ARTIGO
ORIGINAL
Análise
das temperaturas dos alimentos na distribuição em um restaurante comercial no
município de Belo Horizonte/MG
Analysis of the temperatures of food distribution in a commercial
restaurant in the city of Belo Horizonte/MG
Nathalia Ventura
Meneses*, Rita de Cássia Ribeiro**, Márcia Regina Pereira Monteiro**
*Graduanda
em Nutrição, Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Enfermagem,
Departamento de Nutrição, **Professora do Departamento de Nutrição da Escola de
Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais
Recebido 22 de junho
de 2016; aceito 15 de dezembro de 2016
Endereço
para correspondência:
Márcia Regina Pereira Monteiro, Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de
Enfermagem, Departamento de Nutrição, Av. Prefº Alfredo Balena, 190 Santa
Efigênia 30130-100 Belo Horizonte MG, E-mail: mregina0@hotmail.com; Nathalia
Ventura Meneses: nathventura@hotmail.com;
Rita de Cássia Ribeiro: ritagastronomia@hotmail.com
Resumo
O objetivo deste
estudo foi analisar o binômio tempo e temperatura das preparações quentes
arroz, feijão, macarrão, suflê e carne e das preparações frias salada de
alface, vinagrete e maionese de batatas no momento da distribuição em um
restaurante comercial, localizado no município de Belo Horizonte/MG. A coleta
ocorreu no horário do almoço durante três dias em cinco horários diferentes,
onde utilizou-se um termômetro digital para aferição
das temperaturas no horário de distribuição. Realizou-se a análise descritiva
das temperaturas com cálculo de média aritmética e desvio padrão. Os resultados
obtidos mostraram que as médias das saladas dos três dias apresentaram-se
inadequadas, ou seja, acima de 10°C. Em relação às preparações quentes, o
feijão apresentou maior porcentagem de adequação (100%), e o macarrão, estava
abaixo do recomendado. Com isso, conclui-se que as temperaturas encontradas são
propícias para a proliferação de microrganismos patogênicos, agregando níveis
pouco satisfatórios para produção de alimentos seguros.
Palavras-chave: controle de
qualidade, temperatura, alimentação coletiva, doenças transmitidas por
alimentos.
Abstract
The aim of this study was to analyze time and temperature of hot
preparations like rice, beans, pasta, soufflé and meat, and cold preparations
like lettuce salad, vinaigrette and potato salad at the time of distribution in
a commercial restaurant, located in the city of Belo Horizonte/MG. The
collection took place at lunchtime for three days in five different times where
we used a digital thermometer to measure temperatures in the distribution
schedule. We performed a descriptive analysis of temperatures with arithmetic
mean and standard deviation calculation. The results showed that the
temperature of the salads was inadequate, i.e., above 10°C. Regarding the hot
preparations, the beans had a higher percentage of adequacy
(100%), and the pasta was below the recommended by the guidelines. Thus, we
concluded that the temperatures encountered facilitate the proliferation of
pathogenic microorganisms, adding unsatisfactory levels for the production of
safe food.
Key-words: quality
control, temperature, collective feeding, foodborne diseases.
O setor de
alimentação coletiva tem se destacado pela sua representatividade na economia
mundial, em decorrência da intensa urbanização e industrialização, aumento da
profissionalização das mulheres e elevação do nível de vida educação entre
outros. Cada vez mais tem se diminuído o número de refeições realizadas no lar
[1]. Por isso é fundamental que os serviços de alimentação sejam aperfeiçoados,
principalmente no controle da qualidade das refeições seja no aspecto
higiênico-sanitário, sensorial ou nutricional [2].
Entre os
estabelecimentos do segmento comercial, os restaurantes por peso ou self service por quilo têm se
apresentado como um dos mais procurados pelos brasileiros [3]. Segundo Proença et al. [4] estes estabelecimentos estão em
segundo lugar no ranking das
ocorrências de Doenças Transmitidas por Alimentos (DTA). As DTA são causadas
por microrganismos presentes na água ou alimento contaminado, que afetam o
organismo humano podendo levar o indivíduo a morte. Com o número de refeições
fornecidas cresce a preocupação com a qualidade dos alimentos para garantir a
saúde dos usuários.
