Rev Bras Fisiol Exerc 2018;17(3):165-170
doi: 10.33233/rbfe.v17i3.2580ARTIGO
ORIGINAL
Avaliação
do estágio de desenvolvimento motor em crianças de 10 a 11 anos
Evaluation of motor development in 10 to 11 years old children
Rodrigo Bessa*,
Deborah Palma**, Leonardo Emmanuel de Medeiros Lima**, Andreia Camila de Oliveira**
*Graduado
do curso de Educação Física da Universidade Anhembi Morumbi (UAM) São Paulo/SP,
**Docente do curso de Educação Física e membro do Grupo de Pesquisa em
“Esportes e Atividade Física” da Universidade Anhembi Morumbi (UAM), São Paulo/SP
Recebido em 25 de
outubro de 2017; aceito em 15 de janeiro de 2018.
Endereço
para correspondência:
Andreia Camila de Oliveira, Universidade Anhembi Morumbi, Rua Doutor Almeida Lima, 1134 Vila
Mooca São Paulo 03164-000 SP, E-mail:
camilahand@hotmail.com; Deborah Palma: esportes@anhembi.br; Rodrigo
Bessa: bessarodrigo94@gmail.com; Leonardo Emmanuel de Medeiros Lima: leonardolimadocente@gmail.com
Resumo
O objetivo do estudo
é avaliar o estágio de desenvolvimento motor de crianças de 10 a 11 anos,
praticantes de futebol, através do Teste de Escala de Desenvolvimento Motor, e
comparar o desenvolvimento das mesmas em uma academia com programas esportivos,
e alunos que só praticam atividades esportivas, na aula de Educação Física na
escola. Foram escolhidas 8 crianças; o grupo 1 era
composto por 4 alunos regulares de futebol, em uma academia, e o grupo 2, por 4
crianças do 6° ano de uma escola, onde possuíam aula de Educação Física duas
vezes por semana. Os dois grupos foram avaliados através do Teste EDM adaptado,
nas seguintes habilidades: motricidade global, equilíbrio, e organização
espacial. Para a análise estatística dos dados, foi utilizado o programa Excel
2013, com valor de p < 0,05. É esperado que nessa idade, as crianças já
tenham suas habilidades bem desenvolvidas, porém, neste estudo, foi observado
que as crianças que participavam do programa de Escola de Futebol apresentavam
um nível de desenvolvimento motor melhor do que o grupo 2,
que apenas praticavam atividades esportivas nas aulas de Educação Física.
Palavras-chave: desenvolvimento
infantil; esportes; desempenho atlético; academias de ginástica.
Abstract
The objective of the study is to evaluate the motor development of 10 to
11 years old children, soccer practitioners, through the Motor Development
Scale Test, and compare their development in a sport program of sports club,
and students who only practice Sports activities in the Physical Education
classes at school. Eight children were chosen. The group 1 consisted by four
regular soccer students of the sport gym, and group 2
had four children from the 6th grade of a school with Physical Education
classes twice a week. Both groups were evaluated through the Adapted EDM Test,
in the following skills: global motricity, balance
and spatial organization. For the statistical analysis we used Excel 2013
program, with p value <0.05. Normally Children had already well developed
these skills, however, through this study, we observed that the children of the
Football School program presented a better level of motor development than
group 2, who only practiced sports activities in Physical Education classes.
Keywords: child
development; sport; athletic performance; sports academies.
O desenvolvimento
motor humano é uma ciência estudada, a princípio para melhor entendimento do
desenvolvimento cognitivo, pois a maturação dessas duas capacidades ocorre
concomitantemente [1].
Com o crescimento dos
estudos na área, cada vez mais profissionais de Educação Física, Psicologia,
Neurologia, Pediatria, Psicomotricidade, entre outros, acabam trazendo à luz do
conhecimento mais estudos para melhor compreensão do desenvolvimento humano
[2].
Ao examinar os
estudos relacionados ao assunto, vê-se que o desenvolvimento motor possui uma
ordem sequencial, e até que previsível de acordo com a faixa etária, quando o
surgimento de novas habilidades acontece de forma céfalo-caudal
e próximo distal. Podendo sofrer interferências durante o processo, respeitando
a individualidade biológica [3].
Por essa razão, o
desenvolvimento humano não é abordado somente nas questões motoras e
cognitivas, mas também na totalidade do ser humano e questões sociais e
afetivas [4].
