peso, foi utilizada uma balança digital fixa desenvolvida da marca Toledo, com
capacidade máxima de 200 kg e precisão de 50 g e estadiômetro
acoplado. O estadiômetro foi utilizado para
mensuração da altura, cuja régua antropométrica tinha capacidade de 1,05 a 2,01
metros, dividida em centímetros. Os dados de peso e altura foram utilizados
para o cálculo da fórmula do Índice de Massa Corporal (IMC).
As medidas
antropométricas foram avaliadas segundo técnicas padronizadas. A altura foi
quantificada em metros, com duas casas decimais, com o paciente em posição
ortostática, sem sapatos e com o mento paralelo ao plano horizontal. A medição
foi da extremidade da cabeça à base do pé, com as costas e a parte posterior
dos joelhos voltadas para o estadiômetro. O peso foi
considerado em quilogramas e duas casas decimais para as gramas referidas,
estando o paciente com roupas leves.
Para estimar o hábito
alimentar, foi utilizado Questionário de Frequência Alimentar previamente
validado [4]. A partir deste questionário, foram tiradas informações
nutricionais e posterior análise do Índice de Qualidade da Dieta Revisado [5].
O cálculo do valor nutritivo
dos alimentos consumidos e registrados no Questionário de Frequência Alimentar,
bem como o Índice de Qualidade da Dieta Revisado, foram realizados
utilizando-se o programa Virtual Nutri [6] com banco de dados de alimentos de
tabelas de composição química dos alimentos da United States
Departement of Agriculture [7]. Como alguns alimentos poderiam ter
mais de uma opção como referência, foram selecionados ao acaso 10% dos
pacientes, ou 27 indivíduos, para especificar o consumo. Esta segunda referência
foi feita por telefone.
A análise de ingestão
dietética foi feita pelo cálculo do valor energético total e de cada
macronutriente (carboidrato, proteína, lipídeo) com ajuste para a dieta. Fibras
foram calculadas individualmente. Os lipídeos foram divididos em ácidos graxos poliinsaturados, monoinsaturados e saturados. O total de
ácidos graxos poliinsaturados linolênico e linoleico,
ácido graxo trans e colesterol também foram
mensurados.
Para a avaliação da
qualidade da dieta, foi utilizado o Índice de Qualidade da Dieta Revisado [5] e
análise dos 12 componentes que caracterizam diferentes aspectos de uma dieta
saudável. Cada componente foi avaliado e uma pontuação foi atribuída variando
de zero a vinte. Os valores intermediários foram calculados proporcionalmente à
quantidade de alimento consumido. Os indivíduos que possuíram ingestão igual ou
superior ao nível recomendado, atingiram a pontuação máxima (cinco, dez ou 20
pontos), a depender do componente em questão.
No final, a pontuação
de todos os componentes foi somada gerando o Índice de Qualidade da Dieta
Revisado. O valor máximo do Índice de Qualidade da Dieta Revisado é 100 pontos.
Escores altos significam que a ingestão está próxima aos intervalos ou
quantidades recomendadas; escores baixos indicam menor conformidade com a
recomendação.
Para análise dos dados
foi feita inicialmente uma análise exploratória dos dados, mostrada em forma de
tabelas, gráficos e medidas descritivas, com o intuito de obter uma
visualização mais clara dos dados coletados.
As variáveis contínuas
foram categorizadas de acordo com o valor de corte estabelecido na literatura,
independentemente da distribuição dos dados na amostra. A categorização
recomendada pelo Guia Alimentar para a População Brasileira [8] foi utilizada
para os valores de carboidrato, proteína, lipídeo, ácidos graxos saturados, poliinsaturados, trans,
colesterol e fibra. Para ácidos graxos monoinsaturados, optou-se por utilizar
as recomendações nutricionais da IV Diretriz Brasileira Sobre Dislipidemias e
Prevenção da Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia (9). Os
ácidos graxos linolênico e linoléico foram
categorizados com base nas recomendações da Dietary
Reference Intake [10].
A categorização da pontuação total do Índice de Qualidade da Dieta Revisado foi
de acordo com o tercil da pontuação total, assim como recomendam os autores do
mesmo [5]. Para categorização do valor energético total, foi utilizada a
mediana da amostra.