Alguns dos principais
fatores que influenciam na proliferação de microrganismos patógenos são
preparar os alimentos com grande antecipação, deixar os alimentos em
temperatura ambiente por longo tempo para esfriamento, descongelar os alimentos
de forma inadequada, preparar alimentos em quantidades excessivas e aquecer ou
ter um tempo de cocção insuficiente também influenciam na sobrevivência desses
agentes patógenos [5].
Para que a qualidade
das refeições seja garantida, deve-se ter o controle de qualidade da
matéria-prima, realizar higiene dos utensílios e dos manipuladores, além de um
monitoramento do tempo e temperatura. As temperaturas adequadas de
armazenamento, cocção e distribuição dos alimentos contribuem para dificultar a
sobrevivência e reduzir a multiplicação microbiana, diminuindo assim o risco de
doenças de origem alimentar [6].
O binômio “tempo e
temperatura” é um fator muito importante na distribuição de refeições, visto
que a exposição de alimentos à temperatura ambiente permite a multiplicação dos
microrganismos. Em vários restaurantes, o alimento pronto fica exposto no
balcão térmico por longos períodos, e na maioria das vezes, sob
temperatura inadequada, isto acarreta risco maior de sobrevivência e
multiplicação de microrganismos [7].
Neste contexto, o
objetivo do estudo foi avaliar as temperaturas e o tempo de exposição dos
alimentos durante a distribuição em um restaurante comercial do município de
Belo Horizonte/MG.
Trata-se de um estudo
descritivo e observacional envolvendo um restaurante comercial do tipo self service a quilo no município de
Belo Horizonte/MG. A coleta ocorreu no horário de almoço durante três dias
alternados no mês de abril de 2016, e registrados em formulário
preestabelecido.
O critério de escolha
das preparações foi feito de acordo com o cardápio da unidade, esta conta com
cinco cardápios diferentes que muda semanalmente. Tendo em vista que o
restaurante oferecia grande variedade nas preparações foram escolhidas as que
repetiam durante os três dias. As preparações frias foram escolhidas a partir
do critério de risco potencial de causarem toxinfecções alimentares, foram
escolhidas preparações onde havia grande manuseio dos alimentos e as que continham
algum tipo de molho como maionese. As preparações quentes e frias avaliadas
foram prato principal (1 tipo de carne), guarnição
(suflê e macarrão), acompanhamento (arroz e feijão); e salada (maionese de
batatas, vinagrete e alface).
As temperaturas foram
aferidas com termômetro digital do tipo espeto no centro da cuba para
certificar de que os alimentos atingissem temperaturas de cozimento interno suficientemente elevadas para eliminar as bactérias
prejudiciais. A temperatura coletada foi aquela que perdurou por 5 segundos,
tendo-se o cuidado de não haver contato entre o termômetro e as paredes e o
fundo das cubas. Foram realizados procedimentos de higienização do termômetro
com álcool 70% antes e após cada aferição realizada.
Também foi feita
aferição da temperatura da pista fria, esta é o balcão onde ficam os alimentos
que precisam de refrigeração, é importante a verificação da temperatura do
equipamento para descartar temperaturas inadequadas por problemas do mesmo.
Para aferição da temperatura da pista fria foi utilizado o termômetro digital,
infravermelho a laser.
A temperatura de
distribuição foi aferida considerando o período de funcionamento do restaurante.
A distribuição nesse estabelecimento ocorre das 11 às 15 horas. Durante este
período de tempo é feita a reposição dos alimentos, que é feita sem que a cuba
esteja completamente vazia, colocando o alimento novo sobre aquele que estava
exposto há mais tempo. Assim, foram aferidas temperaturas em cinco momentos (11:00, 12:00, 13:00, 14:00 e 15:00).
