Trabalho, estresse e corpo
DOI:
https://doi.org/10.33233/eb.v18i1.2815Resumo
Poderíamos afirmar, sem medo de cometer um erro grosseiro, que uma das questões muito discutidas atualmente, em vários ramos do conhecimento, seja a questão do estresse. Discussões í parte, acerca de seu conceito e de sua comprovação científica, podemos dizer que o senso comum costuma usar sempre a palavra estresse para referir-se a sensações de fadiga, mal humor e tantas outras sensações de natureza semelhante. E um consenso também é observado no que se refere às implicações que o estresse provoca no corpo, podemos aqui abrir um viés e considerar o corpo, não exclusivamente como um corpo biológico, mas os aspectos subjetivos que envolvem seu conceito [1].
Segundo a literatura especialista no tema, ao nos referirmos ao estresse, este pode ser de natureza psicológica, emocional e social e que em excesso pode provocar adoecimento. Portanto, o corpo padece í medida que estamos "estressados".
No que concerne í atribuição de causas do acometimento do estresse, podemos afirmar que o trabalho lidera o ranking. Por razões já bem conhecidas, tais como jornadas excessivas, condições precárias, salários baixos entre outras tantas questões legadas pelo modelo econômico neoliberal que impõe como meta para a vida relações pautadas na disputa, em que o trabalho está para além de realização pessoal, estabelece, outrossim, relações mercadológicas de dominação de cunho econômico e político [2]. Aceitando a sua centralidade í vida, admitindo que a visão marxista seja correta, o trabalho distingue o homem dos demais animais, uma vez que o homem planeja, para posteriormente executar [3].
Assim, o trabalho realiza uma relação peculiar, um pensamento, um planejamento, transforma-se em ação, que modifica, que interage com o mundo, com a realidade [4]. Uma ideia, um pensamento para se objetivar necessita de um corpo, não se pode experimentar uma sensação de estresse, por exemplo, sem um corpo que padeça, que experimente esse sofrimento. É o corpo o lugar de inscrição de nossas experiências, experiências de mundo e experiências de nós mesmos, enquanto singularidade, que reflete, que inventa, que crê, que sofre.
É com o corpo que o homem pode habitar o mundo e o transforma por meio do trabalho, por vezes transgredindo seus limites. Então, através do trabalho, o indivíduo pode realizar-se mediante um conflito de sofrimento e prazer. Se nessa relação aparecem patologias, ou estados que possam conduzir a um desequilíbrio, saúde-doença, como o estresse, nos impõe buscar caminhos para sua compreensão e possíveis soluções, ou amenizações de suas causas. O estudo da corporeidade se afigura como basilar a essa tarefa. A perspectiva de uma experimentação de si, enquanto corpo que percebe o mundo, que vive na carne este mundo, pode conduzir a orientações acerca de autocontrole, relaxamento, motivação que possivelmente amenizem o estresse. Mas, não como algo que se contamine as exigências de mercado, que se submeta as dominações de poder e seus artifícios de manutenção, sejam nas relações macro ou micro. O que se impõe é a compreensão de si, não como um corpo que tenho, mas como um corpo que sou, um corpo vivo.
E quem sabe assim, na medida em que se problematize esse olhar sobre o corpo, a rejeição a uma visão coisificada do homem, tão comum nas relações de trabalho, possa ser refutada, uma vez que as representações sociais de corpo possam se modificar e substituir a visão biologicista, dualista, hegemonicamente aceitas.
Referências
Sartre JP. O ser e o nada: ensaio de ontologia e fenomenologia. Rio de Janeiro: Vozes; 1997.
Foucault M. MicrofÃsica do poder. São Paulo: Graal; 2011.
Antunes R, org. A dialética do trabalho: escritos de Marx e Engels. São Paulo: Expressão Popular; 2004.
Arvon H. A filosofia do trabalho. Lisboa: Coleção Fermento; 1961.