ARTIGO
ORIGINAL
Avaliação
do desenvolvimento motor em crianças praticantes e não praticantes de
exercícios físicos
Motor development evaluation in children practicing and non-practicing
of physical activity
Thalita Ravazani
Silva*, Thaís Santos Contenças, D.Sc.**, Alessandro
Marques, Ft.***
*Graduada
em Fisioterapia para Universidade Paulista (UNIP), **Especialista em
Fisioterapia Neurofuncional pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São
Paulo, Docente da UNIP, ***Pós-Graduado em Fisioterapia e Reabilitação
Músculo-esquelética e Desportiva UGF
Recebido em 13 de
julho de 2017; aceito em 30 de agosto de 2017.
Endereço
para correspondência:
Thais Santos Contenças, Rua Brasília, 54, 11060-000 Santos SP, E-mail:
thaiscontencas@yahoo.com.br; Thalita Ravazani Silva:
thalita.fisioterapia@yahoo.com.br; Alessandro Marques: alessandrofisio@yahoo.com.br
Resumo
Objetivo: Comparar o
desenvolvimento motor em crianças praticantes de exercícios físicos e não
praticantes. Métodos: Participaram do
estudo 30 crianças do gênero masculino, na faixa etária de 8 a 11 anos de
idade. Divididas em dois grupos comparativos de praticantes e não praticantes
de exercícios físicos. Foi utilizada a Escala de Desenvolvimento Motor. Resultados: O resultado das avaliações
de crianças praticantes mostrou que a média de quociente motor geral foi de
109,4, enquanto a média de quociente motor geral de crianças não praticantes
foi de 95,6 revelando uma diferença de 13,5% entre praticantes e não
praticantes. Conclusão: O
desenvolvimento motor das crianças praticantes de exercícios físicos e não
praticantes encontrou-se dentro da normalidade. No entanto, as crianças
praticantes mostraram-se com o desenvolvimento motor
superior que os não praticantes na Escala de Desenvolvimento Motor.
Palavras-chave: destreza motora,
desenvolvimento infantil, atividade motora, crianças.
Abstract
Objective: The present
study evaluated the motor development in children who do participate or do not
participate in physical activity. Methods:
Thirty male children aged 8 to 11 years participated in the study. They were
divided into 2 comparative groups: participants and non-participants of
physical activity program. The Motor Development Scale was used. Results: The results of the participants
showed that the mean motor quotient was 109.4, and the overall motor quotient
of non-participants was 95.6, revealing a difference of 13.5% between
participants and non-participants. Conclusion:
The motor development of children of both groups was within the normal
development; however children who performed physical activity showed better
motor skills than those who were non-participants.
Key-words: motor
skills, child development, motor activity, child.
O Desenvolvimento
Motor (DM) é o processo contínuo que se refere aos resultados da interação
entre condições ambientais, biologia da criança e a idade cronológica [1,2].
Durante a infância, ocorre o início do processo de aprendizagem escolar junto
com um acréscimo de habilidade motora, que se define pela produção de uma ação
hábil [3]. O refinamento e o amadurecimento do DM e das habilidades motoras na
educação infantil são importantes, pois permitem o acesso para a fase dos
movimentos especializados, proporcionando eficiência em jogos, atividades
esportivas, recreativas e sociais [3,4].
A realização de
atividade física regular com intensidade leve a moderada estimula o crescimento
das crianças, evoluindo assim em seu DM [4]. Avaliar os níveis de desempenho
motor pode favorecer a prevenção, conservação e melhora da capacidade
funcional, resultando em melhores condições de saúde e qualidade de vida para
as crianças [5,6]. As ações de diversas funções motoras são chamadas de
motricidade. A incorporação frequente da motricidade implica a constante e
permanente maturação orgânica [1,4].
Os elementos básicos
da motricidade são: Motricidade fina
(capacidade de controlar um conjunto de atividades de movimentos de certos
segmentos do corpo com pequena força) [1]. Motricidade
global (envolve grandes movimentos realizados com o corpo) [7]. Equilíbrio (combinação de ações
musculares com o propósito de assumir e sustentar o corpo sobre uma base,
contra a lei da gravidade) [7]. Esquema
corporal (capacidade de produzir com exatidão as partes corporais) [8]. Organização espacial (noção do espaço.
Ela envolve tanto o espaço do corpo, como o espaço que nos rodeia) [1,2]. Organização temporal (Capacidade de
situar-se em função através de uma sucessão de acontecimentos, da duração de
intervalos) [1,9]. Lateralidade
(predomínio de um dos dois hemisférios a iniciativa da organização do ato
motor) [10].
Além dos elementos
básicos da motricidade, a criança tem a capacidade de usar a informação
sensorial para modificar comportamentos motores e aprender com as experiências.
