Rev Bras Fisiol Exerc
2019;18(2):83-90
ARTIGO ORIGINAL
Avaliação dos indicadores de sarcopenia e de risco de
quedas em idosas
Assessment
of sarcopenia and risk of falls in elderly
Amanda
Santos da Cruz*, Thaís Santos Contenças, D.Sc.**
*Graduada do curso de fisioterapia da Universidade
Paulista (UNIP), Santos/SP, **Fisioterapeuta, Especialista em Fisioterapia Neurofuncional pela Irmandade da Santa Casa da Misericórdia
de São Paulo, Professora Adjunta do Curso de Fisioterapia da Universidade
Federal de Juiz de Fora, Campus Governador Valadares
Recebido
em 21 de maio de 2019; aceito em 30 de junho de 2019.
Correspondência: Thaís Santos Contenças, Rua Leonardo Cristino, 3400 São Geraldo
35012-000 Governador Valadares MG
Amanda
Santos da Cruz: amandasantoscruz001@hotmail.com
Thaís
Santos Contenças: thaiscontencas@gmail.com
Resumo
Objetivo: O objetivo do
presente estudo foi avaliar os indicadores de sarcopenia e os fatores de risco
de quedas nas idosas hígidas acima de 60 anos. Métodos: Estudo transversal, com 30 idosas, no qual foram avaliados
os indicadores de sarcopenia, utilizando os seguintes testes: velocidade de
marcha, força de preensão manual do braço dominante e não dominante e
circunferência da panturrilha. Também utilizamos o questionário SARC-F, para
triagem de sarcopenia. Para avaliar os riscos de quedas e preocupação em cair,
utilizaram-se as escalas Downton e Falls Efficacy Scale International (FES-I
Brasil) respectivamente. As pacientes foram divididas em três grupos: G1 idosas
jovens de 60 a 69 anos; G2 idosas de 70 a 79 anos; G3 muito idosas com idade
igual ou superior a 80 anos. Resultados:
Houve uma pequena diminuição da velocidade de marcha apenas no G3, todos os
grupos apresentaram diminuição na força de preensão manual do braço dominante e
não dominante. Quanto às escalas aplicadas, os grupos G2 e G3 apresentaram
históricos de quedas esporádicas e todos os grupos apresentaram alto risco de
quedas. Conclusão: Conclui-se com o
presente estudo que todos os grupos avaliados apresentaram uma diminuição da
força muscular e também um alto risco de quedas, entretanto nenhum dos grupos
apresentou sarcopenia.
Palavras-chave: sarcopenia;
envelhecimento; Fisioterapia.
Abstract
Objective: The objective
of the present study was to evaluate the indicators of sarcopenia and risk
factors for falls in healthy elderly women over 60 years of age. Methods: A cross-sectional study was
carried out with 30 elderly women, in which sarcopenia indicators were
evaluated using the following tests: gait velocity, hand gripping force of the
dominant and non-dominant arm and calf circumference. We also used the SARC-F
questionnaire for sarcopenia screening. To evaluate the risks of falls and
concern in fall, we used the Downton and Falls Efficacy Scale International
scales (FES-I Brazil) respectively. The patients were divided into three
groups: G1, young women aged 60 to 69 years; G2 elderly women aged 70 to 79
years; G3 very old with age equal or superior to 80 years. Results: There was a small decrease in gait velocity only in G3,
all groups showed decrease in hand gripping force of the dominant and
non-dominant arm. Regarding the scales applied, the groups G2 and G3 had a
history of sporadic falls and all groups presented a high risk of falls. Conclusion: We concluded with the
present study that all the groups evaluated presented a decrease in muscle
strength and a high risk of falls, although none of the groups presented
sarcopenia.
Key-words: sarcopenia;
aging; physical therapy.
O
envelhecimento humano é um processo natural e progressivo, sendo caracterizado
por diversas alterações fisiológicas no organismo, ocasionando perdas e uma
maior dificuldade de adaptação. Tornando-se um processo complexo, o
envelhecimento resulta da interação de diversos fatores como: estilo de vida,
antecedentes familiares, alimentação, doenças osteomusculares e outras, levando
ao declínio das Atividades de Vida Diaria [1-3].
O
crescimento dessa população acontece de forma rápida considerando-se um fenômeno
de abrangência mundial. No ano de 1950, o Brasil aparecia como o 16º país em
quantidade populacional acima dos 60 anos de idade, contudo estima-se que o
país suba para a 6º posição no ranking mundial até o ano de 2025. A cada ano no
Brasil o número de idosos aumenta com uma média de 650 mil indivíduos, e grande
parte possui doenças crônicas, alguns inclusive com limitações funcionais
[1-3].
