ARTIGO
ORIGINAL
Avaliação postural em alunos praticantes de programa de
condicionamento físico: personal trainer
Postural evaluation in students practitioners of
physical fitness program: personal trainer
Josenei Braga dos Santos*,
Radamés Maciel Vítor Medeiros, D.Sc.**,
Evelise de Toledo***, Luciane Valentin****, Maria
Fernanda Longhi*****, Antônio Carlos Gomes******
*Coordenador
da Rede de Estudo da Postura Humana (REPH), **UNIFESP, ***Especialista em
Medicina do Esporte e Atividade Física (UES), ****Especialista em Exercício e
Qualidade de Vida (UFPR), *****Especialista em Biomecânica do Exercício
(CEFIT), ******Superintendente de Alto Rendimento da Confederação Brasileira de
Atletismo - CBAt
Recebido em 25 de
setembro de 2017; aceito em 30 de setembro de 2017.
Endereço
para correspondência:
Josenei Braga dos Santos, Rua Nelson Carline, 148 Jardim Primavera, 12916-083 Bragança Paulista
SP, E-mail: jopostura@gmail.com; Radamés Maciel Vítor Medeiros:
radames_medeiros@hotmail.com; Evelise de Toledo: evefit46@gmail.com;
Luciane Valentin: lumvalentin@gmail.com; Maria Fernanda Longhi:
fer@fitcore.com.br; Antonio Carlos Gomes: contatoacgomes@gmail.com
Resumo
O objetivo desta
pesquisa foi avaliar a postura de 257 praticantes de um programa de
condicionamento físico de ambos os gêneros, na faixa etária entre 10 e 78 anos,
que praticavam exercícios de duas a três vezes/semana com carga horária de 120
a 180 minutos. Para avaliação postural, utilizou-se o protocolo da Portland State University, cujo índice de
correção postural (ICP) para adolescentes (10 a 19 anos) é de ≥ 75%, para
pessoas comuns ≥ 65% (acima de 19 anos) e para análise das imagens a biofotogrametria. Foi realizada análise estatística
descritiva por meio dos valores de média e desvio padrão. Para as diferenças do
ICP entre os gêneros utilizou-se o teste t de Student
para amostras independentes e as diferenças percentuais da classificação das
alterações posturais entre as faixas etárias o teste Qui-quadrado
(p < 0,05). Os resultados mostraram que na faixa etária de 10 a 19 anos o
ICP foi ≥ 79,0%, estando a região de membros
inferiores abaixo do normal no gênero masculino 72,0%, 20 a 59 anos ≥
76,0% e de 60 a 78 anos ≥ 74,0%. Com relação às alterações posturais, as
mais prevalentes no gênero feminino foram ≥ 62,0%, sendo anteriorização da cabeça, hipercifose,
escoliose torácica, inclinação lateral de quadril e eversão
de pé. Já no masculino ≥ 89,0%, com exceção da hipercifose. Conclui-se que os praticantes estão com boa
postura, mas com alterações posturais que podem ser consideradas clínicas,
sendo necessário maior observação/monitoramento por parte dos personal trainers.
Palavras-chave: postura,
condicionamento físico, treinamento personalizado.
Abstract
The aim of this study was to evaluate the posture of 257 practitioners
of a physical fitness program of both genders, in the age group between 10 and
78 years, who practiced exercises two to three times a week with a workload of
120 to 180 minutes. For postural evaluation, the Portland State University
protocol was used, whose postural correction index (PCI) for adolescents (10 to
19 years old) was ≥ 75% for common people ≥ 65% (over 19 years). Biophotogrammetry was used to
analyze the images. A descriptive statistical analysis was done by means of values
and standard deviation. The Student's t-test for independent samples was used
for the differences in the ICP between the genders. The Chi-square test (p
<0.05) was used to analyze the percentage differences in the classification
of postural changes between the age groups. The results showed that in the age
group of 10 to 19 years the PCI was ≥ 79.0%, with the lower limbs region
being below 72.0%, 20 to 59 years ≥ 76.0%, and 60 to 78 years ≥
74.0%. Regarding postural changes, the most prevalent in the female gender were
≥ 62.0%, being anterior head, hyperkyphosis,
thoracic scoliosis, hip lateral slope and foot eversion. With respect to male,
were ≥ 89.0%, except for hyperkyphosis. The conclusion is that the practitioners are in good
posture, but with postural alterations that can be considered clinical, being
necessary more observation and monitoring by the personal trainers.
