ARTIGO ORIGINAL

Efeito do protocolo de isquemia pré-condicionante na performance da potência de membros inferiores em atletas de handebol

Effect of the protocol of pre-conditioning ischemia on performance of low member power in handball athletes

 

Vanessa Montenegro*, Luís Filipe Gomes Barbosa Pereira Lemos, M.Sc.**, Leonardo Emmanuel Medeiros Lima, M.Sc.***, Clarice Maria de Lucena Martins****

 

*Graduada em Educação Física do Centro Universitário de João Pessoa, Unipê/ PB, **Educação Física e Docente da graduação em Educação Física do Centro Universitário de João Pessoa, Unipê/PB, ***Docente da graduação em Educação Física da Universidade Anhembi Morumbi, SP, ****Docente do curso de Educação Física – Universidade Federal da Paraíba – UFPB, PB

 

Trabalho realizado no Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ), no Laboratório de Avaliação Física (LAF), da instituição de ensino superior de João Pessoa, PB, Brasil.

 

Recebido em 17 de julho de 2017; aceito em 28 de novembro de 2017.

Endereço para correspondência: Leonardo Emmanuel Medeiros Lima, Universidade Anhembi Morumbi, Rua Dr. Almeida Lima, 1.134, 03164-000 São Paulo SP, E-mail: leonardolimadocente@gmail.com; Vanessa Montenegro: montenegrovanessa@outlook.com; Luís Filipe Gomes Barbosa Pereira Lemos: luis.training75@gmail.com;  Clarice Maria de Lucena Martins: claricelucenamartinsufpb@gmail.com

 

Resumo

Objetivo: O presente estudo teve como finalidade verificar o efeito da isquemia pré-condicionante na potência de membros inferiores em atletas de handebol. Material e métodos: Este estudo foi realizado com oito atletas de nível competitivo nacional, com média de idade de 22,1 anos, selecionados de forma intencional por conveniência. Os voluntários foram submetidos a uma avaliação em dois momentos, sendo separados por 72 horas. Os mesmos indivíduos realizaram dois protocolos, com e sem ciclos de isquemia pré-condicionante. Grupo controle e Grupo experimental. Para a medida da potência dos membros inferiores, foi utilizado o teste plataforma de salto, com técnicas de salto vertical com contra movimento, sem ajuda dos movimentos dos braços (CMJ), teste de força reativa unilateral. Resultados: O valor de significância foi determinado para p ≤ 0,05. A média de potência no cálculo tamanho de feito foi -0,41 no teste CMJ, para o teste de força reativa com a perna direita -0,53 e -0,43 com a perna esquerda. Conclusão: Nossos resultados nos permitem afirmar que esta estratégia não foi efetiva para promover o aumento da potência muscular.

Palavras-chave: oclusão vascular, isquemia, potência anaeróbia.

 

Abstract

Purpose: The present study aimed to verify the effect of pre-conditioning ischemia on the power of lower limbs in handball athletes. Methods: This study was carried out with eight athletes of national competitive level, with mean age of 22.1 years, selected intentionally for convenience. The volunteers were submitted to an evaluation in two moments, being separated by 72 hours. The same subjects performed two protocols, with and without cycles of preconditioning ischemia. Control group and experimental group. The jump platform test was used to measure the power of lower limbs, with vertical jumping techniques with counter movement, without the aid of arm movements (CMJ), unilateral reactive force test. Results: The significance level was determined for p 0.05. The mean power in the made-to-size calculation was -0.41 in the CMJ test, for the reactive force test with the right leg -0.53 and -0.43 with the left leg. Conclusion: Our results allow us to affirm that this strategy was not effective to promote the increase of muscular power.

Key-words: vascular occlusion, ischemia, anaerobic power.

 

Introdução

 

O handebol é um esporte que possui características intermitentes de alta intensidade e curta duração com pausas entre os esforços, o que exige de seus praticantes um elevado índice de condicionamento físico, principalmente devido ao tempo de jogo (60 min). Pode ser caracterizado como uma modalidade esportiva em que grande parte do gasto energético dos atletas é suprida pelo metabolismo aeróbio, porém as ações determinantes ocorrem como resultado da eficiência do metabolismo anaeróbio [1]. Para que a periodização dos atletas seja altamente eficaz é necessário que conheçamos os mais variados métodos de treinamento existentes e quais são os reais benefícios adquiridos com sua prática.

Alguns estudos investigaram o efeito agudo da aplicação do treinamento de força com oclusão vascular sobre a ativação muscular [2-11]. Porém, há escassez de estudos que investiguem o efeito agudo da aplicação do treinamento em condição ocluída em atletas de handebol.

Alguns efeitos do treinamento com restrição de fluxo sanguíneo são conhecidos, como o aumento da força e da hipertrofia. Conjecturando nas especificidades do esporte, foi aplicado o método de isquemia pré-condicionante (IPC). A IPC refere-se a períodos de isquemia seguidos de reperfusão.