Para a categorização da
análise do Índice de Qualidade da Dieta Revisado, utilizou-se o preconizado por
Philippi [11]. O consumo adequado está relacionado à
recomendação proposta por Philippi nas categorias
frutas, hortaliças, cereais, carnes, leguminosas, leite e derivados, óleos e
gorduras. Embora o Índice de Qualidade da Dieta Revisado subcategorize
ainda mais essas categorias (frutas são divididas em frutas totais e integrais,
hortaliças tem a opção de cores verde-escuro e alaranjadas e cereais que também
tem a opção integral), não foi feita essa análise por não ter a opção destas
individualmente nas categorias na pirâmide de Philippi.
Os dados categóricos
foram representados em frequências absoluta (n) e relativa (%).
As variáveis
quantitativas foram submetidas ao teste Kolmogorov-Smirnov
para verificar o grau de aderência à distribuição normal. As variáveis
quantitativas foram descritas através de frequências, medidas de tendência
central e de dispersão. Os dados paramétricos foram representados por média e
desvio padrão. Os dados não paramétricos foram representados por mediana.
A digitação e
codificação das informações coletadas foram realizadas no programa Excel;
posteriormente os dados foram analisados estatisticamente pelos programas SSPS
versão 17.0.
O projeto de pesquisa
principal Projeto ERICO e este projeto de pesquisa, foram aprovados pelo Comitê
de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo.
Antes da realização da
entrevista, o entrevistador esclareceu sobre a justificativa, os objetivos e os
procedimentos utilizados na pesquisa. Em seguida, obteve-se o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido por escrito de cada sujeito da pesquisa. Para
os pacientes que não foram alfabetizados, ele foi submetido ao responsável
legal.
Os procedimentos para o
desenvolvimento deste estudo respeitaram as diretrizes e normas que
regulamentam as pesquisas envolvendo seres humanos, aprovadas pela Resolução nº
169, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde. Desta forma, no
banco de dados da pesquisa principal está mantido o anonimato e a
confidencialidade dos dados.
A amostra deste estudo
compreende 290 pacientes de ambos os sexos, que corresponde a uma população de
841 pacientes inscritos no projeto ERICO.
As características da
distribuição da amostra encontram-se na tabela I. Pode ser observado que houve
predomínio de indivíduos adultos, do sexo masculino, de etnia branca, com
diagnóstico de IAM sem supra e com sobrepeso.
Tabela I - Distribuição das
frequências absolutas e relativas de indivíduos segundo características gerais.
(*) Idosos indivíduos
> 65 anos; (†) Média ± Desvio Padrão; (‡) Pontos de corte definidos pela
OMS, foram considerados 287 indivíduos para o cálculo do IMC.
A tabela II mostra as
características gerais, bem como sua estatística descritiva em relação aos
nutrientes da dieta na amostra. Os valores entre colchetes indicam o consumo
adequado em relação à recomendação de acordo com a literatura, ajustada pelo
valor energético total, exceto para a variável colesterol e fibra. A dieta do
estudo se caracterizou como hipoglicídica, normoprotéica e hiperlipídica,
com quantidades adequadas de ácidos graxos poliinsaturados,
monoinsaturados e fibras. Quantidades abaixo do recomendado foram observadas na
variável ácidos graxos linolênico e linoleico. Consumo excessivo foi percebido
em ácidos graxos saturados, trans e colesterol.
Tabela II - Distribuição das
frequências absolutas e relativas de indivíduos segundo características gerais
dos nutrientes da dieta segundo recomendação do Guia Alimentar para a População
Brasileira.
(*) Média ± Desvio
Padrão; (†) Mediana; (‡) Pontos de corte definidos pela IV Diretriz Brasileira
Sobre Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose da Sociedade Brasileira de
Cardiologia; § Pontos de corte definidos pela Dietary
Reference Intake.
A estatística
descritiva da pontuação do Índice de Qualidade da Dieta Revisado dividido pelos
seus respectivos componentes encontra-se na tabela III. Além de média, desvio
padrão, valores mínimos e máximos, a frequência relativa dos indivíduos que
apresentaram o escore mínimo e máximo também foi considerada.
Tabela III - Estatística
descritiva dos componentes do Índice de Qualidade da Dieta Revisado.
