Rev Bras Fisiol Exerc 2018;17(1):64-70
doi:10.33233/rbfe.v17i1.2370REVISÃO
Exercício
físico no tratamento de pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica: quais
os benefícios?
Exercise in the treatment of patients with chronic obstructive pulmonary
disease: what are the benefits?
Alex Santos de
Souza*, Maria Daniele da Silva*, Lunara Horn de Sousa*, Juliane Santos
Barbosa**, Daniela Santos**, Pedro Henrique Silva Santos***, Djeyne Silveira
Wagmacker, D.Sc.***, Vinícius Afonso Gomes, Ft., M.Sc.****
*Acadêmicos
de Fisioterapia da Faculdade Adventista da Bahia, Cachoeira/BA, **Professora de
Educação Física, Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Salvador/BA,
***Docente Faculdade Adventista da Bahia, Cachoeira/BA, ****Universidade
Salvador, Feira de Santana/BA
Recebido em 12 de
março de 2018; aceito em 30 de março de 2018
Endereço
de correspondência:
Alex Santos de Souza: alexsantos1991@hotmail.com; Maria Daniele da Silva:
daniellya42@gmail.com; Lunara Horn de Sousa: lunarahorn@hotmail.com; Juliane
Santos Barbosa: juul.barbosa@gmail.com; Daniela Santos:
danisinha1606@hotmail.com; Pedro Henrique Silva Santos: pedro_hss92@yahoo.com.br;
Djeyne Silveira Wagmacker: djeyne.ferreira@adventista.edu.br; Vinícius Afonso
Gomes: vinifisioterapia@yahoo.com.br
Resumo
Introdução: A doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC) é uma afecção sistêmica de abrangência global, que
tem como principal característica a limitação do fluxo aéreo pulmonar causando
redução da aptidão física, gerando prejuízo das atividades laborais e da vida
diária. É necessário que o paciente com DPOC seja assistido por uma equipe
multiprofissional, em destaque o fisioterapeuta, entretanto, não está
totalmente elucidada a relação entre o exercício físico e um programa de
fisioterapia em indivíduos com DPOC. Objetivo:
Revisar pesquisas que analisaram o efeito do exercício físico, na população de
pacientes com DPOC submetida à fisioterapia. Métodos: Artigo de revisão sistemática, sem meta-análise, no qual
foram selecionados ensaios clínicos publicados entre 2007 a 2016, que
analisaram a eficácia do exercício físico no tratamento de pacientes com DPOC.
Foram excluídos estudos com pacientes com idade > 80 anos, com diagnóstico
de neoplasia de pulmão. As buscas foram realizadas nas bases de dados Scielo e Lilacs. Resultados: Na pesquisa introdutória
foram encontrados 1.528 artigos, depois da filtragem foram exclusas 1.475
investigações, 98 artigos foram lidos na integralidade, destes, 8 preencheram os critérios de inclusão deste estudo. Conclusão: O exercício físico assistido
e as manobras respiratórias como fortalecimento do músculo diafragma são de
suma importância para a melhora da capacidade funcional, respiratória e física
em pacientes com DPOC.
Palavras-chave: exercício físico;
doença pulmonar; atividade física; reabilitação.
Abstract
Introduction: Chronic obstructive pulmonary disease (COPD) is a systemic condition
of global scope, whose main characteristic is the limitation of pulmonary
airflow causing a reduction in physical fitness, generating a loss in work
activities and daily life. It is necessary that the patient with COPD be
assisted by a multiprofessional team, emphasizing the physiotherapist, however,
it is not fully elucidated the relationship between physical exercise and a
physical therapy program in individuals with COPD. Objective: To review studies that analyzed the effect of physical
exercise on the population of patients with COPD undergoing physical therapy.
Methods: This was a systematic review without a meta-analysis, in which we selected
clinical trials published between 2007 and 2016 analyzing the efficacy of
physical exercise in the treatment of patients with COPD. We excluded studies
with patients >80 years, diagnosed with lung neoplasia.
The search was performed in the Scielo and Lilacs
databases. Results: In the
introductory research, 1,528 articles were found, after filtering 1,475
investigations were excluded, 98 articles were read in their entirety, of which
8 fulfilled the inclusion criteria of this study. Conclusion: Assisted physical exercise and respiratory maneuvers
such as diaphragm muscle strengthening are important for the improvement of
functional, respiratory and physical capacity in patients with COPD.
Keywords: physical
exercise; pulmonary disease; physical activity; rehabilitation.
A doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC) é uma afecção sistêmica de abrangência global, com
caráter irreversível e progressivo, que tem como principal característica a
limitação do fluxo aéreo pulmonar [1,2]. Além dessa alteração, é comum
constatar no doente com DPOC, quadros de tosse crônica, enfisema pulmonar,
fadiga precoce e alterações bioquímicas na musculatura estriada esquelética
[3-5].
A maioria das
alterações decorrentes da DPOC contribui para uma redução da aptidão física,
gerando prejuízo das atividades laborais e da vida diária. Diante desse
cenário, o exercício físico apresenta-se como uma ferramenta de grande valia,
principalmente por minimizar e até mesmo reestabelecer o déficit físico
previsto nessa condição [6].
Um programa de
movimentos corporais planejados, estruturados e repetitivos, deve ser implementado, independentemente do estágio da doença [5].
Suas adaptações promovidas em nível celular resultam em elevação na
concentração de enzimas oxidativas, ganho de força
muscular e aumento da densidade capilar. Essa combinação de fatores se mostra
fundamental para o aumento ou manutenção da capacidade funcional [7,8].
É necessário que o
paciente com DPOC seja assistido por uma equipe multiprofissional, que garanta
que os benefícios do tratamento sejam alcançados no menor espaço de tempo e com
a maior segurança possível [9]. Dentre esses profissionais, o fisioterapeuta
apresenta papel destacado [10]. Os benefícios gerados por especialista podem
exceder as barreiras da prevenção e recuperação cinético-funcional; aprimorando
a qualidade de vida, as atividades de vida diária e até mesmo a função mental
[11].
Entretanto ainda
assim, não está totalmente elucidada a relação entre o exercício físico e um
programa de fisioterapia em indivíduos com DPOC. Ainda pairam questionamentos
no que se refere à conjunção entre o treinamento físico prescrito pelo
fisioterapeuta e as demais condutas, a ele atribuídas. Baseado nessa
constatação, este artigo objetivou revisar pesquisas que analisaram o efeito do
exercício físico, na população de pacientes com DPOC submetida à fisioterapia.
Artigo de revisão
sistematizado, sem meta-análise, no qual foram selecionados ensaios clínicos
publicados entre 2007 e 2016, que analisaram a eficácia do exercício físico no
tratamento de pacientes com DPOC.
As buscas nas bases
de dados previamente selecionadas foram realizadas por revisores independentes
entre o período de março a julho de 2017, nas bases de dados Scielo, Lilacs e Pubmed; com o cruzamento dos seguintes termos: em
português, “Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica AND exercício”, e, em inglês, “Pulmonary Disease, Chronic Obstructive AND exercise”, em espanhol, “Enfermedad
Pulmonar Obstructiva Crónica AND ejercicio”,
“Fisioterapia” AND “DPOC”.
O processo de triagem
dos artigos se deu inicialmente por meio da leitura dos títulos e resumos. Em
seguida, foram excluídos os textos que não atendiam aos critérios de seleção
para o presente estudo. Assim, os estudos que atenderam aos critérios
estabelecidos foram recuperados para leitura do texto completo, nova avaliação
quanto aos critérios de elegibilidade e extração dos desfechos de interesse da
presente revisão.
Na pesquisa introdutória
foram encontrados 1.528 artigos, já mencionados no banco de dados. Depois da
filtragem foram exclusas 1.475 investigações, por não serem provenientes de
ensaios clínicos; não possuírem diagnóstico de DPOC; não estarem relacionados à
fisioterapia, exercício físico e por não fornecerem acesso completo ao texto.
98 artigos foram lidos na integralidade, e destes, 8
preencheram os critérios de inclusão deste estudo.
Tabela I - Artigos
que preencheram os critérios de inclusão do estudo.(ver
PDF anexo)
Movimentos corporais
planejados, estruturados e repetitivos, potencializam o tratamento
fisioterapêutico de pacientes com DPOC. Quando associado a outras terapêuticas,
o exercício físico pode ocasionar redução da dispneia, aumento da força
muscular, da funcionalidade, da oxigenação e da mobilidade tóraco-pulmonar
[12]. Uma vez que a fisioterapia é pautada no combate aos distúrbios
cinético-funcionais, ela pode incrementar ao exercício físico ainda mais
benefícios [13]. A performance física além de ser
otimizada pela elevação do VO2 máximo (consumo de máximo de oxigênio), também
pode ser melhorada pela redução de quadros álgicos, por ajustes posturais e de
padrões ventilatórios [14].
Ademais, a condução
de um programa de exercícios físicos no tratamento fisioterapêutico, deve ser
pensada de forma abrangente. Como pudemos observar no estudo de Ike [17], foram observados resultados significativos em
relação a força de pacientes com DPOC, entretanto não
houve alterações em relação ao desfecho “funcionalidade” nesse estudo.