Dentre
as doenças relacionadas ao envelhecimento, as mais prevalentes são as
alterações sensoriais, as doenças ósseas, cardiovasculares, diabetes e também a
perda da massa muscular que é um fator muito importante para o idoso, já que
pode ocasionar as quedas e em casos mais graves pode levar a fragilidade,
impedido que eles realizem suas atividades [3].
Os
idosos frequentemente apresentam mais de um fator de risco para quedas como,
por exemplo, a diminuição de massa muscular e assim trazendo desequilíbrios, o
que favorece eventos recorrentes e com consequências mais graves. Nesse
sentido, a avaliação do risco para quedas em idosos é muito importante, pois
mostra o que de fato influencia para que os idosos venham a cair. A redução na
massa muscular decorrente do processo de envelhecimento também é um aspecto que
deve ser considerado [3-4]. A identificação desses fatores favorece a
elaboração de planos e cuidados voltados a minimizar esses eventos, bem como a
reduzir as possíveis complicações provenientes das quedas [4].
A
sarcopenia é conhecida como uma síndrome geriátrica caracterizada por
diminuição de massa muscular, e da função muscular (força ou desempenho físico)
que pode afetar o equilíbrio e a marcha no idoso e então aumentar os riscos de
quedas [5-6]. A European Working Group on Sarcopenia in Older People (EWGSOP) aborda três critérios para avaliar
a sarcopenia: a perda da massa muscular, diminuição da força muscular e baixa
resistência física. O diagnóstico de sarcopenia é dado na presença do primeiro
critério associado com o segundo ou com o terceiro [6-8].
A
atuação do fisioterapeuta no processo de senescência procura proporcionar um
envelhecimento saudável e digno, com isso aumentar sua expectativa e qualidade
de vida [9].
O
objetivo do presente estudo foi avaliar os indicadores de sarcopenia e os
fatores de risco de quedas em idosas hígidas acima de 60 anos.
O
estudo é do tipo descritivo transversal, foi realizando na Clínica Escola da
Universidade Paulista (UNIP). Foram avaliadas 30 mulheres idosas, com idade
igual ou superior a 60 anos, com estado cognitivo preservado e com um resultado
do Mine Exame do Estado Mental igual ou maior que 26 pontos. Os critérios de
exclusão foram idosas que apresentassem doenças
neurológicas ou traumato-ortopédicas, que estivessem
em fase aguda e as impedissem de realizar os testes propostos e também doenças
descompensadas ou pressão arterial elevada no dia da avaliação.
Este
estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da
Universidade Paulista UNIP. Todos os pacientes assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, conforme o conselho nacional de saúde e a
resolução N° 466/12 do Ministério da Saúde para pesquisas envolvendo seres
humanos.
As
pacientes foram divididas em três grupos: G1 idosas jovens de 60 a 69 anos; G2
idosas de 70 a79 anos; G3 muito idosas com idade igual ou superior a 80 anos,
em cada grupo tinham 10 participantes e ao todo foram 30 mulheres idosas
avaliavas.
Na
avaliação, foram utilizados como indicador de sarcopenia os testes de
velocidades de marcha (VM); força de preensão manual (FPM) do braço dominante
(BN) e braço não dominante (BND) e circunferência da panturrilha (CP).
A
VM foi avaliada de modo retilíneo onde o avaliador traçou um percurso de 14
metros. Os dois primeiros e os dois últimos metros foram excluídos do estudo. O
tempo para realizar o percurso foi cronometrado, considerando sem riscos de
quedas tempos maiores que um metro por segundo, aproximadamente [10].
A
FPM foi avaliada com o dinamômetro manual hidráulico da marca Kratos. Os idosos executaram uma FPM-BD e FPM-BND. O teste
foi verificado três vezes, com um minuto de descanso entre as tentativas, o
resultado foi a média das três tentativas. As medidas são demonstradas em
quilogramas/força (kg/f) e os valores adotados como referência foram: idosas
entre 60 e 69 anos FPM- BD 23,8 kgf e FPM-BND 23,0 kgf e as idosas com idade
igual ou maior que 70 anos FPM- BD 23,0 kgf e FPM-BND 22,6 kgf [6-11].
A
CP foi mensurada com o auxílio de uma fita métrica, colocada sobre a maior
porção da panturrilha e os valores menores que 31 cm foram indicativos de
diminuição da massa muscular [14].
As
escalas utilizadas para avaliação foram Sarc-f que é
um questionário para triagem de sarcopenia, rápido e simples de ser aplicado.
