Raça e desempenho atlético

Autores

  • Paulo Farinatti UERJ
  • Jean Louis Peytavin Atlantica Editora

DOI:

https://doi.org/10.33233/rbfe.v11i3.3394

Resumo

Quando o francês Christophe Lemaître correu os 100 metros rasos em menos de 10 segundos pela primeira vez em 2010 (9"™98"), o mito da superioridade negra em corridas de velocidade foi questionado. Rapidamente, apareceram pesquisas mostrando que Lemaître possuiria genes idênticos aos de Usain Bolt e que, fisicamente, poderia ser assimilado a um corredor senegalês pelo comprimento dos membros inferiores. Mas todas essas comparações revelaram-se irrelevantes: os famosos genes que se exprimiam em Usain Bolt e outros velocistas existiriam também em corredores quenianos de fundo. Além disso, comparar Lemaître a um senegalês soa pelo menos estranho, já que nunca um corredor daquele paí­s alcanço marcas inferiores a 10 segundos. Temos que voltar ao fato fundamental: a superioridade negra não é uma questão de raça, mas de grupos bem especí­ficos, composto basicamente de Afro-Americanos e Jamaicanos. A superioridade inata seria menos importante que fatores extrí­nsecos, como investimento, seleção e treinamento.

Voltando í  África, a mesma lógica usualmente aplicada aos velocistas poderia ser aventada a corredores de fundo e meio-fundo do Quênia ou Etiópia, os quais monopolizam recordes e lideram campeonatos há 30 anos? Existiria uma superioridade de negros oriundos do Oeste da África? Nesse sentido, dentre os artigos incluí­dos nesta edição da RBFEx, comentamos o interessante estudo elaborado por José Augusto Rodrigues dos Santos e Tânia Amorim, da Universidade do Porto (Portugal). Os autores produziram uma revisão exaustiva sobre o assunto, na qual analisam variáveis biológicas (genéticas, antropométricas, fisiológicas, morfológicas) e sócio-ambientais, como a nutrição e o estilo de vida, quanto í  sua influência sobre os resultados desses corredores.

É interessante notar que, no estado atual do conhecimento, os fatores que melhor explicariam o sucesso dos corredores africanos de fundo, novamente recairiam sobre particularidades relacionadas ao treinamento (recuperação e sono, esforços de intensidade maior que concorrentes caucasianos etc.) e aspectos psicológicos, como a vontade de ganhar e certa aura de invencibilidade, que serviria como reforço positivo.

Desvaloriza-se a questão genética como determinante de resultados atléticos, o que, certamente, será objeto de estudos cada vez mais aprofundados, no que tange ao mapeamento de caracterí­sticas que favorecem certos tipos de desempenho, mas também ao valor relativo dessa informação no campo da aplicação prática. Afinal, em que pesem aspectos éticos a serem discutidos, até que ponto o aspecto genético poderia ser manipulado e, principalmente, em que medida isso valeria a pena, dada a influência de outros fatores para produzir rendimento de alto ní­vel. Pode-se fazer uma analogia com o aforismo atribuí­do a Winston Churchill, "a sorte não existe, é um conjunto de pequenos detalhes". Isso parece se aplicar ao desporto de elite – ter a sorte de nascer com os "genes certos" seria suficiente para produzir um atleta?

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Publicado

2021-04-09