Rev Bras Fisiol Exerc
2019;18(4):195-208
ARTIGO ORIGINAL
Estereologia e morfometria do
tecido muscular-esquelético de animais submetidos a um programa de treinamento
de força e suplementação de creatina durante 9 semanas
Stereology and morphometry of the musculoskeletal tissue of animals
submitted to a strength training program and creatine supplementation for 9
weeks
Victor Augusto Ramos
Fernandes*, Felipe Lovaglio Belozo**,
Marcelo Conte***, Eduardo José Caldeira*
*Laboratório de
Morfologia dos Tecidos, Departamento de Morfologia e Patologia Básica,
Faculdade de Medicina de Jundiaí, Jundiaí/SP, **Faculdade Network, campus Nova
Odessa, Nova Odessa/SP, ***Escola Superior de Educação Física de Jundiaí,
Jundiaí/SP
Recebido em 16 de
setembro de 2019; aceito em 30 de dezembro de 2019.
Correspondência: Victor Augusto Ramos
Fernandes, Av. dos Expedicionários Brasileiros, 948, 13256-511 Itatiba SP
Victor Augusto Ramos
Fernandes: victorramosfernandes@gmail.com
Felipe Lovaglio Belozo:
flbelozo@yahoo.com
Marcelo Conte:
marcelo.conte.prof@gmail.com
Eduardo José Caldeira:
drdcaldeira@gmail.com
Resumo
A creatina pode
promover efeitos ergogênicos na prática do exercício
físico de alta intensidade, entretanto, são encontradas poucas evidências que
relatam a respeito dos efeitos morfométricos e estereológicos da associação desses componentes em modelos
experimentais. Para isso, foram selecionados 24 ratos Wistar
que se encontravam com idade de 15 semanas e estavam sob condições de
alimentação e hidratação controladas. Para verificar as modificações morfométricas e estereológicas
foi feita a classificação dos animais em quatro grupos: o controle,
suplementado, treinamento, e treinamento e suplementado. Os animais dos grupos
com suplementação de creatina foram suplementados (via gavagem)
nas dosagens de 300 mg/kg de massa corporal durante nove semanas, sendo o
período igual de treinamento que os animais que foram treinados estiveram
submetidos, com o programa de treinamento baseado nos estudos de Honenberg & Farrar. Após o
período de experimentação, os animais repousaram por 48 horas e foram feitas as
excisões dos músculos latíssimo do dorso e bíceps braquial, que posteriormente
foram submetidos ao protocolo de cortes histológicos em criostato, seguido da
coloração em hematoxilina e eosina. Os resultados morfométricos
indicaram poucas modificações da área nuclear para os grupos do experimento,
apresentando diferença estatística apenas no grupo treinado e suplementado em
relação aos outros grupos do estudo. A perimetria
sarcoplasmática foi mais evidente também no grupo submetido a ambos
tratamentos. A análise estereológica verificou a
presença de alguns fagócitos mononucleares no tecido muscular, sem, entretanto,
apresentar condições de inflamação tecidual severa. Conclui-se, portanto, que a
creatina apresenta efeitos morfométricos mais
evidentes quando associada ao treinamento de força.
Palavras-chave: exercício; creatina;
técnicas histológicas; anatomia e histologia.
Abstract
Creatine
may promote ergogenic effects in the practice of high intensity exercise.
However, there is little evidence to report on the morphometric and
stereological effects of the association of these components in experimental
models. Twenty-four Wistar rats, aged 15 weeks and under controlled feeding and
hydration conditions, were selected. To verify the morphometric and
stereological modifications, the animals were classified into four groups:
control, supplemented, training, and training and supplemented. Creatine
supplemented animals were supplemented (via gavage) at dosages of 300 mg/kg
body mass for nine weeks, and the same training period as the animals that were
trained performed a training program based on the studies of Honenberg & Farrar. After the experimentation period,
the animals rested for 48 hours and the latissimus dorsi and biceps brachii
muscles were excised, which were later submitted to the cryostat histological
section protocol, followed by hematoxylin and eosin staining. The morphometric
results indicated few modifications of the nuclear area for the groups of the
experiment, presenting statistical difference only the trained and supplemented
group in relation to the other groups of the study. Sarcoplasmic perimetry was
also more evident in the group undergoing both treatments. The stereological
analysis verified the presence of some mononuclear phagocytes in the muscular
tissue, without, however, presenting conditions of severe tissue inflammation.
