Fisioter Bras. 2023;24(1):89-100
REVISÃO
Impacto do tratamento
fisioterapêutico sobre a cefaleia em pacientes com desordem temporomandibular:
uma revisão sistemática
Impact of physiotherapeutic treatment on headache in patients with
temporomandibular disorder: a systematic review
Alan Nogueira Barbosa1,
Ana Paula Silva Oliveira1, Fernanda Aparecida Ferreira Santos1,
Gabriely Inês Colombo1, Natale de Sena Cerqueira1, Rafaela da Silva
Sales1, André Luiz Lisboa Cordeiro1
1Faculdade Nobre, Feira de Santana, BA,
Brasil
Recebido em 2 de janeiro de
2022; Aceito em 16 de novembro de 2022.
Correspondência: André Luiz Lisboa Cordeiro, E-mail:
andrelisboacordeiro@gmail.com
Como citar
Barbosa AN, Oliveira APS, Santos FAF, Colombo GI, Cerqueira NS, Sales RS, Cordeiro ALL. Impacto do tratamento fisioterapêutico sobre a cefaleia em pacientes com desordem temporomandibular: uma revisão sistemática. Fisioter Bras. 2023;24(1):89-100 doi:10.33233/fb.v24i1.5042
Resumo
Introdução: As disfunções temporomandibulares
(DTM) desencadeiam dor e desconforto na articulação temporomandibular, podendo
apresentar sintomas como cefaleia. Sendo assim, o tratamento fisioterapêutico
vem sendo aplicado para redução desses sintomas através de técnicas manuais. Objetivo:
Revisar o impacto do tratamento fisioterapêutico sobre a cefaleia em pacientes
com DTM. Métodos: Trata-se de um estudo de revisão sistemática com busca
de dados nas bases Scielo, Lilacs
e Pubmed, no qual foram incluídos ensaios clínicos
randomizados e excluídos estudos com histórias de traumas na face, em crianças,
patologias reumáticas, doenças neurológicas, estudos não randomizados, relatos
de caso, observações clínicas e revisões. Os artigos selecionados são tanto na
língua portuguesa quanto inglesa. Foram utilizadas as seguintes palavras-chave:
relação entre cefaleia e disfunção temporomandibular, dor na articulação
temporomandibular e cabeça, tratamento fisioterapêutico e terapia manual. Resultados:
Dos 5 estudos selecionados, 3 obtiveram resultados positivos, melhorando a
intensidade da dor de cabeça e a síndrome da desarmonia corporal, além do
aumento da ADM da cervical, que de certa forma influencia também na DTM. Conclusão:
Conclui-se que há uma melhora significativa no quadro cefaleia após o
tratamento fisioterapêutico.
Palavras-chave: cefaleia; Fisioterapia; transtornos da
articulação temporomandibular.
Abstract
Introduction: Temporomandibular disorders (TMD) trigger pain and
discomfort in the temporomandibular joint, and may present symptoms such as
headache. Therefore, physiotherapeutic treatment has been applied to reduce
these symptoms through manual techniques. Objective: To review the
impact of physical therapy treatment on headache in patients with TMD. Methods:
This is a systematic review study with search for data in the Scielo, Lilacs and Pubmed
databases, in which randomized clinical trials were included and studies with
histories of facial trauma in children, rheumatic pathologies, neurological
diseases, non-randomized studies, case reports, clinical observations and
reviews were excluded. The selected articles are in both Portuguese and
English. The following keywords were used: relationship between headache and
temporomandibular disorder, pain in the temporomandibular joint and head,
physiotherapeutic treatment and manual therapy. Results: Of the 5
selected studies, 3 obtained positive results, improving the intensity of
headache and the body disharmony syndrome, in addition to the increase in
cervical ROM, which in a way also influences TMD. Conclusion: It is
concluded that there is a significant improvement in the headache after
physical therapy treatment.
Keywords: headache; Physical Therapy; temporomandibular joint
disorders.
A
articulação temporomandibular (ATM) faz parte do sistema estomagnáticoque
atua na realização de funções como
sucção, deglutição, fonação e
mastigação. As disfunções
temporomandibulares (DTM) são alterações
frequentes
que geram dores crônicas orofaciais, sem ação de
alguma variação dentária. DTM
e dor orofacial podem ser correlacionadas com patologias, sejam elas
somáticas
ou neurológicas, como a cefaleia [1].