*Vegetal Verde-Escuro e
Alaranjado; † Todos os participantes tiveram pontuação 10
A amostra se
caracterizou predominantemente por homens brancos, adultos, com excesso de peso
e diagnóstico de Infarto Agudo do Miocárdio sem elevação do segmento ST no
eletrocardiograma de repouso. A dieta em geral foi hipoglicídica,
normoprotéica e hiperlipídica,
com consumos elevados de ácidos graxos saturados, trans
e colesterol, consumo insuficiente de ácidos graxos linolênico e linoleico e
consumo adequado das demais variáveis. O Índice de Qualidade da Dieta-Revisado
foi de qualidade regular. A observação foi realizada em um único centro de
tratamento médico, com uma população demograficamente semelhante. Não houve
influência de conduta médica local na análise da população. A população da
amostra é caracterizada por uma população predominantemente adulta (média 61,8
anos), do sexo masculino, de etnia branca, em acordo com outros estudos do
gênero [12-14].
O presente estudo
detectou 67,9% com excesso de peso, sendo 45,3% com sobrepeso e 22,6% com
obesidade pela análise do IMC. A média de IMC foi 27,1 kg/m². Não houve
indivíduos com baixo peso em relação ao IMC. Dados semelhantes foram
encontrados em outros estudos [13,15]. Embora a metodologia do estudo tenha se
baseado no retorno do paciente após cerca de um mês de evento cardiovascular,
foram considerados pacientes com retorno de até 160 dias, normalmente o período
de validação de questionários de frequência alimentar é de três a seis meses
[16]. Durante esse tempo, o peso dos pacientes pode ter se alterado,
interferindo no resultado do IMC.
A média de consumo
calórico foi de 4311,8 kcal, dieta considerada hipercalórica segundo parâmetro
brasileiro de dieta saudável [8]. Consumos reduzidos foram observados para
ácidos graxos linolênicos e linoleicos. Alguns estudos prospectivos sugerem que
dietas ricas em ácidos graxos poliinsaturados, em
especial, o linolênico, estão associadas a um risco reduzido de doença
coronariana independentemente de outros fatores de risco [17,18].
O consumo excessivo de
gorduras saturadas está relacionado à ocorrência de doenças cardiovasculares
pelo aumento do risco de dislipidemias [18]. De acordo com os inquéritos
dietéticos, o aumento do consumo de gordura saturada aumentou cerca de 30% em
30 anos. Na falta de estudos que avaliem a quantidade de ingestão segura de
ácidos graxos trans, recomenda-se que no máximo 1% do
valor energético da alimentação diária seja proveniente desse tipo de gordura.
Dietas com elevada quantidade de ácidos graxos trans
estão correlacionadas com doenças coronárias e aumento da incidência de infarto
do miocárdio [19-21]. No presente estudo, a maior parte da população consumiu
quantidades elevadas de ácidos graxos trans.
O Honolulu Heart Program [23] demonstrou que o colesterol dietético é
positivamente associado com o risco cardiovascular e infarto agudo do miocárdio
ou morte por doença cardiovascular depois de dez anos de seguimento. Consumo
maior que a recomendação foi encontrado nesse estudo.
No projeto ERICO, a
quantidade de consumo de fibras foi surpreendente. Enquanto em muitos estudos
observacionais, a quantidade mínima recomendada de fibra raramente é alcançada,
neste estudo o consumo foi, em média, o dobro da recomendação. Embora o tipo de
fibra não ter sido analisada, estudos posteriores poderiam ser feitos sobre a
distribuição dos tipos de fibra. Apesar de o excesso de fibra poder interferir
na quantidade de minerais e a diminuição destes contribuir para o
desenvolvimento de síndrome coronariana aguda, o mais provável é que houve
superestimação dos alimentos ricos em fibra.
A média do Índice de
Qualidade da Dieta Revisado neste estudo foi de 69,8 pontos, indicando uma
dieta que necessita de melhora, com qualidade moderada. Como o Índice de
Qualidade da Dieta Revisado foi validado recentemente, poucos estudos ainda
foram feitos utilizando como base este índice e os que foram, utilizaram a
população adolescente. Estudos que utilizaram a população adulta e idosa, em
geral, utilizaram outros índices, os quais não incluíram todos os componentes
do Índice de Qualidade da Dieta Revisado e alguns ainda consideravam outros
componentes [5,23-26]. A divisão nesse estudo foi utilizada baseada em tercil
da população. O 3º tercil abrangeu o intervalo de 75,9 a 94,3 pontos. A maior
parte desse intervalo é considerada como dieta saudável.