Key-words: posture,
physical fitness, personal training.
Desde a década de 80,
já se observava uma preocupação exponencial relacionada à atividade física, que
estava direcionada à promoção e manutenção de saúde, por meio de programas de
condicionamento físico, com o objetivo de desenvolver os componentes da aptidão
física: força muscular, flexibilidade e aptidão cardiorrespiratória [1].
Levando em
consideração esta concepção histórica, por volta da década de 90, surgiu o personal trainer,
profissional da área da saúde que está capacitado para desenvolver estes
programas de condicionamento físico.
Este termo personal trainer é
muito utilizado como treinador pessoal, que provém dos Estados Unidos da
América (EUA) e, a partir daí, foi se difundindo para os outros países como,
por exemplo, o Brasil [2].
De acordo com a
literatura nacional, personal trainer pode
ser definido como um profissional da Educação Física que possui conhecimento em
diversas áreas, que por meio de programas de treinamento personalizado,
ministra aulas com horário preestabelecido, planeja, prescreve e controla a
execução de exercícios físicos personalizados, acompanha e respeita a
individualidade biológica de cada aluno [2-8]. Segundo estes autores, os
principais objetivos desta área estão centrados na busca por interferir no
funcionamento do corpo e da mente, proporcionando promoção de saúde, qualidade
de vida, condicionamento físico, estética e reabilitação.
Leal, Carvalho e
Monteiro [9], Mineiro et al. [10], Bossle
e Fraga [11], Salcedo [5], Brooks [7] e Prado e
Liberal [12], quando falam dos programas de treinamento personalizado, afirmam
que este vem crescendo muito nos últimos anos, ampliando sua participação no
mercado da atividade física com uma alta demanda de pessoas.
Neste sentido,
observa-se que com o aumento desta prática, a probabilidade do risco de alterações
posturais nos praticantes de condicionamento físico, poderá ser grande e que se
não orientados e monitorados de forma adequada, supostamente, irá ocasionar
problemas musculoesqueléticos futuros e comprometer a prescrição de exercícios.
Pois se sabe que na
área de personal trainer,
ainda é baixo o percentual de profissionais que utilizam a avaliação física
como um procedimento estratégico para monitorar a saúde e o condicionamento
físico de seus alunos/clientes.
Uma pesquisa, realizada por Bennie
et al. [13] com personal trainers da Austrália, mostrou que aproximadamente
45,0% dos profissionais desta área realizam avaliações físicas de forma
continua, como forma de monitorar a aptidão física de seus alunos/clientes.
Este percentual, considerado
baixo pelo estudo, demonstra a preocupação e importância de uma maior atenção
para avaliar e monitorar a aptidão física, porque esta ação tem efeito positivo
para a aderência do exercício, sendo assim, se torna fundamental, que mais
profissionais utilizem estes procedimentos estratégicos de avaliação e
monitoramento nestes programas de condicionamento.
Uma observação
interessante identificada nesta pesquisa foi que em nenhum momento, dos
procedimentos estratégicos de avaliação e monitoramento estudados, notou-se a
presença da avaliação postural. Desta forma, acredita-se que inserir a
avaliação postural nestes tipos de programa de condicionamento físico, o personal trainer
poderá ter um melhor controle dos exercícios físicos que serão aplicados na
intervenção e poder controlar a sobrecarga que será imposta. Porque já se sabe
que a orientação de uma boa postura na execução de exercícios resistidos
(musculação) é essencial para obtenção de bons resultados, bem como manter o
alinhamento natural das articulações de forma confortável e prevenir problemas
musculoesqueléticos, decorrentes dos exercícios executados de forma incorreta
[7,14-17].
