Rev Bras Fisiol Exerc 2019;18(1):58-63

doi: 10.33233/rbfe.v18i1.2880

REVISÃO

O efeito do exercício físico em pacientes submetidos ao tratamento de hemodiálise

The effect of exercise on hemodialysis patients

 

Henrique Souza Dias*

 

*Especialista em Fisiologia do Exercício e Prescrição do Exercício (FMU)

 

Recebido em 10 de março de 2019; aceito em 28 de março de 2019.

Endereço de correspondência: Henrique Souza Dias, Rua Alto Paraguai, 78 Jaçanã 02238-240 São Paulo SP, E-mail: henriquesouza_edfisica@hotmail.com

 

Resumo

Estudos mostram efeitos benéficos do exercício em pacientes que possuem doença renal crônica e realizam hemodiálise. Objetivo: Revisar na literatura estudos que abordem o papel do exercício físico em pacientes que realizam hemodiálise. Métodos: Foi realizada uma revisão sistemática com os descritores exercise/exercício físico AND kidney disease/doença renal, nas bases de dados Lilacs e Pubmed. Após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão foram selecionados 22 estudos os quais passaram a ser analisados. Resultados: Foi identificada a melhora da qualidade do sono, assim como da qualidade de vida, redução da sensação de dor e melhoria da eficiência dialítica, após aplicação de um programa de exercícios. Conclusão: Estes achados demonstram que o programa de exercícios tem uma resposta positiva, além de ser seguro. Porém nota-se a necessidade de mais estudos para identificação do momento ideal de realização do exercício assim como o tipo de exercício.

Palavras-chave: exercício físico; doença renal; hipertensão.

 

Abstract

Studies show beneficial effects of exercise in patients who have chronic kidney disease and undergo hemodialysis. Objective: To review in the literature studies that address the role of physical exercise in patients undergoing hemodialysis. Methods: A systematic review was performed with the descriptors exercise / physical exercise AND kidney disease, in the Lilacs and Pubmed databases. After applying the inclusion and exclusion criteria, 22 studies were selected and analyzed. Results: Sleep quality improvement, as well as quality of life, reduction of pain sensation and improvement of dialysis efficiency were identified after the application of an exercise program. Conclusion: These findings demonstrate that the exercise program has a positive response, in addition to being safe. However, there is a need for further studies to identify the ideal moment of exercise and the type of exercise.

Keywords: physical exercise; kidney disease; hypertension.

 

Introdução

 

A Doença Renal Crônica (DRC) é uma síndrome gerada pela perda ao longo do tempo e de forma irreversível das funções do rim, como agravante é uma doença silenciosa. Estimasse que cerca de cem mil pacientes estejam em diálise no Brasil, e não há nada a ser feito para alterar o quadro, em casos mais avançados a medida a ser tomada é o tratamento de Hemodiálise (HD). As primeiras fases da DRC podem ser diagnosticadas através de exames laboratoriais. Entre as inúmeras consequências da DRC na vida do paciente estão em destaque o comportamento sedentário e inatividade física, pouco tempo de lazer, restrições na ingesta de alimentos e líquidos, alteração da imagem corporal, distúrbio do sono, depressão. A fadiga associada ao distúrbio do sono tem impacto direto na má qualidade de vida [1-5].

Através de estudos pode-se identificar que a iniciativa da inclusão de exercícios físicos durante a HD é uma ótima alternativa, já que o exercício físico tem a capacidade de influenciar em aspectos sociais, psicológicos e fisiológicos, promovendo inúmeros benefícios à saúde, bem como nos sistemas endócrino, nervoso e variáveis antropométricas. Os exercícios de alongamento, isotônicos, aeróbicos, diminuem os tempos de repouso, consequentemente será um indivíduo mais ativo [6-8].

A aplicação do exercício, bem como o período é fundamental, por conta dos benefícios gerados. Quando aplicados durante a HD melhoram a eficiência dialítica - ativando a circulação estagnada, diminuindo o efeito rebote, melhorando a eficiência do processo dialítico, aumentando a oxigenação. Além dos efeitos vasodilatadores, interfere positivamente na melhora da qualidade do sono. Conclui-se que o exercício físico terá o papel de diminuição da morbimortalidade cardiovascular em pacientes com IRC, aumento da sobrevida, e a qualidade de vida, além das contribuições geradas no sistema imune, agindo na ação das células leucocitárias, marcadores plasmáticos de inflamação (IL- 6 e IL-10). O exercício físico para a população com IRC tem se demonstrado mandatório [9-16].

Há estudos relatando que o treinamento aeróbico de intensidade moderada em curto prazo (16 semanas) não tem efeito significativo sobre a hipotensão pós–exercício, mas o exercício de resistência realizado duas vezes por semana gera efeito significativo na massa muscular e força, justificasse a escolha do tema pelo fato de haver poucos estudos voltados a esta linha de pesquisa, porém quando analisado o papel do exercício físico nessa população nota-se a capacidade de mudanças significativas, como a qualidade de vida e mudanças imunológicas.  O avanço dos estudos possibilitará resultados mais precisos a respeito de qual tipo de exercício se faz mais eficiente, assim como os resultados tanto a curto quanto a longo prazo [7,17,11,12,14].