We concluded, therefore, that creatine has more evident morphometric effects
when associated with strength training.
Keywords: exercise; creatine;
histological techniques; anatomy and histology.
Creatina ou ácido α-metil-guanidinoacético
é uma amina de ocorrência natural exclusiva de células eucarióticas [1].
Encontrada livremente no plasma sanguíneo, citoplasma celular ou fosforilada, nesse último caso, normalmente está na
mitocôndria ou em transição dessa organela para o citoplasma da célula [2].
A formação endógena de creatina ocorre por meio de uma
série de reações metabólicas que resultam nessa molécula [3]. Inicialmente, a
síntese se dá a partir dos aminoácidos arginina, metionina e glicina, processo
que envolve duas reações complementares [4]. Na primeira, a enzima glicina amidinotransferase (AGAT) cataliza
o aminoácido L-arginina, transferindo-o para a região amino terminal da
glicina. O resultado desta etapa é a formação de guanidinoacetato
e ornitina. A segunda etapa irá reunir a S-adenosilmetionina
ao metilato guanidinoacetato,
reação mediada pela enzima guanidinoacetato metiltransferase (GAMT). Ao final desta reação obtém-se
creatina e S-adenosil-homocisteína. A síntese
endógena ocorre nos rins e no pâncreas, devido à presença em grandes
quantidades da enzima AGAT. No fígado, observa-se elevada a presença de GAMT,
contudo pode ser diminuída em caso de consumo exógeno elevado de creatina [5].
Tal consumo é observado com frequência em atletas e
participantes de atividade e treinamentos que envolvem a utilização de força,
bem como o treinamento resistido, treinamento funcional, powerlifting,
levantamentos de pesos e outras modalidades que requerem essa valência física
[6]. A utilização exógena de creatina se dá por meio da suplementação,
normalmente da isoforma monoidratada,
nas dosagens recomendadas pelas pesquisas e pareceres internacionais, que
variam de 0,3 g a 0,5 g de creatina por quilograma de massa corporal [5-7]. Os
principais efeitos do consumo exógeno são melhoras ergogênicas
e aumento de força muscular, além de potenciais efeitos preventivos a lesões,
proteção das células neurais e termorregulação corporal [1-8].
A creatina é a principal molécula de transporte de
fosfato em meio intracelular [2]. Devido a isso, oferece a capacidade de
converter adenosina difosfato em adenosina trifosfato, por meio da ação
enzimática da creatina quinase [9]. Esse mecanismo confere ao músculo rápida
regeneração energética para atividades de alta intensidade e utilização de
força, próximas as capacidades máximas do indivíduo [10].
Genericamente, um homem de 70 quilos dispõe de 120 a
130mmol de creatina a cada quilo de massa corporal seca. Entretanto, ao fazer
uso do suplemento, os estoques podem chegar a 160mmol [5]. Alguns estudos
identificaram que dosagens altas de creatina disponível para as células
musculares beneficia a resistência muscular e a produção de torque [9,11-13].
Ainda, alguns autores pontuam que a creatina pode apresentar potenciais efeitos
anti-inflamatórios [14], fato que ainda não é conhecido por completo na literatura.
Não obstante, a disponibilidade aumentada de creatina para o tecido nervoso
apresenta melhoras funcionais e potencial efeito protetor [16].
Em uma perspectiva histórica, a creatina já foi
considerada um suplemento nocivo à saúde, principalmente aos rins [17].
