ARTIGO ORIGINAL

Comparação do teor de sódio em produtos industrializados diet e light e seus análogos convencionais

Comparison of sodium content in industrialized diet and light products and their conventional analogues

 

Ana Luíza de Melo Oliveira

 

Nutricionista, Especialista em Nutrição Clínica e Vigilância Sanitária e Qualidade dos Alimentos

 

Recebido 11 de maio de 2016; aceito 15 de dezembro de 2016

Endereço para correspondência: Ana Luíza de Melo Oliveira, Rua Antônio Miguel Cerqueira Neto, 202 São Pedro, Ribeirão das Neves MG, E-mail: anamelonutri@yahoo.com.br

 

Resumo

Objetivo: Avaliar a concentração de sódio em alimentos diet e light e seus análogos convencionais e associá-los aos fatores de risco que influenciam no desenvolvimento e complicações da hipertensão arterial e diabetes. Métodos: Foram coletados dados do teor de sódio contido nos rótulos dos alimentos diet e light que possuíam os análogos convencionais. Foram analisados 69 rótulos. Resultados: Houve um aumento da porcentagem de sódio de 61,53% e 55,8% dos diet e light respectivamente. Conclusão: Há uma grande alteração no teor de sódio nos alimentos pesquisados em relação ao convencional. O aumento do consumo desses alimentos, aliados a outros fatores de risco, principalmente os diet pelos diabéticos, pode levar ao desenvolvimento e/ou complicações de hipertensão arterial.

Palavras-chave: hipertensão arterial, diabetes.

 

Abstract

Objective: To evaluate the concentration of sodium in diet and light foods and their conventional analogues and to associate them with the risk factors which influence the development and complications of high blood pressure and diabetes. Methods: We collected data on the sodium content in the labels of diet and light foods that have conventional analogs. A total of 69 labels were analyzed. Results: We observed an increase of the percentage of sodium of 61.53% and 55.8% in diet and light products, respectively. Conclusion: There is a great change in the sodium content in the products in relation to the conventional ones. The increase of the intake, together with other risk factors, especially the diet products by persons with diabetes, can lead to the development and/or complications of high blood pressure.

Key-words: high blood pressure, diabetes.

 

Introdução

 

As transições demográficas, nutricionais e epidemiológicas ocorridas no século passado determinaram um perfil de risco em que doenças crônicas como a hipertensão arterial e o diabetes assumiram ônus crescente e preocupante. Ambas são doenças muito frequentes, constituindo problemas de saúde pública relevantes em todos os países, independentemente do seu grau de desenvolvimento [1].

O aumento no consumo de alimentos processados, ricos em gordura, açúcares e sal, associado ao menor gasto energético diário devido à redução da atividade física, explicam as tendências crescentes de sobrepeso e obesidade na população e também das doenças crônicas não-transmissíveis (DCNT) [2].

A busca por uma alimentação alternativa é, sem dúvida, uma realidade nos dias de hoje. Consumidores que buscam novos e saudáveis hábitos alimentares têm nos produtos diet e light grandes aliados [3].

Produtos diet e light diferem em comparação aos denominados tradicionais ou convencionais, sendo muitas vezes vistos pela população como alimentos mais saudáveis. Apesar do crescimento no consumo desses alimentos, o consumidor não está suficientemente esclarecido quanto ao significado deste termo, acarretando a utilização incorreta deste produto [4].

O consumo excessivo do sódio tem relação direta com o desenvolvimento de algumas patologias, tais como: hipertensão arterial sistêmica, osteoporose, doenças coronarianas, insuficiência renal crônica (IRC), edema e outras complicações. Grande parte deste consumo é proveniente do sal de cozinha (cloreto de sódio), que pode ser ingerido através de embutidos, conservas, temperos prontos, leite e seus derivados, bacon, ovos entre outros [5].

A necessidade nutricional de sódio para os seres humanos é de 500 mg (cerca de 1,2 g de sal), tendo sido definido recentemente, pela Organização Mundial de Saúde, em 6 g de cloreto de sódio ou sal de cozinha (que corresponde a uma média de 2,4 g de sódio) a quantidade considerada máxima saudável para ingestão alimentar diária. O consumo médio do brasileiro corresponde ao dobro do recomendado [6].