Compreende 5 componentes: força, assistência com caminhada, levantar de uma
cadeira ou cama, subir ou descer escadas e as quedas. Os scores variam de 0 a
10 pontos, e scores igual ou superior a 4 são preditivos da sarcopenia [15].
A
preocupação em cair foi avaliada pela Falls
Efficacy Scale International (FES-I Brasil) que avalia a possibilidade
de cair ao realizar 16 atividades cotidianas em uma escala contínua de 0 a 64
pontos. O escore final pode variar de 16 pontos (ausência de preocupação) a 64
pontos (preocupação extrema). Os escores maiores que 23 pontos foram
identificados com associação de histórico de queda esporádicas e maiores que 31
pontos com associação de quedas recorrentes [16,17].
A
Escala de Risco para Quedas de Downton foi aplicada
nos idosos, e avaliou os seguintes pontos: ocorrência de quedas anteriores,
administração de medicamentos, déficit sensorial, nível de estado mental atual
e padrão de deambulação. A pontuação vai de zero a onze, valores iguais ou
superiores a 3 pontos indicaram alto risco para quedas, enquanto que valores
abaixo desse escore indicaram baixo risco para quedas [18,19].
Para
análise dos resultados foi calculada a média e o desvio padrão de cada teste e
escala aplicada para o G1, G2 e G3.
No
presente estudo nenhuma idosa se encaixou dentro dos critérios de exclusão,
foram incluídas 30 idosas todas ativas e com bom estado cognitivo (MEEM igual
ou acima de 26 pontos).
No
G1, a média de idade foi de 66,6 ± 1,8 anos, a VM obteve uma média de 1,00 ±
0,22 seg. A FPM-BD obtida foi de 18,76 ± 2,50 e FPM-BND 17,36 ± 2,70 kgf. A CP
obtida foi de 39,20 ± 4,18 cm (Tabela I).
Tabela I - G1 idosas jovens de 60 a 69 anos. Dados demográficos e indicadores de
sarcopenia
VM
= Velocidade de marcha; FPM-BD = Força de Preensão Manual Braço Dominante;
FPM-BND = Força de Preensão Manual Braço Não Dominante; CP = Circunferência da
Panturrilha
Quanto
às escalas aplicadas no G1 foi observado que a Sarc-f
teve uma média de 2,3 ± 1,9 pontos. Na FESI Brasil média foi de 22,7 ± 5,3
pontos. Na Downton a média foi de 3,1 ± 2,0 pontos,
mostrando que G1 apresentou alto risco de quedas (Tabela II).
Tabela II - Escalas SACR-F, FESI- BRASIL e DOWNTON G1
SARC-F
= Questionário de Sarcopenia; FESI-BR = Falls Efficacy
Scale International (FES-I
Brasil); DOWNT = Escala de Risco para Quedas de Downton
No
G2, a média de idade foi de 73,3 ± 2,8 anos, a VM obteve uma média de 1,05 ±
0,15 seg. A FPM-BD obtida foi de 19,20 ± 3,29 e FPM-BND 17,96 ± 3,92 kgf. A CP
obtida foi de 37 ± 3,74 cm (Tabela III).
Tabela III - G2 Idosos de 70 a 79 anos. Dados demográficos e indicadores de
sarcopenia
VM
= Velocidade de marcha; FPM-BD = Força de Preensão Manual Braço Dominante;
FPM-BND = Força de Preensão Manual Braço Não Dominante; CP = Circunferência da
Panturrilha
Quanto
às escalas aplicadas no G2 foi observado que a Sarc-f
teve uma média de 1,8 ± 1,0 pontos. Na FESI Brasil média foi de 23 ± 3,6
pontos. Na Downton a média foi de 3,7 ± 1,2 pontos,
mostrando que G2 apresentou histórico de quedas esporádicas e alto risco de
quedas (Tabela IV).
Tabela IV - Escalas SARC-F, FESI-BRASIL e DOWNTON G2
SARC-F
= Questionário de Sarcopenia; FESI-BR = Falls Efficacy
Scale International (FES-I
Brasil); DOWNT = Escala de Risco para Quedas de Downton
No
G3, a média de idade foi de 83 ± 2,8 anos, a VM obteve uma média de 0,87 ± 0,16
seg. A FPM-BD obtida foi de 17,53 ± 3,17 e FPM-BND 15,96 ± 2,43 kgf. A CP
obtida foi de 38,5 ± 3,0 cm (Tabela V).