Todavia, na atualidade estudos vão de encontro com os resultados das primeiras
observações a respeito da creatina, apresentando à comunidade científica que a
utilização do suplemento em dosagens recomendadas pelas entidades
internacionais apresenta estritamente efeitos positivos [17-20]. E em caso de
dosagens acima das recomendadas, é observado, frequentemente na literatura, um
aumento da atividade do transito intestinal. Os
prejuízos renais observados anteriormente, salvaguardado os casos de pacientes
que já apresentam ou apresentaram doenças nesse órgão [21], parece não ter
relações com o uso suplementar de creatina exógena [5,7].
Diante de uma vasta literatura a respeito do tema, bem
como dos avanços científicos que permitiram compreender os efeitos da creatina
em diversos sistemas, poucos estudos elucidam a relação do aumento do volume
celular de fibras musculares associadas ao uso do suplemento [22], fato esse
que representa uma lacuna no conhecimento acerca desta temática. O aumento da área
de secção transversa está diretamente associado a uma melhora da produção de
força [9] e diminuição da perda de massa muscular [11], além de maior produção
de torque [13]. Tais efeitos podem ser benéficos em muitas situações, desde
atletas que buscam melhoras de desempenho [1] até idosos que sofrem de doenças
degenerativas que afetam o sistema musculoesquelético [14].
Objetivo
Analisar os efeitos morfométricos
e estereológicos do uso de creatina monoidratada em associação ou não ao treinamento de força
no tecido musculoesquelético de animais da espécie Rattus
novergicus var. albinus
O presente estudo foi aprovado pelo comitê de ética em
pesquisa animal da Faculdade de Medicina de Jundiaí sob o parecer número
490/12. É válido salientar que todos os procedimentos aplicados seguiram os
protocolos de organizações de bons tratos aos animais e respeito aos modelos
experimentais, redigidos por entidades nacionais e internacionais de
regulamentação e ética em pesquisa.
Foram selecionados 24 animais da espécie Rattus novergicus var. albinus, do filo dos roedores e da classe dos mamíferos.
Esses animais foram organizados em quatro grupos, cada um com seis animais. O
grupo controle (GC) recebeu exclusivamente ração e água ad libitum 24 horas por
dia e com ciclo de 12/12 de luz. O grupo suplementado com creatina (GS) recebeu
o mesmo tratamento alimentar que o primeiro grupo, entretanto, três vezes
semanais (segundas, quartas e as sextas-feiras), durante nove semanas, recebeu
a suplementação de 0,3 g de creatina monoidratada por
quilograma de massa corporal (via gavagem). O grupo
treinamento (GT), assim como os outros grupos, teve a mesma dieta e padrão de
sono e claridade, todavia praticou as segundas, quartas e sextas-feiras,
durante nove semanas, um protocolo de treinamento de força, com aumento de
carga progressiva. O grupo treinamento e suplementação de creatina (GTS)
recebeu o tratamento do grupo GS em associação ao grupo GC, estabelecendo assim
um grupo que fez uso do suplemento e do treinamento durante o período de nove
semanas.
Após o período experimental, os animais repousaram por 48
horas e foram induzidos anestesicamente com etoxietano, promovendo ação depressora do sistema nervoso
central. Sequencialmente os mesmos foram eutanaziados em equipamento de CO2, evitando assim qualquer
sofrimento ao animal. Os tecidos musculares do bíceps braquial e do latíssimo
do dorso foram então retirados dos animais e seguiu-se o protocolo de estudo
histológico em hematoxilina e eosina, proposto por Fernandes et al. [15]
para verificação em microscópia de luz. Foram
utilizadas objetivas com aumento em 10, 40 e 100X. A morfometria foi realizada
por meio de uma ocular integradora, ocular quadriculada e morfometria
computadorizada feita pelo software Image Tool modelo
3.0 (desenvolvido pela UTHSCSA). A análise estatística foi conduzida no
software BioState (versão LE 6.9.1.0)
Com o objetivo de verificar as alterações morfométricas e estereológicas
frente ao uso do suplemento creatina monoidratada em
associação ou não ao treinamento de força, os núcleos e os citoplasmas dos
miócitos foram analisados. A seguir, os gráficos de 1 a 8 apresentam os
resultados observados. Posteriormente as imagens dos tecidos serão
apresentadas.