Desse modo, o objetivo do presente estudo foi avaliar a concentração de sódio dos alimentos diet e light e seus análogos convencionais e associá-los aos fatores de risco que influenciam no desenvolvimento e complicações da hipertensão e diabetes.

 

Material e métodos

 

A pesquisa foi realizada em supermercados de grande porte da cidade de Belo Horizonte/MG, no qual foram coletados dados referentes ao teor de sódio contido nos rótulos dos alimentos diet e light que possuíam os análogos convencionais. Os rótulos consultados e utilizados para o estudo foram dos seguintes alimentos: achocolatado em pó, açúcar refinado, atum ralado enlatado, bebida citrus, bebida tônica, biscoito salgado, biscoito integral do tipo cookies, cappuccino em pó, chás, chocolate, coalhada, cereais em barra, mistura em pó para o preparo de bolos, pó para o preparo de pudins, pó para o preparo de gelatinas, sucos prontos para o consumo, refrigerantes, milho de pipoca, leite em pó, iogurte, leite condensado, leite de coco, macarrão instantâneo, maionese, margarina, creme de ricota, cream cheese, creme de leite, pães, requeijão, salsicha e torrada. Foram observados os teores de sódio nos rótulos dos alimentos de forma aleatória e de acordo com a disponibilidade destes alimentos nas gôndolas. Os mesmos foram registrados em planilhas.

Foram analisados 69 rótulos de alimentos de diferentes marcas e sabores, sendo 43 de produtos light e 26 de produtos diet, e comparados aos seus respectivos análogos convencionais (Tabela I). Para o porcionamento, foi utilizado como base as porções dos alimentos classificados como convencionais, os demais alimentos (diet e light) foram adequados às porções dos alimentos tradicionais por meio de regra de três. O banco de dados foi elaborado no Excel.

 

Resultados e discussão

 

Os resultados obtidos da avaliação dos rótulos dos alimentos estão expressos nas tabelas e nas figuras abaixo.

 

Tabela IO teor e o percentual de redução nas concentrações de sódio dos alimentos light e seus respectivos análogos convencionais informados pela rotulagem nutricional.

 

 

É demonstrado na tabela I, a redução do teor de sódio dos alimentos light pesquisados, informados pela rotulagem nutricional e seus respectivos análogos convencionais.

Alguns alimentos tiveram uma redução variando entre 1,47 a 100% do teor de sódio quando comparados aos produtos convencionais. Os produtos que apresentaram redução do teor de sódio representaram 34,9% do total avaliado. Essa diminuição pode ser justificada pelo termo light, que é a redução de no mínimo 25% de qualquer nutriente, dentre eles o sódio, se comparado ao original.

 

Tabela IIO teor e o percentual de aumento nas concentrações de sódio dos alimentos light e seus respectivos análogos convencionais informados pela rotulagem nutricional.

 

 

A partir da tabela II, podemos observar que, houve diferença marcante entre o aumento do teor de sódio dos alimentos light para os convencionais. A variação do teor de sódio dos alimentos em sua composição foi de 1,49 a 276%. Dos 43 avaliados 55,8% apresentaram aumento do sódio dos produtos. Os alimentos light com redução de gordura, como coalhada, creme de leite, maionese e margarina possuem redução da gordura, e o uso do cloreto de sódio é recomendando, principalmente em produtos com baixo teor de gordura, pois o sal inibe o poder de retenção de umidade, além de diminuir a extração das proteínas, eliminando características sensoriais indesejáveis [7].

 

Tabela IIIProdutos diet que tiveram redução nos níveis de sódio e o percentual.

 

 

Houve uma redução de 1,53 a 100% do teor de sódio quando comparados aos produtos convencionais como mostra na tabela III. Aqueles que apresentaram redução do teor de sódio representaram 26,9% do total avaliado.

 

Tabela IVProdutos diet que tiveram aumento nos níveis de sódio e o percentual.

 

 

De acordo com a tabela IV, a variação do aumento do teor de sódio dos alimentos diet em sua composição foi de 1,96 a 190,9%. Do total de 26 alimentos avaliados, 61,53% apresentaram esse aumento.