Meliscki, Monteiro e Giglio
[18], quando falam sobre a avaliação postural, afirmam que ela é fundamental em
qualquer exame físico (prevenção e/ou reabilitação), podendo-se adquirir
condições de mudar hábitos inadequados ou ineficientes de cada indivíduo.
Outro fator
importante, enfatizado por Prado e Liberal [12], está relacionado aos motivos
que levam mulheres a procurar o treinamento personalizado. Cem por cento das
entrevistas afirmaram ser as avaliações físicas periódicas o principal motivo,
pelo fato dos resultados permitirem ao personal trainer verificar o progresso e o desempenho do aluno,
mostrando se os métodos adotados de treinamento merecem alguma modificação ou
foram eficazes.
Conforme os apontamentos
demonstrados na literatura, percebe-se que avaliar a postura de praticantes de
treinamento personalizado é uma excelente estratégia de avaliação a ser adotada
nos programas de condicionamento físicos, que são aplicados nas intervenções
por personal trainers,
academias, estúdios e centros de reabilitação.
Acredita-se que, por
meio desta avaliação, haverá uma prestação de serviço de melhor qualidade,
tendo em vista que o personal trainer
trabalha com um número menor de alunos e/ou clientes, o que faz com que tenha a
possibilidade de prescrever, orientar e monitorar melhor os exercícios físicos
que são aplicados, bem como poderá identificar, prevenir problemas
musculoesqueléticos e adotar estratégias de intervenção eficientes.
Desta forma,
objetivou-se nesta pesquisa avaliar a postura dos praticantes de um programa de
condicionamento físico que é atendido por personal trainers. Selecionaram-se os seguintes
objetivos específicos: a) verificar quais as regiões corporais mais acometidas
e b) identificar quais as alterações posturais mais predominantes nestes
praticantes.
Caracterização
da amostra
A pesquisa
caracterizou-se como transversal, ou seja, é uma estratégia
de estudo epidemiológico de observação direta de determinada quantidade
planejada de indivíduos em uma única oportunidade [19], sendo considerada de
caráter descritivo exploratório, conforme Thomas e Nelson [20].
Amostra
Para coleta de dados,
utilizou-se uma amostra aleatória constituída de 257 praticantes de treinamento
personalizado, na faixa etária entre 10 e 78 anos, que praticavam de duas a
três vezes por semana, com uma carga horária de 120 a 180 minutos/semana.
Critério
de inclusão e exclusão
Como critério de
inclusão adotou-se estar praticando treinamento personalizado por um período
mínimo de seis meses e no período da coleta. Já como critério de exclusão
adotou-se ter indicação médica de problemas musculoesqueléticos (lesões,
entorses, contraturas e cirurgias recentes) ou sem treinar durante o período da
coleta.
Procedimentos
de coleta de dados
Para aquisição das
informações referentes aos praticantes, aplicou-se um questionário estruturado
com perguntas abertas desenvolvido em uma planilha eletrônica do Programa
Microsoft Office Excel 2012, com informações referentes a:
gênero, idade, local de nascimento, profissão, problema de saúde (ex: doenças, cirurgia, entorses, dores musculares e etc.),
anos de estudo (AE), massa corporal e estatura.
No que se referiu à vestimenta utilizada
para avaliação, os praticantes do gênero masculino estavam trajando shorts e as
do gênero feminino bermuda e top. Com relação aos praticantes que tinham
cabelos compridos, solicitou-se que fossem presos no momento da avaliação, para
facilitar a observação postural, mais especificamente, na região do pescoço.
Método
PSU
Como instrumento de
avaliação, adotou-se o método proposto pela Portland State
University (PSU) [21,22] conforme descrito por Santos
et al. [23], que é um instrumento que usa
os sentidos visuais (observação), dentro de uma perspectiva subjetiva.