A dor pode
ocorrer tanto em regiões musculares quanto em ósseas, variando a intensidade a
depender do local. Os sintomas mais frequentes são: fadiga muscular, ruídos
articulares, cefaleia e dores na face. É importante salientar que há
repercussões físicas e emocionais, portanto, durante a avaliação da patologia
devem-se considerar os aspectos subjetivos e psicológicos, principalmente
quando for um processo crônico, característico de dor relatada com duração
maior de três meses [1].
A maioria
dos pacientes com DTM procura o dentista devido aos incômodos na região e
acabam associando que seja algo ligado a dentição, normalmente localizada na
área pré-auricular, sendo encontrada também na região
retroauricular, podendo se irradiar para as áreas temporal, frontal ou
occipital, e se apresentar como cefaleia [2]. Além do tratamento farmacológico,
é de fundamental importância a abordagem com profissionais de diversas áreas
como fisioterapia, fonoaudiologia, psicologia e o odontologia.
Vários
fatores, especialmente o estresse e a ansiedade, podem causar hiperatividade
muscular e o desenvolvimento de hábitos parafuncionais,
levando a microtraumas da ATM e lesões musculares
[3].
Os
tratamentos existentes para as DTMs são variados e o
diagnóstico clínico por um especialista é imprescindível para que o mais
apropriado seja aplicado. Segundo a literatura, devido às causas
multifatoriais, o método escolhido em primeiro plano deve ser conservador,
reversível e não invasivo [4,5,6]. A Fisioterapia tem o papel fundamental para o
alívio destes incômodos musculoesqueléticos, reduzir as inflamações e em curto
tempo já proporciona grau de ADM eficiente para que consiga realizar mínimos
movimentos sem sentir incômodos reestabilizado a função motora. Dito também,
que exercícios voltados ao tratamento proporcionam melhor condicionamento na
região cervical tendo efeito positivo em sua forma e mobilidade. Ou seja, além
de tratar a DTM, o fisioterapeuta trata também a região cervical [7].
Para
analisar o distúrbio, deve-se ter como base dois aspectos fundamentais: sua
fisiopatologia e sua causa. Sabe-se que a fadiga muscular e o espasmo são
responsáveis pelos principais sintomas de dor, sensibilidade, ruído e limitação
de função, que caracterizam a síndrome de dor e a disfunção na articulação
temporomandibular [8].
O
tratamento fisioterapêutico baseia-se, em alongamentos, massagens, exercícios,
terapia de liberação posicional, estimulação elétrica nervosa transcutânea
(TENS), laser e ultrassom. Há casos em que Disfunção Temporomandibular está
associada a alterações posturais, portanto mostra-se a efetividade da
fisioterapia quando se procura evitar a cirurgia, minimizando a dor muscular,
melhorar a amplitude de movimento, reposicionar a mandíbula, melhorar a
postura, reduzir a inflamação, reduzir a carga na ATM e fortalecer o sistema
musculoesquelético [9].
É de
extrema importância também a participação de órgãos governamentais voltados
para a saúde pública para auxiliar as pessoas que não tem condições financeiras
de arcar com este tipo de tratamento. Tudo isso visando não só na redução de
gastos financeiros que muitos infelizmente custam a pagar, mas também serve
como questão humanitária, pois beneficia parte da população de baixa renda.
Quando este tipo de serviço é oferecido pelo governo tende a dar maior apoio e
conforto a quem necessita [10].
Portanto,
o objetivo principal desse estudo é investigar os efeitos do tratamento
fisioterapêutico em pacientes com disfunções temporomandibulares que apresentam
cefaleia.
Trata-se
de uma revisão sistemática, cuja questão norteadora é: “Qual o impacto do
tratamento fisioterapêutico sobre a cefaleia em pacientes com desordem
temporomandibular?” A busca da literatura foi realizada utilizando as seguintes
bases de dados: Scientific Electronic
Library Online (Scielo), Literatura Latino-americana
e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs) e PubMed no período de março a junho de 2019. As
palavras-chave utilizadas para busca dos artigos foram: cefaleia,
temporomandibular, dor temporomandibular, fisioterapia, terapia manual,
sinônimos e palavras-chave acrescidas dos operadores booleanos “and” e “or” de acordo com os
Descritores em Ciência da Saúde (DeCS). Os artigos
selecionados são tanto na língua portuguesa quanto na inglesa. A pesquisa foi
estruturada com base na ferramenta PICO [11], como consta no Quadro 1 abaixo.