Pode-se sugerir que, através dos dados obtidos, os alimentos diet possuem maior quantidade de sódio devido ao fato destes serem isentos de algum componente e possivelmente, esta isenção ser compensada por uma carga maior de adição de sódio na sua formulação.

 

Figura 1Produtos light que tiveram o maior aumento de % de sódio quando comparado ao convencional.

 

 

 

Figura 2Produtos diet que tiveram o maior aumento de % de sódio quando comparado ao convencional.

 

 

 

Figura 3Percentual do aumento de sódio dos alimentos diet estudados acima de 100%.

 

 

 

A figura 3 demonstra a porcentagem de aumento dos alimentos diet que foram maiores do que 100%, sendo eles: gelatina (138,6%), cappuccino (150%) e refrigerantes (variação entre 147,05 a 190,9%). O refrigerante mate guaraná é o que contêm maior porcentagem de quantidade de sódio entre os alimentos pesquisados (190,9%).

Os alimentos diet com aumento no teor de sódio se comparado ao convencional, teve uma média de 93,98% de aumento dos níveis, isso se deve principalmente à introdução do ciclamato de sódio em bebidas dietéticas em combinação com a sacarina, geralmente na proporção de dez partes de ciclamato para uma de sacarina, que resulta em potencialização do sabor doce e, ao mesmo tempo, mascara o sabor amargo residual da sacarina. As bebidas denominadas diet, por conterem edulcorantes artificiais, apresentam cerca de duas vezes a média de sódio encontrada em bebidas adoçadas com açúcar [4,8].

Ferrari e Soares [8] analisaram 14 marcas de refrigerantes diet/light e seus análogos convencionais, onde observaram que as concentrações de sódio encontradas variaram de 19 a 202 mg Na/L, assim as bebidas denominadas diet/light apresentaram cerca de duas vezes a média de sódio encontrada em bebidas comuns. Como consequência, um consumidor médio de refrigerante tradicional (259 ml/dia) estaria ingerindo por dia cerca de 19 mg de sódio, por outro lado, o consumidor médio que preferir bebidas do tipo diet/light estará ingerindo aproximadamente 39 mg de sódio/dia. Já o grande consumidor (2 l/dia) estará ingerindo cerca de 300 mg Na/dia (12,5% da recomendação diária), quando considerado o refrigerante como fonte unicamente do nutriente.

 

 

Figura 4Percentual de aumento de sódio dos alimentos light estudados acima de 100%.

 

 

A figura 4 demonstra a porcentagem de aumento dos alimentos light que foram maiores do que 100%, sendo a bebida cítrus (150%), cappuccino (230,3%) e bebida tônica (275%). A bebida tônica foi a que teve uma porcentagem maior de aumento do teor de sódio, se comparado ao convencional, sendo 275%, de todos os alimentos light pesquisados.

No caso do cappuccino, tanto na versão diet quanto na light, a porcentagem de aumento do sódio foi muito elevada, 150 e 230,3 % respectivamente. O cappuccino light possui 211,4 mg de sódio por porção, o equivalente à 42,28% do consumo mínimo diário (500 mg) recomendado para um indivíduo normal [9].

Os consumidores vão às compras buscando qualidade, preço, comodidade, segurança, conforto, praticidade e saúde. Porém, a sociedade não tem o entendimento correto da diferença entre os produtos diet e light, e muitas vezes, por um consumo equivocado pode comprometer a saúde ou até mesmo agravar alguma morbidade existente, como a hipertensão arterial sistêmica (HAS) e o diabetes mellitus.

A hipertensão arterial é uma doença de alta prevalência no Brasil, e vários são os seus fatores de risco, sendo um deles a ingestão elevada de sódio. O consumo exagerado e continuo de produtos industrializados, principalmente o diet/light com alto teor de sódio, como mostrado na pesquisa, chegam a ter um aumento de até 275%, podendo levar ao desenvolvimento da hipertensão arterial ou a elevação da mesma.