Seu principal
objetivo é detectar as simetrias, assimetrias e os possíveis desvios e/ou
alterações posturais entre os segmentos corporais e regiões, em duas posições
(posterior e lateral), o que permite ao avaliador quantificar o Índice de
Correção Postural (ICP) do avaliado em valores percentuais (%), obtido por meio
de equações matemáticas estipuladas pelo escore diagnóstico.
Para obtenção do ICP
total e por regiões, este método adota como critério de avaliação três escalas:
a) 5 – sem desvio; b) 3 – ligeiro desvio lateral; e c) 1 – acentuado desvio
lateral.
No que se refere à
classificação da postura, este método utiliza como critério de boa postura
valor ≥ 75,0% para adolescentes, faixa etária entre 10 e 19 anos e 65,0%
para pessoas acima de 19 anos de idade.
Aquisição
e análise das imagens
Para a aquisição das
imagens, utilizou-se uma câmera fotográfica digital Sony Cyber-Shot Sony 8.1 Mega pixels e um
tripé FT – 361A, que foi posicionado a 3 metros de distância do avaliado e a
uma altura de 1,07 metros do chão.
Já com relação à
análise das imagens, utilizaram-se recursos de computação gráfica do software
Corel DrawX6® (2014), que é um software de edição de imagens, assim como adotou-se a biofotogrametria (bios – vida;
fotogrametria – aplicação métrica a imagens fotográficas), que é um recurso que
remete à aplicação métrica em fotogramas de registro de movimentos corporais,
permitindo detectar simetrias, assimetrias e os desvios e/ou alterações
posturais entre os segmentos corporais, assegurando acurácia, confiabilidade e
reprodutibilidade [24,25].
Consentimento
da pesquisa
Com relação ao consentimento
da pesquisa, todos os praticantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE), na qual fica assegurada a privacidade dos mesmos,
confirmando que estavam cientes dos propósitos da investigação e dos
procedimentos que seriam utilizados e autorizaram a publicação dos dados.
Todo procedimento
tomou como base a resolução específica do Conselho Nacional de Saúde
(Resolução196/96) [26].
Análise
estatística
Após análise da
normalidade e homogeneidade dos dados, a análise descritiva foi realizada por
meio da representação de média ± desvio padrão, sendo posteriormente realizado
o teste t de Student para medidas independentes, no
intuito de comparar os resultados do ICP entre os gêneros masculino e feminino.
Além disto, também
foi realizada uma análise de Qui-Quadrado para
avaliar a diferença percentual entre os grupos de faixa etária, quando
analisada a classificação das alterações posturais de ambos os gêneros. As
análises estatísticas foram realizadas por meio do pacote estatístico SPSS,
versão 19.0 [27], adotando-se nível de significância de p < 0,05.
Na Tabela I são
apresentadas as características gerais dos participantes com faixa etária entre
10 e 18 anos, sendo observadas as variáveis antropométricas (massa corporal e
estatura), estado nutricional (IMC) e a quantificação do tempo de estudo
escolar.
A idade média para os
avaliados do gênero masculino e feminino foram, respectivamente, 15,6 (±1,9)
anos e 16,0 (±2,4) anos. O masculino apresentou maior estatura (+ 6,94%) e
menor IMC (- 14,5%), quando comparados às mulheres.
Tabela
I – Características dos praticantes do
treinamento personalizado na faixa etária de 10 a 18 anos.
IMC – Índice de Massa
Corporal.
Na Tabela II, são
apresentadas as mesmas características gerais dos participantes, porém
avaliando apenas aqueles que apresentavam faixa etária entre 20 e 59 anos. Para
estes sujeitos, foram observados maiores valores de massa corporal (+ 21,5%),
estatura (+ 7,4%) e IMC (+ 8,4%) para os homens.