Os dados obtidos
foram comparados com a Resolução RDC 216/2004 [8] e a Portaria CVS 5/2013 [9],
segundo as quais preparações quentes devem permanecer a temperatura superiores
a 60ºC por no máximo 6 horas de exposição, e os alimentos frios devem ser
submetidos a temperaturas inferiores a 10ºC.
Realizou-se a análise
descritiva das temperaturas com cálculo de média aritmética e desvio padrão, os
dados também foram avaliados através da análise de variância (ANOVA). Estes
cálculos foram realizados pelo programa Excel.
A tabela I apresenta
média das temperaturas encontradas para cada preparação analisada durante os
três dias. Pode-se afirmar que houve diferença significativa nas temperaturas
dos três dias apenas para a maionese (p < 0,05). As médias das temperaturas
dos pratos quentes variaram de 54,78ºC a 75,4ºC, e dos pratos frios
permaneceram entre 17,4ºC e 24,16ºC.
Tabela
I - Médias das preparações quentes e frias em
diferentes dias de um restaurante comercial no município de Belo Horizonte/MG,
2016.
*Diferença
estatisticamente significativa realizada pelo teste de variância ANOVA
(p>0,05) na mesma linha.
A tabela II
demonstram que apenas as temperaturas da guarnição 1
variou significativamente, todas as outras temperaturas das preparações da
pista quente e fria não variaram significativamente durante os diferentes
horários de coleta (p > 0,05).
Tabela
II -
Médias por horário de distribuição das
preparações quentes e frias de um restaurante comercial no município de Belo
Horizonte/MG, 2016.
H1*= 11:00, H2* = 12:00, H3* = 13:00, H4* = 14:00, H5 = 15:00; NA
= Não se aplica, horário que não houve aferições; *Diferença estatisticamente
significativa realizada pelo teste de variância ANOVA (p > 0,05) na mesma
linha.
As figuras 1 e 2
representam as médias encontradas para cada preparação quente e fria,
respectivamente. Das preparações quentes duas (20%) apresentaram temperaturas
inadequadas nos três dias, entre as preparações frias, todas apresentaram
temperaturas inadequadas nos três dias de aferição. As temperaturas dos balcões
quente e frio também foram observadas. A temperatura do balcão quente estava
abaixo de 80ºC em todos os dias, e o frio estava abaixo de 10°C nos três dias.
Figura
1 - Média das temperaturas das preparações
quentes em um restaurante comercial no município de Belo Horizonte/MG, 2016.
Figura
2 - Média das temperaturas das preparações
frias em um restaurante comercial no município de Belo Horizonte/MG, 2016.
Na análise dos
resultados obtidos, verificou-se que apenas duas
preparações quentes, arroz e feijão (tabela I) apresentaram a média de temperatura
com 100% de adequação durante os três dias de aferição, quando comparadas ao
preconizado pela RDC 216/2004 [8]. De acordo com esta resolução, os alimentos,
após serem submetidos à cocção, devem ser mantidos em condições de tempo e
temperatura que não favoreçam a multiplicação microbiana, garantido sua
qualidade e segurança. Assim sendo, é recomendado que os alimentos permaneçam em temperaturas superiores a 60ºC por no máximo
seis horas. Quanto às preparações frias, observou-se que todas se mantiveram em
temperaturas superiores a 10°C, uma inadequação de acordo com a resolução, que
recomenda que os alimentos frios fiquem expostos a temperaturas inferiores a
10°C.
A portaria CVS5/2013
[9], ainda, ressalta que a temperatura para as preparações frias pode ficar
entre 10°C e 21ºC durante duas horas. Porém, no restaurante os alimentos ficam
expostos a temperaturas maiores que 10ºC por um período de aproximadamente seis
horas, mesmo havendo reposição dos alimentos durante a distribuição, os
alimentos não eram colocados imediatamente após o esvaziamento da cuba, muitas
vezes as cubas ainda estavam parcialmente cheias e era colocado o alimento novo
por cima do que já estava a mais tempo na
distribuição. Além disso, os alimentos não eram armazenados adequadamente após
o preparo, as preparações eram mantidas em refrigeradores que não comportavam a
quantidade de alimentos e não conseguiam manter as preparações em temperaturas
abaixo de 10ºC, ou eram mantidas em temperatura ambiente por aproximadamente
uma hora antes da distribuição.