A falta de experiência sensório-motora pode limitar a capacidade da criança de
se adaptar ou mudar em resposta às novas exigências da tarefa [3,8].
Dentre as modalidade de esporte, cada uma tem suas exigências
particulares e requerem características e habilidades especificas, que
delimitam o comportamento motor de uma criança [3,5].
A escala de
desenvolvimento motor compreende um conjunto de provas muito diversificadas e
de dificuldade graduada, conduzindo a uma exploração minuciosa de diferentes
setores do desenvolvimento, já descritos anteriormente. A aplicação da mesma
permite avaliar seu nível de desenvolvimento motor, conforme êxitos e fracassos
e considerando as normas estabelecidas pelo autor da escala [1,2].
O objetivo do
presente estudo foi comparar o desenvolvimento motor em crianças praticantes e
não praticantes de exercícios físicos.
Participaram do
estudo crianças com idades entre 8 e 11 anos do gênero
masculino, distribuídas em dois subgrupos: 15 crianças praticantes de
exercícios físicos (futebol de campo e salão) e 15 crianças não praticantes. No
Grupo GP foi necessária a prática do exercício físico no mínimo três vezes na
semana (não considerando a educação física escolar), para o Grupo GNP poderia
apenas praticar a educação física escolar.
O estudo foi aprovado
pelo Comitê de Ética de Pesquisa (CEP) com Seres Humanos da UNIP, parecer
1.857.344. Os responsáveis pelas crianças assinaram o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE).
Os dados obtidos nas
avaliações foram coletados pelos próprios autores e foram realizados em uma
clínica de fisioterapia no município de Santos/SP.
O instrumento utilizado para avaliar o DM foi o protocolo de testes da Escala de Desenvolvimento Motor (EDM) (anexo 1), desenvolvida por Neto [1], que analisa as seguintes áreas do desenvolvimento motor: motricidade fina, motricidade global, equilíbrio, esquema corporal, organização espacial, organização temporal e lateralidade.
Avaliaram-se também: Idade Cronológica (IC), obtida pela data de
nascimento da criança expressa em anos, meses e dias que é transformada em meses;
Idade motora (IM), que é um procedimento aritmético para avaliar e pontuar os
resultados dos testes; Idade Motora 1(IM1 - Motricidade Fina) ou 2 (IM2 –
Motricidade Global) ou 3 ( IM3 – Equilíbrio) ou 4(IM4 – Esquema Corporal) ou 5
(IM5 – Organização Espacial) ou 6 (IM6 – Organização Temporal) que é a soma dos
valores positivos alcançados nos testes e é expressa em meses; Idade Motora
Geral (IMG) que é a soma dos resultados positivos obtidos expressos em meses.
IMG = IM1 + IM2 + M3 + M4 + IM5 + M6/6
O Quociente Motor
(QM) 1 ou 2 ou 3 ou 4 ou 5 ou 6 é obtido através da
divisão da respectiva idade motora 1 ou 2 ou 3 ou 4 ou 5 ou 6 com a idade
cronológica. O resultado é multiplicado por 100. O Quociente Motor Geral (QMG)
é obtido através da divisão entre a idade motora geral e idade cronológica multiplicado por 100.
QMG = IMG / IC.100
As baterias de testes
consistiram em 10 tarefas motoras (com exceção da lateralidade que são três
tarefas para lateralidade das mãos, duas para os pés e duas para os olhos),
distribuídas entre 2 e 11 anos, entretanto foram
utilizados os testes com idade entre 7 e 11 anos, organizados por grau de
complexidade, e a cada êxito era atribuído para cada tarefa o valor
correspondente da idade motora. O teste era suspenso, caso a criança não
conseguisse realizar a tarefa, conforme o protocolo.
No final dos testes
era determinada a IM em cada uma das áreas referidas anteriormente, depois era
calculada a idade motora geral (IMG), o quociente motor geral (QMG) da criança
e com esse resultado (QMG) classificaram-se as habilidades em padrões de DM
(Quadro 1).
Quadro
1 – Classificação Geral da Escala de
Desenvolvimento Motor.
Para análise
estatística foi usado o teste t não pareado no programa de Excel para comparar
o quociente motor de cada item e o quociente motor geral. Foi calculada a
mediana e desvio padrão de cada item. O nível de significância adotado neste
estudo foi p < 0,05.
Participaram deste
estudo 30 crianças, gênero masculino, divididos em dois subgrupos: Grupo
Praticante com 15 crianças praticantes de exercícios físicos, no mínimo três
vezes na semana, com mediana de idade cronológica de 116 meses e mediana de
idade motora de 124 meses; e Grupo Não Praticante, com outras 15 crianças que
realizavam somente educação física escolar, com mediana de idade cronológica de
112 meses e idade motora de 106 meses.