Tabela
II –
Características dos praticantes do
treinamento personalizado na faixa etária de 20 a 59 anos.
IMC – Índice de Massa Corporal.
Na Tabela III, são
apresentadas as características gerais dos que apresentaram faixa etária entre
60 e 78 anos. Para as variáveis antropométricas, foram observadas diferenças
apenas na massa corporal e na estatura, que apresentaram maiores valores para
os homens (+ 7,0% e 5,9%, respectivamente).
Tabela
III
– Características dos praticantes do
treinamento personalizado na faixa etária de 60 a 78 anos.
IMC – Índice de Massa
Corporal.
Na Tabela IV, são
apresentados os resultados do ICP, no intuito de demonstrar as alterações
posturais ocorridas por região, apontando a situação mais crítica, conforme
observado na avaliação dos praticantes, de acordo com cada faixa etária e
gênero.
Os maiores valores do
ICP foram identificados na região da coluna dorsal e lombar (RCDL) tanto sob a
referência da idade, quanto para ambos os gêneros (79,0% - 89,3%). Já a região
dos membros inferiores (RMI) apresentou menores valores para quase todos os
grupos analisados (69,8% - 76,2%), exceto para o gênero feminino de faixa
etária entre 60 e 78, que apresentou menores valores na região do abdômen e
quadril (RAQ) como pode ser observado (72,1%).
Quando analisadas as
diferenças significativas entre os gêneros, observamos que, para a faixa etária
entre 20 e 59 anos, os homens apresentaram menores valores do ICP nas seguintes
regiões: RCDL (- 3,6%), RAQ (- 6,0%) e RMI (- 7,3%). Já para a faixa etária
entre 60 e 78 anos, essa mesma diferença foi encontrada apenas para a RAQ (-
4,1%).
Tabela
IV –
Valores percentuais (%) do Índice de
Correção Postural (ICP) para cada região corporal de praticantes de treinamento
personalizado, segundo a faixa etária e o gênero.
RCP = Região da Cabeça
e do Pescoço; RCDL = Região da Coluna Dorsal e Lombar; RAQ = Região do Abdômen
e Quadril; RMI = Região dos Membros Inferiores; ICP = Índice de Correção
Postural; *Menor valor; **Maior valor. ¹Diferença
significativa em relação ao gênero feminino (p < 0,05).
Na Tabela V, são
apresentados os valores de frequência percentual das alterações posturais no
gênero feminino, de acordo com cada faixa etária. O grupo de 60 a 78 anos
apresentou menores percentuais de anteriorizacão da
cabeça e hiperlordose, quando comparados aos grupos
de menor idade. Porém, este percentual foi maior, quando avaliada a eversão.
Tabela
V – Classificação das alterações posturais no
gênero feminino em valores percentuais (%), de acordo com os grupos de faixa
etária.
IncLatCab = Inclinação Lateral
da Cabeça; AntCab = Anteriozação
da Cabeça; IncLatQuad = Inclinação Lateral de
Quadril; 1Diferença significativa em relação ao grupo 10 a 19 anos; 2Diferença
significativa em relação ao grupo 20 a 59 anos.
Na Tabela VI, são
referenciados os mesmos valores percentuais, relacionados à classificação das
alterações posturais no gênero masculino, de acordo com cada faixa etária. Foi
observada diferença entre os grupos apenas para a hipercifose,
que foi maior para os homens entre 60 e 78.
Tabela VI – Classificação
das alterações posturais no gênero masculino em percentual (%).
IncLatCab = Inclinação Lateral
da Cabeça; AntCab = Anteriozação
da Cabeça; IncLatQuad = Inclinação Lateral de
Quadril. 1Diferença significativa em relação ao grupo
10 a 19 anos; 2Diferença significativa em relação ao grupo 20 a 59 anos.