Alves et al. [6] e Momesso et al. [10] encontraram resultados semelhantes: 22% e 20%,
respectivamente, dos alimentos quentes analisados apresentaram temperatura
adequada, de acordo com a RDC 216/2004 [8].
Penedo et al. [11] não encontraram temperaturas
adequadas em nenhuma preparação fria analisada. Alves et al. [6] ainda sugerem que a falha na refrigeração dos alimentos
pós-preparo, assim como a falta de conscientização dos manipuladores, são os
principais fatores que interferem negativamente no controle de temperatura dos
alimentos frios. As preparações frias após o preparo devem ficar armazenadas sob refrigeração até o momento de distribuição, este é o
procedimento recomendado pelo Manual ABERC [12]. Os alimentos devem ir para
distribuição já com a temperatura inferior a 10ºC, para que a pista fria
mantenha a temperatura.
De acordo com a
tabela II o único alimento que manteve a média da temperatura adequada em todos
os horários de distribuição foi o feijão, este evento pode ser explicado devido
a melhor condutibilidade de temperaturas em alimentos com maior teor de água
[13]. A guarnição 1, macarrão, obteve a média de
temperatura adequada somente em um horário, este já chegava ao balcão térmico
com temperatura abaixo do exigido, este fato pode ser explicado por ser um
alimento que continua o processo de cozimento quando exposto à altas
temperaturas, isto faz com que o restaurante não exponha o macarrão a
temperatura ideal para que não fique ressacado e passe do ponto al dente [14].
Frantz et al. [15] constataram em seu estudo de
avaliação de registros de processos em unidades de alimentação e nutrição que
as preparações quentes tiveram maior adequação de temperaturas em relação as
preparações frias. De um modo geral, o presente estudo também apresentou
melhores temperaturas nas preparações quentes.
A temperatura da água
não atingiu o valor ideal nos três dias de aferição, ficando com a temperatura
na faixa de 62º a 65º C, segundo a CVS5/2013 [9], a temperatura adequada é
entre 80°C e 90°C. As temperaturas não ficaram dentro do ideal possivelmente
pelo tempo insuficiente para o aquecimento, o balcão térmico era ligado meia
hora antes do início da distribuição e a água colocada no equipamento não
estava em temperatura alta, outro fator pode ser o funcionamento pouco eficaz
do equipamento, Ricardo et al. [16] em estudo realizado em
Goiânia, também não encontrou temperaturas acima de 80ºC na água do balcão
térmico.
Os resultados das
análises das médias das temperaturas mostraram que as saladas necessitam de um
controle maior após o preparo, para melhoria da qualidade de temperatura. A
falta de funcionários treinados, equipamentos e espaço físico são os principais
fatores pelas falhas no controle da temperatura. É necessário o investimento em
treinamento e novos equipamentos para que os alimentos consigam chegar às
temperaturas adequadas, trazendo segurança alimentar para os consumidores.
Também foram
encontradas preparações quentes com temperaturas inadequadas, podendo ser
veículos de transmissão de DTA, o tempo e a temperatura são fatores muito
importantes na distribuição de refeições e devem ser monitorados
constantemente.
Como medida corretiva
foi pedido aos funcionários responsáveis pelas saladas
para que após o preparo dos alimentos, estes fossem armazenados nos
refrigeradores, e também foi pedido um técnico para que verificasse a regulagem
das temperaturas dos mesmos. Para as preparações quentes foi pedido para que a
água colocada nos balcões térmicos esteja acima de 80ºC.
O restaurante, apesar
de algumas não conformidades realiza o monitoramento dos tempos e temperaturas,
porém estas devem ser mais efetivas, com capacitação adequada dos profissionais
envolvidos nesta atividade.