No IM1, a mediana de
praticantes foi de 113 e não praticantes foi de 107 (p = 014). O GP atingiu o
valor máximo neste domínio. No IM2, a mediana de praticantes foi de 112 e não
praticantes foi de 107 (p = 0,12). O GNP atingiu o número de valor máximo neste
domínio. No IM3, a mediana de praticantes foi de 112 e não praticantes foi de
99 (p = 0,02). O GP atingiu o valor máximo neste domínio, mas também o obteve
como valor mínimo na bateria de testes para o grupo.
No IM4, a mediana de
praticantes foi de 100 e não praticantes foi de 79 (p = 0,04). No IM5, a
mediana de praticantes foi de 112 e não praticantes foi de 99 (p = 0,02). O GNP
atingiu esse domínio com o valor mínimo na bateria de testes. No IM6, a mediana
de praticantes foi de 109 e não praticantes foi de 91 (p ≤ 0,001). O GP
atingiu o valor máximo neste domínio (Tabela I).
O resultado das
avaliações de crianças praticantes mostrou que a mediana de quociente motor
geral foi de 110 classificando-as na EDM em normal alto, enquanto a media de
quociente motor geral de não praticantes foi de 95,6 classificando-as na EDM em
normal médio. E revelou uma diferença de 13,5% entre praticantes e não
praticantes, embora os dois grupos se encontrassem no padrão de normalidade.
Tabela
I – Resultado das avaliações de crianças praticantes
e não praticantes de exercícios físicos.
Dados expressos em
mediana e desvio padrão.
Na lateralidade para
as crianças praticantes de exercícios físicos foram encontradas: destros
26,66%, sinistros 20% e indefinidos 53,34%. Entre as crianças não praticantes
encontraram-se: destros 13,33%, sinistros 6,66%, indefinidos 46,68% e cruzadas
33,33% (Tabela II).
Tabela
II -
Lateralidade dos Praticantes e Não
Praticantes.
No resultado do
desenvolvimento motor entre crianças praticantes de exercícios físicos,
obteve-se a classificação na EDM entre normal médio 46,68% e superior 26,66%.
Enquanto o resultado do desenvolvimento motor entre crianças não praticantes de
exercícios físicos obteve-se a classificação na EDM entre normal médio 73,34 e
normal baixo 26,66% (Tabela III).
Tabela
III
– Classificação dos resultados das
crianças praticantes.
Ao avaliar as
crianças, o presente estudo verificou que as crianças praticantes de exercícios
físicos demonstraram um desenvolvimento superior ao das não praticantes. Isso
ocorreu porque essas crianças estavam na fase da segunda infância e é quando
acontece o vértice do desenvolvimento motor. Iniciando a etapa de transição
para movimentos especializados que é o refinamento dos movimentos fundamentais.
Segundo Santos et al. [11] é o ambiente que proporciona
estímulos para ajudar no desenvolvimento dos componentes da motricidade e tem
capacidade de auxiliar no domínio do controle motor e maximizar o
desenvolvimento motor.
Autores relatam que a
oportunidade das práticas da atividade física lúdica favorece o desenvolvimento
motor das crianças [9,12].
De modo geral, alguns
autores analisaram que as crianças inseridas em ambientes esportivos
demonstraram perfil motor específico em consequência das exigências da
modalidade [13]. E quanto maior o tempo de treinamento esportivo maior será o
desenvolvimento motor da criança desde o início da prática [14].
Em uma pesquisa
utilizando o Test of Gross Motor
Development (TGMD 2), verificou-se o efeito do
treinamento sobre o desenvolvimento motor das crianças. Os iniciantes não
apresentaram índices abaixo da média, enquanto os praticantes com tempo
superior a seis meses demonstraram valores significantes na classificação
normal alto. Esses resultados reforçam que a prática esportiva, mesmo que por
pouco tempo (seis meses), agregou positivamente para a potencialização do
desenvolvimento motor nas habilidades de motricidade fina, motricidade global e
esquema corporal [11].
De acordo com o
estudo de alguns pesquisadores, com aumento da idade cronológica ocorre um
aumento da idade motora, o que pode significar que com o aumento da idade
cronológica as crianças são capazes de realizar mais tarefas. Porém, esse
resultado não apresenta o comportamento de todas as crianças, podendo haver
variações [15]. Como visto nesse estudo, as crianças não praticantes obtiveram
uma média de idade motora inferior a média da idade
cronológica, mostrando que a prática dos exercícios físicos pode aumentar a
idade motora da criança.
Em relação à prática
dos exercícios físicos, observou-se que os meninos obtiveram uma melhor forma
de apresentação do movimento, uma forma mais madura do movimento [16].