A funcionalidade deve
ser enaltecida, pois, além de representar um dos cinco principais desfechos em
saúde [15], está associada a piores resultados em relação a
mortalidade quando encontrada de forma reduzida [16]. Diante disso, é
importante priorizar os ganhos funcionais, visto que a melhora exclusiva da
força pode representar um desenlace superficial diante das reais necessidades
do paciente [17].
Em contraponto ao
estudo de Ike [17], o trabalho de Trevisan e colaboradores
[18] em 2010 melhoraram a funcionalidade de portadores de DPOC, utilizando
exercícios que visaram primariamente a melhora da
força. Todavia nesse caso, o músculo diafragma também fora exercitado, o que
pode ter sido determinante para os resultados positivos. É sabido que o mal condicionamento da musculatura diafragmática prejudica a
perfusão dos músculos do esqueleto apendicular, por meio de um mecanismo
conhecido como metaboreflexo [19].
No metaboreflexo existe um direcionamento considerável do
débito cardíaco para os músculos respiratórios, devido à acentuação de vias
eferentes autonômicas simpáticas. Como resultado, observa-se vasoconstricção
adrenérgica nos membros, e redução drástica do VO2 nessas regiões, precipitando
assim o metabolismo anaeróbico e a fadiga muscular precoce. O simples fato de
fortalecer o diafragma pode modificar esse mecanismo e prolongar a tolerância
ao esforço, aumentando a capacidade funcional e a qualidade de vida [19].
Conta ainda a favor
da fisioterapia, a possibilidade de realizar manobras e/ou técnicas que
favoreçam a própria realização do exercício físico. Rodrigues e colaboradores
[21] conseguiram, por meio de manobras fisioterapêuticas, melhorar
a mobilidade toracoabdominal, favorecendo um melhor desempenho
no exercício físico e na funcionalidade avaliada através do teste de caminhada
de 6 minutos.
Marrara [22] em 2012
mostrou que, apesar de importantes, os cuidados usuais de fisioterapia de forma
isolada são inferiores à associação dessa terapia com o exercício físico.
Através de avaliação da capacidade funcional por meio do teste do degrau de 6
minutos (TD6), pôde-se observar um número maior de degraus subidos e um menor autorrelato de dispneia em pacientes que foram submetidos a
6 semanas de treinamento na esteira, treinados
3x/semana, com velocidade alternada, que poderia chegar a 70% do valor
alcançado no teste cardiopulmonar.
Ainda no que tange a
associação entre fisioterapia e exercícios físicos em pessoas com DPOC, podem
existir fases da doença em que uma ou outra dessas terapias seja mais
destacada. Nos casos de exacerbação da doença, o simples fato de respirar pode
tornar-se uma tarefa complexa. O excesso de secreções brônquicas e o edema das
vias aéreas passam a se tornar agora, um dos principais empecilhos à
independência funcional, somados às alterações crônicas já presentes nesses
pacientes [23].
Nesse contexto, os
exercícios físicos devem ser utilizados com maior critério e por vezes até
realizados de forma passiva ou assistida, visando um menor gasto energético
[24]. Em boa parte dos casos existe a necessidade de incremento de outras
condutas, como a oxigenoterapia e o suporte
ventilatório não invasivo durante as sessões. Dessa forma, abordagens que
dispendam maior produção de ATP, apresentam um papel mais destacado nos
estágios em que a doença esteja sob controle [25].
Partindo desse
pressuposto que Landal et al. [26] propuseram em seu estudo, a utilização de exercícios de
alta intensidade em pacientes com DPOC estável. Foi possível avaliar a massa
magra corpórea (MMC) antes e após 12 semanas de treino supervisionado e
observar a correlação dessa variável a outros parâmetros. Ficou claro que os
voluntários que apresentaram maior MMC na avaliação “pré-tratamento”
denotaram maior força muscular respiratória e periférica, melhor função
pulmonar, maior gasto energético durante atividades e maior capacidade de
exercício.
Ainda sobre o estudo
de Landal [26] o fato curioso é que no período pós-
tratamento de pacientes que melhoraram a MMC, foi
possível verificar apenas a evolução da força muscular expiratória, ou seja, o
aumento de MMC não trouxe consigo a otimização dos demais fatores observados.
Analisando nesse escopo, a MMC atuou mais como um marcador do que como um fator
de risco para a funcionalidade.
O exercício físico
assistido e as manobras respiratórias como fortalecimento do músculo diafragma
são de suma importância para a melhora da capacidade funcional, respiratória e
física em pacientes com DPOC. Essa associação se faz positiva mesmo durante as
exacerbações da doença, desde que seja respeitada a necessidade real do
paciente frente a sua condição clínica.