Grande quantidade da
população teve consumo mínimo de cereais integrais (70,3%) e 52,4% da população
consumindo o escore máximo de frutas totais. Os vegetais tiveram grande
consumo, assim como os vegetais verde-escuro e alaranjados. Entretanto,
comparando com a pirâmide alimentar, o consumo de vegetais foi abaixo da
recomendação em 49,5% da população. Não só de fibras são ricos os componentes
frutas e vegetais/hortaliças. A trilogia frutas, legumes e verduras é utilizada
para enfatizar a alimentação saudável [8]. A vantagem nutricional desses
alimentos é que eles possuem compostos bioativos, que exercem funções
biológicas benéficas distintas.
Pontualmente, a média
das leguminosas foi de 6,3 pontos, sendo 28,6% da população consumindo a
pontuação máxima. Analisando pela Pirâmide Alimentar, observa-se que quase 60%
da população consumiu quantidades elevadas de leguminosas. Como frutas,
vegetais e cereais integrais tiveram consumo baixo, conclui-se que o consumo elevado
de fibras vem da participação do consumo excessivo de leguminosas. Os feijões
contêm carboidratos complexos e são ricos em fibra alimentar, vitaminas do
complexo B, ferro, cálcio e outros minerais, bem como em compostos bioativos. A
comparação com dados de padrão alimentar brasileiro é oposta aos desse estudo.
Os dados disponíveis acerca da alimentação brasileira revelam uma tendência de
queda no consumo de feijões pela população, em prol de alimentos
industrializados. Entre 1974 e 2003, a participação relativa de leguminosas no
total energético da alimentação caiu 31%. Essa redução de consumo resultou em
importante queda de fibra alimentar.
Os cereais totais
obtiveram média de 3,9 pontos de 5 pontos no máximo. Ninguém teve escore mínimo
de consumo e 45,2% obteve o escore máximo. Utilizando-se como base a Pirâmide
Alimentar, 78,6% da população consumiu menos que a recomendação de cereais.
Esse dado não acompanhou os dados da POF 2008/2009 que demonstraram consumo
adequado de cereais [27].
Os alimentos de origem
animal também são parte de uma alimentação saudável, que inclui pequenas
quantidades de carnes, leites e derivados. As carnes tiveram consumo adequado
na população. O componente leite e derivados teve consumo mais baixo que a
recomendação. Os alimentos de origem animal são boa fonte de proteína [28]. O
consumo moderado de alimentos de origem animal é recomendado devido ao alto
teor de gorduras saturadas desses alimentos, que aumentam o risco de
desenvolvimento de obesidade e doenças cardíacas [29].
Óleo e sódio tiveram
consumo elevado. Entretanto uma consideração deve ser feita, o consumo desses
nutrientes provavelmente foi subestimado. Não foi considerada na entrevista a
quantidade de óleo adicionada nos alimentos tanto nas preparações como em
alimentos prontos, como saladas. Utilizou-se como forma de contornar esse viés
o padrão de receita do programa Virtual Nutri para as preparações, para as
saladas, não se considerou o óleo. A quantidade de sódio foi a do componente de
cada alimento, o sal adicionado às preparações, bem como
outros temperos prontos, não foram considerados. Os dados desse estudo
mesmo com valores subestimados para sódio foram superiores aos da POF 2008/2009
[27].
A maior parte dos
indivíduos foram homens adultos de etnia branca, com sobrepeso e diagnóstico de
Infarto Agudo do Miocárdio sem elevação do segmento ST no eletrocardiograma de
repouso. A dieta média foi considerada hipercalórica, hipoglicídica,
normoprotéica e hiperlipídica.
Em relação aos micronutrientes, as quantidades foram adequadas para ácidos
graxos polinsaturados, ácidos graxos monoinsaturados
e fibras. Consumos elevados foram observados para ácidos graxos saturados,
ácidos graxos trans e colesterol e consumos abaixo do
recomendado para ácidos graxos linolênicos e ácidos graxos linoleicos. A
qualidade da dieta dos indivíduos necessita melhorar. Para os componentes
cereal total, carne e derivados, leguminosas, leite e derivados, óleo e
gorduras e sódio, o aumento dos mesmos,
aumentou em
relação à gravidade da doença. Os valores
médios mais baixos em relação à
pontuação total foram para os componentes cereal
integral, leite e derivados e
gordura saturada enquanto os mais altos foram vegetal total,
óleo e derivados e
sódio.