Morfometria da área
nuclear das fibras do músculo bíceps braquial em diferentes condições conforme
o protocolo experimental. O sinal *indica diferença estatística em relação ao
grupo controle. A análise estatística utilizada foi Anova
one way assumindo o p < 0,05
e com teste de verificação de Kruskal-Wallis para
cada grupo do experimento. Estatística realizada no software BioState (Versão LE 6.9.1.0)
Gráfico 1 – Área dos núcleos
das fibras musculo-esqueléticas do músculo bíceps
braquial
Após a análise morfométrica da
área nuclear, seguiu-se a verificação do perímetro desta importante organela eucariótica.
Nesse sentido, o gráfico dois apresenta os resultados observados.
A sinalização com *
indica diferença estatística em relação ao grupo controle. A sinalização com $
apresenta diferença estatística aos outros grupos do experimento. O tratamento
estatístico utilizado foi Anova one way assumindo o p < 0,05 e com teste
de verificação de Kruskal-Wallis para cada grupo do
estudo. Estatística realizada no software BioState
(Versão LE 6.9.1.0)
Gráfico 2 - Análise morfométrica do perímetro nuclear das fibras do músculo
bíceps braquial
Análise morfométrica da área sarcoplasmática das fibras do músculo
bíceps braquial dos grupos experimentais. A sinalização com * indica diferença
estatística em relação ao grupo controle. A sinalização com $ apresenta
diferença estatística aos outros grupos do experimento. O tratamento
estatístico utilizado foi Anova one
way assumindo o p < 0,05 e com teste de
verificação de Kruskal-Wallis para cada grupo do
estudo. Estatística realizada no software BioState
(Versão LE 6.9.1.0)
Gráfico 3 – Área
sarcoplasmática das fibras músculo-esqueléticas do
músculo bíceps braquial
As análises morfométricas do
núcleo celular devem ser sempre acompanhadas das análises morfométricas
citoplasmáticas [15], nesse sentido, buscando estabelecer relações entre as
duas regiões celulares mais evidentes em microscopia de luz. Assim, os próximos
gráficos (três e quatro) ilustram as observações do sarcoplasma dos miócitos
dos grupos deste estudo.
Análise morfométrica do perímetro sarcoplasmático das fibras do
músculo bíceps braquial. A sinalização com * indica diferença estatística em
relação ao grupo controle. O tratamento estatístico utilizado foi Anova one way
assumindo o p < 0,05 e com teste de verificação de Kruskal-Wallis
para cada grupo do estudo. Estatística realizada no software BioState (Versão LE 6.9.1.0)
Gráfico 4 – Perímetro
sarcoplasmático das fibras musculo-esqueléticas do
músculo bíceps braquial
Em conjunto com a morfometria foi realizada a análise estereológica, que consiste em observar as condições
teciduais e as modificações frente aos diversos tratamentos propostos neste
estudo. Assim, as imagens a seguir apresentam a esterologia
do músculo bíceps braquial.