Em consequência
disso, pode-se afirmar que o processo de desenvolvimento motor é influenciado
por diversos fatores. Essas interferências podem ser de natureza genética, ou
seja, genes herdados dos parentes, ou dos fenótipos, que são alterações
genéticas, causadas pelas características ambientais em que o indivíduo vive
[2].
Uma das maiores
referências quando se trata do tema desenvolvimento motor são Gallahue e Ozmun [3]. Os autores
classificaram as fases do desenvolvimento motor, divididas em: Fase Motora
Reflexiva: o bebê apresenta reações involuntárias; Motora Rudimentar: de 1 a 2
anos de idade. O primeiro estágio é o de inibição dos reflexos, caracterizado
por movimentos cada vez mais controlados e voluntários, dando início ao estágio
de pré- controle que possui como principal
característica a manutenção do equilíbrio e uma melhor habilidade para
se locomover e manipular objetos; Motora Fundamental: de 2 a 7 anos. É nesse
momento, que as crianças devem desenvolver as capacidades básicas para realizar
qualquer tipo de atividade no seu dia a dia até a vida adulta, como: correr,
saltar e rolar; Motora especializada: apresenta o estágio de transição, de 7 a
10 anos, que é caracterizado principalmente pela busca de refinação de
integração das habilidades. A partir dos 11 anos, o indivíduo já possui a
consciência de suas limitações e qualidades, procurando treiná-las para
aperfeiçoamento e buscando desenvolver melhor seu desempenho em determinados
esportes, de sua predileção, tanto em competições, como de cunho recreacional.
Visto que o
desenvolvimento motor apresenta fases, conclui-se que as atividades físicas propostas
a essas crianças devem respeitar cada estágio de sua maturação motora, para um
melhor desempenho da mesma, proporcionando prazer ao praticar exercício físico,
e incentivando uma vida ativa no futuro [5].
Sendo assim, faz-se
importante a realização de testes de avaliação das capacidades motoras, que
dizem respeito à aprendizagem e coordenação motora, velocidade, flexibilidade,
força, velocidade, agilidade e resistência. Além de conhecer suas
possibilidades e limitações, com esses dados, podemos estimular a criança à
prática de esportes e descobrir talentos esportivos [6,7].
Como método de
avaliação, que descreve todos os aspectos do desenvolvimento humano, foi
elaborado o teste de Escala de Desenvolvimento Motor adaptado (EDM) [8]. Criado
por Rosa Neto [9], o EDM é composto por uma bateria de testes, para crianças de
2 a 11 anos, que possui como objetivo avaliar as seguintes capacidades motoras:
motricidade fina, motricidade global, equilíbrio, esquema corporal, organização
espacial, organização temporal e lateralidade [2].
A aquisição de novas
habilidades motoras está relacionada não apenas à faixa etária da criança, mas
também às experiências motoras vividas junto ao seu grupo social [10]. Bento et al. [11], no que diz respeito ao desenvolvimento
de habilidades motoras relacionadas ao desempenho esportivo priorizam a
dimensão procedimental dos conteúdos.
Como é reconhecida a
força que o esporte tem na sociedade atual, presente diariamente na sociedade,
entra-se em contato com ele por meio da mídia televisiva, escrita ou internet.
A todo instante nos deparamos com espaços esportivos e clubes, onde há um
grande número de pessoas vivenciando suas diversas manifestações [12].
O fenômeno esportivo
envolve procedimentos atitudinais, paralelamente permeados, na mesma medida,
pelo desenvolvimento de habilidades. Nas escolas de esportes de escolas e
academias, a possibilidade de exploração de atividades para melhor
desenvolvimento é ampla.
Naturalmente inserido
nas aulas práticas de Educação Física, o esporte tem sua presença fortalecida
com o propósito de formar e desenvolver indivíduos capazes de interagir na
sociedade a qual pertencem [12]. Ofertada no contra turno escolar, em academias
e clubes encontram-se as escolas de esportes.
Em escolas de
esporte, as motivações dos pais que as procuram diferenciam-se em função
daquilo que satisfaz o gosto de seus filhos. Se por um lado há aqueles que as
escolhem para a ocupação do tempo livre, outros buscam esta possibilidade para
que as crianças aprendam um esporte, com a esperança de que se tornem
profissionais [11].
A popularidade do
futebol leva centenas de crianças às escolas de esportes. A experiência no
futebol pode ser uma excelente experiência motora para a criança. Uma série de
fundamentos está ligada diretamente aos movimentos fundamentais de manipulação,
locomoção e de estabilidade como o chute, passe, drible, marcação, entre outros
[13].