O diabetes frequentemente está associado à pressão arterial, favorecendo a ocorrência de doenças cardiovasculares e complicações decorrentes dessa patologia. Sua redução tem como base a dieta hipocalórica, a prática regular de atividades físicas aeróbicas e a redução de ingestão de açúcar simples [10]. Assim, é importante ressaltar que o consumo de alimentos diet por diabéticos é considerável, e que muitas vezes podem influenciar no desenvolvimento ou nas complicações da HAS, uma vez que contêm teor de até 190,9% aumentado se comparado ao convencional, como mostra dados da pesquisa.

 

Conclusão

 

A partir dos dados analisados pode-se perceber que há uma grande alteração no teor de sódio em alimentos diet e light em relação a seu convencional. Assim, o aumento do consumo destes alimentos aliados a outros fatores de risco, principalmente os diet pelos diabéticos, pode levar ao desenvolvimento e/ou complicações da hipertensão arterial.

Muitas vezes, a população com o entendimento equivocado da diferença entre alimentos diet e light, acaba por consumir estes produtos com a ideia de que eles estariam auxiliando-os na restrição calórica de suas dietas ou então, estes alimentos seriam isentos de açúcares ou gorduras. Este tipo de consumo errôneo pode, por muitas vezes, comprometer a saúde do consumidor ou agravar ainda mais as morbidades existentes.

Outro aspecto considerado importante é o excesso de sódio, uma vez que muitos alimentos dietéticos utilizam, em sua composição, edulcorantes na forma de sais em substituição ao açúcar convencional. E ressaltando que na população, muitos pacientes diabéticos utilizam esses produtos, também são hipertensos ou são mais propensos a desenvolver a HAS.

Dessa forma, nota-se a necessidade de um esclarecimento maior para a população sobre esses produtos, além do incentivo a leitura de rótulos, de modo a fornecer conhecimentos suficientes para a escolha dos alimentos. É de grande importância a conscientização dos consumidores em relação aos alimentos para fins especiais, podendo ser realizada através da educação nutricional em postos de saúde, hospitais, escolas, instituições de ensino superior, redes de supermercados, entre outros.

O papel do profissional de saúde, principalmente do nutricionista, é de informar e auxiliar na educação da população acerca do assunto, orientando e oferecendo as melhores alternativas de uma alimentação saudável.

Os consumidores devem ser informados da presença e dos teores de sódio nos produtos, que são informados em rótulos, de maneira a possibilitar um melhor controle das fontes desse mineral na sua dieta, pois um mesmo produto pode, ao mesmo tempo, ser considerado essencial ao consumo, bom para a saúde e prejudicial à mesma.

 

Referências

 

  1. Toscano CM. As campanhas nacionais para detecção das doenças crônicas não transmissíveis: diabetes e hipertensão arterial. Ciência & Saúde Coletiva 2004;9:885-95.
  2. Lessa I. Doenças crônicas não-transmissíveis no Brasil: um desafio para a complexa tarefa da vigilância. Ciência & Saúde Coletiva 2004;9(4):931-43.
  3. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Rotulagem Nutricional Obrigatória: Manual de orientação às indústrias de alimentos. Brasília; 2005.
  4. Cândido LMD, Campos AM. Alimentos para fins especiais: Dietéticos. São Paulo: Varela; 1996.
  5. Pertschy P. Comparação do teor de sódio em alimentos convencionais, light e diet pela rotulagem dos produtos. Guarapuava; 2010.
  6. Sociedade Brasileira de Cardiologia /Sociedade Brasileira de Hipertensão / Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol 2010; 95(1)(Supl1):1-51.
  7. Vieira ACP, Cornélio AR. Produtos light e diet: o direito a informação ao consumidor. Jus Navigandi 2004;9(530).
  8. Ferrari CC, Soares LM. Sódio em bebidas carbonatadas nacionais. Ciênc Tecnol Aliment 2003;23(3):414-7.
  9. Krummel DA et al. Terapia nutricional na hipertensão. In: Mahan LK, Escott-Stump S. Krause: Alimentos, nutrição e dietoterapia. 11. ed. São Paulo: Roca; 2005. p.850-76.
  10. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Hipertensão arterial sistêmica para o Sistema Único de Saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.