Sabemos que com o
avançar dos anos, diversas alterações posturais vão surgindo devido ao processo
de envelhecimento biológico de cada ser humano, o que possivelmente, irá afetar
nossa saúde e poderá trazer problemas musculoesqueléticos que na maioria das vezes,
poderiam ser evitados se fossem ensinados como cuidar de nossa postura desde a
infância.
Neste sentido,
mediante os resultados analisados referentes à postura dos praticantes,
observa-se que o ICP, em todas as faixas etárias e gêneros,
está com valores acima dos padrões de normalidade, mostrando que a
prática do treinamento personalizado tem contribuído para o desenvolvimento de
uma boa postura e saúde, respeitando as maturações biológicas em cada faixa
etária.
Estes achados
corroboram o pensamento de Baroni et al. [14], Teixeira e Guedes Júnior [15], Brooks [7], pois na visão
destes autores, a prática do treinamento resistido contribui significativamente
para promover a saúde, melhorar a aptidão física, aprimorar o desempenho
esportivo e reabilitar fisicamente, principalmente quando aplicados com
eficiência e qualidade, pois a musculatura esquelética, em associação com o
sistema osteoligamentar (ossos, ligamentos e cápsula
articular), asseguram três funções principais no aparelho locomotor: desencadear
o movimento, assegurar o equilíbrio e manter a estabilidade segmentar.
Com relação às
regiões corporais, notou-se que tanto na faixa etária de 10 a 19 anos, como na
de 20 a 59 anos, em ambos os gêneros, a RCDL apresentou maior valor e a RMI
menor valor, e a RMI, na faixa etária de 10 a 19 anos no gênero masculino,
ficou abaixo da normalidade, o que merece uma observação clínica. Na faixa
etária de 60 a 78 anos a RCDL também obteve maior valor em ambos os gêneros e
na região de menor valor houve uma diferenciação, no feminino foi a RAQ e no
masculino foi a RMI.
Percebe-se que às
alterações posturais, no feminino, a sequência ocorreu da seguinte forma:
escoliose torácica, inclinação lateral de quadril, hiperextensão, anteriorização da cabeça, eversão
e hipercifose. Já no masculino ocorreu de forma
diferente: escoliose torácica, hiperextensão, inclinação lateral de quadril, anteriorização da cabeça, eversão
e hipercifose.
Kendall et al. [28], quando falam das alterações
posturais, explicam que elas se originam devido ao uso incorreto da
funcionalidade das capacidades corporais, não na estrutura e função normal.
O estudo de Baroni et al. [14] sobre
alterações posturais em praticantes de musculação (homens e mulheres), na faixa
etária de 14 a 73 anos, mostrou que 73,8% foi na região lombar, 55,2% na
torácica e 43,4% na cervical. Além disto, também identificaram que 48,0%
apresentaram escoliose, destes, 37,0% tinham gibosidade. Estes achados, segundo
estes autores, indicam que os praticantes de musculação apresentam percentuais
consideráveis de alterações posturais, enfatizando a necessidade de maior
atenção e controle, recomendando-se a inserção da avaliação postural nesta
área, haja vista que não foram encontrados estudos que observassem a
prevalência de alterações posturais em praticantes de musculação no Brasil e no
mundo.
Buscando explicar
sobre as alterações posturais observadas nesta pesquisa e seus possíveis
fatores intervenientes, notou-se que a escoliose torácica, geralmente, é
ocasionada pela quantidade de repetição de gestos motores específicos no lado
dominante na execução dos movimentos nas atividades de vida diária (AVD) e
profissionais. Para Godinho et al. [29] é uma
deformidade que causa desvio lateral da coluna vertebral podendo ser observada
em diversas fases: infância, juventude, adolescência e adulta, dependendo do
tipo de escoliose em questão. Bienfait [30] a
classifica como praticamente uma herança de todos os seres humanos, sendo comum
encontrar indivíduos com um ombro mais alto que outro. De acordo com Vanícola e Guida [31], Baroni et al. [14], Matos [32] e Kendall et al. [28] é uma inclinação lateral da
coluna que rotaciona os corpos vertebrais, essa
rotação surge pela contratura dos músculos profundos do tronco, que rodam as
vértebras, quando elas se inclinam e, dependendo da gravidade, pode afetar a
respiração. Silva et al. [33] mencionam que ela pode ser
ocasionada por um encurtamento muscular do trapézio superior e/ou elevador da
escápula.
