O quanto podemos exigir das unidades motoras nas doenças neuromusculares?

Autores

  • Marco Orsini UNISUAM
  • Mauricio de Sant"'Anna Jr IFRJ
  • Marcos RG de Freitas UFRJ
  • Viviane Marques UNIRIO
  • Adriana Leico Oda UNIFESP
  • Acary Bulle Oliveira UNIFESP
  • Silmar Teixeira UFPI
  • Victor Hugo Bastos UFPI
  • Caroline Lourenco Medeiros UFF

DOI:

https://doi.org/10.33233/fb.v18i4.1213

Resumo

Frequentemente discutimos sobre qual seria a melhor estratégia para a prescrição de exercí­cios terapêuticos em pacientes com doenças neuromusculares, quanto ao tipo, frequência e intensidade. Partindo do principio que a contração muscular é dependente da informação de vias descendentes até a musculatura estriada esquelética, podemos concluir que sejam as doenças da medula espinhal, dos nervos periféricos, da junção mio-neural e\ou exclusiva dos músculos, todo um circuito é ativado, sendo por vezes sobrecarregado [1].

O grande questionamento é a busca de um programa de reabilitação que promova benefí­cios sem a realização de overtraining (desencadeamento de efeitos deletérios em um sistema já combalido). São muitos os efeitos da neurotransmissão, como, por exemplo: 1 - Chegada do PA nos terminais, 2 - Liberação de acetilcolina (Ach), 3 - Complexo receptor Ach, 4 - Abertura de canais de Na e NT dependentes; 5 - Potencial pós- sináptico = Potencial de Placa; 6 - Abertura de Canais Na e K voltagem dependentes, fora da placa motora; 7 - geração e propagação do PA pelo sarcolema [2].

É imperioso citar também a cascata de transdução eletro-mecânica, que culmina com a condução do PA pelo sarcolema até o inicio da contração muscular. Fato que merece destaque é o "ciclo das pontes cruzadas" – "Quanto mais tempo dura o PA no sarcolema, mais tempo dura o Ca++ no mioplasma". "Quanto mais vezes o ciclo se repete, maior será o grau de deslizamento" [2].

Sempre que traçamos metas e objetivos terapêuticos, devemos repensar seus efeitos nas doenças neuromusculares. Por vezes, os exercí­cios provocam intolerância, com queixas relacionadas í  fadiga central e\ou periférica, exaustão, cansaço e dores mio-articulares. Nas distrofinopatias, por exemplo, há uma perda progressiva de fibras musculares, resultando em aumento da fraqueza muscular e redução do VO2máx devido í  perda de massa muscular funcional. Excessivas respostas cardiopulmonares ao exercí­cio ocorrem em algumas miopatias mitocondriais, além de outras patologias em discussão [3].

Nossas deduções, muitas baseadas em princí­pios neuroquí­micos e neurofisiológicos, são literalmente colocadas em "xeque" pelas particularidades dos pacientes: crí­ticos ou ambulatoriais, dependentes ou independentes, no status metabólico\nutricional, em questões hemodinâmicas, em doenças pré-existentes, nos medicamentos utilizados e, principalmente, no espectro de apresentação das doenças. Médicos e Fisioterapeutas devem compreender que para um programa de reabilitação ser implementado com prudência, são necessários conhecimentos sobre metabolismo basal, efeito térmico de ingesta alimentar e gasto energético (agudo e crônico) [4].

Muitas vezes nos esquecemos do principal: do dinamismo e do presente. Pacientes que respondem de forma favorável a exercí­cios terapêuticos recém-empregados, podem apresentar repercussões secundárias deletérias e declinarem durante o processo de recuperação (quando as doenças não possuem caráter progressivo). A discussão é realmente provocativa, pois são essas variações que nos intrigam na prática clinica diária. Infelizmente não temos resposta para a maioria dos questionamentos levantados. Passemos a traçar e correlacionar o perfil clinico e funcional de nossos pacientes de acordo com suas particularidades? Esqueçamos um pouco a história natural das doenças e vamos apostar com prudência no potencial funcional.

A relação (anabolismo x catabolismo) também é tema de ampla discussão. Será que estamos realmente trabalhando em limites mí­nimos, submáximos, máximos? Estarí­amos "desobedecendo" um perí­odo de repouso necessário para restabelecimento de um sistema deficiente com exercí­cios que induziriam ainda mais o catabolismo? Será que estamos contribuindo efetivamente para oferecer o que de mais precioso existe para nossos pacientes? Não podemos nos esquecer da "função", objetivo crucial da reabilitação [5].