Neste processo de
identificação de potencial para esta modalidade, é importante, em crianças,
avaliar o estágio de desenvolvimento motor. É propósito deste
trabalho utilizar a Escala de Desenvolvimento Motor [9] como instrumento
avaliativo e comparativo entre diferentes escolas de esportes.
O EDM possui um
esboço do seu protocolo desde os anos 90, quando o autor, com dificuldades de
encontrar um teste que compreendesse todas as habilidades motoras, começou a
criá-lo. Em 1996, publicou sua versão, utilizando como parâmetro para analisar
o perfil psicomotor de crianças em sua tese de doutorado [9].
Esta escala foi
construída como alternativa a profissionais da educação e da saúde, a fim de
que pudessem realizar estudos longitudinais e transversais através da aplicação
do EDM. Consiste em uma bateria de testes que segue uma ordem, a saber:
motricidade fina, motricidade global, equilíbrio, esquema corporal, organização
espacial, organização temporal e lateralidade. Sua realização leva em média 30
a 45 minutos, devendo ser realizado em local com pelo menos 5 a 6 metros
longitudinais, iluminado e longe de ruídos para minimizar as interferências
[9].
Devido a sua grande
adesão e grande uso na prática de avaliação motora, por diversas áreas, tais
como: Fisioterapia, Psicologia, Pedagogia, Fonoaudiologia, Medicina e Educação
Física, a editora Artmed publicou a primeira edição do Manual de Avaliação
Motora [9]. Em 2011, foi publicada sua segunda edição pela editora DIOESC.
É notável que o
ambiente cada vez mais tecnológico que as crianças vivem em seu dia a dia,
diminui a oportunidade de se movimentar, podendo influenciar diretamente no
tempo de estágio nas fases que o desenvolvimento motor apresenta [14,15].
Nessa perspectiva,
tendo em vista a geração desta década, e o interesse pela prática do futebol,
foi propósito do estudo avaliar, identificar o perfil motor e comparar a
efetividade do treinamento de futebol e as aulas de Educação Física no
desenvolvimento motor de crianças entre 10 e 11 anos.
Para os fins a que se
propõe este estudo, os procedimentos metodológicos seguiram a linha da pesquisa
quase experimental e o delineamento estudo de campo, com uma amostra não
probabilista intencional.
Participaram do
estudo 8 crianças do sexo masculino, com idade
cronológica (IC) 10-11 anos, residentes do município de São Paulo/SP, divididos
em dois grupos: o Grupo 1 era formado por 4 escolares que não praticavam
nenhuma atividade esportiva, além das duas aulas práticas semanais de Educação
Física do colégio; o grupo 2, composto por 4 alunos que praticavam futebol com
frequência de duas vezes por semana, no programa de esportes de uma academia.
A escolha da amostra
teve caráter intencional, pois participaram da intervenção as crianças que não
apresentam nenhuma limitação física ou mental, e possuíam por escrito a
autorização prévia dos pais ou responsáveis para participação do estudo.
Para correlacionar a
idade cronológica com a idade motora (IM), foi utilizado
o EDM, com os seguintes testes: motricidade global, equilíbrio e organização
espacial. Em cada bateria de testes, é atribuído um valor equivalente à sua
idade motora (IM), expressa em meses, a partir desses valores, é feita a média
de (IM1, IM2, IM3), considerado o valor da idade motora geral (IMG).
Foram selecionados os
testes de motricidade global (MG), equilíbrio (EQ) e organização espacial (OE),
pois são as habilidades que mais se relacionam com o futebol. As outras
habilidades que compõe o EDM, tais como: motricidade fina, espaço temporal e
lateralidade, não entraram como base neste estudo, já que as mesmas não têm
influência direta no treinamento de futebol, e nem no desempenho do aluno na
modalidade.
A intervenção foi
realizada em um lugar reservado para os testes, sem a interferência de
terceiros, para que não houvesse inibição da criança, o que influenciaria nos
resultados. Com o tempo médio de 15 minutos, o participante realizava tarefas
de sua idade correspondente; caso não obtivesse êxito, era submetido ao teste
da faixa etária anterior, até completar com sucesso o teste. Para a análise
estatística dos dados, foi utilizado o programa Excel 2013, com valor de
p<0,05.
Todos os
participantes menores de idade foram autorizados a participar do estudo por
seus respectivos pais e responsáveis, através da assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido. A coleta de dados foi realizada no período
de 21/03/2017 a 23/03/2017.
