Sí­ndrome de Williams-Beuren: história contada de experiência vivida

Autores

  • Ana Lúcia Fernandes Farias Ricci Marques FAMERP

DOI:

https://doi.org/10.33233/eb.v16i2.993

Resumo

Neste Editorial busco apresentar o que considero uma ou mais uma "lacuna" na atenção em saúde em nosso meio – a assistência a portadores de doenças raras e a orientação í  famí­lia, seus pais, principalmente. As doenças raras não são tão raras quanto se imagina e em muitos casos o tratamento médico e de outros profissionais não ambiciona a cura.

No caso das sí­ndromes genéticas, geralmente o tratamento se limita a cuidados básicos de vida diária e uso de terapias auxiliares/complementares/alternativas, com vistas a melhorar a qualidade de vida dos pacientes, seja no contexto familiar, seja em núcleos sociais a começar pela própria famí­lia e, quando possí­vel, também a escola, clubes e outros espaços públicos.

Sou biomédica e enfermeira e mãe de uma criança, hoje com 11 anos, acometida por uma doença rara, a Sí­ndrome de Williams-Beuren. Tenho buscado desde o diagnóstico o que poderia fazer para ajudar meu filho a integrar-se da melhor forma possí­vel í  vida social e familiar.

Esta trajetória pessoal me levou í  pesquisa dos cuidados e terapias auxiliares no tratamento de doenças raras, especialmente das sí­ndromes genéticas, iniciando com uma pós-graduação em psicopedagogia. O passo mais recente foi minha associação ao grupo de pesquisa Nemoreges (Núcleo de Estudos sobre Morbidade referida e gestão em saúde), iniciado e dirigido pela Profª. Dra. Zaida AS Geraldes Soler, no intuito de buscar qualificação acadêmica que encontrar e/ou desenvolver materiais de referência que facilitem a vida dos pais e orientem os profissionais de saúde sobre o melhor procedimento a ser adotado nestes casos.

A partir deste ano estou me inserindo como aluna especial na pós-graduação, em ní­vel de mestrado, para aprofundar conhecimentos, desenvolver pesquisas e fazer divulgações sobre tal sí­ndrome, tomando como ponto de partida o crescimento e desenvolvimento de meu filho. Quem sabe o que será possí­vel alcançar... no mí­nimo beneficiarei minha famí­lia, meu filho e outros pais e crianças com doenças raras.

Durante o II Congresso Iberoamericano de Doenças Raras, realizado em 2016, na cidade de Brasí­lia, veio í  tona a informação de que o número estimado de pessoas com doenças raras no Brasil é de 13 milhões. Este número é maior do que a população da cidade de São Paulo que, segundo dados do IBGE atualizados em 2016, é de 12 milhões de pessoas, sendo considerada atualmente a terceira maior cidade do mundo! Todas estas pessoas se encaixam no conceito adotado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que indica como doença rara aquela que atinge até 65 pessoas a cada 100 mil indiví­duos, ou seja, apenas 1,3 paciente numa população de 2 mil pessoas.

 No universo de doenças raras, estão as sí­ndromes genéticas, algumas já bastante conhecidas como a Sí­ndrome de Down e outras que carecem de informação e pesquisa como a Sí­ndrome de Williams-Beuren. Esta sí­ndrome afeta gravemente o desenvolvimento cognitivo, comportamental e motor desde a mais tenra infância e geralmente é acompanhada também de anomalias fí­sicas, sendo mais comuns a mal formação cardí­aca e problemas do trato renal.

O nome atribuí­do í  sí­ndrome vem de dois profissionais que primeiro identificaram o conjunto de sintomas que caracterizam a doença, os médicos J. C. P. Williams, da Nova Zelândia, e o alemão A. J. Beuren. A sí­ndrome é diagnosticada em laboratório pelo exame de hibridação in situ por fluorescência FISH (sigla inglesa para Fluorescent In Situ Hybridization) ou ainda em consultório pelo fenótipo caracterí­stico: nariz pequeno e arrebitado, cabelo encaracolado, lábios cheios, dentes pequenos e sorriso frequente.