O objetivo deste estudo é identificar o efeito do exercício físico em pacientes submetidos ao tratamento de hemodiálise.

 

Material e métodos

 

Protocolo e registro

 

A pesquisa sistematizada seguiu as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) e Cochrane (Higgins).

        

Critérios de elegibilidade

 

Os critérios de inclusão foram: 1) Artigo com livre acesso; 2) Artigo na integra; 3) Ensaio clínico randomizado controlado, nos padrões de PICO; 4) Estudos que abordassem o papel do treinamento físico em pacientes que possuíam doença renal crônica; 5) Efeito do exercício físico em pacientes dialíticos; 6) Artigos publicados a partir de 2012; 7) Estudos realizados com humanos.

Os critérios de exclusão foram: 1) Artigos de revisões com e sem metanálise; 2) Carta ao editor e projeto de pesquisa; 3) Artigos que não descressem o protocolo de treinamento; 4) Artigos duplicados; 5) Artigos com amostras não diagnosticados com problemas renais; 6) Artigos não escritos em português, inglês; 7) Artigos que utilizassem técnicas terapêuticas juntamente com exercícios físico.

 

Fontes de informação

 

As bases de dados utilizadas foram: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs); Pubmed; Scientific Electronic Library Online (Scielo), sendo realizada a busca de setembro a novembro de 2017.

 

Resultados

 

Tabela I - Estudos publicados sobre exercício físico em pacientes tratados por hemodiálise

 

Grupo Experimental; ES = Eficiência do Sono; CF = Capacidade Funcional; QV = Qualidade de Vida; FC = Função Cognitiva; CM = Capacidade Mental; MA = Antropométricas; Desnutri =  Desnutrição; Aero =  Aerobio; Resis = Resistência; Flex = Flexibilidade; NºP = Número de passos; TSL =  Sentar e Levantar; PC = Peso Corporal; CC = Circunferência da Cintura; TC6M = Teste de Caminhada de 6 min -12; AF =  Atividade Física; ED = Eficiência Dialítica; PF = Perfil lipídico; MM =  Massa Muscular, Kt/V = Índice de depuração da ureia por sessão de hemodiálise

 

Discussão

 

A hemodiálise é um procedimento realizado para os pacientes em que apresentam graus elevados de lesão renal, o procedimento é realizado através de uma máquina, a qual faz a filtragem do sangue, liberando as toxinas presentes no organismo do paciente, consequentemente tende a controlar a pressão arterial. Por se tratar de um procedimento invasivo é necessário que seja feito em hospitais, ou clínicas especializadas, a frequência e duração do procedimento são definidos de acordo com o estado clínico do paciente, mas estão na faixa de 2 a 3 vezes por semana, com duração de aproximadamente 3 ou 4 horas. O exercício por sua vez tem o papel de contribuir para o controle e até mesmo diminuição dos fatores associados a esta síndrome, de maneira que irá abranger alterações físicas, morfológicas, funcionais e na qualidade de vida [17-19].

Dos 22 estudos inclusos observou-se com maior frequência entre eles o aumento do número de passos, melhora na qualidade de vida, associado a melhor qualidade do sono, aumento da capacidade funcional, possibilitando aos pacientes se sentirem mais independentes e terem maior autonomia na realização das suas tarefas diárias, além da melhora nos testes de caminhada, teste de sentar e levantar, além notar-se a diminuição da dor após as sessões de HD.

Outros resultados com menor frequência também puderam ser observados nos estudos como o aumento da eficiência dialítica, capacidade mental, diminuição da desnutrição.

A amostra total desta revisão foi de 1090 indivíduos, uma média de aproximadamente 50 indivíduos por estudo, compostos por ambos os gêneros e das diversas faixas etárias (8 a 71 anos). Notou-se em alguns estudos a diminuição da amostra inicial com a final em razão do declínio ao tratamento por parte de alguns pacientes, motivos sendo óbito, melhora ou agravamento do estágio da síndrome, valores pressóricos durante as sessões de acordo com o protocolo do estudo.

 

Conclusão

 

Dessa forma foi possível notar que na literatura não há uma única forma de aplicação de exercício para esta população, tanto exercícios resistidos quanto aeróbios resultam na melhora dos fatores decorrente da síndrome. De fato, sabe-se que o exercício físico tem proporcionado a diminuição das dores, melhora da qualidade de vida. Ainda assim se faz necessário a presença de mais estudos, com o objetivo de identificar o melhor momento de aplicação do exercício, tipo de exercício associado ao período de aplicação, bem como a prescrição de exercício que se mostra mais eficaz a esta população.

 

Referências

 

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