Quadro 1 - Estratégia de pesquisa PICO [11]
Foram
incluídos ensaios clínicos randomizados que tivessem relação ao tratamento
fisioterapêutico em pacientes com cefaleia por DTM, sem restrição temporal.
Foram excluídos os estudos envolvendo traumas na face, em crianças, patologias
reumáticas, doenças neurológicas ou com uso de aparelhos ortodônticos, estudos
não randomizados, relatos de caso, observações clínicas e revisões.
Foram
incluídos artigos sistematicamente pesquisados com a finalidade
de avaliação da
qualidade metodológica. Os artigos coletados por meio das
pesquisas nas bases
de dados foram selecionados por rastreio dos títulos (primeira
etapa), resumos
(segunda etapa) e leitura integral (terceira etapa). Em seguida, foi
realizada
uma leitura exploratória dos estudos selecionados e,
posteriormente, leitura
seletiva e analítica. Foram sistematizados os dados
extraídos dos artigos:
autores, título, revista, ano, resumo e conclusões, de
forma a possibilitar a
obtenção de informações pertinentes
à pesquisa. Além disso, para avaliação da
qualidade metodológica dos artigos, dois pesquisadores avaliaram
de forma
independente, auxiliando na escolha das revisões
sistemáticas, se houvesse
dúvidas ou contradições, um terceiro avaliador
seria ouvido. As recomendações
da PRISMA [12] foram seguidas.
Para a
análise a qualidade metodológica dos estudos foi avaliada de acordo com a
escala de PEDro, que pontua 11 itens, a saber: 1)
Critérios de elegibilidade, 2) Alocação aleatória, 3) Alocação oculta, 4)
Comparação da linha de base, 5) Indivíduos cegos, 6) Terapeutas cegos, 7)
Avaliadores cegos, 8) Acompanhamento adequado, 9) Intenção de tratar a análise,
10) Comparações entre grupos, 11) Estimativas pontuais e variabilidade. Os
itens são pontuados como presentes (1) ou ausentes (0), gerando uma soma máxima
de 10 pontos, com o primeiro item sem contar. Quanto mais alta a pontuação,
melhor a qualidade dos estudos. A PEDro é uma base de
dados específica para estudos que investigam a eficácia de intervenções em
fisioterapia, podendo ser acessada gratuitamente por meio do site
www.pedro.org.au [13].
Foram
encontrados 53 artigos, destes apenas 5 foram selecionados através dos
critérios prescritos (excluídos os estudos com histórias de traumas na face, em
crianças, patologias reumáticas, doenças neurológicas ou com uso de aparelhos
ortodônticos, estudos não randomizados, relatos de caso, observações clínicas e
revisões) e da consequente verificação dos artigos por dois pesquisadores. O
fluxograma presente na figura 1 demonstra todos os critérios e bases de dados
utilizados para a seleção dos artigos. Logo depois de realizada essa análise, é
possível determinar os 5 estudos que foram escolhidos para tornarem-se base
desta revisão sistemática.
Figura 1 - Fluxograma para obtenção dos
ensaios clínicos randomizados no período março a junho de 2019
A
qualidade metodológica avaliada através da escala PEDro
é mostrada no quadro 2. Os 5 estudos incluídos nesta revisão sistemática
discutem sobre o impacto do tratamento fisioterapêutico sobre a cefaleia em
pacientes com desordem temporomandibular.
Quadro 2 - Avaliação da qualidade
metodológica dos estudos incluídos nesta revisão utilizando a escala da base de
dados PEDro
Dos cinco
estudos incluídos, quatro artigos obtiveram resultados positivos quanto à dor
relatando abertura máxima da maxila sem dor [14], melhora na intensidade da dor
de cabeça [15], mostraram redução significativa em todos os aspectos do
comprometimento cervical após o período de tratamento [16] e melhora
significativa na intensidade da dor [17], além de melhorias nas condições de
saúde bucal dos idosos [18], conforme tabela I.
