Rev Bras Fisiol Exerc 2018;17(1):104-112
doi: 10.33233/rbfe.v17i2.2266ARTIGO
ORIGINAL
Nível
de atividade física de profissionais de duas unidades de pronto atendimento na
região norte do Brasil
Level of physical activity of professionals of two emergency units in
the north region of Brazil
Thaizi Campos Barbosa*,
Alyne Nunes Mota*, Gustavo Noleto Mendonça**,
Fernando Rodrigues Peixoto Quaresma***, Erika da Silva Maciel, D.Sc.****
*Mestranda
em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina do ABC, Santo André/SP,
**Bacharel em Educação Física pelo Centro Universitário Luterano de Palmas,
CEULP/ULBRA, Palmas/TO, ***Docente do Centro Universitário Luterano de Palmas,
CEULP/ULBRA, docente da Universidade Federal do Tocantins, Campus Palmas,
Doutorando em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina do ABC, Santo
André/SP, Docente da Universidade Federal do Tocantins, Campus Miracema/TO
Recebido em 17 de
abril de 2018; aceito em 20 de junho de 2018.
Endereço
para correspondência:
Thaizi Campos Barbosa, Quadra 308 sul, alameda 13, lote HM1-1C, casa 2, Palmas-TO,
E-mail: thaizi@gmail.com; Alyne Nunes Mota: alynenmota@gmail.com: Gustavo Noleto Mendonça: gustavonoleto18@gmail.com; Fernando
Rodrigues Peixoto Quaresma: ferodriguesto@gmail.com; Erika da Silva Maciel:
erikasmaciel@gmail.com
Resumo
Introdução: O trabalho dentro
de uma unidade de urgência e emergência gera situações de desgaste físico e
emocional nos profissionais, aumentando os riscos de adquirirem doenças
cardiovasculares. A prática de atividade física regular auxilia na prevenção e
tratamento de doenças cardiovasculares. Objetivo:
Avaliar o nível de atividade física dos profissionais que trabalham em Unidades
de Pronto Atendimento na região norte do Brasil. Material e métodos: Trata-se de um estudo descritivo e transversal,
com uma amostra composta por 165 profissionais. Os instrumentos utilizados
nessa pesquisa foram o questionário socioeconômico e demográfico e o
Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ) para avaliar o Nível de
Atividade Física e Equivalente Metabólico (MET). Resultados: Os resultados indicaram maior prevalência de
profissionais insuficientemente ativos e sedentários (63,6%). Entre as
categorias profissionais destacam-se os técnicos de RX (MET total – 6825,50) e
os farmacêuticos (MET total – 3892,50) como os profissionais mais ativos e os
odontólogos (MET total – 383,75) e auxiliar de odontologia (MET total – 819,00)
como os profissionais menos ativos. Conclusão:
É necessário adotar medidas de inclusão de programas de incentivo à prática de
atividade física para os profissionais das redes de urgência e emergência, com
o intuito de minimizar os elevados índices de inatividade física e suas
consequências.
Palavras-chave: estilo de vida;
exercício; saúde do trabalhador; serviços de saúde.
Abstract
Introduction: The work inside an urgency and emergency unit generates situations of
physical and emotional exhaustion in the professionals, increasing the risks of
acquiring cardiovascular diseases. The practice of regular physical activity
helps in the prevention and treatment of cardiovascular diseases. Objective: To evaluate the level of
physical activity of professionals working in Emergency Care Units in the north
of Brazil. Methods: This is a
descriptive and transversal study, with sample of 165 professionals. The instruments
used in this research were the socioeconomic and demographic questionnaire and
the International Physical Activity Questionnaire (IPAQ), to evaluate the Level
of Physical Activity and Metabolic Equivalent (MET). Results: The results indicated a high prevalence of insufficiently
active and sedentary professionals (63.6%). Among the professional categories,
X-Ray technicians (total Metabolic Equivalent (MET) - 6825.50) and pharmacists
(total MET - 3892.50) were the most active professionals, and dentists (total
MET - 383.75) and dental assistant (total MET - 819.00) as the less active
professionals. Conclusion: It is
necessary to adopt measures to include incentive programs for the practice of
physical activity for the professionals of the urgency and emergency networks,
in order to minimize the high rates of physical inactivity and its
consequences.
Keywords: life style;
exercise; occupational health; health services.