No que se refere à anteriorizacão da cabeça, a hipercifose
e inclinação de quadril, na maioria das vezes, ocorrem de forma combinada,
podendo também acontecer em situações distintas e específicas em cada faixa
etária, devendo-se levar em consideração alguns fatores: a) 10 a 19 anos – fase
de crescimento e desenvolvimento, utilização da cadeira escolar, mochila e
transporte do material; b) 20 a 59 anos – atividades profissionais e
sedentarismo, c) 60 a 78 anos – processo de envelhecimento musculoesquelético e
o surgimento de morbidades (artrite, sarcopenia,
osteoporose, diabetes, hipertensão e etc.).
Já dentro de um
âmbito geral, estas alterações podem ser causadas pelo uso excessivo do
celular, da televisão e do computador por longas horas na posição sentada
(navegação na internet, jogos eletrônicos, instagram,
e-mails, twitter, facebook,
etc.), de forma incorreta e estática, o que provoca projeção do pescoço à
frente, coluna curvada e pressão na região glútea causando desconfortos.
Marques, Hallal e Gonçalves [34] apontam que a
manutenção prolongada na posição sentada gera o desenvolvimento de posturas
inadequadas e sobrecarregam as estruturas do sistema musculoesquelético.
Kendall et al. [28] mencionam que a manutenção de
um bom alinhamento corporal na posição sentada, pode minimizar e/ou até mesmo
prevenir a dor associada a problemas relacionados à postura.
Matos [32] explica
que essas alterações ocorrem devido à falta de manutenção da musculatura antigravitacional, que possivelmente estão desequilibradas
pelo encurtamento e/ou pela deficiência de um ou mais grupamentos musculares,
ou seja, na anteriorizacão da cabeça a musculatura do
trapézio superior, semiespinhal e esplênios e na hipercifose músculos abdominais, dorsais e peitorais, não
falando nada sobre a inclinação lateral de quadril.
Vanícola e Guida [31], quando
falam da hipercifose, afirmam que apresenta uma
flexão aumentada da coluna torácica, que geralmente é acompanhada de uma protação de ombros à frente, de uma rotação interna de ombros
e de uma abdução de escápulas, sendo necessário desenvolver duas formas de
intervenção: a) alongar abdominais, peitorais (maior e
menor), redondo maior e deltoide porção esternal
e b) fortalecer eretor da coluna torácica, romboides, trapézio e rotadores
laterais de ombro (supraespinhoso, infraespinhoso e redondo menor).
Baroni et al. [14], pesquisando sobre alterações posturais em praticantes de
musculação, observaram que a hipercifose foi a mais
prevalente nos homens (54,0%) do que nas mulheres (29,0%) e que 77,2% dos
praticantes apresentam inclinação de quadril no plano sagital (ante ou
retroversão), resultados estes, diferentes de nossa pesquisa. Segundo estes
autores, estas duas alterações se não cuidadas, podem levar à dor crônica na
região lombar, causa mais comum de dor na coluna vertebral, responsável por
60,0% das queixas álgicas do segmento.
Kendall et al. [28], com relação à inclinação
lateral do quadril, afirmam que ocorre uma fraqueza unilateral dos músculos
abdutores do quadril, posterior do glúteo médio, laterais do tronco e atrofia
do glúteo máximo, podendo ocorrer separadamente ou combinadas, sendo geralmente
a segunda opção, a mais comum.
Com relação à
hiperextensão, esta ocorre quando o joelho é hiperextendido
além de seu limite, o que causa um desalinhamento na patela ou rótula,
ocorrendo geralmente devido ao excesso de fortalecimento da musculatura do
quadríceps (vasto lateral, medial, intermediário e o reto femural)
e encurtamento da musculatura posterior da coxa (bíceps femoral, semitendíneo e semimembranáceo).
