Fragilização do cuidado e sofrimento moral
DOI:
https://doi.org/10.33233/eb.v11i2.3789Abstract
A prática de cuidados de saúde é uma atividade moral, já que o modo como os profissionais desempenham seu papel tem implicações morais [1]. A temática da governabilidade na enfermagem é uma questão fortemente articulada aos valores, í moral e í ética, assim como ao exercício de poder dos sujeitos envolvidos e í própria constituição de sujeitos na sociedade.
A formação profissional da enfermagem está dirigida para a importância de uma prática ética, o que implica a ênfase para um permanente enfrentamento de problemas éticos e morais nos ambientes de trabalho, ou seja, da incerteza moral, de dilemas morais e do sofrimento moral [2]. Vivenciar situações de dilema moral pode provocar sofrimento moral, pois as trabalhadoras de enfermagem sabem o que é correto e o que deveriam fazer, porém, se deparam com diferentes obstáculos, sejam institucionais, como falta de tempo, relutância das chefias, constrangimentos legais ou barreiras relacionadas ao poder médico, sejam por dificuldades individuais de enfrentamento da situação [3], o que pode comprometer moralmente sua atuação. O sofrimento moral na prática da enfermagem foi descrito, inicialmente, como um desequilíbrio psicológico ocasionado por sentimentos dolorosos que ocorrem, quando as trabalhadoras de enfermagem não podem executar ações moralmente adequadas, segundo suas consciências [2].
Assim, a fragilização do cuidado de enfermagem pode ser importante fonte de sofrimento moral, associada a questões relacionadas í organização do trabalho, í sua humanização e ao exercício de poder no trabalho. Quando o sofrimento moral se faz presente, o impacto para o doente pode ser a falta de advocacia por parte da enfermagem e situações em que as trabalhadoras evitam o contato com ele, causando um aumento no desconforto e no próprio sofrimento do paciente frente í doença e ao tratamento [4].
Para as trabalhadoras de enfermagem, o sofrimento moral pode estar associado ao abandono da profissão ou, o que pode ser até mais prejudicial, a sua continuidade de atuação na área da Enfermagem, mas com o possível abandono dos valores da profissão por parte dessas trabalhadoras. Assim, compreender a problemática do sofrimento moral é relevante para desvelarmos um fenômeno bastante presente na prática da enfermagem, embora ainda pouco reconhecido, e que pode estar se naturalizando como parte da profissão, com consequências não apenas para as trabalhadoras como para os que vêm sendo por elas cuidados.
No entanto, tão importante quanto compreender e explorar esse fenômeno são necessárias ações coordenadas dos órgãos formadores e de fiscalização do exercício profissional, assim como das próprias trabalhadoras de enfermagem para o seu fortalecimento como sujeitos moralmente comprometidos com ações de cuidado do outro, com a construção e implementação de estratégias de enfrentamento dos problemas morais e éticos e, consequentemente, do sofrimento moral para evitarmos uma aparente normalização deste fenômeno na enfermagem.
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References
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