Tabela V - G3 idosos com idade igual ou superior a 80 anos. Dados demográficos e
indicadores sarcopenia
VM
= Velocidade de marcha); FPM-BD = Força de Preensão Manual Braço Dominante; FPM-BND
= Força de Preensão Manual Braço Não Dominante); CP = Circunferência da
Panturrilha
Quanto
às escalas aplicadas no G3 foi observado que a Sarc-f
teve uma média de 2,5 ± 1,5 pontos. Na FESI Brasil média foi de 26,6 ± 5,0
pontos. Na Downton a média foi de 4,4 ± 2,0 pontos,
mostrando que G3 apresentou histórico de quedas esporádicas e alto risco de
quedas (Tabela VI).
Tabela VI - Escalas SACR-F, FESI- BRASIL e DOWNTON G3
SARC-F
= Questionário de Sarcopenia; FESI-BR = Falls Efficacy
Scale International (FES-I
Brasil); DOWNT = Escala de Risco para Quedas de Downton
As
idosas avaliadas no presente estudo foram separadas em grupos de acordo com a
faixa de idade. Todas apresentaram estado cognitivo preservado e eram
independentes para realizar suas atividades. No presente estudo foram avaliados
os indicadores de sarcopenia e os riscos de queda nas idosas hígidas,
entretanto houve uma diminuição da força muscular nos três grupos avaliados,
essa perda de força muscular relacionada com o envelhecimento denomina-se “dinapenia”, que pode afetar o desempenho físico dessa
população.
No
estudo de Paula et al. [20], também foi avaliada a sarcopenia com diferentes
combinações de métodos avaliativos, mas a circunferência da panturrilha não
mostrou alteração menor que 31 cm, corroborando o presente estudo já que os
grupos G1, G2 e G3 apresentaram CP maiores que 31 cm.
De
acordo com Buchner et al. [21], a velocidade de marcha diminui com o avanço da idade e
pode haver uma relação entre a força de membros inferiores e a velocidade de
marcha. As idosas do G1 e G2 do presente estudo não apresentaram alterações na
velocidade de marcha, porém as do G3 por serem muito idosas entre 80 e 87 anos
apresentou um declínio da velocidade de marcha, mas não houve relevância
significativa.
No
estudo feito por Rossetin et al. [22], com objetivo de analisar os indicadores de sarcopenia
em idosas caidoras e não caidoras.
Observou que as idosas caidoras e não caidoras avaliadas não apresentaram alterações nos testes
de VM, FPM e CP, não corroborando o presente estudo, já que as idosas do G3
apresentaram diminuição na VM e FPM no BD e BND.
O
envelhecimento humano leva a sarcopenia que está associada ao declínio
progressivo da massa e, consequentemente, da função muscular (força, potência e
resistência). Esse déficit pode ser relacionado a uma contração muscular
inadequada, seja em função de alterações nas proteínas actina e miosina ou por
um estresse oxidativo nas células. O início e a progressão dessa perda muscular
estão relacionados à perda de miócitos via apoptose, essa perda é mais
pronunciada nas fibras do tipo II [23,24].
De
acordo com Rebelatto et al. [25], as alterações anatomofisiológicas
características do processo de envelhecimento são muito importantes do ponto de
vista funcional do sistema muscular. A sarcopenia ocorre principalmente pela
diminuição do peso muscular e diminuição da área de secção transversal.
Consequentemente, o idoso terá menor qualidade em sua contração muscular, menor
força, menor coordenação dos movimentos e, provavelmente, maior probabilidade
de sofrer acidente, por exemplo, quedas e com isso trazer outros prejuízos para
saúde dos idosos.
Dentre
os métodos disponíveis para avaliação da massa muscular, os mais adotados na
literatura são as estimativas indiretas para avaliar a composição corporal como
dados antropométricos, Índice de Massa Corporal (IMC) e a bioimpedância,
entretanto a Dual Energy X-Ray Absorptiometry (DXA) é um método mais preciso e
apresenta-se como padrão ouro para avaliação da composição corporal. Esse exame
pode quantificar o conteúdo de gordura, massa muscular e massa óssea,
especialmente na população idosa [26].
A
prática regular de exercícios físicos em idosos é muito importante, pois os
benefícios acarretam uma melhor qualidade de vida, através dos exercícios
acontece o aprimoramento da força e da resistência muscular, da flexibilidade,
do equilíbrio e do condicionamento cardiorrespiratório prevenindo muitas
doenças inclusive sarcopenia [27].
Conclui-se
com o presente estudo que todos os grupos avaliados apresentaram uma diminuição
da força muscular e também um alto risco de quedas, entretanto nenhum dos
grupos apresentou sarcopenia.