Tabela I - Dados gerais sobre os ensaios
clínicos randomizados incluídos, por meio do impacto do tratamento
fisioterapêutico sobre os desfechos de pacientes com DTM e cefaleia (ver Tabela)
Em grande
parte dos estudos, foi evidenciado que a fisioterapia associada ao tratamento
com fármacos e atuação multidisciplinar tem uma eficácia e aceitação maior.
Além do tratamento multidisciplinar, é necessário instrução e conscientização
do paciente, pois a DTM é uma doença progressiva sendo preciso orientar o
paciente para que ele melhore o seu nível de qualidade de vida, tendo tempo
para si mesmo e minimizando ao máximo as condições que possam levar ao
estresse.
Foi
possível analisar melhorias especificamente no quesito da dor de cabeça. No
quadro geral, Michelotti et al. [14] relatam
melhora durante abertura máxima da maxila sem dor e Piekartz
et al. [15], após o tratamento, apresentou melhoras no quesito da
intensidade da cefaleia. Apesar de apresentar objetivos diferentes, Piekartz et al. [15] relatam que a melhora na
intensidade do quadro álgico ocorre devido a diferente intervenção
fisioterapêutica realizada.
Dentro do
tratamento realizado com a fisioterapia foram observadas as técnicas de terapia
manual, exercícios terapêuticos na região cervical e orofaciais, trabalhados
juntos ou de forma individual, foi trabalhada também mobilização das
articulações e alongamento. Os resultados que ficam evidentes, em sua grande
maioria, são que os portadores da disfunção temporomandibular precisam realizar
tratamento tanto da ATM quanto das outras disfunções associadas [15].
O
tratamento cervical e orofacial foi mais eficaz do que o tratamento cervical
isolado para aumentar os limiares de dor à pressão na região do trigêmeo e
produzir abertura bucal máxima livre de dor [18]. Além disso, foi possível
observar também que no estudo de Piekartz et al.
[16], a adição de técnicas de tratamento orofacial ao tratamento usual da
terapia manual cervical obteve efeitos benéficos em cuidados habituais,
delimitando-se apenas ao comprometimento cervical em indivíduos com
características e sinais de DTM.
A procura
de um fisioterapeuta traz mudanças físicas e fisiológicas na disfunção de ATM.
Em razão da função motora ser acometida, o terapeuta atua justamente com o
objetivo de promover a melhora gradativa do paciente e gerar qualidade de vida
tratando também outras regiões que possam ser as causadoras da disfunção, como
já citado acima, realizando a fisioterapia na região cervical e orofacial [17].
Observa-se,
também, uma melhor mobilidade da região cervical, realizando uma prevenção de
possíveis cervicalgias ou dores correlacionadas a musculatura como “pinçamento”
de fibras musculares ou tensões na região [16]. As pesquisas realizadas nos
embasam em um melhor grau de conhecimento e forma de tratamentos, visando a
melhora do condicionamento físico facial do paciente ao promover mais alívio e
uma melhor qualidade de vida.
Após
demonstrar a correlação entre cefaleia e disfunções na articulação
temporomandibular foi possível perceber que há uma melhora significativa no quadro
de dores do paciente, ao acrescentar o tratamento fisioterapêutico. Além disso,
é possível também salientar a importância da atuação multidisciplinar e da
orientação correta para que esse paciente continue progredindo durante o
tratamento.
Conflito
de interesses
O presente
estudo não possui conflito de interesses.
Fonte
de financiamento
O presente
estudo não foi financiado.
Contribuição
dos autores
Concepção
e desenho da pesquisa:
Barbosa AN, Oliveira APS, Santos FAF, Colombo GI, Cerqueira NS, Sales RS,
Cordeiro ALL; Coleta de dados: Barbosa AN, Oliveira APS, Santos FAF,
Colombo GI, Cerqueira NS, Sales RS, Cordeiro ALL; Análise e interpretação
dos dados: Barbosa AN, Oliveira APS, Santos FAF, Colombo GI, Cerqueira NS,
Sales RS, Cordeiro ALL; Redação do manuscrito: Barbosa AN, Oliveira APS,
Santos FAF, Colombo GI, Cerqueira NS, Sales RS, Cordeiro ALL; Revisão
crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Cordeiro
ALL