Geralmente o protocolo de IPC envolve três ou quatro ciclos de 5 min de oclusão circulatória acima da pressão arterial sistólica, seguido por um período de 5 min de reperfusão [6].

Deste modo, o objetivo do presente estudo foi verificar o efeito do protocolo de isquemia pré-condicionante em atletas de handebol, direcionado para a potência de membros inferiores.

 

Material e métodos

 

A pesquisa experimental de natureza aplicada e transversal foi realizada no laboratório de Avaliação Física da instituição de ensino superior Unipê de João-Pessoa/PB. A população do estudo foi composta por oito atletas da equipe masculina de handebol Grêmio Unipê, com idade entre 18 e 27 anos, que realizaram em ordem aleatória um protocolo com dois testes de saltos verticais. Os critérios de exclusão foram incumprimento dos procedimentos relacionados à realização da coleta de dados.

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de ética em pesquisa (parecer nº 0476/13) do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba - CEP/CCS. Os voluntários assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido para fazer parte da pesquisa, conforme determina a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

O protocolo de isquemia pré-condicionante consistiu em três ciclos de isquemia com igual período de reperfusão. A pressão utilizada na isquemia foi de 220 mmHg (Manômetro para Treinamento com Oclusão Vascular CardioMed), a mesma pressão utilizada nos estudos de Clevidence et al. [12], Cruz et al. [13], Gibson et al. [14,15], Groot et al. [16], Kido et al. [3], Marocolo et al. [5].

Para a medida de potência dos membros inferiores, foram utilizados os testes de salto vertical com o auxílio do instrumento eletrônico plataforma de salto (Jump System Pro Cefise) seguindo o protocolo de Bosco et al. [17], com técnica de salto vertical com contra movimento, sem ajuda dos movimentos dos braços (Counter-Movement Jump - CMJ) e teste de força reativa unilateral, realizado em uma altura de 20 cm da plataforma. Foi informado aos voluntários que os mesmos permanecessem com os membros inferiores estendidos durante a fase de voo.

As sessões de IPC consistem em ciclos de 5 minutos de oclusão, seguido de 5 minutos de reperfusão (sem oclusão), repetidas vezes de acordo com o protocolo: Grupo experimental realizou três ciclos de IPC e Grupo Controle (sem ciclos de IPC). Foi padronizado o tempo de 30 minutos em todas as sessões, antes da execução dos testes.

Todos os sujeitos foram informados na primeira sessão, bem como 24 horas antes do teste, dos procedimentos prévios para a realização da coleta, que foram: não ingestão de cafeína, álcool ou drogas 24 horas antes do teste, abstenção de atividade física 48 horas antes do teste. As sessões aconteceram no mesmo dia para as duas sessões experimentais, com intervalo de 72 horas entre elas.

Os indivíduos do grupo IPC realizaram três ciclos de 5 minutos ocluídos com 5 minutos de reperfusão, totalizando 30 minutos. Logo em seguida, realizaram os testes de saltos verticais. Na circunstância de grupo controle, os indivíduos não realizaram ciclos de IPC, apenas os testes de saltos verticais em circunstâncias iguais as da condição de grupo experimental. Na análise estatística dos dados foi utilizado o software SPSS 24. Para o teste de normalidade foi utilizado o teste de Shapiro-Wilk. As diferenças entre os diferentes grupos foram analisadas utilizando o teste tamanho de efeito, segundo Cohen (1988).

 

Resultados

 

Todos os dados obtidos com o cálculo da potência em todos os testes são apresentados na tabela I.

Os valores da potência pós IPC apresentaram diferenças estatísticas quando comparados aos valores da sessão controle. A condição ocluída promoveu uma queda no desempenho da maioria dos atletas em todos os testes realizados.

 

Tabela I Valores absolutos de potência nos grupos controle e experimental (n=8).

 

n = tamanho da amostra. Valores apresentados como média ± desvio padrão. *p<0,05 diferença significante da IPC; Abreviações: CMJ = Salto com contra movimento; Reat. D = medidas relativas ao teste de força reativa com a perna direita; Reat. E = medidas relativas ao teste de força com a perna esquerda.

 

Na tabela II estão indicados os valores do procedimento estatístico tamanho de efeito. Houve diferença significante nas variáveis entre os grupos controle e experimental (p<0,05).

 

Tabela IIValores teste tamanho de efeito.

 

*p<0,05 diferença significante da IPC; Abreviações: CMJ = Salto com contra movimento; Reat. D = medidas relativas ao teste de força reativa com a perna direita; Reat. E = medidas relativas ao teste de força com a perna esquerda.