Unidade de Pronto
Atendimento (UPA) são unidades de saúde com atendimento 24 horas, com estrutura
para atendimento de média complexidade, que funciona todos os dias da semana,
por fazer parte de uma rede de urgência e emergência do Sistema Único de Saúde
(SUS) [1]. O trabalho dentro de uma unidade de urgência e emergência gera
situações de desgaste físico e emocional nos profissionais, em parte pelas
condições de trabalho como: prolongadas jornadas de trabalho, trabalhos
noturnos e/ou aos finais de semana, ritmo acelerado de trabalho, excesso de
tarefas [2-4]. Nesse contexto, aumentam-se os riscos de adquirem doenças
ocupacionais, além de elevar o nível de estresse e, consequentemente, o
acometimento de doenças cardiovasculares [5,6]. Tais doenças são as principais
causas de morte no Brasil, responsáveis por cerca de 20% de todas as mortes em
indivíduos com mais de 30 anos [7]. O sedentarismo, obesidade, hipertensão
arterial e diabetes mellitus, são considerados como importantes fatores de
risco para doenças cardiovasculares [8], sendo esses fatores modificáveis [9].
A prática de
atividade física, portanto, exerce efeito protetor a doenças cardiovasculares,
além de ser essencial na manutenção de funções musculoesqueléticas, como
fortalecimento muscular, melhoria do sistema cardiovascular, aperfeiçoamento de
habilidades físicas, perda e/ou manutenção do peso corporal e melhoria no
perfil lipídico [10-12]. Como recomendação, a Organização Mundial da Saúde
(OMS), indica que a prática de atividade física deve ser executada por pelo
menos 150 minutos semanais, de intensidade leve ou moderada, ou no mínimo 75
minutos de atividade intensa [13]. Tendo em vista que a inatividade física é um
fator de risco modificável para doenças cardiovasculares e sabendo que esses
profissionais possuem um desgaste físico elevado o objetivo do estudo foi
analisar o Nível de Atividade Física dos profissionais que atuam em duas
Unidades de Pronto Atendimento na região norte do Brasil.
Desenho
de estudo
Trata-se de um estudo
transversal, de caráter descritivo, apresentado segundo as diretrizes da Strengthening the Reporting of Observational
Studies in Epidemiology
(STROBE) [14], realizado com os profissionais de duas Unidades de Pronto
Atendimento da cidade de Palmas/TO.
Contexto
As UPA são unidades
responsáveis pelo atendimento de média complexidade e fazem parte de uma rede
de urgência e emergência com o objetivo de acolher pacientes, interceder quanto
à condição clínica e encaminhar, se necessário, para
outros pontos de atenção à saúde especializada. Porém, o serviço desses
trabalhadores é considerado um dos mais desgastantes do setor [15].
Atualmente o
município de Palmas/TO, conta aproximadamente 287 mil
habitantes e com duas UPA para atender a comunidade local, uma localizada na
região sul e outra na região norte. A UPA Sul tem um
atendimento médio diário em torno de 600 e a UPA norte de 500.
Esta pesquisa foi
submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos (CEP),
via plataforma Brasil, atendendo a Resolução 466/2012 sob Certificado de
Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) de número 07564412.0.00005516.
Participantes
A amostra da pesquisa
foi composta por profissionais de ambas as unidades. Foram incluídos todos funcionários das UPA, que concordassem em participar
do estudo com a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
(critério de inclusão). Profissionais que estavam de licença médica ou férias
não foram incluídos no estudo (critério de não inclusão) e aqueles
que não responderam de maneira completa os questionários, foram
excluídos da amostra (critério de exclusão). As duas unidades avaliadas no
estudo contam com 268 funcionários, 118 e 150 respectivamente.
Variáveis
O Nível de Atividade
Física (NAF) foi o desfecho principal estudado, sendo avaliado a partir de
dados com atividades físicas realizadas na semana anterior dividido em
subgrupos (caminhada, atividades moderadas e atividades vigorosas).
Além disso, as
características sociodemográficas foram analisadas
como variáveis que poderiam influenciar no desfecho. Essas variáveis foram:
sexo, idade, regime de trabalho, tempo de serviço na instituição, tempo de
repouso durante o trabalho, renda mensal, entre outros.
Fontes
de dados/Mensuração
O NAF e MET foram
avaliados pelo Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ) versão
curta, validado para população brasileira [16]. O questionário avalia o nível
de atividade física em “muito ativo”, “ativo”, “insuficientemente ativo” e
“sedentário”, através de questões sobre caminhada, atividades moderadas e
vigorosas, exercidas durante a semana.
As condições
demográficas foram avaliadas utilizando o Questionário Sociodemográfico,
produzido pelos pesquisadores, contendo questões como sexo, data de nascimento,
idade, regime de trabalho, tempo de serviço na instituição, tempo de repouso
durante o trabalho, renda, entre outros.