Figura 1 - Grupo controle do
estudo. A1 apresenta corte histológico do músculo bíceps braquial dando maior
atenção a região estromal do tecido (seta). Aumento
de 10X. A2 apresenta o corte histológico do músculo bíceps braquial com grande
área de tecido muscular, aumento de 10X. A3 apresenta o corte histológico do
bíceps braquial com aumento de 40X. Identificados em roxo os núcleos celulares
e em vermelho ou roseado os citoplasmas
Figura 2 - Grupo suplementado
com creatina monoidratada. A1 apresenta corte
histológico do músculo bíceps braquial em objetiva de 10X, assim como o quadro
A3 (que identifica pela seta a área estromal). A2
apresenta o corte histológico com aumento de 40X e identifica uma região de
sustentação do tecido muscular, área de estroma (seta), próximo a fibra (cabeça
de seta)
Figura 3 - Grupo treinamento
de força. A1 apresenta o corte histológico do bíceps braquial em aumento de
10X, assim como o quadro A3. A seta no quadro A3 identifica uma região de
intensa atividade de células do sistema fagocitário mononuclear, próximos ao
lúmen de uma artéria. A2 identifica o corte com aumento de 40X e a seta
apresenta um núcleo da fibra muscular
Figura 4 - Grupo treinamento
e suplementados com creatina monoidratada. A1
identifica o corte histológico do bíceps braquial com aumento de 40X. A2 e A3
estão apresentando o corte com aumento de 10X. A seta em A3 identifica uma
região com intensa atividade de células do sistema fagocitário mononuclear, em
área estromal
Os resultados observados nos músculos
latíssimo do dorso foram diferenciados dos observados no músculo bíceps
braquial. Os gráficos a seguir expressam as observações das áreas e perímetros
nucleares e, posteriormente, sarcoplasmáticos.
Análise morfométrica da área nuclear das fibras do músculo
latíssimo do dorso dos grupos experimentais. A sinalização com * indica
diferença estatística em relação ao grupo controle. O tratamento estatístico
utilizado foi Anova one way assumindo o p<0.05 e com teste de verificação de Kruskal-Wallis para cada grupo do estudo. Estatística
realizada no software BioState (Versão LE 6.9.1.0).
Gráfico 5 – Área dos núcleos
das fibras musculo-esqueléticas do músculo latissimo do dorso
A análise morfométrica do
perímetro nuclear das fibras do latíssimo do dorso indicaram que esse músculo
se comportou de modo diferente do bíceps braquial. O gráfico 6 ilustra essa
observação.
Análise morfométrica do perímetro nuclear das fibras do músculo
latíssimo do dorso dos grupos experimentais. A sinalização com * indica
diferença estatística em relação ao grupo controle. O tratamento estatístico
utilizado foi Anova one way assumindo o p < 0,05 e com teste de verificação de Kruskal-Wallis para cada grupo do estudo. Estatística
realizada no software BioState (Versão LE 6.9.1.0).
Gráfico 6 - Perímetro dos núcleos
das fibras musculo-esqueléticas do músculo latissimo do dorso
Conforme mencionado
anteriormente, se faz necessária a comparação morfológica entre os núcleos e também entre os citoplasmas, que nesse estudo se trata do
sarcoplasma, em estudos envolvendo a microscopia de luz. Nesse sentido, os
gráficos sete e oito apresentam esses resultados.
Análise morfométrica da área sarcoplasmática das fibras do músculo
latíssimo do dorso dos grupos experimentais. A sinalização com * indica
diferença estatística em relação ao grupo controle. O tratamento estatístico
utilizado foi Anova one way assumindo o p < 0,05 e com teste de verificação de Kruskal-Wallis para cada grupo do estudo. Estatística
realizada no software BioState (Versão LE 6.9.1.0)
Gráfico 7 – Área
sarcoplasmática dos núcleos das fibras musculo-esqueléticas
do músculo latissimo do dorso.
Análise morfométrica da área nuclear das fibras do músculo
latíssimo do dorso dos grupos experimentais. A sinalização com * indica
diferença estatística em relação ao grupo controle. O tratamento estatístico
utilizado foi Anova one way assumindo o p < 0,05 e com teste de verificação de Kruskal-Wallis para cada grupo do estudo. Estatística
realizada no software BioState (Versão LE 6.9.1.0)
Gráfico 8 – Perímetro
sarcoplasmático dos núcleos das fibras musculo-esqueléticas
do músculo latissimo do dorso
Posteriormente às análises morfométricas,
o estudo da estereologia tecidual foi conduzido. As
imagens a seguir apresentam o comportamento e as condições musculoesqueléticas
frente aos tratamentos experimentados nesta pesquisa, no músculo latíssimo do
dorso.
