A cesariana em microrregião do interior paulista: uma realidade assustadora

Autores

  • Luciana Braz de Oliveira Paes FAMERP
  • Zaida Aurora Sperli Geraldes Soler FAMERP

DOI:

https://doi.org/10.33233/eb.v15i6.713

Resumo

A resolução do parto por cesárea constitui-se em problema amplamente discutido no Brasil e na região que abrange uma microrregião do estado de São Paulo - da Divisão Regional de Saúde XV (DRS XV),  já que inclui municí­pios com os maiores í­ndices de cesárea do Brasil e, consequentemente, do mundo. Como em outras localidades brasileiras, várias questões são aventadas para explicar os í­ndices abusivos de cesárea nesta região paulista, em especial nos setores de saúde suplementar e em ní­vel particular.

Ocorre o desrespeito às indicações obstétricas e as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), que desde 1985 publicou que não há justificativa para í­ndices superiores a 10-15%, em qualquer paí­s, estado, região, municí­pio ou instituição de saúde. Recentemente, pela Portaria Nº 306, de 28 de março de 2016, foram aprovadas as "Diretrizes de Atenção í  Gestante: a operação cesariana", definindo a taxa de cesariana no Brasil entre 25%-30%.

Na microrregião em foco não temos tais taxas de partos normais nem no sistema público de saúde (SUS), evidenciando-se um aumento crescente nas taxas de cesariana, muitas vezes induzindo-se a mulher e famí­lia para conseguir meios financeiros para financiamento desta cirurgia. Que se dirá, então, do sistema privado de atenção em obstetrí­cia, com í­ndices que se aproximam de 99% de nascimentos por cesariana.

Vale apresentar o perfil das mulheres que realizam a cesárea, a maioria de forma eletiva: faixa etária de 20 a 34 anos; 6 a 7 consultas de pré-natal; casadas ou com companheiro; maior ní­vel de escolaridade e de recursos financeiros; sem problemas obstétricos.

É preocupante verificar que o maior acesso ao pré-natal não reduziu o número de cesarianas, que esta cirurgia teve um aumento progressivo e se tornou quase absoluta no setor privado de atenção obstétrica; que estão aumentando os í­ndices de cesárea no SUS e mesmo com todas as evidências, há dificuldades de atuação do enfermeiro obstetra.

As publicações cientí­ficas sobre este assunto são unânimes em destacar a cesariana eletiva como uma vergonha nacional e sobre a necessidade de ações e intervenções para coibir essa prática e de promover a formação e (re)inserção da enfermagem obstétrica, com vistas í  humanização do nascimento e alcance de maiores í­ndices de parto normal.

Dados de pesquisa em todo o paí­s mostram a influência médica e familiar na decisão pela cesárea, os fatores socioeconômicos que são decisivos para sua indicação e realização e a precariedade da assistência pré-natal. Interagem e se emaranham interesses econômicos, corporativistas de conveniência/interesse/poder médico e a "preferência" da mulher.

Emerge neste contexto as lacunas na qualidade da assistência ao nascimento que revelam caminhos de violência obstétrica, da medicalização que negligencia ou impede o trabalho em equipe, o abuso de intervenções e de uso de tecnologias desnecessárias e também a não valorização ou desvalorização da participação do enfermeiro obstetra na condução do trabalho de parto ao menos. Como explicar a perpetuação de uma prática em um paí­s com tantos problemas na atualidade, não permitindo ações humanizadoras que desonerariam a atenção obstétrica e devolveriam ou propiciariam í  mulher o protagonismo do parto. Legislações neste aspecto existem em grande número, mas são descumpridas sem maiores responsabilizações.

Percebe-se que o momento atual de resolução do parto na região da DRS XV estudada é mais crí­tico do que seria possí­vel imaginar e que é preciso juntar forças para modificação de comportamentos e usar de estratégias que viabilizem resultados alentadores, com foco na humanização do nascimento.

São necessárias estratégias e ações a serem implementadas embasadas em pesquisas sobre questões sociais, econômicas, possibilidades de espaços de atuação, agentes envolvidos e determinação das competências de cada um, deixando claro o que é privativo e o que é compartilhado e que a mulher/famí­lia são os protagonistas nesse contexto. Cabe não esmorecer na luta pela enfermagem obstétrica: a cada um o seu papel, a todos a responsabilidade do agir profissional ético, legal e humaní­stico.

Biografia do Autor

Luciana Braz de Oliveira Paes, FAMERP

Enfermeira Obstetra, Mestranda Programa Pós Graduação em Enfermagem da FAMERP, Docente de Curso de Graduação em Enfermagem FIPA, Coordenadora da enfermagem obstétrica do Hospital Padre Albino

Zaida Aurora Sperli Geraldes Soler, FAMERP

Obstetriz, enfermeira, livre-docente em enfermagem obstétrica, docente e orientadora da graduação e pós-graduação na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP), organizadora e coordenadora geral do Curso de pós-graduação em Enfermagem Obstétrica na FAMERP; Coordenadora Geral do Mestrado Acadêmico – Programa Enfermagem, FAMERP

Referências

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Publicado

2016-12-26