 

Discussão

 

No presente estudo, partiu-se da premissa de que os ciclos de isquemia pré-condicionante poderiam ocasionar um efeito positivo no desempenho da potência de membros inferiores em atletas de handebol. Entretanto, verificou-se que o protocolo de IPC não demonstrou diferenças estatísticas muito relevantes entre o grupo controle e o experimental. Porém, vale ressaltar que visivelmente, a fadiga e a queda do desempenho dos indivíduos são muito perceptíveis.

O efeito que o treinamento com IPC exerce sobre as variáveis fisiológicas ainda apresenta certas discrepâncias. Em revisão [6] apontou-se alguns dos possíveis fatores que levam a estas discrepâncias, como, por exemplo, os diferentes protocolos de IPC que não limitam a mesma pressão de oclusão, localização aplicada, número de ciclos de isquemia/reperfusão, e o tempo de pré-exercício pós-IPC. Nessa revisão, o autor afirma que cerca de metade dos estudos anteriores mostraram efeitos benéficos da IPC no desempenho do exercício. O que vai de encontro aos resultados obtidos em nosso estudo.

Crisafulli et al. [17] e Cruz et al. [13] sugerem que a IPC reduz a sensibilidade do corpo aos sinais de fadiga, indo de encontro à nossa hipótese de que o acúmulo de metabólitos pode aumentar a fadiga central e prejudicar a potência anaeróbia. Talvez, essa diferença de resultados possa ser explicada pelo tempo de pré-exercício pós-IPC. 

Em 2013, Gibson et al. [14] investigaram se a IPC em uma população treinada afetaria o desempenho do sprint máximo. E concluíram que não haverá benefício para os jogadores de esporte em equipe utilizar a IPC como meio de melhorar o desempenho do sprint a uma distância de 30 m. Esse mesmo estudo cogitava que a movimentação neural e a taxa de passo aumentada induzida pela IPC poderiam ter influência positiva em tarefas que exigissem alta potência, como a corrida.

Corroborando os resultados do nosso estudo, Paixão et al. [7] concluíram que a IPC tem um efeito prejudicial sobre a performance anaeróbia. Seu protocolo consistiu em 4 ciclos de 5 min de IPC e 5 min de reperfusão com pressão aplicada de 250 mmHg. O desempenho foi avaliado em testes de Wingate para potência máxima e média, potência anaeróbia total e índice de fadiga. Eles sugerem que a poupança de ATP poderia ser o principal aspecto que contabiliza os efeitos negativos da IPC.

Como podemos observar, ainda não existe uma metodologia ideal de IPC para fins esportivos. E baseados no princípio da individualidade biológica, podemos apenas especular com nossos resultados que os atletas podem ser classificados como responsivos ou não responsivos a IPC.

 

Conclusão

 

Nossos resultados indicam que uma sessão de isquemia pré-condicionante nos membros inferiores foi capaz de diminuir a performance dos atletas. O que pode explicar a queda do desempenho é o acúmulo de metabólitos ocasionado pela condição ocluída anteriormente à realização do exercício. Os resultados estatísticos, aliados à nossa percepção visual no momento dos testes, permite-nos afirmar que esta estratégia não foi efetiva para promover o aumento da potência muscular.

 

Referências

 

  1. Pearson SJ, Hussain SR. A review on the mechanisms of blood-flow restriction resistance training-induced muscle hypertrophy. Sports Med 2015;45(2):187-200.
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  3. Kido K, Suga T, Tanaka D, Honjo T, Homma T, Fujita S et al. Ischemic preconditioning accelerates muscle deoxygenation dynamics and enhances exercise endurance during the work-to-work test. Physiological Reports 2015;3:e12395–e12395.
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  6. Masahiro H. Ischemic preconditioning: Potential impact on exercise performance and underlying mechanisms. Sports Med 2017;6(1):15-23.
  7. Paixão RC, Mota GR, Marocolo M. Acute effect of ischemic preconditioning is detrimental to anaerobic performance in cyclists. Int J Sports Med 2014;35(11):912-5.
  8. Roseguini AZ, Silva ASR, Gobatto CA. Determinações e relações dos parâmetros anaeróbios do RAST, do limiar anaeróbio e da resposta lactacidemica obtida no início, no intervalo e ao final de uma partida oficial de handebol. Rev Bras Med Esporte 2008;14(1):46-50.
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  14. Gibson N, White J, Neish M, Murray A. Effect of ischemic preconditioning on land based sprinting in team sport athletes. Int J Sports Physiol Perform 2013;8(6):671-6.
  15. Gibson N, Mahony B, Tracey C, Fawkner S. Effect of ischemic preconditioning on repeated sprint ability in team sport athletes. J Sports Sci 2015;33(11):1182-8.
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  18. Crisafulli A, Tangianu F, Tocco F, Concu A, Mameli O, Mulliri G, Caria MA. Ischemic preconditioning of the muscle improves maximal exercise performance but not maximal oxygen uptake in humans. J Appl Physiol 2011;111:530-6.