Os questionários
foram entregues aos participantes mediante assinatura do TCLE e foram
preenchidos por eles, sem o auxílio dos pesquisadores, de maneira autorrelatada.
Viés
Os dados podem
apresentar vieses comuns a amostragem por
conveniência, em que não é possível que todos os indivíduos apresentem a mesma
chance de participar do estudo. Para diminuir este viés, todos os funcionários
das unidades pesquisadas foram contatados e convidados a participar da
pesquisa.
Tamanho
do estudo
O trabalho na rede de
urgência e emergência é, por muitas vezes, desgastante e estressante,
independente do setor da unidade. A prática de atividade física entra como um
fator de proteção de diversas patologias, bem como na diminuição do estresse
causado pelo ambiente de trabalho, em consequência, melhora a qualidade de vida
desses profissionais [17].
A falta de atividade
física juntamente com o aumento do estresse e carga horária excessiva são as
principais causas de licenças médicas nas redes, seja por doenças relacionadas
ao sistema osteomuscular por doenças relacionadas ao aparelho respiratório, ou
por transtornos mentais [18,19].
Variáveis
quantitativas
Todas as variáveis
quantitativas do estudo foram utilizadas com classificação e dados brutos. O
motivo dessa escolha foi estimular relações diretas entre as variações dos
dados das variáveis de desfecho com as variáveis que poderiam influenciar no desfecho.
Métodos
estatísticos
Os dados coletados
foram analisados e processados no software SPSS 21.0, no qual foi utilizada a
distribuição em frequência e percentuais, teste normalidade e comparação,
considerando o nível de significância p < 0,05.
Participantes
Dos 268 profissionais
das UPAs, foram incluídos de
acordo com os critérios de inclusão 194 profissionais, destes 29 foram
excluídos, restando 165 participantes da pesquisa (figura 1).
Figura
1 – Fluxograma da composição da amostra
64,8% são do sexo
masculino. Em relação à renda desses profissionais, 59,4% com renda mensal de
R$ 790,00 a R$ 5.000,00 por mês. Foram identificadas 13 diferentes profissões
na amostra, os profissionais de Enfermagem (Técnicos/Auxiliares
e Enfermeiros) correspondem a 58,8% da amostra total (Tabela I).
Tabela
I - Descrição dos participantes das Unidades de
Pronto Atendimento, Palmas, 2016
Dados
descritivos
Em relação ao NAF, a
prevalência de profissionais insuficientemente ativos e sedentários, juntos
representam 60,6% dentre os participantes sendo superior do que os
profissionais ativos e muito ativos que representam 39,4% (Tabela II).
Tabela
II -
Classificação do Nível de Atividade
Física das Unidades de Pronto Atendimento, Palmas, 2016
Desfechos
Na descrição média em
cada item que compõe o IPAQ, nota-se que as atividades vigorosas e moderadas
apresentaram os valores de Equivalentes Metabólicos (MET) superior à caminhada,
esse resultado pode ser influenciado pelas atividades laborais desenvolvidas
por esses profissionais (Tabela III)
Tabela
III
- Análise Descritiva das Unidades de
Pronto Atendimento, Palmas, 2016.
Quando se considera
os valores médios do NAF em cada categoria de atividade (caminhada, atividade
moderada e atividade vigorosa) em relação a cada categoria pesquisada
observa-se que os valores superiores são dos técnicos de Raio
X, farmacêuticos, enfermeiros, assistentes sociais, técnicos e
auxiliares de enfermagem e os assistentes de serviços gerais, respectivamente.
Os profissionais classificados como insuficientemente ativos foram os
odontólogos, seguido pelos auxiliares odontológicos e auxiliares
administrativos (Tabela IV).
Tabela
IV -
Análise dos MET por Profissão das
Unidades de Pronto Atendimento, Palmas, 2016
MET = Equivalentes
Metabólicos; DP = Desvio Padrão
Resultados
principais
Quando se considera
outras variáveis, observa-se que em relação ao local de trabalho os
profissionais da UPA 1 são mais ativos fisicamente do
que os que trabalham na UPA 2; em relação ao sexo, os homens são mais ativos
fisicamente com predominância de atividade física vigorosa. Dentre os grupos de
renda, os profissionais com renda mensal superior tendem a praticar mais
caminhada (Tabela V).