Em motricidade fina,
as crianças não praticantes de atividade física obtiveram um melhor resultado
que as crianças praticantes. Sugere-se que isso pode ser devido à era
tecnológica que vivemos hoje em dia, pois as crianças passam mais tempo em seus
smartphones, computadores e vídeo games, para os quais se faz necessário o
domínio de motricidade fina para interagir com os mesmos. Relata-se que meninas
têm mais habilidade com a motricidade fina [17].
Já, quando falamos de
motricidade global, foram às crianças praticantes de atividade física que
obtiveram o valor máximo. Estudo realizado com dois grupos de crianças, um que
apresentava aptidão física superior e outro de aptidão física inferior,
observou que um grupo apresentou QMG normal médio, enquanto o outro grupo
apresentou QMG normal baixo. As crianças com aptidão física inferior também
apresentavam maiores dificuldades em motricidade [8].
Em equilíbrio as
crianças praticantes se encontram em valor máximo e valor mínimo. E alguns
autores informam que a faixa etária de 7/8 anos de idade é sinalizada por uma
mudança na estratégia de manutenção e coordenação do equilíbrio. Eles
atribuíram esse fenômeno ao controle do equilíbrio postural imaturo, resultando
em perda de estabilidade em situações de conflito sensorial, que só está totalmente
desenvolvido aos 12 anos [7,16]. Em um estudo comparando dados cinéticos de
equilíbrio em crianças e adolescentes de 8 a 11 anos, praticando exercícios
físicos ou não [18], houve uma diferença significativa entre as crianças
praticantes e não praticantes.
Sobre o esquema
corporal/rapidez, a média dos praticantes foi maior que as crianças não
praticantes. Em outros estudos, autores relatam que o esquema corporal esteve
entre as principais áreas que apresentaram maior défict motor em relação ao
esperado na sua idade cronológica. Esse domínio é essencial para o
desenvolvimento da criança, já que essa organização direciona para as diversas
possibilidades de ação. Autores mencionam que o atraso do desenvolvimento do
esquema corporal em relação à idade cronológica achado em seus estudos é devido
ao excessivo tempo empregado com jogos televisivos e a redução de atividades de
respiração, simetria corporal, equilíbrio postural [8,9], mas nos estudo de
outros autores observou-se que a população estudada apresentou esquema corporal
adequado a faixa etária [16,18], corroborando achados de nosso estudo.
Na organização
espacial em crianças não praticantes de exercícios físicos, foi encontrado como
valor mínimo entre os outros domínios. Em outros estudos, encontraram-se dados
semelhantes: os maiores atrasos motores foram identificados no domínio de
organização espacial; e verificou-se também esse domínio como o de maior
dificuldade. Deve ser trabalhada com precisão a relação entre o indivíduo e o
ambiente, para desenvolver uma direção. A criança deve saber em qual direção
ler e escrever além de saber quais direções deve ir, por isso é importante que
esse domínio seja desenvolvido no tempo certo [1,18,19].
A organização
temporal foi o domínio de valor máximo para as crianças praticantes de
exercícios físicos. Em outros estudos foi verificado que uma menor
classificação de desenvolvimento motor nesse domínio indica uma dificuldade de
aprendizagem [19-21].
Sobre a lateralidade predominante em ambos
os grupos foi indefinida. Autores relatam que a lateralidade mal estabelecida
pode resultar em problemas de linguagem e fator de risco para a alfabetização.
De certo modo pode ser responsável pela dislexia em crianças. Quando for
lateralidade cruzada apresenta problemas com a linguagem e escrita. O autor
relatou que a lateralidade está envolvida em todos os níveis de processos de
aprendizagem escolar [10,21].
Através dos
resultados, podemos conferir que quanto maior é o contato da criança com a atividade
motora, melhor é seu desenvolvimento motor que lhe asseguram a qualidade de
vida e que as mais diversas formas de movimentos refinam o desenvolvimento
motor das crianças, não especificando nenhuma modalidade em especial [23]. Além
disso, o ambiente externo é de extrema importância para tal desenvolvimento e
mostrou-se que mais da metade dos espaços e objetos domiciliares não oferecem
oportunidades capazes para o desenvolvimento motor das crianças [24].
A avaliação motora
deveria ser rotina nas escolas, possibilitando um melhor diagnóstico da
criança, como um conhecimento mais profundo de suas habilidades e limitações
reais.
O desenvolvimento
motor das crianças tanto as praticantes exercícios físicos quanto as não praticantes
encontram-se dentro da normalidade, porém os praticantes se encontram com o
desenvolvimento motor melhor que os não-praticantes.
Entretanto, quando comparados, foi possível notar os efeitos positivos da
atividade física como aprimoramento do desenvolvimento motor nas crianças
praticantes de exercícios físicos.
Foi possível
identificar as áreas de maiores déficits das crianças para auxiliar no processo
de desenvolvimento motor, ajudando a escola, treinadores e pais a diminuírem os
déficits.