Figura 5 - Grupo controle,
cortes transversais do músculo latíssimo do dorso. A1 apresenta área muscular
próxima do tecido estromal (evidenciado pela seta
branca). A2 apresenta a região ventral do músculo. Cabeças de setas indicam o endomísio revestindo as fibras musculares. As setas pretas
apontam para os núcleos periféricos do latíssimo do dorso. Objetiva de 40X
Figura 6 - Grupo Creatina,
cortes transversais do músculo latíssimo do dorso. A1 apresenta área muscular
com intensa atividade de células do sistema fagocitário mononuclear (círculo
branco), região estromal apontada pela seta branca e
pela cabeça de seta preta o endomísio. As setas
pretas indicam os núcleos periféricos do latíssimo do dorso. A2 apresenta uma
área do ventre muscular. Objetiva de 40X
Figura 7 - Grupo
Treinamento, cortes transversais do músculo latíssimo do dorso. A1 apresenta
ventral do músculo. O círculo branco evidencia área com células do sistema fagocitário
mononuclear. Setas pretas aponta para os núcleos periféricos. O quadro A2
apresenta região associada a lamina de tecido
conjuntivo, sendo indicada pela seta branca. Objetiva de 40X
Figura 8 - Grupo treinado e
suplementado com creatina, cortes transversais do músculo latíssimo do dorso. A1
apresenta região muscular com associação ao tecido estromal
sendo indicado pela seta branca. A seta preta, tanto em A1 quanto no quadro A2,
aponta para os núcleos celulares periféricos das fibras musculares. A cabeça de
seta em A2 indica o endomísio e a seta branca indica
o perimísio. Objetiva de 40X
Portanto, os resultados morfométricos
indicaram uma diferenciação das condições nuclear e sarcoplasmática entre os
grupos do experimento. Além disso, num comparativo entre os músculos
analisados, também houve diferenças, apesar de ambos pertencerem ao mesmo
sistema. Ainda, a presença de algumas células fagocitárias mononucleares
persistentes após 48 horas de treinamento também são fatores que devem ser
levados a discussões, haja vista a relação entre o reparo tecidual e a presença
dessas células.
O tamanho nuclear e suas características são fatores
fundamentais no diagnóstico patológico e no entendimento do comportamento
celular em um determinado momento [22]. Entretanto, a maior parte dos estudos
que investigam a morfologia desta organela se concentram em aspectos
qualitativos, deixando os quantitativos em segundo plano [23]. O mesmo é válido para outras regiões celulares, tal qual o
citoplasma ou, como no caso da presente pesquisa, o sarcoplasma [24].
Nas
ciências que investigam os fenômenos esportivos, há
uma concentração maior dos pesquisadores na área
molecular e seus efeitos
observáveis frente as diferentes práticas de treinamento
e atividade física
[25-30]. Não obstante, poucos pesquisadores desse segmento
aprofundam os
estudos nas modificações morfológicas e no uso de
técnicas histológicas para a
verificação de tais alterações, em especial
na Educação Física, profissão que
tem grande interesse pelas descobertas dos efeitos do exercício
no organismo
[31].
No presente estudo se deu preferência, portanto, aos
aspectos quantitativos e qualitativos, buscando assim preencher algumas lacunas
do conhecimento acerca desta temática.
Os resultados observados, no que diz respeito ao núcleo
celular do músculo bíceps braquial, mostraram que o tratamento com creatina monoidratada, feito no GS, durante o período de nove
semanas via gavagem três vezes semanais, aumentou a
área nuclear em 0,46 µm, em comparação ao grupo controle. Todavia, o
treinamento praticado pelo grupo três também modificou a área nuclear,
aumentando-a em aproximadamente 0,52 µm, em comparação ao grupo controle. Mas a
modificação morfométrica mais evidente nessa variável
analisada se deu no grupo que foi suplementado e executou o programa de
treinamento ao longo do período de nove semanas, com 0,57 µm de aumento.