A raridade da sí­ndrome faz com que muitos familiares convivam com a doença sem obterem o correto diagnóstico e, em decorrência disto, também ficam sem acesso ao tratamento adequado. É certo que é desconhecido nesta sí­ndrome, assim como em outras doenças raras, aspectos de prevenção e de tratamento que possibilite a cura ou ao menos ações terapêuticas mais efetivas e eficazes. Via de regra o tratamento médico é em ní­vel sintomático, para corrigir ou amenizar os vários problemas de saúde fí­sica que geralmente acompanham os indiví­duos acometidos pela sí­ndrome.

Cuidando de meu filho e estudando sobre tal sí­ndrome vivenciei o quanto a fonoaudiologia contribuiu para a redução da ansiedade e também quanto ele aprendeu na verbalização de suas demandas. A terapia ocupacional e fisioterapia também têm contribuí­do fortemente para superar as deficiências no desenvolvimento motor, principalmente na coordenação motora fina, permitindo maior independência no uso de tecnologia (celular, computador); atividades de cuidados pessoais (escovar os dentes, usar o banheiro, pentear os cabelos) e até mesmo na alfabetização. Sem dúvida, os cuidados e as terapias melhoram a qualidade de vida do paciente e da famí­lia, permitindo a inserção do indiví­duo na rotina habitual da famí­lia e o acesso a locais públicos como escola, parques, clubes, shopping e outros.

Assim, se ele for estimulado, por exemplo, a comer sozinho (usando talheres, copos e pratos) será capaz de frequentar um restaurante, trazendo um fio de normalidade para a rotina da famí­lia e aumentando a qualidade de vida de todos os envolvidos.

No contexto das doenças raras, em que não se ambiciona a cura, a aplicação destes cuidados na infância é de fundamental importância porque irão determinar o ní­vel de independência e adaptação í  sociedade que este indiví­duo terá na idade adulta. No caso do meu filho, ele hoje frequenta a mesma escola que os irmãos e está totalmente alfabetizado.

Diz o antigo ditado português "o que não tem remédio, remediado está", mas eu ouso discordar para dizer que "aquilo que não tem remédio inspira cuidados", porque nestes casos, os cuidados representam tudo o que o paciente e sua famí­lia têm de concreto em termos de assistência em saúde.

 Mais, tomo como minha a frase final, considerando a competência (conhecimento, habilidade, atitudes, valores e emoções) que eu como mãe e minha famí­lia desenvolvemos no cotidiano de convivência com nosso filho, portador da sí­ndrome de Williams-Beuren ...Enquanto eu viver, darei sempre o melhor de mim, na esperança de que todos possam ter um futuro melhor. Leobino Filho

Biografia do Autor

Ana Lúcia Fernandes Farias Ricci Marques, FAMERP

Biomédica, enfermeira, pós-graduada em Psicopedagogia, Membro do grupo de Pesquisa Nemoreges e aluna especial do Programa de Pós-Graduação  Stricto Sensu  em Enfermagem – Mestrado Acadêmico, da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto/SP (FAMERP)

Referências

Congresso Iberoamericano de Doenças Raras. Brasília, Outubro de 2016. [citado 2017 Abr 6]. Disponível em: URL: http: amaviraras.com

IBGE. Wikipedia. [citado 2017 Abr 8]. Disponível em: URL: https://pt.wikipedia.org/wiki/São_Paulo_(cidade)

Associação Brasileira de Síndrome de Williams-Beuren. [citado 2017 Abr 6]. Disponível em URL: http://swbrasil.org.br

Ministério da Saúde, “Doenças raras ainda representam desafio para saúde públicaâ€. [citado 2017 Abr 6]. Disponível em: URL: http://www.brasil.gov.br/saude/2015/03/doencas-raras-ainda-representam-desafio-para-saude-publica

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Publicado

2017-05-29