Após o término das práticas terapêuticas, o consumo de oxigênio (VO2) não retorna aos valores de repouso de forma instantânea. Os pacientes e, principalmente os que lidam com o tratamento clinico e de reabilitação (equipe transdisciplinar), devem conscientizar-se que durante as atividades uma "divida metabólica" é assumida. Podemos caracterizar esse débito como um consumo excessivo de oxigênio pós-exercí­cio ou consumo excessivo de oxigênio após Exercí­cio (EPOC) [6,7].

Doenças Neuromusculares nos alertam para desequilibrio metabólico e, principalmente, sinalizam para cautela. Ser cauteloso não é sinômino de não apostar. Ser cauteloso é ter consciência que existem processos ainda não compreendidos no que tange (exercicios terapêuticos x doenças neuromusculares). Perguntamos, ainda sem critérios definidos de resposta: As atividades prescritas não produziriam um efeito EPOC, acelerando o processo de determinadas doenças neuromusculares? Essa tal "dí­vida metabólica" seria realmente sanada com o repouso? Seria o tempo de repouso variável entre o espectro de apresentação das doenças e das particularidades dos pacientes?

Cabe ressaltar que para a prescrição dos exercí­cios terapêuticos utilizamos estratégias consagradas na literatura, principalmente para determinação da intensidade das atividades, tais como frequencia cardí­aca e a sensação subjetiva de esforço. A análise de gases através da ergoespirometria (considerado padrão-ouro) tem sido pouco utilizada em função de questões como: alto custo do equipamento, mão de obra capacitada para interpretação dos resultados e dificuldade de acesso [8,9].

Apesar da grande influencia sofrida pela modulação autonômica cardiovascular, a frequencia cardí­aca ainda é um importante marcador para a prescrição do exercí­cio fí­sico, sem nos esquecermos da sensação subjetiva de esforço descrita por Borg [9], devidamente validada e que apresenta correlação com a frequencia cardí­aca.

 Outra preocupação nas doenças neuromusculares faz referência í  disfagia, desde ao gerenciamento de saliva í  ingestão oral de qualquer consistência, o que podem ocasionar desnutrição, desidratação, aspiração, desconforto, desprazer e isolamento social, além de complicações mais graves como a pneumonia aspirativa e o óbito. A deglutição envolve mais de 30 músculos esqueléticos. O controle de eficácia dos exercí­cios está relacionada í  utilização de diferentes técnicas terapêuticas fonoaudiológicas para o tratamento da disfagia orofarí­ngea em populações que ainda não esclareceram a casuí­stica estudada [10,11]. A aplicação de estí­mulos táteis, térmicos e gustativos demonstram resultados positivos especialmente nas disfagias neurogênicas, visto que estimulam principalmente a propriocepção das estruturas relacionadas com o processo de deglutição sem promoverem esforço [12,13].

Faz-se necessário a busca por informações mais robustas no que tange a prescrição de exercí­cios terapepêuticos para portadores de doenças neuromusculares, afim de que sejam respeitados os limites impostos pela doença, mas que também não ocorra uma subestimação da real capacidade do indiví­duo. Partindo dessa premissa estudos têm sido conduzidos com o objetivo de elucidar essas questões para portadores de ELA [14,15], Sí­ndrome de Guillan-Barré e Polineuropatias [16], distrofinopatias [17], dentre outras. Evergem também pesquisas que consideram a utilização de suplementação especí­fica e suporte nutricional adjuvante às atividades terapêuticas [1]. Medicar e Reabilitar pacientes com doenças neuromusculares, indubitavelmente, ainda é um campo extenso de especulações. 

Biografia do Autor

Marco Orsini, UNISUAM

Programa de Mestrado em Ciências Aplicadas í  Saúde, Universidade Severino Sombra, Vassouras/RJ e Ciências da Reabilitação, UNISUAM/RJ

Mauricio de Sant"'Anna Jr, IFRJ

Instituto Federal do Rio de Janeiro, IFRJ

Marcos RG de Freitas, UFRJ

Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Viviane Marques, UNIRIO

Universidade do Estado de Rio de Janeiro UNIRIO

Adriana Leico Oda, UNIFESP

Departamento de Doenças Neuromusculares da Universidade Federal de São Paulo

Acary Bulle Oliveira, UNIFESP

Departamento de Doenças Neuromusculares da Universidade Federal de São Paulo

Silmar Teixeira, UFPI

Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal do Piaui

Victor Hugo Bastos, UFPI

Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal do Piaui

Caroline Lourenco Medeiros, UFF

Departamento de Neurologia da Universidade Federal Fluminense

Referências

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Publicado

2017-10-05

Edição

Seção

Comunicação breve