Esses aumentos também são observados no perímetro
nuclear, fato que pôde ser expresso em 1,14 µm para o grupo creatina, 1,22 µm
para o grupo treinamento e 2,84 µm para o grupo treinamento e suplemento, de
aumento dessa variável.
É importante destacar que o grupo treinamento e
suplementação com creatina (grupo GTS) apresentou valores que,
estatisticamente, significaram maior expressividade e diferenciados que os demais
grupos do estudo, além do grupo controle. Esse resultado permite inferir que os
tratamentos empregados nesta pesquisa, quando utilizados em conjunto, resultam
em modificações morfométricas do núcleo celular das
fibras do bíceps braquial de maneira efetiva.
Esse achado pode complementar as informações obtidas em
outros estudos, por exemplo, o que foi realizado por Torok
et al. [32], no qual verificam os efeitos da suplementação de creatina
antes do uso de doxorubicin em ratos machos. É válido
destacar que o doxorubicin se trata de um medicamento
utilizado no controle de alguns tipos de câncer e tem como efeito colateral
aumento da fadiga e fraqueza muscular [32]. Diante disso, os pesquisadores
avaliaram os potenciais efeitos atenuantes da creatina frente ao uso desse
medicamento. Os resultados apresentados evidenciaram que o uso do suplemento
diminuiu a fadiga do músculo sóleo dos animais e
atenuou a perda da força de pressão da pata dos animais que foram submetidos ao
tratamento com doxorubicin.
Ao se comparar os achados de Torok
et al. [32] com os resultados observados na presente pesquisa,
salvaguardados os modelos experimentais, pode-se inferir uma linha de relação
entre o aumento da área nuclear e do perímetro dessa organela com a melhora da resistência
a fadiga observada pelos pesquisadores. Se conhece, desde os anos de 1985, com
o advento dos avanços das pesquisas a respeito do ciclo celular, que no núcleo
de uma célula eucariota há vasta quantidade de material genético que controla a
síntese de proteínas com as mais diversas finalidades, desde estruturação,
transporte até atividade metabólica da célula, e que em núcleos interfásicos
com grande atividade de síntese proteica, a organela tende a aumentar o seu
tamanho [33]. Logo, a utilização de creatina monoidratada
poderia estimular a síntese de algumas proteínas que são elementares no aumento
ou desenvolvimento da força das fibras musculares [34].
A exemplo disso, Gualano et
al. [35] identificaram, através de uma revisão sistemática da literatura,
que a utilização de creatina monoidratada como
suplemento alimentar pode alterar a transcrição de ácidos ribonucleicos
regulatórios da miogênese, além disso, o uso de
creatina também poderia contribuir com uma maior tradução proteica que resulta
em aumento do volume celular, tais como a fosfatidil
inositol-3-quinase, proteínas quinase B, a proteína alvo de rapamicina
de mamíferos do tipo II, dentre outras.
A principal dúvida que surge diante dos efeitos ergogênicos da creatina monoidratada
é se o uso dessa molécula apresenta tais modificações moleculares, e como
observado na presente pesquisa histológicas, mesmo sem a prática do exercício
físico. Diante disso, os gráficos 1 e 2 podem ilustrar os resultados
observados, nos quais foram comparados o uso desse suplemento com e sem o
programa de treinamento de força.
A área e o perímetro nuclear do grupo apenas suplementado
com creatina, ou seja, o grupo dois, obteve valores menores que o grupo
treinado exclusivamente. Todavia, os resultados observados na área e no
perímetro citoplasmático do grupo apenas suplementado foram maiores que o grupo
treinado, grupo três. Tais observações corroboram resultados de outros estudos
que identificaram que o uso isolado da creatina aumenta diversas vias proteicas
que estão predominantemente localizadas no citoplasma celular, principalmente
as que necessitam do transporte de fosfato para sua atividade [35]. Porém, como
já é de conhecimento amplamente difundido, o exercício físico é um potente
agente epigenético, que potencializa a transcrição genética e por consequência
leva ao aumento da atividade nuclear [36]. Fato esse que pode ser observado na
presente pesquisa por meio do aumento da área e perímetro dessa organela.