Tabela
V - Análise por variáveis categóricas das
Unidades de Pronto Atendimento, Palmas, 2016
MET = Equivalentes
Metabólicos; DP = Desvio Padrão; UPA = Unidade de Pronto Atendimento
Resultados
principais
Os resultados desta
pesquisa revelaram que os profissionais classificados como ativos apresentaram
maiores escores de atividade física vigorosa. Os odontólogos e os auxiliares de
odontólogos foram os profissionais que apresentaram menor proporção de sujeitos
ativos. Esses profissionais possuem como característica de trabalho permanecer
na posição sentado por um período prolongado [19], e
mesmo realizando caminhadas durante sua jornada de trabalho, não conseguem
suprir uma proporção substancial de atividade física diária.
Esses profissionais
mesmo realizando caminhadas durante sua jornada de trabalho, não conseguiam
suprir uma proporção substancial de atividade física diária.
Limitações
É importante destacar
algumas limitações em relação ao presente estudo, principalmente no que diz
respeito ao número e seleção amostral. Por ter avaliado uma amostra intencional
de apenas as UPAs, os dados
deste estudo não podem ser generalizados para outras localidades. Desse modo,
sugere-se a realização de estudos futuros que busquem avaliar a Atividade
Física, em amostras maiores e em diferentes localidades.
Embora inúmeros
estudos tenham avaliado a qualidade de vida e/ou o nível de atividade física em
trabalhadores de diferentes setores da economia, ainda são
escassos os estudos que buscam avaliar a associação dessas variáveis em
profissionais de saúde que trabalham em ambiente hospitalar, especificamente na
urgência e emergência como nas UPA o que limita a discussão e comparação desses
resultados.
Interpretação
A rotina diária de
trabalho destes profissionais, como o uso excessivo da força, a alta
repetitividade dos movimentos entre outros, está ligada diretamente a fatores
causadores de Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho (DORT),
tornando-se necessária a prática complementar de atividade física [17,18,20].
Por outro lado, os
técnicos de raio X, farmacêuticos e enfermeiros
apresentaram os maiores valores sendo superiores a outros profissionais que
também possuem nível de atividade elevado como o dos assistentes sociais e
técnicos e auxiliares de enfermagem e auxiliares de serviços gerais.
Acredita-se que estes profissionais se sobressaíram pelo fato de que ambos
possuem características laborais parecidas na UPA, pois realizam muito tempo de
caminhada durante a sua jornada de trabalho.
Além disso, cabe
ressaltar o quanto pode ser penoso, insalubre e estressante o ambiente de
urgência e emergência, e quanto pode ser desgastante lidar com o sofrimento
alheio e cuidar de enfermos [17,18].
A elevada carga
horária de trabalho, a baixa remuneração e o pluriemprego podem levar ao
adoecimento do profissional, aumento de riscos de acidentes de trabalho e
diminuição da qualidade de vida [20].
Esse fator juntamente
com os níveis de inatividade física pode ter contribuído para a diferença entre
os componentes do nível de atividade física, entre os ativos e inativos, e
revela o quanto estes profissionais estão sujeitos a altas horas de trabalho.
Generalização
Diante disso, medidas
simples e baratas como a avaliação do nível de atividade física periodicamente,
o acompanhamento destes profissionais ou propor programas de condicionamento
físico que podem prevenir problemas futuros de saúde, diminuindo o absenteísmo
nas UPAs, aumentando o
rendimento pessoal e, consequentemente, possibilitando a melhoria da qualidade
do serviço prestado à população.
Dessa forma, o
incentivo à prática de Atividade Física por parte da Unidade de Pronto
Atendimento, com programas que estimulem a prática esportiva pode ser um ponto
fundamental na promoção da saúde dos seus colaboradores.
Porém, cabe destacar
a importância do presente estudo, uma vez que os resultados aqui descritos
podem subsidiar o desenvolvimento de pesquisas futuras que procurem comparar
diferentes intervenções de promoção à saúde do trabalhador e seu impacto nos
domínios da atividade física em profissionais de saúde que atuam nos serviços
de urgência e emergência.
A partir dos
resultados obtidos pode-se concluir que os profissionais de maior renda
praticam mais atividade física que os de menor renda. Além disso, os
profissionais do sexo masculino são mais ativos que os de sexo feminino. Cabe
ressaltar que os profissionais com menor nível de atividade física são aqueles
que trabalham a maior parte do tempo sentado, como é o caso dos odontólogos e
trabalhadores do setor administrativo.
Assim, constata-se a
importância de ser dada maior atenção por parte dos gestores e dos setores de
saúde do trabalhador para a inclusão de programas de incentivo à prática de
atividade de física para esses profissionais, no intuito de tentar minimizar ou
evitar os elevados níveis de inatividade física e suas consequentes morbidades.