Siqueira [35] orienta
que estudar pessoas com hiperextensão de joelhos se faz necessário, pelo fato
dela ser uma condição clinicamente relevante a ser observada. Quando estudou
sobre o assunto, identificou que ela pode ser considerada como uma condição
postural transitória dependente da demanda de equilíbrio, devido a seu efeito
sobre a estabilidade postural, que ocasiona aumento da velocidade de
deslocamento do centro de pressão na postura bípede quieta (postura
intrinsecamente instável), por necessitar manter a projeção vertical do centro
de gravidade, que se localiza distante do solo, incidindo sobre uma base de
apoio, relativamente pequena.
Leal et al. [36] avaliaram os graus de variação
da hiperextensão do joelho em praticantes de treinamento resistido e
constataram que 69,8% foram nas mulheres e 80,8% nos homens, explicando que é
necessário a definição de uma metodologia específica para se ter mais precisão,
bem como se aprofundar os estudos para tal medida, pois ela se apresenta, até o
momento, como pertencente à amplitude articular fisiológica do joelho.
Já a eversão pode ser explicada pelo fato dos indivíduos ficarem
na posição em pé e sentado, com os pés abdutos, por
longos períodos de tempo no desenvolvimento de suas atividades de vida diária,
o que contribui para que ocorra o desalinhamento desta articulação, e, às
vezes, até mesmo na própria prática das sessões de treinamento resistido.
Para Shigaki et al. [37], as
correções do eixo do corpo pelos mecanismos de controle postural, suscitadas
como consequência da própria dinâmica do organismo vivo, conferem ao corpo
humano pequenas e constantes oscilações quando de pé, com importante papel na
distribuição da pressão na superfície plantar. Dietz,
Horstmann e Berger [38] e Nashner
[39] apontam que automaticamente ocorre uma resposta nos músculos dos membros
inferiores, para compensar o desequilíbrio ou o aumento da oscilação postural. Guskiewicz [40] menciona que o alinhamento dos segmentos
articulares, que é necessário para manter o centro de gravidade (CG) dentro dos
limites máximos de estabilidade é fornecido pelos pés. Os pés desempenham papel
fundamental, uma vez que, sendo o segmento mais distal da extremidade inferior,
é o responsável pela base de suporte do corpo [41].
Para finalizar Matos
[32] e Kendall et al. [28] nos passam uma orientação
muito importante, ou seja, alterações posturais quando não observadas e
corrigidas, futuramente determinarão encurtamentos musculares importantes, que
ocasionarão sintomas de tensão mecânica e muscular e, consequentemente, trarão
deformidades ósseas.
Conclui-se que os
praticantes do programa de condicionamento físico estão com uma boa postura de
acordo com o ICP, mas com diversas alterações posturais que podem ser
classificadas como consideráveis e clínicas, necessitando de monitoramento
constante a fim de se evitar problemas musculoesqueléticos graves futuramente.
É importante e
necessário reforçar que os personal trainers devem começar a utilizar a avaliação postural como
mais uma ferramenta estratégica de avaliação e que esta esteja totalmente
voltada para prescrição de exercícios e treinamento de seus alunos e/ou
clientes, pois isto irá ajudar no desenvolvimento das intervenções que serão
aplicadas, no ensinamento da consciência corporal, na execução correta de cada
exercício e nas atividades de vida diárias de forma funcional e eficaz.
Outra orientação é
que os personal trainers
desenvolvam uma observação investigativa frente às alterações posturais de seus
alunos e/ou clientes, porque este hábito irá facilitar na prescrição de
exercícios corretivos e compensatórios.
A todos os personal trainers pelo respeito e
contribuição para o desenvolvimento desta pesquisa e aos praticantes de
treinamento personalizado da amostra estudada.