Diante dos resultados observados e da literatura
disponível a respeito desse tema, pode-se inferir que os efeitos ergogênicos da creatina, pelo menos no que diz respeito as
modificações morfométricas do núcleo do bíceps
braquial de ratos precisam estar associados a prática do treinamento de força.
Os resultados dos músculos latíssimos do dorso que foram
removidos dos animais organizados nos grupos do experimento foram tão
interessantes quanto os do bíceps braquial. É válido destacar que, apesar de
ambos os tecidos extraídos serem músculos estriados esqueléticos, o bíceps
braquial é composto predominantemente por fibras paralelas que se inserem em um
único tendão fusiforme, fato esse que leva a um comportamento mecânico
diferenciado do latíssimo do dorso, que se trata de um vasto músculo com
fixações em locais diferentes (processos espinhosos, transversos e corpos
vertebrais de vértebras torácicas e lombares; crista ilíaca e fáscia toracolombar), além de possuir fibras com trajetos oblíquos
em algumas partes desse músculo, logo o comportamento mecânico dele é
particularizado e reconhecido de modo diferente do bíceps braquial [37].
Todavia, ambos os músculos estão envolvidos no movimento de escalada realizado
pelos animais no protocolo de treinamentos proposto nesta pesquisa, sendo uma
análise complementar e, em perspectivas mecânicas, diversificada.
No músculo latíssimo do dorso foram menos significativas
as diferenças entre os grupos para as variáveis área e perímetro nuclear,
estando apenas o grupo quatro, treinamento e creatina, com diferenças observáveis.
Isso valendo para a área e perímetro citoplasmático. Esse resultado corrobora
as identificações descritas acima, a respeito de que os efeitos da
suplementação de creatina serão melhor aproveitados se
estiverem associados a prática de exercícios.
É importante destacar que um músculo produz torque ao
longo de todo o seu comprimento, bem como na região musculotendínea
que também sofre os efeitos do tracionamento provocado inicialmente na área
ventral do músculo [38-40]. Diante disso, toda a região muscular apresenta-se
com uma área de secção transversa adaptada na produção do torque [41].
Um fator que também deve ser levado em consideração
diante dos resultados promissores observados na presente pesquisa é que o uso
da creatina em associação ao treinamento, mostrou-se mais eficiente que o uso
isolado na molécula ou apenas do treinamento, no que diz respeito as
modificações morfométricas nucleares e
citoplasmáticas do bíceps braquial e do latíssimo do dorso, bem como as
estimativas de produção de tensão muscular desses músculos. Sabe-se que quanto
mais forte o músculo, maior será também a magnitude da contração isométrica
desse [39,41,42]. Nesse sentido, o aumento da área de secção transversa está
intimamente relacionado ao aumento da força muscular, além de ter sido
comprovado por muitos estudos que a creatina potencializa os ganhos dessa
valência, percebe-se por essa via, portanto, que o uso de creatina e do
exercício resistido pode ser uma alternativa eficiente no tratamento
complementar da perda de força e massa magra em idosos ou em doenças
degenerativas, por exemplo [14]. Somado a isso, constata-se uma grande lacuna
do conhecimento no que diz respeito as modificações imunológicas causadas pela
associação das terapias experimentadas nesta pesquisa, fato que deve ser
profundamente estudado, haja vista as recentes observações de que o exercício é
um importante agente no avanço da imunossenescência
[43].
Conclui-se, diante dos resultados e da literatura sobre o
tema já produzida, que a creatina monoidratada em
associação ao treinamento produz modificações morfométricas
no núcleo celular e no citoplasma das fibras musculares de ratos, de maneira
mais eficiente que o suplemento ou o treinamento
administrados isoladamente.
Os autores agradecem ao apoio financeiro
oferecido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(CAPES) e ao Núcleo de Pesquisa e Pós-Graduação da Faculdade de Medicina de
Jundiaí (NAPED/FMJ).