O grupo estudado
possuía idade média de 10 anos e 7 meses, o colégio e
a academia, onde foram realizados os testes, localizam-se em uma região de
classe média alta da cidade de São Paulo. Nenhum dos participantes possuía
alguma limitação física ou mental, e todos se mostraram motivados em realizar
as tarefas. A amostra limitou-se em 8 crianças, pois
alguns alunos não obtiveram a autorização dos pais, e por essa razão foram
excluídos.
Figura
1 – Resultados
De acordo com os
resultados mostrados na Figura 1, o Grupo 1 composto
por escolares, possuía média de IC de 128.5 meses, e demonstrou média de IM de
96.75 meses, ou seja, inferior ao esperado.
Observando os
resultados do grupo 2, que é formado por crianças que
praticam futebol regularmente duas vezes na semana, além das aulas de Educação
Física em seus respectivos colégios. Esse grupo possui média de IC 126.75 e IM
média de 130 meses.
Os resultados
demonstram que a média do Grupo 2 de IC era menor e o
IM maior do que o Grupo 1, no entanto, na habilidade de MG, mostrou-se a maior
diferença de desempenho, pois as crianças que praticam o futebol regularmente,
todas tiveram êxito máximo no teste, e as escolares, todas se mostraram abaixo
do esperado.
Segundo Rosa Neto
[16], o equilíbrio é a capacidade base para a execução de outros gestos
motores, isso explica a relação entre os resultados do teste de EQ e MG. O
Grupo 1 mostra-se abaixo nos dois quesitos, enquanto o
Grupo 2 obteve êxito.
Segundo Gallahue [3], crianças entre 10-11 anos deveriam ter
eficiência em atividades que exijam habilidades estabilizadoras e locomotoras.
Os testes de motricidade global e equilíbrio colocam à prova essas
competências. Santos et al. [5] também encontraram
resultados de IM superiores em crianças que praticam futebol, no contra turno
escolar, corroborando os resultados deste estudo. Além disso, os autores também
observaram uma baixa coordenação em crianças que não praticam atividades
esportivas estruturadas fora da escola.
As aulas de futebol
em escolas de esporte possuem uma estruturação que segue fases de aprendizado,
de acordo com a faixa etária das turmas, de modo que as atividades
desenvolvidas nos treinamentos não tenham só o objetivo de desenvolver a
técnica do praticante, mas sim possibilitar o seu desenvolvimento motor em
geral. Em vista disso, é esperado que as crianças que frequentem escolas de
futebol ampliem e desenvolvam melhor seu repertório motor [13].
Crianças geralmente
gostam de correr, brincar, pular, e qualquer fator que a impossibilite de
realizar essas ações, dificulta sua socialização, diminuindo sua qualidade de
vida, um dos fatores que prejudicam essas ações é a obesidade. Além disso, a
obesidade é fator de limitação no desenvolvimento motor, haja vista que
crianças eutróficas demonstram IM maiores do que
crianças obesas [17].
Considerando que cada
criança possui seu tempo e maturação dos centros nervosos, respeitando o
princípio da individualidade, verificam-se diferenças no ritmo de aprendizado e
desenvolvimento motor em crianças da mesma idade, porém o que se mostra muito
importante nesse processo é a exposição às atividades esportivas. Apesar das
crianças, nas brincadeiras, e atividades desenvolvidas no cotidiano,
naturalmente enriquecer o seu acervo motor, quanto mais atividades que requerem
exercício físico melhor será sua evolução motriz [16].
Com base nos dados
apresentados, neste estudo, conclui-se que as crianças que praticam aulas de
futebol regularmente possuem um melhor desenvolvimento motor, comparado com as
crianças que apenas praticam esportes nas aulas práticas de Educação Física na
escola.
O esporte mostra-se
importante para o desenvolvimento motor de qualquer indivíduo, sendo o futebol
o esporte mais praticado no Brasil é visto como mais do que o jogo favorito de
muitas crianças, pois não só desenvolve as habilidades com bola como também
proporciona outras habilidades que permitem a prática de outros esportes com
aptidões mínimas para outros esportes e atividades esportivas.
Por essa razão,
podemos afirmar que aulas semanais de futebol, além do contra turno escolar,
mostram-se efetivas no desenvolvimento motor. Porém, mais estudos na área são
necessários, com uma amostra maior, já que existem ainda poucos estudos
relacionados ao desenvolvimento motor no futebol.